terça-feira, 22 de novembro de 2022

Os Engenheiros do Caos - Cap 3 - Waldo Conquista o Planeta

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Waldo Conquista o Planeta

A data 25 de fevereiro de 2013 é marcada por uma incrível coincidência. No mesmo dia em que o Movimento 5 Estrelas concorre às eleições pela primeira vez e se torna o partido italiano mais votado – obtém 25% do sufrágio –, o canal de TV inglês Channel Four exibe uma ficção que explica esse fenômeno mais claramente que qualquer ensaio de sociologia política. No início do episódio da série Black Mirror que passou naquela noite, Waldo, um pequeno urso digital azulado, no papel de apresentador de um talk-show terrivelmente trash, zomba do convidado do dia com piadas de péssimo gosto. Por trás do simulacro se esconde Jamie, um homem frustrado de 30 anos, que empresta a Waldo seus gestos e suas (raras) ideias, sempre maltratando os convidados, como Liam Monroe, um arrogante ex-ministro da Cultura surgido das fileiras do Partido Conservador.

A certa altura, o produtor do show constata que o ursinho está ficando popular: “As pessoas querem ver mais o Waldo no monitor”, ele diz. A chance aparece quando um deputado conservador é obrigado a renunciar por causa de um escândalo de pedofilia e Liam Monroe é escolhido para concorrer em seu lugar. Por que não segui-lo onde quer que ele vá e ridicularizar sua campanha?, imaginam, então, os produtores. Melhor: que tal juntar ele e Waldo, cara a cara?

Em início de campanha, Monroe tenta ignorar Waldo, que acompanha cada passo e gesto seu, deixando uma trilha de insultos e piadas vulgares. O problema é que o público adora o urso gozador. Ele faz rir e não tem papas na língua – ao contrário dos políticos, que se expressam em códigos e jargões. Sustentado pelo povo, Waldo acaba por ser incluído entre os políticos ao ser admitido num debate público. Acontece que Jamie, o ator que empresta a voz ao implacável urso, não está no clima: “Não tenho a menor ideia de como responder a uma pergunta séria”, ele se queixa. “Mas ninguém está pedindo isso a você”, dizem os produtores. “Você é o alívio cômico”.

Durante o debate, Monroe tenta desconstruir e liquidar de uma vez por todas a pantomima do urso de pelúcia: “Sua presença em cena desvaloriza nossa democracia”, exclama. “É só um personagem de desenho animado, que não propõe nada além de algumas piadas, e quando elas se esgotam, parte para a agressão. Por trás dele se esconde um ator fracassado que, aos 33 anos, nunca fez nada de sua vida. Fale, se você tem algo a propor, ou retire-se e dê seu lugar aos verdadeiros candidatos!”.

Por um instante, Waldo vacila. Mas se recupera rapidamente. “Vá para o inferno, Monroe. Você é menos humano que eu, embora eu seja só um urso de mentira com uma piroca azul-turquesa. Vocês, os políticos, são todos iguais, e é culpa de vocês mesmos se a democracia virou uma piada e ninguém sabe mais para que ela serve!” Em poucos minutos, a tirada de Waldo viraliza e registra milhões de visualizações no YouTube, além de likes, retweets e compartilhamentos.

Os comentários se multiplicam: “Todo mundo está farto de tanto imobilismo, esse urso é o porta-voz dos desalentados!”. Waldo começa a participar de programas mais sérios, e quando os apresentadores fingem indignar-se por sua falta de educação e sua ignorância, ele replica: “Cale a boca, hipócrita! Graças a mim você vai ter o maior número de compartilhamentos da sua vida!”.

De olho nos votos, os produtores criam um aplicativo que geolocaliza os eleitores potenciais de Waldo, e os presenteia com um gadget e uma piada. Um marqueteiro americano contata os produtores: “No momento, Waldo é antipolítico, mas no futuro ele poderá veicular qualquer conteúdo político! E isso pode funcionar em cadeia mundial!”. “Como a batata Pringles!”, responde Jamie, com sarcasmo. “Exatamente como a batata Pringles!”, replica o americano, sem ironia.

O produtor, então, recebe as encomendas de Waldo no lugar do escrupuloso Jamie e começa a incitar seus partidários a realizar ações cada vez mais violentas. No dia das eleições, Waldo perde por um punhado de votos, mas pouco importa. O fenômeno é incontrolável. No momento da proclamação dos resultados, Waldo ordena a seus fãs que tirem os sapatos e os lancem em Monroe, que, submerso numa chuva de calçados, se vê logo como protagonista de um novo vídeo viral. “Se esse troço se tornar a principal oposição”, ele prevê sombriamente enquanto atravessa a cidade em seu carro, “então é o sistema inteiro que se revela absurdo. E é provável que seja, mesmo que se trate do mesmo sistema que construiu essas ruas”.

A cena final se passa alguns anos mais tarde, à noite, numa megalópole não identificada, à la Blade Runner. Uma patrulha de milicianos uniformizados caça a golpes de cassetete um grupo de mendigos que dormem sob uma ponte. Entre eles encontra-se Jamie, que se vê diante de um gigantesco painel eletrônico. Desfilam na tela imagens que chegam dos quatro cantos do planeta: estudantes asiáticos usando uniformes azul-turquesa-Waldo, aviões militares com a efígie de Waldo. Em superposição, destacam-se, traduzidos em todas as línguas, os slogans vazios do novo poder: Change, Hope, Believe, Future. O antissistema tornou-se o sistema e, por trás da máscara do Carnaval, estabeleceu um regime de ferro.

Em fevereiro de 2013, quando a história de Waldo passou pela primeira vez na TV, os espectadores não italianos puderam pensar, sem susto, que se tratava de uma sátira inverossímil. À época, Donald Trump ainda era uma figura exuberante num reality show da NBC, e, na Grã-Bretanha, como na França e no resto da Europa, homens políticos tradicionais, oriundos de partidos tradicionais, exerciam o poder de maneira tradicional, sem que nada deixasse antever o fenômeno que estava prestes a se abater sobre eles. Mas, alguns anos passados da transmissão, fica claro que Waldo está, de certa forma, em vias de tomar o poder simultaneamente em todas as praças. Portanto, vale a pena estudar as características dessa estranha besta que se nutre do ódio, da paranoia e da frustração dos outros.

Num livro publicado em 2006, Peter Sloterdijk reconstruiu a história política da cólera. Segundo ele, um sentimento irresistível atravessa todas as sociedades, alimentado por aqueles que, com ou sem razão, pensam ter sido lesados, excluídos, discriminados ou insuficientemente ouvidos. 

Historicamente, a Igreja foi a primeira a abrir os exaustores para que essa imensa raiva acumulada se expandisse. Depois, os partidos de esquerda tomaram a frente a partir do fim do século XIX. Esses últimos garantiram, segundo Sloterdijk, a função de “bancos de cólera”, acumulando as energias que, em vez de serem gastas num instante, poderiam ser investidas na construção de um projeto mais amplo. Um exercício difícil, pois se tratava, de um lado, de atiçar constantemente a fúria e o ressentimento e, ao mesmo tempo, controlar tais sentimentos para que não fossem desperdiçados em episódios individuais, mas servindo à realização do plano maior. Segundo esse esquema, o perdedor se transforma em militante, e sua raiva encontra um caminho político para se expressar.

Hoje, diz Sloterdijk, ninguém gerencia mais a cólera que os homens acumulam. Nem a religião católica – que teve de abandonar os tons apocalípticos, o juízo universal e a revanche dos humilhados no “outro mundo” para se adaptar à modernidade –, nem a esquerda – que, em geral, reconciliou-se com os princípios da democracia liberal e as regras do mercado. Por isso, desde o início do século XXI, a cólera passou a se expressar de maneira cada vez mais desorganizada, dos movimentos antiglobalização às revoltas dos subúrbios.

Dez anos depois da publicação do ensaio de Sloterdijk, já está comprovado que as forças da ira se reorganizaram e expressam-se no centro da galáxia dos novos populismos que, do Leste Europeu aos Estados Unidos, passando pela Itália, a Áustria e os países escandinavos, dominam cada dia um pouco mais a cena política de seus respectivos países. Para além de todas as diferenças entre si, esses movimentos têm como ponto comum o fato de pôr em primeiro lugar de sua agenda política a punição das elites tradicionais, de direita e de esquerda. Essas últimas são acusadas de terem traído o mandato popular, ao cultivar os interesses de uma minoria restrita em vez de servir aos anseios da “maioria silenciosa”. Muito mais que medidas específicas, os líderes populistas oferecem aos eleitores uma oportunidade única: votar neles significa servir de torcida contra os governantes.

Assim, um dos prospectos distribuídos em favor do Brexit trazia os rostos satisfeitos do primeiro-ministro, David Cameron, e do chanceler do Tesouro, George Osborne, acompanhados do slogan: “Acabe com a vontade deles de sorrir, votem ‘Leave’ (o ‘sim’ para a saída do bloco europeu)”. As multidões que recebiam Trump em seus comícios eleitorais entoavam em coro, por sua vez, “Lock her up! Lock her up! ” – “mandem-na para a cadeia”, fazendo referência à sua rival, Hillary Clinton.

Desde a Grécia antiga, as punições dos poderosos já era, sempre, o primeiro ponto do programa dos demagogos. E, mesmo se o restante dos projetos dos populistas é nebuloso e irrealista, é preciso admitir que, nesse aspecto punitivo, eles cumprem a palavra. Um voto suplementar em seu favor – ou mesmo uma simples preferência expressa numa pesquisa eleitoral – é capaz de semear o pânico entre as elites políticas tradicionais. Assim, aqueles que declaram que a chama populista durará pouco – pois uma vez no poder, as forças que a encarnam não conseguirão manter suas promessas – estão nadando em plena ilusão. A promessa central da revolução dos populistas é a humilhação dos poderosos, e ela se realiza já no momento em que eles ascendem ao poder.

Por trás da ira pública, há causas reais. Os eleitores punem as forças políticas tradicionais e voltam suas bandeiras para líderes e movimentos cada vez mais extremistas. Sentem-se ameaçados pela perspectiva de uma sociedade multiétnica. E, no conjunto, castigados pelos processos de inovação e mundialização que as elites lhes vêm empurrando goela abaixo, em doses cavalares, ao longo do último quarto de século.

Nós não estaríamos, evidentemente, falando de Waldo, de Trump e de Salvini, do Brexit e de Marine Le Pen se não houvesse uma realidade material sobre a qual os novos populistas tenham fincado os pés para levar suas reivindicações adiante. Mas, se olharmos os dados mais de perto, esses elementos, ainda que pertinentes, não bastam para explicar a amplitude das mudanças em curso. Como o prova, aliás, o simples fato de que, quase em todos os lugares, não são necessariamente as categorias mais pobres, nem as mais expostas à imigração e à mudança, as que se entregam ao abraço do urso Waldo. Os eleitores de Trump tinham, em 2016, um nível de renda mais elevado do que os que votavam em Hillary Clinton, enquanto na Europa os partidos xenófobos registram seus melhores resultados nas regiões que abrigam menos imigrantes.

Se a desconfiança contemporânea se baseia em razões objetivas cuja importância ninguém pretende negar, elas se alimentam também de um ingrediente ulterior, o verdadeiro tabu que ninguém ousa evocar: não são só as elites que mudaram, mas também o “povo”.

Como diz o escritor americano Jonathan Franzen, pode ser que “todos, cada um por si, tenham se tornado, de repente, desconfiados das elites”. Mais provável, no entanto, é que a internet e o advento dos smartphones e das redes sociais tenham uma boa dose de participação no processo. Um elemento fundamental da ideologia do Vale do Silício é a sabedoria das multidões: não confiem nos especialistas, as pessoas comuns sabem mais. O fato de andar por aí com a verdade nos bolsos, na forma de um pequeno aparelho brilhante e colorido no qual basta apoiar o dedo para ter todas as respostas do mundo, influencia inevitavelmente cada um de nós.

Fomos nos habituando a ter nossas demandas e nossos desejos imediatamente satisfeitos. Qualquer que seja a exigência, “There’s an app for that” – “Há um aplicativo para isso” – prometia o slogan da Apple. Uma forma de impaciência legítima tomou conta de todo mundo: não estamos mais dispostos a esperar. Google, Amazon e os deliveries de comida nos habituaram a ver nossos desejos atendidos antes mesmo de terem sido totalmente formulados. Por que a política deveria ser diferente? Como é possível continuar tolerando os rituais demorados e ineficazes de uma máquina governada por dinossauros impermeáveis a toda e qualquer solicitação?

Mas por trás da rejeição às elites e da nova impaciência dos povos há a maneira pela qual as relações entre os indivíduos estão se transformando.

Somos criaturas sociais, e nosso bem-estar depende, em boa parte, da aprovação dos que estão em volta. Ao contrário dos outros animais, o homem nasce sem defesas e sem competências e continua assim por muitos anos. Desde o início, sua sobrevivência depende das relações que ele consegue estabelecer com os outros. O diabólico poder de atração das redes sociais se baseia nesse elemento primordial. Cada curtida é uma carícia maternal em nosso ego. A arquitetura do Facebook é toda sustentada sobre a nossa necessidade de reconhecimento, como admite, tranquilamente, seu primeiro financiador, Sean Parker:

“Nós fornecemos a você uma pequena dose de dopamina cada vez que alguém o curte, comenta uma foto ou um post, ou qualquer outra coisa sua. É um loop de validação social, exatamente o tipo de coisa que um hacker como eu poderia explorar, porque tira proveito de um ponto fraco da psicologia humana. Os inventores, os criadores, eu, Mark [Zuckerberg], Kevin Systrom, do Instagram, estávamos perfeitamente conscientes disso. E, mesmo assim, fizemos o que fizemos. E isso transforma literalmente as relações que as pessoas têm entre si e com a sociedade como um todo. Interfere provavelmente na produtividade, de certa maneira. Só Deus sabe qual o efeito que isso produz nos cérebros de nossos filhos.”

Bem antes dos Bannon e dos Casaleggio, há o trabalho dos aprendizes de feiticeiros do Vale do Silício. O maquinário hiperpotente das redes sociais, suspenso sobre as molas mais primárias da psicologia humana, não foi concebido para nos confortar, mas, pelo contrário, veio à luz para nos manter num estado de incerteza e de carência permanente. O cliente ideal de Sean Parker, de Zuckerberg e de todos os outros é um ser compulsivo, empurrado por uma força irresistível para voltar à plataforma dezenas, centenas, milhares de vezes por dia, fissurado por essas pequenas doses de dopamina da qual se tornou dependente. Um estudo americano demonstrou que, em média, cada um de nós dá 2.617 toques por dia na tela do nosso smartphone. Sem dúvida, não é o comportamento de uma pessoa que esteja sã de espírito. Está mais próximo do modo de agir de um junkie em fase terminal, que se “aplica”, ao longo do dia, seguidas doses de refresh e de likes.

Para compreender a raiva contemporânea, é preciso, portanto, sair da perspectiva puramente política e entrar numa lógica diferente. A raiva, dizem os psicólogos, é o “afeto narcisista por excelência”, que nasce de uma sensação de solidão e de impotência e que caracteriza a figura do adolescente – um indivíduo ansioso, sempre em busca da aprovação de seus pares, e permanentemente apavorado com a ideia de estar inadequado.

O problema é que hoje, nas redes sociais, somos todos adolescentes fechados em nossos pequenos quartos, onde aumenta a frustração por causa do crescente abismo entre a mediocridade de nossa vida e todas as vidas possíveis que se oferecem virtualmente em nossos monitores e telas de celular. E, exatamente como um adolescente, explicam os psicólogos, temos fortes probabilidades de terminar em dois tipos de sites de internet que alimentam ainda mais nossa frustração: os sites pornográficos e os sites conspiratórios, que exercem um poder de fascinação intenso porque oferecem, enfim, uma explicação plausível para as dificuldades nas quais nos encontramos. É culpa dos outros!, nos dizem eles, pois os outros nada fazem senão nos manipular para realizar seus objetivos demoníacos. Nós mostraremos a você a verdade, continuam, e assim você poderá se unir aos outros que, como você, finalmente abriram os olhos!

O conspiracionista propõe sempre uma mensagem lisonjeira. Ele compreende o raivoso, ele conhece sua ira e a justifica: OK, não é sua culpa, é dos outros, mas você ainda pode se corrigir e se transformar num soldado da batalha pela verdadeira justiça. Começa-se de coisas as mais ínfimas para se chegar às maiores. Simone Lenzi relatou, em um belo livro, a epidemia de ressentimento e de raiva que se apoderou dos italianos, a partir de um episódio aparentemente banal. “Eu me lembro que um dia começou, no blog, uma discussão sobre o ato de dar troco. Em especial sobre aqueles que se enganam quando dão o troco. Todo mundo contava suas próprias experiências: na tabacaria, com o vendedor de jornais, o farmacêutico ou o garçom na hora da conta. Todos os participantes da discussão haviam sido vítimas de um troco errado. Mas, claro, no sentido contrário, ninguém jamais recebeu troco demais. Tentaram embolsar dois euros de um, dez euros de outro. Balconistas, farmacêuticos, garçons, taxistas: todos fingem se enganar para roubar os outros. Mas chegou, enfim, o momento de dizer chega. Eles não aceitariam mais ser enganados. Eles não estavam sós, não eram mais uns átomos soltos no universo: agora, faziam parte de uma legião”. – “Como você se chama?”, perguntou Jesus. – “Eu me chamo legião, porque nós somos muitos.”

A história do troco é naturalmente um exemplo trivial, mas ilustra muito bem a dinâmica paranoica que está na base das mil conspirações que florescem o tempo todo nas telas.

As redes sociais não são, por natureza, talhadas para a conspiração. Sean Parker e Mark Zuckerberg não ligam muito para a questão dos trocos errados, nem – presumo – creem que as vacinas causam autismo, ou que George Soros planejou a invasão da Europa por imigrantes muçulmanos. Mas os complôs funcionam nas redes sociais porque provocam fortes emoções, polêmicas, indignação e raiva. E essas emoções geram cliques e mantêm os usuários colados ao monitor.

Um recente estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) demonstrou que uma falsa informação tem, em média, 70% a mais de probabilidade de ser compartilhada na internet, pois ela é, geralmente, mais original que uma notícia verdadeira. Segundo os pesquisadores, nas redes sociais a verdade consome seis vezes mais tempo que uma fake news para atingir 1.500 pessoas. Temos, enfim, a confirmação científica da frase de Mark Twain segundo a qual “uma mentira pode fazer a volta ao mundo no mesmo tempo em que a verdade calça seus sapatos”!

Os novos empregados contratados pelo Facebook aprendem imediatamente que o parâmetro crucial para a empresa se chama L6/7 – índice que mede o percentual de usuários tão intoxicados pela plataforma que chegam a utilizá-la seis dias por semana. Para aumentar esse número, as verdadeiras informações e as rodas de botequim virtuais entre velhos amigos de classe não bastam. “A simples contemplação da realidade não ocupa tempo suficiente”, escreve Jaron Lanier. “Para manter seus usuários conectados, uma empresa de redes sociais deve, sobretudo, fazer as coisas de maneira que eles se enervem, sintam-se em perigo ou tenham medo. A situação mais eficaz é aquela em que os usuários entram em estranhas espirais de um consenso muito poderoso ou, ao contrário, de sério conflito com outros usuários. Isso não acaba jamais, e é esse, exatamente, o alvo. As empresas não planificam nem organizam nenhum desses modelos de utilização. São os outros que são incitados a fazer o trabalho sujo. Como os jovens macedônios que completam seu orçamento mensal postando fake news envenenadas. Ou mesmo os americanos ansiosos por faturar um dinheiro extra.”

As implicações de um negócio desse gênero que aplica seu modelo a um terço da humanidade – 2,2 bilhões de pessoas –, que utiliza o Facebook ao menos uma vez por mês, ainda precisam ser plenamente compreendidas. Mas já ficou evidente que um dos efeitos da propagação de redes sociais foi o de aumentar estruturalmente o nível de cólera já presente na nossa sociedade.

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Todos os estudos mostram que as redes sociais tendem a exacerbar os conflitos, ao radicalizar os tons até se tornar, em alguns casos, um real vetor de violência. Na Birmânia, ONGs denunciam, há anos, o papel exercido pelas comunicações via Facebook na perseguição da minoria muçulmana dos Rohingyas. Em 2014, um extremista budista provocou uma série de linchamentos ao compartilhar na plataforma a falsa informação de um estupro. As autoridades foram obrigadas a bloquear o acesso ao Facebook para interromper o turbilhão. Um estudo sobre milhares de postagens foi capaz de traçar os contornos de uma verdadeira campanha que desumaniza os Rohingyas e promove o recurso à violência até chegar ao extremo do genocídio.

No Brasil, várias investigações provaram o papel exercido pelo YouTube na difusão do vírus da Zika. A partir de 2015, enquanto as autoridades médicas se esforçavam para distribuir as vacinas e os larvicidas que matam os mosquitos transmissores do vírus, os primeiros vídeos conspiracionistas fizeram sua aparição na rede. Alguns desses vídeos revelavam a suposta existência de um complô das ONGs para exterminar as populações mais pobres, enquanto outros atribuíam a essas mesmas vacinas e larvicidas a propagação do vírus. A popularidade desses filmes criou um clima de desconfiança que levou muitos pais e mães a recusar os procedimentos médicos imprescindíveis para a sobrevivência de seus filhos. 

“Nós lutamos diariamente contra o doutor YouTube, e estamos perdendo a batalha”, denunciou um médico na imprensa brasileira.

Ex-funcionário do YouTube, Guillaume Chaslot explicou claramente de que maneira o algoritmo da plataforma, responsável por 70% dos vídeos assistidos, foi concebido para impulsionar o público na direção dos conteúdos mais extremos, maximizando o nível de engajamento até seus limites. Assim, quem procura informações acerca do sistema solar no YouTube terá diante de si um menu bem farto de vídeos sustentando a teoria da Terra Plana, ao passo que o usuário interessado por questões de saúde será rapidamente reorientado para as ideias dos No Vax, o movimento antivacina, e dos conspiracionistas. O mesmo mecanismo está acelerado no terreno político. É assim que os brasileiros assistiram, nos últimos anos, à ascensão de uma nova geração de YouTubers de extrema-direita, que souberam explorar o algoritmo da plataforma para multiplicar sua visibilidade (e seu faturamento). É o caso de Nando Moura, um guitarrista amador que reúne mais de três milhões de inscritos no seu canal do YouTube, alternando canções, instruções para videogames e, sobretudo, uma variedade extraordinária de teorias da conspiração. Ou o caso de Carlos Jordy, um fisiculturista coberto de tatuagens que deve sua popularidade, e sua cadeira no Congresso, a uma série de vídeos denunciando um complô dos professores de esquerda para espalhar o comunismo nas escolas.

Ou ainda o exemplo do Movimento Brasil Livre, uma organização fundada durante a campanha a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, dotado de uma poderosa produtora de vídeos para o YouTube que empregava jovens profissionais dedicados à luta contra o que consideram “a ditadura do politicamente correto”. Em outubro de 2018, um de seus membros mais ativos, Kim Kataguiri, foi eleito, aos 22 anos, o mais jovem deputado a integrar o Congresso Nacional. Na mesma ocasião, outros cinco postulantes do MBL fizeram sua entrada no parlamento. Juntos, esses personagens, assim como inúmeras figuras similares, contribuíram para criar o clima que tornou possível a eleição de um ex-militar de extrema-direita, ele mesmo muito popular nas redes sociais, à presidência da república. O vídeo dos apoiadores de Jair Bolsonaro, reunidos em Brasília no dia de sua posse, que gritavam alegremente os nomes do Facebook e do YouTube, rodou o mundo.

Na França , o movimento dos Coletes Amarelos se alimenta desde o começo de dois ingredientes: a raiva de certos segmentos populares e o algoritmo do Facebook. A partir dos primeiros Groupes Colères – Grupos de Cólera –, que começaram a aparecer na plataforma no início de 2018, até as petições on-line contra o preço dos combustíveis, que recolheram milhões de adesões, passando por grupos como “La France en colère!!!”, que se tornaram órgãos de informação e centros de coordenação dos protestos. Na ausência de qualquer organização formal, os criadores das páginas mais seguidas no Facebook automaticamente se tornaram líderes do movimento, recebidos pelas autoridades e cortejados pelas mídias. A própria ideia de um colete de segurança como sinal de reconhecimento nasce, aliás, de um vídeo postado no Facebook por um jovem mecânico, Ghislain Coutard, visualizado mais de 5 milhões de vezes no espaço de poucos dias. Ali, também, o que choca é a rapidez: o vídeo apareceu on-line em 24 de outubro e, três semanas depois, em 17 de novembro, 300 mil Coletes Amarelos mobilizavam-se por todo o território francês, para um protesto autônomo que causou uma morte e deixou 585 pessoas feridas.

Mais uma vez, o Facebook funcionou como um formidável multiplicador, nutrindo-se dos ingredientes mais díspares para disseminar uma epidemia de cólera que se transferiu da dimensão virtual para a realidade. Na base do protesto, havia, claro, as demandas legítimas de manifestantes, face ao aumento das taxas sobre combustíveis e outras medidas do governo. Mas, desde o primeiro dia, o algoritmo desencadeado pela rede social californiana misturou esses temas com os chamamentos à revolta lançados por extremistas de direita e de esquerda, com as fake news e com as teorias da conspiração de fontes múltiplas. Circularam também: uma falsa carta do presidente da república convocando as forças da ordem a usar a violência contra os manifestantes; detalhes de um complô da maçonaria para subjugar a França; e a análise de um suposto constitucionalista explicando que a eleição de Macron era ilegítima. Vastamente compartilhada foi uma outra tese exótica, segundo a qual o Global Compact sobre as imigrações promovido pela ONU seria, na realidade, um complô para neutralizar a classe média branca. Macron, de acordo com essa teoria, teria “vendido a França” ao assinar o acordo, em Marrakesh, segundos antes de renunciar.

Para se ter uma ideia dos ingredientes do coquetel explosivo que alimentava o furor dos manifestantes, bastava, durante os dias em que ocorreram os protestos em série, ir ao Facebook e fazer uma ronda pela página “La France en colère!!!”, principal endereço de coordenação do movimento, com dezenas de milhões de cliques em seu ativo estatístico. Argumentos os mais sensatos e testemunhos de verdadeiros Coletes Amarelos em dificuldade se alternavam permanentemente com ataques contra deputados com rendas elevadas e mídias submissas ao poder, até chegar às fake news de matriz russa e a convites para tomar de assalto o Palácio do Eliseu.

Em sua plasticidade, capaz de combinar tudo e, principalmente, o contrário de tudo, o movimento dos Coletes Amarelos mostrou pela enésima vez que a raiva contemporânea não nasce somente de causas objetivas de natureza econômica e social. Nasce, também, do encontro de duas grandes tendências que vêm sendo observadas. No plano da oferta política, o enfraquecimento das organizações que canalizam tradicionalmente a revolta popular, os “bancos de cólera ” de Sloterdijk: a Igreja e os partidos de massa. E, no plano da demanda, a irrupção de novas mídias que parecem ter sido concebidas de propósito – e foram, de fato – para exacerbar as paixões mais extremadas, os “clubes da luta dos covardes”, na precisa definição de Marylin Maeso.

A capacidade de se posicionar no coração desse cruzamento de tendências determina o verdadeiro talento dos engenheiros do caos. Um deles, o grande conselheiro de Viktor Orban, Arthur Finkelstein, descreveu a situação nos seguintes termos, na primavera de 2011:

“Eu me desloco muito pelo mundo e vejo, onde vou, um grande volume de raiva. Na Hungria, Jobbik obteve 1% dos votos com a mensagem ‘É culpa dos ciganos’. A mesma coisa se passa na França, na Suécia, na Finlândia. Nos Estados Unidos, a raiva é focada nos mexicanos, nos muçulmanos. Há um só grito: eles roubam nosso trabalho, eles mudam nosso estilo de vida. Isso produzirá uma demanda por governos mais fortes e homens mais fortes, que ‘impeçam essa gente’, quem quer que seja ‘essa gente’. Eles falarão de economia, mas a essência de seu negócio é outra: é a raiva. É uma grande fonte de energia que está em pleno desenvolvimento no mundo inteiro.”

Os engenheiros do caos compreenderam, portanto, antes dos outros, que a raiva era uma fonte de energia colossal, e que era possível explorá-la para realizar qualquer objetivo, a partir do momento em que se decifrassem os códigos e se dominasse a tecnologia.

O Waldo de Black Mirror não é nada mais que a tradução política das redes sociais. Uma máquina temível que se nutre de raiva e tem como único princípio o engajamento de seus partidários. O importante é alimentá-la permanentemente com conteúdos “quentes”, que suscitam emoções.

Atrás do escritório de Davide Casaleggio, em Milão, um monitor mede, em tempo real, os índices de popularidade dos conteúdos postados nas diferentes plataformas digitais da galáxia do Movimento 5 Estrelas. Sejam eles positivos ou negativos, progressistas ou reacionários, verdadeiros ou falsos, não importa. Os conceitos que agradam são desenvolvidos e relançados, transformando-se em campanhas virais e em iniciativas políticas. 
Os outros simplesmente desaparecem, num processo darwiniano que tem como único critério de seleção a atenção atraída por uma tela.

Desde o fim de 2014, a Liga de Matteo Salvini equipou-se de um aparelho similar, chamado “A Besta”. As redes sociais de Salvini são sistematicamente analisadas para que se compreenda quais são as postagens e os tweets que têm o maior número de respostas e que tipo de pessoas interagem em suas órbitas. Nenhum esforço é feito para alimentar a Besta, como no caso da iniciativa “Vinci Salvini”, um jogo on-line lançado durante a campanha eleitoral de 2018 que permitia acumular pontos graças à produção de conteúdos pró-Liga e, por que não, encontrar o líder do partido. Todos os dados são devorados pela Besta que, depois de mastigá-los, os regurgita, na forma de slogans e de campanhas capazes de interceptar centenas de milhares, às vezes milhões, de eleitores.

É claro que, como no caso de Waldo, a mão humana se esconde por trás da Besta. Ela pertence a Luca Morisi, doutor em filosofia pela Universidade de Verona, onde lecionou, por dez anos, “informática filosófica”, ou seja, “como a revolução digital redefine os temas clássicos do pensamento ocidental”.

De forma manifesta, o fruto dessa reflexão aprofundada se identifica com as posturas à la Mussolini 2.0 do “Capitão”, apelido que Morisi inventou para Salvini. “Matteo é um campeão da comunicação polarizada”, ele diz. “Avança na direção das pessoas mesmo quando elas disparam uma bazuca na cara dele. Abraça o conflito. Assim, consegue, mais ainda que Trump, fidelizar os que os seguem. Se você sai de férias e gosta de um restaurante, você dá um ‘like’ na página do estabelecimento no Facebook mesmo sendo pouco provável que volte lá. O segredo de Salvini está no fato de que ele conseguiu catalisar uma atenção constante sobre si mesmo. A continuidade do contato é o que há de mais importante.”

Engajamento, engajamento, engajamento. O parâmetro capital é sempre o mesmo. Graças às artes mágicas de Morisi, o capitão se tornou, em poucos meses, o líder europeu mais seguido no Facebook, com 3,3 milhões de curtidas, contra 2,5 milhões de Merkel e 2,3 milhões de Macron. Trump tem 22 milhões, mas, acrescenta Morisi, “Matteo ganha dele em termos de engajamento do público: 2,6 milhões de cliques em uma semana para Salvini contra 1 milhão e meio para Trump”.

Para atingir esses resultados, alguns afirmam que a Liga teria utilizado como armas softwares e perfis falsos. O que Morisi nega: “Eu nunca criei perfis falsos no Twitter ou no Facebook para aumentar artificialmente o engajamento”, ele garante. Por outro lado, reivindica a criação de avatares de carne e osso. “Nós inventamos, em 2014, um sistema, ‘Seja um porta-voz de Salvini’, do qual se falou muito: o usuário se registrava e aceitava tuitar automaticamente conteúdos publicados por Salvini. Não eram pessoas inventadas, mas pessoas reais que topavam dar um cheque em branco para disseminar certos conteúdos em certos contextos.” A iniciativa funcionou bem. Dezenas de milhares de pessoas, frequentemente neófitos da internet, aceitaram registrar-se instantaneamente nas redes sociais só para serem avatares do Capitano. “Mas, hoje, há uma base tão forte, mesmo no Twitter, que nós nem precisamos mais da ferramenta.”

Esse resultado, indiscutível em termos numéricos, nasce, em parte, graças à habilidade de Morisi. Os novos engenheiros do caos são muitas vezes criativos e dominam técnicas que os spin doctors mais tradicionais ainda não conhecem.

Na Alemanha, a campanha do AFD, partido de extrema-direita, conseguiu que cada vez que um eleitor escrevesse o nome “Angela Merkel” no Google, o primeiro resultado a aparecer na tela fosse uma página denunciando a traição da chanceler no que se refere à política de refugiados e às vítimas do terrorismo na Alemanha.

Nos Estados Unidos, por trás da aparente simplicidade da campanha de baixo custo de Donald Trump havia também técnicas psicométricas da Cambridge Analytica e, sobretudo, a capacidade de se alavancar nas funcionalidades mais inovadoras do Facebook graças a uma equipe de técnicos mobilizados pela empresa (que a campanha de Hillary recusara).

No Brasil, os comunicadores a serviço do candidato ultranacionalista Jair Bolsonaro driblaram os limites impostos aos conteúdos políticos no Facebook comprando milhares de números de telefone para bombardear quem utiliza o WhatsApp com mensagens e fake news.

Mas, apesar das proezas acumuladas pelos engenheiros do caos, a verdadeira vantagem competitiva de Waldo não é de caráter técnico. Ela reside na natureza de conteúdos nos quais se baseia a propaganda populista.

A indignação, o medo, o preconceito, o insulto, a polêmica racista ou de gênero se propagam nas telas e proporcionam muito mais atenção e engajamento que os debates enfadonhos da velha política.

Os engenheiros do caos estão bem conscientes disso. Como diz Andy Wigmore, braço direito do líder soberanista britânico Nigel Farage e estrategista de duas campanhas em favor do Brexit: “Quando nós publicávamos alguma coisa sobre a economia, recebíamos três ou quatro mil curtidas no máximo. Mas, cada vez que incluíamos um fator emocional, tínhamos, sempre, ao menos quatrocentas ou quinhentas mil, às vezes dois ou três milhões de curtidas!”.

Pouco importa se o engajamento nasce de se jogar lenha na fogueira dos preconceitos e do racismo, ou da propagação de falsas informações: “Nós fotografamos a realidade”, defende-se Morisi. “Claro que utilizamos cores fortes, mas nos damos conta de que tais sentimentos já estão, de fato, no âmago dessas pessoas”.

Waldo não quer nada além de repetir o que “essas pessoas” pensam, e fazê-lo sem hipocrisia, na linguagem que elas utilizam. E melhor ainda se as elites inimigas do povo acharem que é uma linguagem ofensiva e vulgar. Será o sinal de que estão desconectadas do povo, o qual apenas Waldo é capaz de representar. Ou, melhor ainda, de refletir.

Mas, ao posar de espelho do pior, Waldo age como um multiplicador. Na Itália, como nos Estados Unidos de Trump ou na Hungria de Orban, o primeiro e principal efeito da nova propaganda é a liberação da palavra e dos comportamentos. Pela primeira vez depois de muito tempo, a vulgaridade e os insultos não são mais tabus. Os preconceitos, o racismo e a discriminação de gênero saem do buraco. As mentiras e o conspiracionismo se tornam chaves de interpretação da realidade.

E tudo isso apresentado como uma guerra sacrossanta para a libertação da voz do povo, finalmente desatada dos códigos opressivos das elites globalizadas e politicamente corretas. Essas mesmas elites que provocaram a crise financeira, que causou o empobrecimento das classes populares, e, para coroar o conjunto, conspiraram com as ONGs e o lobby judaico-maçônico para substituir a mão de obra local por imigrantes provenientes dos países do Sul.

Uma vez liberada a cólera, passa a ser possível construir qualquer tipo de operação política. “Descubra por que as pessoas estão enraivecidas, diga a elas que a culpa é da Europa, vote e a faça votar pelo Brexit”, foi assim que um dos engenheiros do caos resumiu a estratégia, elementar e temível, de uma campanha referendária que parecia fadada ao fracasso. “Deixem-me ser o porta-voz da sua ira”: foi com essa mensagem que o candidato mais improvável da História tomou a Casa Branca.

Por trás das principais evoluções geopolíticas dos últimos anos, há o riso ácido de Waldo, o urso azul que parecia ser uma piada e se tornou um ator em vias de mudar a face do mundo. Se para Lenin o comunismo eram “os Sovietes e a eletricidade”, para os engenheiros do caos o populismo é filho do casamento entre a cólera e os algoritmos.

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