sábado, 28 de setembro de 2019

O arquétipo da sombra, o lado sombrio da sua alma


Segundo a psicologia analítica de Carl Jung, o arquétipo da sombra representa “o lado sombrio” de sua personalidade. É um submundo feroz da alma onde você armazena a parte mais primitiva de si mesmo. Há o egoísmo, os instintos oprimidos e o eu “não aprovado” que rejeita sua mente consciente. Esta é a parte que está enterrada nas camadas mais profundas do seu ser. A sombra é o arquétipo do lado negro da sua alma.

Você provavelmente já ouviu falar sobre esse conceito no passado. A ideia do arquétipo da sombra é um conceito familiar. Os psicólogos ainda usam isso para falar sobre confronto. Refere-se àquela percepção de um conflito interno que você às vezes experimenta quando está frustrado, com medo, inseguro ou zangado.

“Uma pessoa não é iluminada por imaginar figuras de luz, mas por estar ciente da escuridão.” -Carl Jung-

Mas você não deve esquecer que a ideia que Jung descreveu em seu trabalho sobre os arquétipos já era histórica e culturalmente presente em nossa sociedade. O conceito de sombra ou lado sombrio da alma é uma dúplice comum. Até inspirou Robert Louis Stevenson a escrever seu romance clássico, O Estranho Caso do Dr. Jekyll e Mr. Hyde. Stevenson, é claro, escreveu este romance antes mesmo de Jung desenvolver sua teoria sobre o arquétipo da sombra.

Tudo o que consideramos em um determinado momento como “ruim” devido à nossa educação e aos padrões morais da nossa sociedade se transforma na nossa sombra. No entanto, não é aconselhável ver todas essas dinâmicas internas como experiências reprováveis ou perigosas, até o ponto de pensar que todos nós carregamos um Hyde que quer se manifestar.

O próprio Jung explicou que existem diferentes tipos de sombras e que uma maneira de alcançar o bem-estar, a cura e a liberdade pessoal é torná-las conscientes e enfrentando todas elas.

O arquétipo da sombra, o lado negro dos seres humanos

O arquétipo da sombra está intimamente ligado ao conceito de “subconsciente” de Freud. Mas possui aspectos únicos que o distinguem de maneira significativa dessa ideia. Esses aspectos únicos também enriquecem o conceito de Jung. Não podemos esquecer que o que começou como um idílio intelectual entre Freud e Jung acabou esfriando, até o ponto de Jung dizer que o pai da psicanálise era “uma figura trágica, um grande homem, mas uma pessoa com a qual ele não concordava”.

Jung desenvolveu seu próprio método, a psicologia analítica. Ele rejeitou o banco e a relação assimétrica entre o terapeuta e o paciente. Jung era a favor de uma terapia baseada na conversa. Ele acreditava que a terapia deveria penetrar na estrutura da mente e no inconsciente onde os arquétipos vagueiam. De todos os arquétipos, o arquétipo da sombra é, sem dúvida, o arquétipo com o valor mais terapêutico. Vamos aprender as características deste arquétipo no restante deste artigo …

A sombra, uma presença conhecida mas oprimida

– Jung emprestou o termo “sombra” de Friedrich Nietzsche.
– Essa ideia representa a personalidade oculta que todo ser humano possui. Do lado de fora, a maioria de nós (e nós também acreditamos) são pessoas boas e amigáveis. Mas algumas partes de nós são suprimidas. Esses são instintos herdados que às vezes escondem violência, raiva e ódio.
– O arquétipo da sombra não existe apenas nos indivíduos. Também grupos de pessoas (seitas, grupos religiosos, partidos políticos) podem ter um arquétipo da sombra. Em algum momento, esses grupos podem mostrar seu lado sombrio e justificar fatos violentos contra a humanidade.
– Quanto mais reprimimos a sombra, mais destrutiva, traiçoeira e perigosa ela se torna. De acordo com Jung, ela pode “projetar-se”. Ocorre então na forma de uma neurose ou psicose .
– Jung também identificou duas tipologias dentro do arquétipo da sombra. A primeira é a sombra pessoal. Todos nós temos isso. Inclui todas as nossas pequenas frustrações, medos, egoísmo e negatividade comum. O outro tipo é a sombra impessoal. Ela contém a essência mais arquetípica do mal e acompanha o genocídio, o assassinato implacável e assim por diante.

Jung sobre como lidar com o lado negro da sua alma

“Infelizmente, não há dúvida de que o homem, como um todo, é menos bom do que pensa ou quer ser de si mesmo. Todo mundo carrega uma sombra. E quanto menos é expresso na vida consciente do indivíduo, mais escura e pesada ela é. Se um sentimento de inferioridade é consciente, há sempre uma chance de melhorá-lo. Além disso, está em contato constante com outros interesses, de modo que está constantemente sujeito a mudanças. Mas se for suprimido e separado da consciência, nunca é corrigido. Além disso, provavelmente entrará em erupção em um momento inconsciente. Em qualquer caso, é um problema inconsciente que bloqueia as tentativas mais recentes. ”

-Carl Jung-

Como posso enfrentar minha própria sombra?

Você pode pensar que a teoria do arquétipo da sombra é interessante. Em sentido metafórico, tem seu charme e certa mística. Porque nesta imagem vemos o reflexo do que é tabu de uma maneira clássica. Representa o mal e o lado sombrio da personalidade humana que sempre desperta nosso interesse. Mas há alguma coisa nessa teoria que possamos aplicar em nossas vidas diárias?

A resposta é “sim”. Jung nos lembra em seus escritos, em livros como O Arquétipo e o Inconsciente Coletivo. Ele diz que é nosso trabalho na vida nos aceitar plenamente e integrar nossa “sombra” em nossa personalidade. Desta forma, podemos estar cientes disso e trabalhar face a face com ela. Ignorar e permitir que permaneça no inconsciente pode nos privar do equilíbrio e da chance de sermos felizes.

Também não devemos esquecer quais aspectos esse conceito significa que chamamos de “sombra”. Aqui encontramos nossos medos, nossos traumas passados, as decepções que nos envenenam e os sonhos que nunca se realizaram como resultado de nossa própria indecisão. Se escondermos todos esses demônios interiores, eles se tornarão mais violentos. Se os silenciarmos, eles eventualmente nos controlarão. Eles vão retratar uma imagem de nós mesmos que não gostamos ou discordamos.

Devemos, portanto, lembrar que nosso crescimento pessoal e nosso bem-estar psicológico sempre dependerão da nossa capacidade de trazer essas sombras à luz. Assim que fazemos esse esforço corajoso, o delicado, mas valioso trabalho de cura começa. Só então poderemos encontrar paz e bem-estar.

Caso Dino

Anda-se falando muito de Flávio Dino recentemente. Para o bem dele. Antes de fazermos algumas análises sobre ele, fica um alerta: nada do que falamos aqui o Dino não percebe. Antes de mais nada, Dino é um político extremamente inteligente e articulado e sabe muito bem analisar e antecipar cenários. Não deve ser subestimado em nenhuma hipótese e sim respeitado.

A religião neopentecostal lulista e sua blogosfera de fiéis aguardando a volta do seu messias no purgatório de Curitiba exultam. No desespero da falta de opções além de Lula para 2022 e na necessidade de destruir as verdades incômodas ditas por Ciro, agarram-se à figura de Dino de forma que beira à cegueira. Nada mais insensato. Porém, cobrar sensatez da seita parece ser tarefa cada vez mais impossível de retorno.

Primeiramente, vamos aos fatos: Lula apoiou a família-quadrilha Sarney no Maranhão, contra o Dino. A célebre picada do escorpião tanto dita pelo Ciro aí tem mais um exemplo. Dino foi picado e não esqueceu. Só omite porque sabe que o eleitorado do relativamente pobre Maranhão é lulista até o osso. E surfa na onda, até agora com sucesso. Mas a lembrança da traição faz com que o Governador do Maranhão não seja um lulista fanatizado, apenas um estrategista habilidoso que deseja alçar seu voo próprio sempre e que aguarda o seu momento.

Outro ponto é a legenda: se a bandeira vermelha da foice e martelo do Partido Comunista for digerida pelo eleitorado do Sul e Sudeste em 2022 este quem escreve lhes promete que arrancará um dedo. Uma candidatura do PCdoB, pelo contrário, fará a alegria do Dória, Witzel e Moro. A sigla é totalmente estigmatizada e conhecida no eleitorado como "um puxadinho" do PT. Para voos fora de seu Estado, Dino terá que necessariamente se desfiliar do PCdoB. E ele parece estar avaliando isso. Os caminhos naturais seriam 1- o PSB; 2- a Rede; e 3- o PDT, este a 3a opção porque é o único que tem um rival que lhe bloqueia: Ciro Ferreira Gomes. Mesmo assim, a direita bombardeará a questão do Dino "comunista disfarçado em outra sigla para enganar o povo". Algo difícil de superar, dado que ele teria um desgaste grande para se explicar como socialdemocrata que é. Vale lembrar que por questões bem menores que essa Ciro gastou uma parte preciosa da sua campanha para - a contragosto - se explicar.

Por fim, mesmo se Dino almejar ser vice de uma chapa progressista - o que é possível - dificilmente um candidato de centroesquerda (PSB, PDT, REDE) colocaria um "comunista" nela. Por exemplo, Ciro necessita de um(a) vice mais tecnocrata e ao centro, melhor se for do Sudeste ou Sul, para expandir sua base eleitoral como contrapeso ao Nordeste que a ele se inclinaria melhor num cenário sem o PT. Dino, nordestino e "comunista", portanto, não é uma opção seguindo a lógica fria eleitoral. Essa estigmatização é injusta mas é um fato. O estigma antipetista e anticomunista sobreviverá ao bolsonarismo decadente no eleitorado do Centro-Sul.

Dino sabe de todo esse cenário. Tem a admiração e o repeito do trabalhismo que o considera um dos melhores políticos brasileiros. O que ele fez pelo Maranhão foi histórico, um exemplo para toda a esquerda, mesmo com a traição do populista Lula a ele, apoiando a quadrilha Sarney. Porém, se Dino enveredar pela permanência na sigla comunista ou - pior - não se desvincular do antipetismo que lhe aguarda de braços abertos no centro-sul do país, seriam dois equívocos graves numa pretensão ao Planalto como cabeça ou vice, porém erros pouco prováveis, dado a perspicácia típica de Flávio Dino, que tem no seu currículo a destruição - pela via da esquerda - da estrutura da dinastia Sarney no Maranhão. Feito notável que por si só já lhe coloca como uma das maiores lideranças de esquerda na História do Brasil.


Via Daniel da Vitória Melo



Tomada a morte, sem exagero

Espero colocar mais coisas dela por aqui. Gostei muito...

Tomada a morte, sem exagero
Wislawa Szymborska

Ela não pode fazer uma piada
encontrar uma estrela, construir uma ponte.
Ela nada sabe sobre tecelagem, mineração, agricultura,
construir navios, ou assar bolos. 

No nosso plano para o amanhã,
ela tem a última palavra,
que está sempre ao lado do ponto.

Nem mesmo pode tomar parte
nas tarefas que fazem parte do seu comércio:
cavar uma sepultura,
fazer um caixão,
limpar tudo depois de si.

Preocupada com o matar,
ela faz o trabalho desajeitada, 
sem sistematização ou habilidade.
Como se cada um de nós fosse a sua primeira morte.

Ah, ela tem seus triunfos,
mas olhe para os seus incontáveis fracassos,
sopros perdidos,
e tentativas de repetição!

As vezes, ela não é forte o suficiente
para golpear uma mosca no ar.
Muitas são as lagartas
que a superam.

Todas esses bulbos, vagens,
tentáculos, barbatanas, traqueias,
pluma nupcial e peles de inverno
mostram que ela tem ficado para trás
com o seu trabalho meia-boca.

A vontade da doença não basta
e até nossa mãozinha com guerras e golpes de estado
não é suficiente.

Corações batem dentro de ovos.
Esqueletos de bebês crescem.
Sementes, em trabalho duro, brotam o seu primeiro pequenino par de folhas
e, às vezes, até mesmo árvores altas seguem seu curso.

Quem afirma que ela é onipotente
está ele mesmo provando
que ela não é.

Não há vida
que não possa ser imortal
pelo menos por um momento.

Morte
sempre chega ao momento atrasada. 

Em vão ela puxa a maçaneta
da porta invisível.
Tão logo você veio
não pode ser desfeito.




sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Estados da Mente....

Quando a mente fica entediada, quer satisfazer sua fome lendo um livro, assistindo à tevê, navegando na Internet. A alternativa é aceitar o tédio e a ansiedade e observar como é sentir-se entediado e ansioso. À medida que você se dá conta dessa sensação, surge um espaço arejado e uma calma em volta da sensação. O tédio, a ansiedade, a raiva, a tristeza e o medo não são seus. Eles são estados da mente. É por isso que vão e voltam. Nada que vai e volta é você.

Eckhart Tolle



Estar inteiro....

Muitas vezes não percebemos como é fácil não estar presente, mesmo que sem sair do lugar. Já se tornou rotineiro estar na rua, restaurantes ou bares e ver pessoas com os celulares na mão, mesmo quando acompanhadas de outras. Sempre tem alguém em algum lugar tentando manter uma conversa e acabando falando sozinho, ou tendo de repetir tudo o que havia acabado de falar. Nossa realidade é tão acelerada, com horários tão urgentes e constante movimento que, se não fosse essencial, esqueceríamos até mesmo de respirar.

Não adianta, temos que criar consciência de que o futuro não pertence a nós, afinal, a vida sempre vai encontrar uma maneira de nos surpreender. Estar presente não é apenas conversar com alguém ou “levar seu corpo para passear”. É sentir a energia do que acontece, prestar atenção no que lhe é dito e no significado além das palavras. Estar presente é ter sempre em mente que há sentimento e energia envolvidos em tudo aquilo que se faz. Conexão não é apenas interagir, é criar vínculo.

É importante tirarmos um tempo para meditar sobre onde estamos e para onde queremos ir, mas tire um tempo especial para isso, alguns minutos do seu dia e não o tempo todo. Viver o tempo todo no futuro só vai te deixar ansioso. Assim como viver no passado só lhe trará tristeza e sentimento de saudade. Aproveite mais seu agora.

Desde que comecei a pensar mais no agora, passei a me tornar uma pessoa menos ansiosa e cada vez mais realizada. Aprendi a saborear mais minha comida, sentir tudo com mais intensidade e descobrir mais sobre as pessoas com as quais convivo. Passe a apreciar mais o vento e os raios solares quando tocam sua pele, busque redescobrir as pessoas que ama e faça do agora um momento pelo qual você se sente agradecido.

Faça da sua presença, sua essência.

Texto: Evelise Marques


Lya....

Canção da Minha Ternura
Rondaste o meu castelo solitário
como um rio de vozes e de gestos;
baixei as minhas pontes fatigadas
e conheci teus lumes, teus agrados
teus olhos de ouro negro que confundem;
andei na tua voz como num rio
de fogo e mel e raros peixes belos,
cheguei na tua ilha e atrás da porta
me deste o banquete dos ardores
teus.

Mas às vezes sou quem volta
a erguer as pontes e cavar o fosso
e agora em sua torre, ternamente,
sem mágoa se debruça nas varandas
vendo-te ao longe , barco nessas águas,
querendo ainda estar se regressares
-porque seria pena naufragarmos
se poderias ter, sem tantas dores,
viagens e chegadas nos amores meus.

Lya Luft


Grande Mario....

"Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado."

Mário Quintana


Escolhas II....

O Êxito de qualquer Relação

O encanto do casamento resume-se, numa medida embaraçosa, ao facto de ser tão desagradável estar sozinho. Isto não é necessariamente culpa nossa como indivíduos. A sociedade como um todo parece determinada a tornar o estado de solteiro tão vexatório e deprimente quanto possível: uma vez acabados os tempos despreocupados da escola e da universidade, companhia e afeto tornam-se desanimadoramente difíceis de encontrar; a vida social começa a girar opressivamente em torno de casais; não resta ninguém a quem telefonar ou com quem passar o tempo. Não é para admirar, então, que quando encontramos alguém medianamente decente possamos ficar-lhe agarrados. 

Noutros tempos, quando as pessoas só podiam (em teoria) ter sexo depois de casarem, observadores sábios sabiam que alguns podiam ser tentados a casar pelas razõs erradas - e, assim, sustentavam que os tabus à volta do sexo pré-matrimonial deviam ser levantados para ajudar os jovens a tomar decisões mais calmas, menos conduzidas pelos impulsos. 

Mas se é verdade que esse particular impedimento ao bom senso foi removido, o facto é que uma outra espécie de ânsia parece ter tomado o seu lugar. O anseio de companhia pode não ser menos poderoso ou irresponsável nos seus efeitos do que foi em tempos o motivo sexual. Passar a sós cinquenta e dois domingos seguidos pode fazer gato-sapato da prudência de qualquer pessoa. Também a solidão pode provocar precipitações e a repressão das dúvidas e da ambivalência acerca de um potencial cônjuge. O êxito de qualquer relação não deveria ser determinado apenas pela satisfação que um casal tem em estar junto mas também pelo grau de preocupação que cada um dos parceiros tem em não estar num qualquer relacionamento. 

Alain de Botton, in 'O Curso do Amor'


Escolhas....

Eu não sei se é uma nova era, mas existe um movimento mundial para que você tenha liberdade de procurar qual vida é a sua vida.

A gente fala do sucesso profissional tanto quanto a gente fala da sua capacidade de lidar com o fracasso. Porque se você está decidida a ter um sucesso você não pode tirar da equação que seu maior professor é o fracasso. Não que a gente incentive que você fracasse, mas a questão é como você lida com isso em algumas áreas. Existe na nossa sociedade um enaltecimento ao sucesso. As pessoas, quando contam suas histórias, tendem a não dizer que elas aprenderam efetivamente quando as coisas começaram a dar errado. O Alain de Botton tem uma frase que diz que as pessoas só ficam verdadeiramente interessantes quando começam a chacoalhar as barras das suas jaulas.


Será que se você decidir ser uma pessoa muito bem-sucedida na sua área profissional você vai ter sucesso na sua área emocional? Qual dos dois você privilegia? É muito pessoal essa resposta, mas você tem que entender que um implica em perder um pouco do outro. É impossível você ser bom em todas as áreas. E isso tem que ficar muito claro porque essas conclusões e essas percepções nunca são colocadas. Se você privilegia sua vida profissional você tem que abrir mão de alguma área da sua vida. Se não é a amorosa, é a familiar. Se não é a familiar, é a dos seus amigos. Se não é a dos seus amigos, é o tempo que você passa lendo… Não cabe tudo. O grande problema é que as pessoas, quando tomam decisões, não trazem junto para o bolo das decisões o que elas vão ter que abrir mão.

Texto: Jackie de Botton



Mario Quintana

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

Mario Quintana


Enterrado vivo....

"As emoções que não expressamos não morrem dentro de nós, elas são simplesmente enterradas vivas e surgem da pior maneira."

( Sigmund Freud )


Excerto de A Peste de Camus

Foi mais ou menos nessa época que os nossos concidadãos começaram a se inquietar com o caso, pois, a partir do dia 18, as fábricas e os depósitos vomitaram centenas de cadáveres de ratos. Em alguns casos, foi necessário acabar de matar os bichos, pois sua agonia era demasiado longa. Mas desde os bairros, exteriores até o centro da cidade, por toda parte onde o doutor Rieux passava, por toda parte onde os nossos concidadãos se reuniam, os ratos esperavam em montes, nas lixeiras ou junto às sarjetas, em longas filas. A imprensa da tarde ocupou-se do caso a partir desse dia e perguntou  se a municipalidade se propunha ou não a agir e que medidas de urgência tencionava adotar para proteger os seus munícipes dessa repugnante invasão. A amunicipalidade nada se tinha proposto e nada previra, mas começou por reunir-se em conselho para deliberar. Foi dada a ordem ao serviço de desratização para recolher os ratos mortos todas a madrugadas. Em seguinda, dois carros do serviço de desratização deveriam transportar os animais até o forno de incineração de lixo a fim de serem queimados. 

Mas, os dias se seguiram, a situação agravou-se. O número de roedores apanhados ia crescendo e a coleta era a cada manhã mais abundante. A partir do quarto dia, os ratos começaram a sair para morrerem em grupos. Dos porões, das adegas, dos esgotos, subiam em longas filas titubeantes, para virem vacilar à luz, girar sobre si mesmos e morrer perto dos seres humanos. À noite, nos corredores e nas ruelas, ouviam-se distintamente seus guinchos de agonia. De manhã, nos subúrbios, encontravam-se estendidos nas sarjetas com uma pequena flore de sangue nos focinhos pontiagudos; uns, inchados e pútridos; outros, rígidos e com bigodes ainda eriçados. Na própria cidade, eram encontrados em pequenos montes nos patamares ou nos pátios. Vinham, também, morrer isoladamente nos evstíbulos das repartições, nos recreios das escolas, por vezes nos terraços dos cafés. Nossos concidadãos, estupefatos, encontravam-nos nos locais mais frequentados da cidade.


Dentro de mim....

No meio do ódio eu achei que havia dentro de mim um amor invencível. No meio das lágrimas eu achei que havia dentro de mim um sorriso imbatível. Em medo do caos eu achei que havia dentro de mim uma calma imbatível.
Dei-me conta, apesar de tudo, que no meio do inverno havia dentro de mim um verão invencível. E isso me faz feliz. Porque não importa o quão duro o mundo empurra contra mim, dentro de mim há algo melhor empurrando de volta.

*Albert Camus*


Necessidade....

Diferenciam-se os comunicadores pela razão de ser de sua função, e pela razão de ser da pessoa que se presta à função. Vejam os jornalistas e os poetas: ambos comunicam coisas de interesse da sociedade, faça prazer ou faça doer, eis sua função. Por mérito da vida, diferenciam-se em sua razão: o primeiro comunica por utilidade, e o segundo por necessidade."

__Jon


Lesley Oldaker











Esse sou eu....


Pepe Escobar analisa a nova etapa da guerra EUA-China


Pepe Escobar - sem censura: Lula, Amazônia e guerra híbrida


quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Pepe Escobar explica o que foi o 11 de setembro, 18 anos depois


Só tenha cuidado....

Há bastante deslealdade, ódio, violência, absurdo no ser humano comum para suprir qualquer exército em qualquer dia. E o melhor no assassinato são aqueles que pregam contra ele. E o melhor no ódio são aqueles que pregam amor, e o melhor na guerra, são aqueles que pregam a paz. Aqueles que pregam Deus precisam de Deus, aqueles que pregam paz não têm paz, aqueles que pregam amor não têm amor. Cuidado com os pregadores, cuidado com os sabedores. Cuidado com aqueles que estão sempre lendo livros. Cuidado com aqueles que detestam pobreza ou que são orgulhosos dela. Cuidado com aqueles que elogiam fácil, porque eles precisam de elogios de volta. Cuidado com aqueles que censuram fácil, eles têm medo daquilo que não conhecem. Cuidado com aqueles que procuram constantes multidões, eles não são nada sozinhos. Cuidado com o homem comum, com a mulher comum, cuidado com o amor deles. O amor deles é comum, procura o comum, mas há genialidade em seu ódio, há bastante genialidade em seu ódio para matar você, para matar qualquer um. Sem esperar solidão, sem entender solidão eles tentarão destruir qualquer coisa que seja diferente deles mesmos.



11 de setembro

Por Pepe Escobar, no Asia Times
Tradução de Regina Aquino
Após anos de reportagens sobre a Grande guerra ao terror, muitas questões permanecem pendentes.
O Afeganistão foi bombardeado e invadido por causa do 11/09. Eu estava lá desde o começo, bem antes do 11/09. Em 20 de Agosto de 2001, eu entrevistei o comandante Ahmad Shah Massoud, o “Leão do Panjshir *“, que me contou sobre a aliança profana entre o Talibã, a al-Qaeda e o ISI (Inter-Services Intelligence, o serviço de Inteligência paquistanesa).
De volta a Peshawar, eu fiquei sabendo que algo realmente grande estava para acontecer: meu artigo foi publicado pelo Asia Times em 30 de Agosto. O comandante Massoud foi morto em 9 de Setembro: eu recebi um e-mail sucinto de uma fonte em Panjshir, afirmando somente, “atiraram no comandante”. Dois dias depois, o 11/09 aconteceu.
E ainda, no dia anterior, ninguém mais que Osama bin Laden, em pessoa, esteve num hospital Paquistanês, em Rawalpindi, recebendo tratamento, como foi relatado pela CBS. Bin Laden foi proclamado o autor do atentado já as 11h da manhã no dia 11/09 – com absolutamente nenhuma investigação. Não deveria ser exatamente difícil localizá-lo no Paquistão e “trazê-lo para a Justiça”.
Em dezembro de 2001, eu estava em Tora Bora rastreando bin Laden – debaixo de bombas B-52 e lado a lado com combatentes Pashtun (**). Mais tarde, em 2011, eu revisitaria o dia em que bin Laden desapareceria para sempre.
Um ano após o 11/09 , eu estava de volta ao Afeganistão para uma investigação mais profunda sobre o assassinato de Massoud. Até aquele momento era possível estabelecer uma conexão Saudita: a carta de apresentação dos assassinos de Massoud, que se colocaram como jornalistas, foi fornecida pelo comandante Sayyaf, um ativo saudita.
Por 3 anos minha vida girou em torno da Guerra Global ao Terror; a maior parte do tempo eu vivia literalmente na estrada, no Afeganistão, Paquistão,Irã, Iraque, o Golfo Pérsico e Bruxelas. No começo do “Choque e Pavor” no Iraque, em Março de 2003, o Asia Times publicou minhas abrangentes investigações na qual os neo-cons arranjaram a guerra no Iraque.
Em 2004, errante pelos EUA, eu re-rastreei a viagem do Talibã para o Texas, e como uma prioridade máxima, desde os anos Clinton todo o caminho até os neo-cons, era sobre o que eu havia batizado como “Oleodutistão” - nesse caso como construir o gasoduto Turmequistão-Afeganistão-Paquistão (TAPI) contornando Irã e Rússia e estendendo o controle estadunidense na Ásia Central e Sul.
Mais para frente, eu passei a examinar as difíceis questões que a Comissão do 11/09 nunca respondeu, e como a campanha de re-eleição de Bush estava totalmente condicionada e dependente do 11/09.
Michael Ruppert, um informante da CIA, que pode – ou não – ter cometido suicídio em 2014, era um dos principais analistas do 11/09. Nós trocamos um monte de informação e sempre enfatizando o mesmo ponto: Afeganistão era tudo sobre a (existente) heroína e o ( não-existente) gasoduto.
Em 2011, o tardio, grande Bob Parry desmascararia mais mentiras sobre o Afeganistão. E em 2017, eu detalharia a principal razão do porque os EUA nunca deixarão o Afeganistão: a rota da heroína.
Agora, o Presidente Trump pode ter encontrado um possível acordo Afegão – o qual o Talibã, que controla dois terços do país, são obrigados a recusar, o que permitiria recolher somente 5 mil soldados estadunidenses dos 13 mil atuais. Mais ainda, o “Deep State” estadunidense é absolutamente contra qualquer acordo assim como a Índia e o raquítico governo de Kabul.
Porém Paquistão e China são a favor, especialmente porque Pequim planeja incorporar Kabul no Corredor Econômico China-Paquistão e já admitiu Afeganistão como membro da Organização de Cooperação de Xangai, portanto agregando as montanhas Hindu Kush e a Passagem de Khyber para o vindouro processo de integração da Eurásia.
Rezando por um Pearl
Dezoito anos depois do ato mudança-do-jogo, nós permanecemos reféns do 11/09. Os neocons estadunidenses, reunidos em torno do Projeto para o Novo Século Americano, vinham rezando por um “Pearl Habour” para reorientar a política externa estadunidense desde 1997. Suas preces foram atendidas para muito além de seus mais selvagens sonhos.
Já em “O grande tabuleiro de Xadrez”, também publicado em 1997, um ex-consultor de Segurança Nacional e co-fundador da Comissão Trilateral Zbigniew Brzezinski, nominalmente um não neocon, tem salientado que o público Americano “ apoiou o envolvimento amplo da América na segunda Guerra Mundial por causa do efeito do choque do ataque dos Japoneses a Pearl Habour.
Assim, Brzezinski acrescenta, América “ pode achar mais difícil formar um consenso em temas de política externa, exceto em circunstâncias de verdadeiramente massiva e de ampla percepção de ameaça externa direta.”
Como um ataque a terra natal, o 11/09 gerou a Guerra Mundial ao Terror, iniciada as 11h da noite desse mesmo dia, inicialmente batizada com “ A Longa Guerra” pelo Pentágono, mais tarde higienizada como Operação de Contingenciamento Ultramar pela administração Obama. Tem custado trilhões de dólares, matando mais de meio milhão de pessoas e se ramificado em guerras ilegais contra sete nações muçulmanas – tudo justificado por “razões humanitárias” e alegadamente apoiada pela “comunidade internacional”.
Ano após ano, o 11/09 é essencialmente um ritual cerimonial Você Tem o Direito de Aceitar Somente a Versão Oficial , mesmo que a evidência generalizada sugira que o governo estadunidense sabia que o 11/09 aconteceria e não o parou.
Três dias após o 11/09, Frankfurter Allgemeine Zeitung relatou que em Junho de 2001, a Inteligência Alemã alertou a CIA que terroristas do Oriente Médio estavam “planejando sequestrar uma aeronave comercial para usar como arma para atacar importantes símbolos da cultura Americana e Israelense.”
Em Agosto de 2001, o Presidente Putin ordenou a Inteligência Russa para avisar ao governo Estadunidense “nos mais fortes termos possíveis” de ataques eminentes a aeroportos e prédios governamentais, a MSNBC revelou numa entrevista com Putin transmitida em 15 de Setembro desse ano.
Nenhuma agência governamental estadunidense liberou qualquer informação sobre quem usou conhecimento prévio do 11/09 no mercado financeiro. O Congresso estadunidense nem mesmo tocou no assunto. Na Alemanha, o jornalista investigativo de finanças Lars Schall trabalha por anos num estudo intenso detalhando a grande extensão de informações privilegiadas antes do 11/09.
Enquanto o NORAD dormia
Desacreditada a narrativa oficial e imutável do 11/09, permanece um último tabu. Centenas de arquitetos e engenheiros envolvidos numa meticulosamente desmitificação técnica de todos os aspectos da estória oficial do 11/09 foram sumariamente dispensados como “ teoristas conspiradores”.
Em contraponto, o ceticismo enraizado na tradição Grega e Latina surge com, provavelmente, o melhor documentário sobre o 11/09: Zero, uma produção italiana. Assim como, seguramente o mais estimulante livro sobre o 11/09 é também italiano: O Mito de 11 de Setembro, por Roberto Quaglia, que oferece delicadas nuances narrativas do 11/09 como um mito estruturado, como num filme. O livro foi um sucesso imenso na Europa Oriental.
Questões sérias sugerem suspeitas bastante plausíveis a serem investigadas relativas ao 11/09 para além dos 19 Árabes com caixas de facas. Dez anos atrás, no Asia Times, eu perguntei 50 questões, algumas delas extremamente detalhadas, a respeito do 11/09. Depois das demandas e sugestões de leitores, acrescentei outras 20. Nenhuma dessas questões foram convincentemente abordadas – sequer respondidas - pela narrativa oficial.
A opinião pública mundial é levada a acreditar que na manhã de 11/09, quatro aviões comerciais, presumivelmente sequestrados por 19 árabes portando caixas com facas, viajaram sem ser incomodados – por duas horas – através do mais controlado espaço aéreo do planeta, o qual é supervisionado pelo mais devastador aparato militar existente.
O vôo 11 da American Airlines foi desviado de seu caminho as 8:13 da manhã e se chocou com a torre do World Trade Center as 8:57. Somente as 8:46 o NORAD – o Comando de Defesa Aeroespacial Norte Americano - ordenou que dois interceptadores F-15 decolassem da base militar Otis.
Por uma curiosa coincidência um exercício de guerra do Pentágono estava em ação naquela manhã do 11/09 – por isso os controladores de radar podem ter registrados somente “sinais fantasmas” de aeronaves não existentes simulantes um ataque aéreo. Bem, isso é muito mais complicado do que parece, como demonstraram pilotos profissionais.
‘O Anjo era o próximo’
A opinião pública mundial também foi levada a acreditar que um Boeing 757 – com uma largura de uma ponta a outra das asas de 38 metros – foi dirigido para penetrar o Pentágono através de um buraco de seis metros de abertura na altura do chão. Um Boeing 757 com trem de aterrissagem abaixado tem 13 metros de altura. São aeronaves que se recusam a chocar com o chão – por isso é uma façanha convencer alguém a voar a 10 metros do chão, com o trens de pouso abaixados, e a uma velocidade de 800 quilômetros por hora.
De acordo com a narrativa oficial, o Boeing 757 literalmente pulverizou-se. Mesmo que antes da pulverização, foi dirigido para perfurar seis paredes dos três anéis do Pentágono, fazendo um buraco de dois metros de abertura na ultima parede e danificando levemente os segundo e terceiros anéis. A narrativa oficial é que esse buraco foi causado pelo nariz do avião – ainda firme após a pulverização. E o resto do avião – uma massa de 100 toneladas viajando a 800 quilômetros por hora - miraculosamente parou no primeiro anel.
Tudo isso aconteceu sob a administração de um certo Hani Hanjour, que 3 semanas antes foi avaliado por seus instrutores de voo como incapaz de pilotar um Cessna. Hanjour, entretanto, gerenciou a aeronave para alcançar uma ultra-rápida espiral descendente de 270 graus, alinhando-a a 10 metros, no máximo, do chão, calibrando minuciosamente a trajetória e mantendo uma velocidade de cruzeiro em torno de 800 quilômetros por hora.
As 9:37 da manhã, Hanjour atinge precisamente o escritório de análise de orçamento do Pentágono, aonde todo mundo trabalhava freneticamente num misterioso desaparecimento de nada menos que $2,3 trilhões, que o Secretário de defesa Donald “Conhecido Desconhecido” Rumsfeld, numa entrevista coletiva de imprensa no dia anterior, disse que não poderia ser monitorado. Assim, não foi só o Boeing que se pulverizou dentro do Pentágono.
A opinião pública mundial foi também dirigida a acreditar que a física Newtoniana estava suspensa como um bônus especial para o WTC 1 e 2 no 11/09 (sem mencionar o WTC 7, que nem mesmo foi atingido por uma aeronave). O vagaroso WTC levou 10 segundos para cair 411 metros, começando da imobilidade. Ou seja, ele caiu 148 quilômetros por hora. Considerando o tempo de aceleração inicial, ocorreu uma queda livre, não impedida por um maciço de vigas verticais de aço que compunham a estrutura central da torre.
A opinião pública mundial foi também dirigida a acreditar que o voo 93 da United Airlines – 150 toneladas de aeronave com 45 pessoas, 200 lugares, bagagens, com 38 metros de comprimento de uma asa a outra – espatifou-se num campo na Pensilvânia e também literalmente, pulverizou-se, desaparecendo totalmente dentro de um buraco de 6 metros por 3 metros de abertura e dois metros de profundidade.
De repente, o Air Force One era “o único avião nos céus.” O coronel Mark Tillman que estava a bordo lembrou : “Recebemos um relato de que existe uma mensagem dizendo que “Anjo” será o próximo. Ninguém realmente sabe agora da onde veio o comentário - isso chegou mal traduzido ou truncado entre a Casa Branca, a Sala de Crise, os operadores de rádio. “Anjo” era nosso nome código. O fato é que eles sabiam sobre “Anjo”, bem, você tem que ser do círculo interno.”
Isso significa que os 19 Árabes com caixas com facas, e a maioria dos seus mandantes, certamente, tem que ser do “círculo interno”. Inevitavelmente , isso nunca foi completamente investigado.
Já em 1997, Brzezinski tinha avisado, “ É imperativo que nenhum adversário Eurasiano emerja com capacidade de dominação da Eurásia e portanto de desafiar a América”.
No final, para o desespero dos neocons estadunidenses, toda a fúria e som combinada do 11/09 e a Guerra Global ao Terror/Operação de Contingenciamento Ultramar, em menos de 2 décadas, acaba em metástases representadas não somente por um rival mas também na parceria estratégica Rússia-China. Esse é o “inimigo” real – não a Al-Qaeda, uma mera invenção do imaginário da CIA, reabilitada e higienizada na forma de “rebeldes moderados” na Síria.

Paixões....

Para mim não há liberação à tout prix. Não poderia desembaraçar-me de algo que não possuo, que não fiz, nem vivi. Uma liberação real só é possível se fiz o que poderia fazer, se me entreguei totalmente a isso, ou se tomei totalmente parte nisso. Se me furtar a essa participação, amputarei de algum modo a parte de minha alma que a isso corresponde. É claro que essa participação pode me parecer demasiadamente penosa, e que eu tenha boas razões para não me entregar internamente a isso. Então, ver-me-ei constrangido a um non possumus e serei obrigado a reconhecer que talvez tenha omitido algo de essencial, que não cumpro uma tarefa. A consciência aguda de minha incapacidade compensa a ausência do ato positivo. O homem que não atravessa o inferno de suas paixões também não as supera. Elas se mudam para a casa vizinha e poderão atear o fogo que atingirá sua casa sem que ele perceba. Se abandonarmos, deixarmos de lado, e de algum modo esquecermos-nos excessivamente de algo, correremos o risco de vê-lo reaparecer com a violência redobrada“ 

Carl Gustav Jung


O Caminho da Felicidade Requer Renúncia e Discernimento

A vida é feita de paradoxos. Para trilhar o caminho da bem-aventurança, o primeiro passo é querer o bem de todos os seres. O passo seguinte consiste em trabalhar de modo prático, durante muito tempo, para que os outros sejam felizes. O auto-esquecimento abrirá as portas do bem-estar durável.  
 
A substância da vida é feita de solidariedade. Cada criança é resultado da interação amorosa dos seus pais. Alguém cuida do indivíduo humano quando ele nasce, e alguém cuida dele quando morre.
 
Logo no início da vida, o ser humano começa a aprender a arte de cuidar de si mesmo. Esta arte tem limitações, porque mesmo na fase mais “independente” da sua vida haverá sempre alguém cuidando da pessoa. Seus amigos, os colegas, o chefe no trabalho, os professores, pais, dentistas, médicos, motoristas de táxi, filhos e irmãos ou mesmo netos, todos cuidam de algum modo de cada ser humano. A sociedade inteira protege e ajuda o cidadão individual, dando-lhe ruas calçadas para caminhar e outros tantos benefícios da vida em comunidade.
 
O fato de ser objeto de cuidados é agradável, mas cuidar dos outros é melhor ainda. O caminho da paz requer que pensemos no bem-estar interior daqueles a quem queremos bem, e devemos querer o bem de todos os seres. A atitude altruísta é benéfica para nós próprios. Aquilo que fazemos aos outros é o que retornará, cedo ou tarde, para nós.
 
Cuidar Requer Lucidez e Desapego
 
Embora trabalhar para o benefício dos outros seja a fonte do verdadeiro bem-estar, isso não significa que a tarefa seja fácil. Cuidar de modo eficiente é uma arte, e também um mistério que implica boa dose de auto-sacrifício.
 
Coragem, renúncia, desapego e discernimento são necessários para cuidar dos outros seres como devem ser cuidados.  Ajudar não é fazer sempre o que a pessoa deseja. Atender a todas as vontades daqueles com quem nos relacionamos é um caminho seguro para a infelicidade. Firmeza e um determinado rigor nas relações interpessoais são fatores úteis. Saber ceder é tão importante quanto saber dizer não. O uso do discernimento permitirá tomar a decisão correta a cada instante. Os erros trarão as lições que devemos aprender.  A meta é não cuidar das pessoas buscando o caminho mais cômodo, mas fazendo aquilo que estimulará seu crescimento e seu sentido de responsabilidade.
 
Seja adulto ou criança, o ser humano precisa saber que há limites. A ausência da aceitação de obstáculos é uma fonte de dor e violência psicológicas. A moderação deve ser cultivada.  Embora os limites possam ser transcendidos através do amor e da compreensão, eles não devem ser necessariamente eliminados. A diferença entre transcender e eliminar é fundamental: a transcendência não é destruição, e a destruição não é transcendência.
 
O estabelecimento de limites nas relações solidárias faz com que o fortalecimento da vontade individual ocorra sobre canais adequados.  A administração correta do desejo é uma ciência em si. Uma vontade forte, usada sem discernimento, cria uma quantidade apreciável de dor. A mesma vontade, usada com eficiência em função de uma meta correta, tem diversos efeitos positivos. Ela transcende o impulso cego, produz uma compreensão ampla e lúcida da vida, e faz com que surja a felicidade incondicional.
 
Cada um deve aprender a administrar corretamente a sua vontade, dotando-a de força solidária e discernimento. Esta meta pode ser ensinada a crianças e adultos, e o indivíduo deve buscá-la por esforço próprio. Os limites nos relacionamentos são linhas de respeito mútuo. Eles sustentam e protegem as relações solidárias, e devem ser estabelecidos mutuamente. É correto aceitar os limites que os outros nos colocam, a menos que haja sérios motivos para fazer o contrário. 
 
A arte de cuidar de alguém é inseparável do processo do autoconhecimento e da arte de cuidar de si mesmo. Cuidamos dos outros como cuidamos de nós. Descuidar dos outros é descuidar de si, e o egoísmo constitui sobretudo uma falta de atenção e vigilância diante da vida. Nosso eu emocional é nossa criança interna. Ele merece ser tratado com paz-ciência, estabilidade e respeito, porque a auto-estima emocional é indispensável no caminho do altruísmo. A generosidade começa no modo como vemos a nós próprios, e isso não significa indulgência ou falta de auto-crítica. Os erros devem ser olhados com rigor, mas desde o ponto de vista do nosso potencial sagrado.
 
Um Planeta Solidário
 
A importância das descobertas de Charles Darwin não deve ser exagerada. O apoio mútuo, e não a competição, constitui a lei da vida. Todos os seres progridem através da ajuda recíproca. Animais, e até vegetais, ajudam uns aos outros. É falsa a ideia de que a lei da selva é a lei da competição.  Na verdade, reina a harmonia nas florestas. Já no mundo humano, o sábio ajuda o inexperiente, e o novato auxilia seu irmão mais velho.  Cada família e cada nação é sustentada pelo amor de uns pelos outros e pela prática do respeito e da cooperação.
 
O planeta Terra inteiro é um círculo multidimensional de laços de afeto que se desdobram em diversos níveis de ação e percepção. Há dor e violência no planeta, seguramente.  Mas isso se deve à presença provisória da ignorância, cujo final podemos acelerar em tudo aquilo que depende de nós.
 
Aquele que é apto para cuidar do outro sente prazer em não provocar dor, e sofre quando causa sofrimento para alguém. Todo ser consciente sabe que o outro é seu espelho. Só o desinformado bate no espelho e imagina que assim obterá alguma vitória.
 
Todos São Mestres, o Tempo Inteiro
 
Os relacionamentos humanos são todos recíprocos e se alimentam de padrões repetitivos estáveis, em torno dos quais surge a base instintiva sobre a qual a vida se desenvolve.  
 
Em consequência disso, cuidar da vida é criar bons hábitos, primeiro para si mesmo, e em seguida na relação com os outros. Cuidar é também abandonar os hábitos nocivos, e entre estes ocupam lugar de destaque o desperdício de tempo e o desperdício de energia.
 
“Devemos fazer aquilo que é correto e, com o tempo a ação se tornará agradável”, ensina a tradição pitagórica.
 
Os hábitos criam o caráter, e o caráter é um fator importante na determinação do carma ou “destino” de alguém.  A pessoa deve primeiro estabelecer metas claras, e em seguida criar padrões de comportamento que sejam coerentes com suas metas.
 
Lições não nos faltam. Elas estão por todo lado ao nosso redor: o desafio é prestar atenção a elas.  Todos os seres educam uns aos outros ao interagir. Todos são professores, e devem ter um sentido de responsabilidade por aquilo que ensinam o tempo inteiro através de cada ação, cada palavra, sentimento e mesmo pensamento articulado em silêncio.    
 
Cuidar ou educar seres de qualquer idade implica estimular a sua independência solidária. Ajudar é também ensinar a combater as causas, e não só os efeitos do sofrimento. Aquele que é auxiliado deve fazer por merecer, erguendo-se por força própria em tudo que as circunstâncias permitem.   
 
Cuidar Inclui o Bom Combate
 
Assim como há conflitos na alma humana, há combates no mundo. O bom guerreiro é um cuidador e um protetor da vida e sabe agir com severidade. O policial civil e o policial militar protegem a população. A Polícia Rodoviária atua na defesa da vida.  O soldado protege o povo.  
 
Aquilo que ocorre fora é uma exteriorização do mundo interno. No organismo físico do ser humano, o sistema imunológico combate num estilo verdadeiramente  policial-militar  as infecções, intoxicações, agentes nocivos e todo tipo de perigo para a saúde.  
 
No plano emocional e psicológico, quando alguém trata de disfarçar e suprimir conflitos, imaginando que são desnecessários, a situação fica em geral mais difícil.  Os combates disfarçados se travam ocultamente e passam a ser desnecessariamente violentos. Esconder o conflito provoca traições e punhaladas emocionais que seriam desnecessárias se houvesse coragem, confiança mútua e bom senso suficientes para estabelecer uma transparência na relação.
 
A desarmonia disfarçada ou “suprimida” atua de modo mais perigoso no plano subconsciente, enquanto que o conflito honesto, tornado consciente, é colocado sobre a mesa e pode ser resolvido com mais facilidade, porque está sujeito a um exame lúcido e equilibrado. O conflito honesto preserva o respeito e permite a construção de uma paz durável.  A transparência é fonte de paz em todas as esferas da vida.
 
O Cuidado Como Função da Alma
 
Para viver corretamente, não basta querer cuidar de si e cuidar dos outros. A eficácia de um indivíduo diante destes dois desafios práticos depende da sua capacidade de ouvir o inaudível.  Ele deve ser capaz de escutar a voz sem palavras da sua própria alma imortal. Nela existe um reservatório ilimitado de energia, conhecimento e vocação de vitória.
 
A voz do silêncio transcende respeitosamente as variadas marés de pensamentos, sentimentos, ações e reações. Ela vê a unidade dinâmica da vida sem negar ou lamentar a diversidade e o contraste, a alegria e a dor.  Ela ensina que a consciência interna do ser humano não nasce com o nascimento do seu corpo físico, e não morre quando o corpo é abandonado ao final de uma encarnação.
 
A consciência profunda atua como uma Testemunha Sagrada. Ela possui a substância da serenidade. Ela constitui a fonte de paz no interior de cada um. 
 
Quando amplia a conexão com sua alma imortal, o indivíduo passa a enxergar a vida como uma rede ilimitada de reciprocidades em ação: nossa Terra é uma grande cooperativa de crescimento espiritual, e tudo o que ocorre nela leva à iluminação ou esclarecimento dos seus habitantes.  
 
O bom Carma escreve certo por linhas tortas. A vida converte cada limão em limonada. Ao perceber que a transformação de ignorância em Sabedoria e de sofrimento em Felicidade é a Lei inevitável da evolução, diminuímos a taxa de desperdício da nossa energia vital. Então compreendemos as implicações do fato de que trabalhar para o bem dos outros é o modo mais eficaz de trabalhar para o nosso próprio bem. Qualquer indivíduo que sofre pode fazer a experiência prática e verificar por si mesmo este princípio básico da filosofia teosófica: é cuidando dos outros, com perseverança,  que alguém cura do modo mais definitivo as suas próprias feridas.  Ao pensar continuamente  em seu próprio sofrimento,  o desinformado usa mal a força do pensamento e torna a dor mais profunda sem necessidade.
 
A teosofia aponta para uma cura natural, de dentro para fora, a partir do contato individual e  silencioso com a alma espiritual, a essência sagrada do nosso ser. A consciência desta alma é universal e por isso é abençoada.  Ela ensina que os seres humanos devem cuidar de si próprios, e que também devem cuidar uns dos outros, do planeta Terra, e do futuro da humanidade como um todo.
 
Aquele que percebe estas verdades simples compreende que o egoísmo é uma ilusão. Os sonhos egocêntricos estão situados fora da realidade.  O fato de os desinformados serem numerosos não os torna sábios, nem lhes dá bom senso ou eficácia. Ao contrário.  Quando a ignorância materialista parece dominar, a sabedoria e o realismo da lei da causa e efeito se tornam ainda mais necessários.
 
São os poucos que fazem a diferença.  É a filosofia do altruísmo auto-responsável, ensinada pela teosofia das diferentes religiões e tradições filosóficas, que nos permite estar em contato com a Realidade. 
 
A visão solidária da vida vem sendo ensinada a todos os povos e nações pelos sábios de todos os tempos. A expansão dos horizontes liberta o indivíduo do pesadelo doloroso criado pelas formas erradas de busca da felicidade.  A filosofia da solidariedade universal abre diante de cada ser humano o antigo caminho, morro acima, estreito e difícil, mas verdadeiro, que conduz à bênção interior e incondicional.