Porque vocês virão no decorrer desses 21 dias essas cartas soltas do Tarot de Crowley por aqui? Somente para ajudar quem necessitar tê-las em tamanho grande e de boa qualidade. Simplesmente para isso, pois é difícil encontrá-las assim num lugar só. Aproveite, copie a vontade se quiser.
Abaixo, temos um texto do livro de Veet Pramad sobre as cartas. Eu acho bem interessante.
A
Grande Viagem
Abordar os Mistérios Maiores é toda uma aventura. Um estudo sistemático
sobre a estrutura interna, atribuições e caminhos, poderia ser árido demais
para os profanos do Tarô. E um glossário de significados práticos, deixaria o
leitor sem rumo.
Eis a razão deste capítulo. Com ele pretendo passar uma visão de
conjunto dos Arcanos (Mistérios), através das identificações que cada um deles
suscita em nós. Veremos como refletem em nossas vidas e, sentindo‑nos presentes
nas cartas, poderemos, aos poucos, conhecê‑las. A seqüência de Arcanos maiores
será considerada aqui como a Grande Viagem do Ser Humano em busca da
Realização de Si Mesmo.
Consideraremos cada uma das 22 cartas como um diferente estado de consciência,
desde a Suprema Potencialidade do louco até a Plena Consciência ou Síntese
Final do Universo. Tal
consideração só poderá ser feita se colocarmos o Louco como a primeira carta da
seqüência. O Louco, carta número 0, vai enfrentar três séries, cada uma sete
cartas. Cada carta é uma prova que o impele a se conhecer, a ser mais ele
mesmo.
O Louco é a criança, pura, espontânea a inocente, totalmente potencial. Alguns autores atribuem ao louco a idéia de
inconsciência. Nada mais falso. A criança sabe muito bem o que é bom para ela e
o que não é, seus instintos (salvo graves problemas em sua vida intra‑uterina)
estão intactos. Sua memória corporal engloba as lembranças de toda a evolução
da espécie. Ela é potencialmente consciente, de forma alguma inconsciente. É
óbvio que a criança desconhece o mundo tão complexo ao qual chegou, desconhece
a mente dos adultos e suas neuroses, a violência contra os mais fracos, a falta
de amor, as guerras. Ela não sabe que em 1987 no mundo foram gastos 1,3
bilhões de dólares por minuto, em orçamentos militares. E que em cada um
daqueles minutos, trinta crianças morriam de fome.
Realmente, a criança que acabou de encarnar nesta Escola Planetária não
precisa saber nada disto para crescer. Para realizar‑se, ela precisa,
fundamentalmente, de uma coisa só: AMOR. Ela é um ser perfeito e
completo, que se desenvolve a partir de uma energia central, de uma semente
original, de um átomo divino. Não está faltando nada. A criança não precisa de
escola, de universidade, de família para ser educada. A sabedoria está dentro
dela, no ponto para se manifestar. Apenas precisa de Amor para afirmar‑se, para
desenvolver suas potencialidades, para florescer, para se lembrar do que ela
já sabe.
Assim, a Criança‑Louco sorridente e com os olhos maravilhados frente ao
desconhecido, livre de medos, preconceitos e bloqueios, cai no mundo disposta a
viver a eternidade em cada momento. Neste ponto de absoluta potencialidade,
o Louco começa a desenvolver uma primeira polaridade, começa a entrar em
contato e a se expressar de duas maneiras fundamentais, que correspondem aos
dois princípios básicos que operam no universo: o Yang e o Ying. No Tarô,
recebem o nomes de o Mago (Arcano I) e a Sacerdotisa (Arcano II).
A primeira expressão Yang ao nascer pode ser o choro ou o riso, se são
respeitados os ritmos da natureza: se é o nenê que nasce ou é o doutor fazendo
mais um parto. Depois, o nenê vai sugar os peitos da mamãe, vai comunicar‑se,
relacionar‑se, vai procurar coisas a descobrir, compreender e levar para a
forma concreta os arroubos de sua prodigiosa imaginação. Vai criar,
transformar, encontrar seus limites e tentar ultrapassá‑los; enfim, vai sair
de seu espaço interior para atuar no mundo exterior. Tudo isso é expressão do Mago,
Arcano I.
A Sacerdotisa, Arcano II,
está relacionada com as forças que levam a criança a interiorizar‑se. São
aqueles momentos em que a criança fica quietinha num cantinho, tranqüila e
silenciosa, às vezes de dedo na boca, totalmente conectada com ela mesma,
receptiva ao externo e ao interno, compreendendo, intuitivamente, os
significados de tudo o que acontece. Nesses momentos a criança nos surpreende
com uma expressão de serenidade e sabedoria, que só os Budas conseguiram resgatar.
Quando o nenê manifesta‑se através dessas duas forças básicas, ele vai
entrando, gradualmente, em contato com o mundo da matéria, que é também o
mundo das regras, dos limites e da moral. Quem coloca a criança em contato com
esse mundo é, primeiro, a mãe e depois o pai: a Imperatriz e o Imperador,
Arcanos III a IV respectivamente. Os pais são os seres que mais
influenciam a vida de qualquer um, tanto pelo que fazem como pelo que não
fazem. São mais importantes para nosso desenvolvimento do que a escola, os
irmãos, os amigos, a sociedade, o sistema econômico, a nacionalidade, a classe
social, etc. Até o ponto de determinar, em alto grau, o futuro da criança,
como confirma a sabedoria popular: “Tal pai, tal filho”. A pessoa pode fazer os
maiores esforços para liberar‑se da programação parental. Porém, é muito
difícil acabar totalmente com ela, como afirma Eric Berne, baseado no
Panchatantra:
“Estas cinco coisas tereis de
vossos pais, seis anos após sair do útero: A duração de vossos dias, vosso
fardo, vossa riqueza, vossa instrução e vossa tumba”.
Quando o Ser Espiritual começa a encarnar, ele o faz dentro da mãe. Ela
é a primeira a dar forma e, portanto, limite a esse Ser. Ela dá a possibilidade
de nascer e, ao mesmo tempo, está assinando a sua sentença de morte. A emoção
da mãe na hora da fecundação, seja o prazer do orgasmo, seja o amor pelo
parceiro, o medo de ficar grávida ou a rejeição ao macho, qualquer desses
sentimentos será o primeiro tijolo do corpo emocional da criança. Ainda
durante a vida intra‑uterina, a mãe mexe intensamente com o filho, aceitando‑o
ou rejeitando‑o, amando‑o ou odiando‑o.
A mãe pode escolher. Pode sentir‑se abençoada pelas Forças da Vida,
que lhe confiaram a gestação de um Ser Perfeito e através do qual ela tem a
possibilidade de resgatar sua própria perfeição. Ou pode sentir sua
gravidez como um castigo, como algo terrível, que é “melhor tirar logo”. A
criança vai saber muito bem até que ponto pode mudar sua vida, tendo ou não o
amor da mãe. Justamente o que ela mais precisa, especialmente em seus primeiros
dois anos de vida, é de uma mãe amorosa e nutritiva. Infelizmente, para a
humanidade e para a vida do planeta como um todo, é difícil encontrar mães que
estejam disponíveis para seus filhos; que sejam capazes de fazer mudanças em
suas vidas para ajudar o desenvolvimento de suas crianças; capazes de abrir
seus corações para o novo Ser. Tem ocorrido assim, porque neste mundo
Ocidental, cristão e “civilizado”, a imensa maioria das mães sente‑se
frustrada. Vivemos num sistema grosseiramente machista, que de todos os
ângulos massacra a mulher.
Porém, constatamos que as próprias mulheres continuam vendendo‑se aos
machões, se acomodando. Renunciando à sua individualidade e liberdade, ao seu
prazer e sexualidade, à realização de seus sonhos e, enfim, ao desenvolvimento
de suas potencialidades, para se vender à aparente segurança que o macho dá. Renuncia
a lutar por sua felicidade e dignidade, fazendo de sua renúncia e sofrimento,
um mérito. Em alguns casos, compete com o macho no mundo dos machos,
chegando, muitas vezes, a ser mais destrutiva que eles, (Indira Chandi,
Margaret Tacher). A mulher aceitou o contrato de sua degradação: disse sim
para o amo e não para ela mesma. Isso acaba gerando tanta raiva que
estrangula sua capacidade de amar e a deixa incapaz de sentir outra coisa que
não seja raiva, ódio e desejo de vingança. E acaba se vingando nos filhos,
transmite‑lhes sua frustração.
Se a raiva de todas as frustradas do mundo se juntasse, imediatamente o
planeta explodiria, com mil vezes mais força do que todas as armas que os
machos acumularam. Assim, a mulher não pode aceitar as manifestações da
individualidade da criança, nem pode tolerar suas iniciativas. Suas expressões
espontâneas, instintivas e livres são um insulto para ela, já que questionam
sua própria escravidão. Disse a mãe: “Eu renuncio, me humilho e obedeço. Você
tem que fazer a mesma coisa. Você não pode ser livre nem receber amor, assim
como eu não sou livre nem me sinto amada”. A mãe fecha os olhos para o amor sem
limites que a criança lhe dá, vira as costas ao que poderia ajudá‑la a melhorar
sua própria auto‑estima. joga fora a chave de sua salvação, enquanto despreza
os sentimentos de seu filhote.
A criança ama, seu coração está aberto, ela pede contato, atenção,
carinho. Mas mamãe não tem
tempo, tem outras prioridades, outras obrigações. A criança sente‑se rejeitada
e abandonada e passa pela amarga experiência de conferir que pedir amor,
expressar suas emoções, são coisas que a levam ao sofrimento. Ela fica sabendo
que tomar iniciativas, agir espontaneantente é ruim. Quanto mais é ela
mesma, mais é desaprovada, invalidada, criticada e sofre mais. A criança
acaba acreditando que seu amor não vale nada, que por alguma insolência do
destino ela não merece carinho nem atenção. Seu Ser fica cada vez mais
fraco, perde a confiança em seus sentimentos. Deixa de se guiar por
suas emoções, de ser livre e espontânea. Perde o caminho de seu coração.
A expressão emocional e instintiva da criança fica corrompida pela
mamãe. A criança, precisando mais do que nunca de amor, atenção e aprovação,
começa a fazer qualquer coisa para conseguir isso da mãe. Então, começa a
obedecer ordens absurdas, que vão contra sua própria natureza. Esconde e
disfarça suas emoções, se comporta falsamente e, já que a via direta lhe foi
trancada, começa a tentar manipular os outros, atuando papéis, se comportando
de maneira a satisfazer a mamãe, que lhe dá as dicas: “Seja boazinha... se tu
me amas tem que... come... faz isto e aquilo... que mamãe vai ficar contente,
meu anjo”.
A criança, que sabia muito bem o que era o Amor (ela era, há pouco tempo
atrás, puro amor tomando forma),
acaba acreditando que amar é dar satisfações, que amar é se sacrificar,
renunciar. E a criança passa, também, a pedir satisfações, pede e pede, pede
bobagens, já que não tem mais coragem de pedir diretamente o que realmente
quer: amor, contato, apoio. Com o tempo a criança vai‑se transformando em
alguém que ela não é, que nunca foi, só traindo seu verdadeiro ser. No melhor
dos casos, consegue migalhas de aprovação.
Enquanto a mãe padroniza as emoções e a instintividade, a criança vai entrando,
cada vez mais intensamente; em contato com o pai, que programa, especialmente,
a mente de seu filho. A mente que, neste ponto, já trabalha desligada das
emoções e instintos originais. A mãe deixou o filho carente. Ele se vira, amorosamente,
para o pai, esperando ser preenchido e, na maioria dos casos, recebe uma boa
dose de lixo. O macho, que há séculos trancou seus sentimentos, quando não é
totalmente omisso com seu filho fala para ele sobre autoridade, disciplina,
ordem, trabalho, dinheiro, sociedade, utilidade, em como ser alguém, etc. Quer
seja com indicações específicas ou pelo próprio exemplo, ele deforma a mente da
criança. Ensina‑lhe, geralmente com métodos nada socráticos, a aceitar o
inaceitável, a acreditar no inacreditável, a respeitar o irrespeitável, a ser
razoável, servil e obediente, a ser competitivo, e endurecer‑se, a procurar o
poder como uma compensação da falta de amor e liberdade.
Se a fêmea vendeu‑se ao macho, este vendeu‑se aos mais poderosos. Virou
uma formiga mais ou menos importante, incapaz de questionar qualquer coisa sobre
si mesmo. Ficou estéril, covarde, rígido e babaca. Se tiver
"sorte" e conseguiu ser um dos poderosos, de tanto amolar suas armas
para vencer, hoje não é mais que uma carcaça vazia. É um velho abutre
insensível, distante e morto. Este é o exemplo que o macho passa para seu
filho e que o filho engole sem mastigar, para ter a aprovação do pai. Este
mostra o caminho "correto", dá os objetivos práticos, e deixa a
criança “pronta” para a vida. Para uma vida de escravidão. O pai possibilita
a existência dos exércitos e a destruição da vida, imagens do mundo moderno.
Acontece que a criança percebe muito bem o ódio que os pais destilam em
cima dela, a raiva escondida atrás do “sai fora... não incomode... vai para seu
quarto... você não dá conta... você não presta ....” O impacto é tão forte e
doloroso que, para não sofrer ainda mais, a criança apaga suas próprias
percepções e acredita nas desculpas que lhe dão seus pais: “E pelo teu bem...
é preciso que você compreenda certas coisas... se você não aprende em casa,
ninguém vai te aceitar lá fora,” etc, etc. Para não sofrer, para poder
sobreviver psiquicamente, a criança deforma a realidade, não dá mais valor ao
que vê, à sua própria experiência, à sua própria verdade. E passa a acreditar,
cada vez mais, no que os pais falam, no que a TV mostra, no que as religiões
ensinam.
Através do trabalho da Imperatriz (Arcano III) e do Imperador
(Arcano IV), o louco enfraquece seu Eu, a tal ponto que perde sua
espontaneidade, fica com medo de tomar iniciativas, de expressar idéias. Já
não acredita nele mesmo, acha que não merece amor, nem nada de positivo. Perde
seu entusiasmo, seu tesão, tranca seus instintos. Ele fica carente, ansioso,
falso e manipulador, cheio de traços que nada têm a ver com ele mesmo. Vira um
frustrado, um mendigo de amor, um monstro incapaz de entregar-se, incapaz de
amar. Ele não sabe que tudo o que teve que trancar continua trabalhando dentro
dele, manipulando‑o, influenciando sua vida.
Três fatores fundamentais permitem esta sinistra transformação: 1) A
entrega amorosa da criança a sua sensibilidade. 2) A necessidade de amor a
aprovação que ela tem. 3) A supremacia física dos pais e a dependência material
da criança. Na seqüência, o louco vai encontrar e incorporar o Hierofante,
Arcano V.
O Hierofante são as doutrinas com que a sociedade dá o toque final à
falsa personalidade que o louco foi adquirindo. O Hierofante é o poder
Ideológico, os fundamentos filosóficos, morais e até científicos, que ajudam a
sustentar o Poder Econômico, o “Sistemão”, O Imperador. O Hierofante abençoa os
exércitos de jovens que o Imperador manda para a morte. O Hierofante, que um
dia foi, no Ocidente, o Vaticano, são hoje os meios de comunicação, o quarto
poder que fabrica a pseudocultura, massificada, anticriativa e idiotizante, que
arrasa com a sabedoria popular e impõe valores alheios à idiossincrasia de
cada povo. Valores especialmente decadentes, destilados nos laboratórios
das Agencias de Inteligência Internacionais a partir de elementos judeu‑cristãos.
No Brasil, poderíamos citar como um claro exemplo de Hierofante a Rede Globo.
A criança e o adolescente, igualmente privados de seus referenciais
internos, caem nas garras dos mercadores de sonhos. Os jovens precisam de alguma coisa para “ser
alguém”, para preencher seu vazio de identidade, mas só podem pegar o que está
no mercado. Assim, começam a consumir lixo, andrajos com os quais tentam
reconstruir sua própria imagem, mais caipira ou mais urbana, mais simples ou
mais sofisticada, mais barata ou mais cara. Porém, sempre falsa e cuja
interpretação é incapaz de oferecer uma gratificação profunda. Por outro
lado, os critérios de seleção de andrajos já foram dados pelos pais. A criança,
o adolescente, pode aceitá-los ou, sempre desconectado de si mesmo, pode
procurar, numa tentativa de revolta geralmente autodestrutiva, os opostos.
O ser vai ficando preso num série de camadas superpostas, perfeitamente
encaixadas umas nas outras.
Para encobrir essa terrível sensação de medo, fraqueza, mediocridade,
frustração e desamor, o jovem se veste de orgulho, de especial, de
invulnerável, de herói, de sábio. O Louco já está pronto para ser um
militar, um advogado, um político, um padre, um juiz, um marginal, um
intelectual, um membro de tal ou qual time ou partido, um fulano de tal, um
número, um rótulo. Ficou civilizado, uma ovelha do rebanho dos sem
vontade, sem emoções, sem critérios próprios, sem um corpo próprio, já que até
sua estrutura corporal foi mudada.
No capítulo segundo do Tao Te King (o Livro sagrado do Taoísmo) está
escrito: “O Ser e o Não‑Ser se engendram mutuamente”. Isto não só indica que
toda qualidade contém seu oposto, em maior ou menor grau, mas também mostra que
na medida em que intensificamos uma dessas qualidades, estamos criando as
condições para que a outra cresça. Na medida em que uma se expande, a outra se
fortalece, até que acontece a mudança. O ponto de maior robotização é o
início da libertação.
Em palavras do Mestre indiano Osho Rajneesh:
“A confusão é uma grande oportunidade. O problema com as pessoas que não
estão confusas é grande. Se você está realmente confuso, você está abençoado. Agora,
alguma coisa é possível: você está no limiar”.
Na poesia do Tao Te King:
"Todos os homens se esforçam para achar a felicidade. Caminham para
seu próprio sacrifício como se assistissem a um banquete, e cheios de orgulho
vivem inconscientemente como se estivessem nos jardins de uma varanda na
primavera. "
Só eu fico na calma e não tenho
desejos para expressar. Eu sou como uma criança que ainda não conhece o sorriso
e vivo livre como uma pessoa sem família nem lar.
Todos os homens possuem mil coisas supérfluas, no entanto, eu não estou
interessado nessas coisas. Tenho o coração de um Louco! Tão agitado e tão
confuso!
Os outros têm um ar de seres inteligentes que tudo têm esclarecido. No
entanto eu vivo na ignorância. Todos os homens confiam mais ou menos em si
mesmos Eu sou arrastado pelas ondas sem ter um ponto onde me segurar.
Todos os homens têm um propósito Só eu não procuro nada e,
aparentemente, não tenho objetivos na vida.
Só eu sou diferente dos homens porque amo a Mãe que me alimenta”. (Cap.
XX)
Quando aceitamos a nossa ignorância, quando a
mente se rende e diz: “desisto de ter uma explicação para tudo”, estamos dando o primeiro passo para a
verdadeira sabedoria.
Quanto mais escravos somos, menos energia temos
disponível, já que a empregamos para bloquear‑nos. Assim, é menor o fluxo
vital e também menor o prazer e a alegria de que somos capazes de desfrutar. A
escravidão é uma ameaça para as Forças da Vida, tanto para aquelas que operam
dentro de cada um de nós, que são nossos instintos, quanto para as que
trabalham a nível planetário e cósmico. Essas forças são nossas aliadas em
nossa libertação. Quanto maior é o bloqueio, quanto maior é a confusão,
maior é também nossa necessidade vital de achar uma saída e, portanto, a
possibilidade de encontrá‑la será também maior. Não nos esqueçamos que,
perguntando aos sete sábios gregos sobre o que era o mais forte, a resposta
foi: “a necessidade”.
Em outro nível, podemos dizer que quanto mais
alienante é a cultura dominante, mais luminosas serão as faíscas de beleza e
consciência, que atravessando as camadas sobrepostas podem atingir o Ser e
ajudá‑lo a manter‑se vivo. Os poetas, músicos e artistas, com sua linguagem
sutil, têm a capacidade de manter‑nos vivos, mexendo com nossas fibras mais
sensíveis, favorecendo o contato interno e ajudando‑nos a sentir prazer.
Uma dessas faíscas é a carta que o cacique Seattle escreveu ao Presidente dos
Estados Unidos da América, em 1854, quando este pretendia comprar o território
de sua tribo, em troca de uma reserva:
“Como podereis vós comprar ou
vender o céu, o calor, a terra? Se nós possuíssemos a frescura da água e a
fragância do ar, de que maneira V. Exa
poderia comprá‑los?
Cada pedaço desta terra é sagrado
para o meu povo. Cada espinho do pinheiro, cada rio murmurante, cada bruma nos
Bosques, cada clareira, cada zumbido de inseto é sagrado na lembrança e na
vivência de meu povo.
Nós somos uma parte da terra e
ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo,
a grande águia são nossos irmãos. As rochas escarpadas, o aroma das pradarias,
o ímpeto de nossos cavalos e todos os homens, são da mesma família.
Assim, o grande chefe de
Washington, mandando dizer que quer comprar nossa terra, está pedindo demais a
nós, índios. Manda o grande chefe dizer que nos reservará lugares onde poderemos
viver confortavelmente.
Ele será nosso pai e nós seus
filhos. Prometemos pensar na vossa idéia de comprar nossa terra.
Mas não será fácil, pois esta
terra, para nós é sagrada. A água cintilante que corre nos riachos e nos rios
não é só água mas, também, o sangue de nossos ancestrais. Os rios são nossos
irmãos. Eles saciam nossa sede, levam nossas canoas e alimentam nossos filhos.
Se nós vendermos nossa terra, vós
deveis vos lembrar e ensinar a vossos filhos que os rios são nossos irmãos e
também vossos, e vós deveis doravante dar aos rios a ternura que mostrais para
um irmão.
Sabemos que o homem branco não
entende nossos costumes. Um pedaço da terra, para ele é igual ao pedaço de
terra vizinha, pois ele é um estranho que chega e se apossa da terra de que tem
necessidade.
A terra não é sua irmã, mas sua
inimiga, e uma vez conquistada, o homem branco vai mais longe. Seu apetite
arrasará a terra e não deixará nela mais que um deserto.
Não sei, nossos costumes são
diferentes dos vossos. A imagem de vossas cidades faz mal aos olhos do homem
vermelho. Mas, isso talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não
entende.
O ar é precioso ao índio, pois
todas as coisas participam do mesmo sopro ‑ o animal, a árvore, o homem ‑ eles
dividem todos o mesmo sopro. O homem branco parece não lembrar do ar que
respira. O vento, que deu a nosso avô seu primeiro fólego, recebeu tambêm seu
último suspiro.
Pensaremos, portanto, na vossa
oferta de comprar as nossas terras. Mas se decidirmos a aceitá‑la, eu porei uma
condição: o homem branco deverá tratar os animais selvagens como irmãos. O que
é o homem sem os animais? Se os animais desaparecerem, o homem morrerá dentro de
uma grande solidão.
Ensinais também a vossos filhos,
aquilo que ensinamos aos nossos: que a terra é nossa mãe. Dizeis a eles que a
respeitem, pois tudo o que acontecer à terra, acontecerá também aos filhos da
terra. Ao menos sabemos isto: a terra não é do homem, o homem pertence à
terra. Todas as coisas são dependentes. Não foi o homem que teceu o fio dessa
teia de sua vida, ele não passa de um fio dessa teia. Tudo o que ele fizer para
essa teia, estará fazendo para si mesmo.
Nosso Deus e vosso Deus é o mesmo
e sua piedade é igual para o homem branco e o vermelho. Esta terra lhe é
preciosa e danificá‑la é acumular desprezo para seu criador”.
Grande é o poder da beleza. O poder da verdade
também é grande, mas é preciso algo ainda mais explosivo para abrir alguma
fenda na armadura sinistra da falsa personalidade. Se a programação foi
feita a sangue e fogo, será necessário alguma coisa que mexa com nosso sangue
(nossas emoções) e nosso fogo (nossos instintos). É preciso o poder da
paixão, onde o amor e o tesão se unem. Na seqüência, o Louco encontra‑se
com Os Amantes (Arcano
VI). A paixão leva‑o a acreditar e a gostar dele mesmo, a ampliar os
limites aos quais a programação o havia reduzido. Apaixonado, ele acha coragem
para lutar pelo que quer, se abre, tira a gravata ou o soutien, é capaz de se
entregar, embora parcialmente. Ele ama e se sente amado. No momento em
que vive sua paixão, em que está amando, o Louco pode ser total no aqui e
agora. Sente que está sendo autêntico consigo mesmo, pode conhecer a felicidade
e também pode transcender.
Ele percebe que não está somente amando
alguém; às vezes, seu amor vai além desta pessoa. O Louco
descobre‑se amando o cantar dos passarinhos, o pôr-do‑sol, as ondas do mar, as
crianças brincando, as flores e tudo o que o rodeia. Por uns instantes,
sente‑se unido em amor ao universo, sente esse êxtase e fica imensamente
grato. Tem um encontro real com ele mesmo. Sua energia vital se multiplica
por mil e ele tem a intuição de que sua vida poderia ser bem diferente. Ele se
pergunta: será que este estado é algo que depende do relacionamento afetivo
e sexual que estou vivendo? Ou é, simplesmente, a expressão de algo meu, que
sempre esteve aqui e que as situações me ajudam a resgatar?
Diante de si, um grande dilema: fazer desse momento a própria vida, construir
a vida na base de momentos assim ou continuar a rotina mecânica, escravizante,
mesquinha, sem prazer nenhum. Essa escolha ‑ continuo sendo um escravo ou
luto para me libertar ‑ é algo muito perigoso para o "Sistemão",
que só pode se manter se existirem escravos para o alimentar. Na verdade,
o que é muito perigoso para o poder estabelecido é o Amor e o Tesão.
Por isso a sexualidade foi tão reprimida por qualquer tipo de poder (Vide vida
e obras de W. Reich: A função do orgasmo; Escuta, Zé Ninguém. A Revolução
Sexual).
Não é por acaso que, estando no poder personagens tão reacionários
quanto Reagan, Tatcher e Woytila (o Papa), o AIDS, que nunca tinha causado
maiores problemas para a humanidade, vira ameaça séria, a ponto de impor um
comportamento mais puritano a grandes grupos populacionais, reforçando
instituições como a família, que vinha sendo questionada há décadas, e
começando a ser substituida pela comunidade.
Os Amantes levam o louco a uma opção fundamental: a escolha entre dois
caminhos. Por um lado, a vida do desconhecido, do prazer, das mudanças, da espontaneidade,
do amor, do amante. Por outro, o caminho do conhecido, das frustrações, das
rotinas, do autocontrole, do medo, dos padrões que mamãe ensinou. Mudar
significa abandonar um esquema de vida, toda uma série de restrições que, ao
mesmo tempo, davam segurança e proteção. Mudar significa começar uma viagem
onde as metas não estão ainda muito claras. Para realizar essa viagem, o
louco sobe no O Carro (Arcano VII).
Esta é sua primeira iniciação. Ele ainda não é capaz de realizar seus
potenciais, nem de se expressar espontaneamente. Não sabe bem que direção tomar,
só quer tornar permanente um estado de plenitude e prazer que conheceu. Como os
cavaleiros do Rei Artur, sai à procura do Santo Graal, sem saber que está
dentro de si mesmo.
Para isso, porém, tem que deixar para trás os condicionamentos mais grosseiros,
tem que se desapegar das mordomias de Camelot. Nesta hora, o Louco pode estar
abandonando o lar paterno, a universidade ou o emprego, a cidade ou o país,
para se lançar na aventura de encontrar‑se a si mesmo, embora carregue sua
armadura de medos, bloqueios e mecanismos de defesa, enfim, seu ego.
O vislumbre da plenitude, da felicidade que o Louco enxerga através da
paixão por outro ser humano, pode também ser atingido por outros caminhos,
como a meditação, o encontro com um Mestre Iluminado, o uso ritualístico de uma
droga ou uma mistura delas (Santo Daime, "a pequena fumadinha" de Don
Juan, etc) ou qualquer experiência‑limite, como por exemplo passar pelo limiar
da morte. Todos eles, de uma maneira ou de outra, são uma expressão da
energia dos Amantes. Na hora em que o Louco deixa para trás as prisões‑proteções
mais grosseiras, as rotinas mais sufocantes, e começa a se jogar na vida, um
ajustamento se faz necessário para continuar sua evolução, um ajustamento
que só agora é possível, já que agora ele está desprotegido, mais
disponível para o desconhecido. Este ajustamento é o encontro com seu próprio
Karma.
Desde o início de sua programação, o louco começou a destruir a si mesmo
e aos outros, especialmente se se tornou um homem poderoso. Agora, para atingir
níveis superiores de consciência e prazer, vai ter que equilibrar sua balança
kármica, vai ter que saldar suas contas, do mesmo jeito que um inveterado
consumidor de carne, lácteos e álcool vai ter que se submeter a uma dieta
purificadora em algum momento, se quiser melhorar a saúde que um passado de
inconsciência abalou. No encontro com a carta do Ajustamento (Arcano
VIII), também chamada A Justiça na maioria dos baralhos, o louco limpa
uma boa parte de seu passado e, assim, pode assinar a paz com ele mesmo e com o
mundo. E continuar sua viagem de um novo ponto, mais equilibrado e fluído.
Aqui não existe escolha, a justiça atua inexoravelmente, pela
necessidade de equilibrar o Universo. Para que não seja destruído, o insustentável deve ser removido.
É claro que os efeitos do Ajustamento não são, em princípio, nada agradáveis. O
Louco vai sair muito mexido deste encontro, se não sair profundamente abalado.
Ele assume, então, a vulnerabilidade que pretendia ocultar atrás de certas
máscaras que o Karma arrasou. E percebe que não pode continuar seu caminho de
auto‑libertação, enquanto não conhecer melhor a si mesmo. Nesta hora, o louco
começa a viver O Ermitão (Arcano IX).
Será a primeira interiorização do louco, desde que iniciou a viagem no
Carro. Ele vira a atenção para si mesmo e começa a se estudar. Sua abordagem é
fundamentalmente analítica, utiliza os níveis inferiores da mente para se
conhecer, para esclarecer seus medos, bloqueios e padrões de comportamento,
para pesquisar na infância as origens de toda a negatividade que inibe sua
evolução, que o impede de ser feliz. Vai esclarecendo áreas de seu
inconsciente, tomando contato e assumindo suas vontades profundas, seus
desejos interditados e “inconfessáveis”. Nesta jornada, ele começa a discernir
entre aquilo que é dele mesmo e o que lhe foi embutido.
Movido por essa nova consciência, o louco faz terapia, yoga ou Tai‑Chi,
muda sua alimentação e ritmo de vida, deixa de autodestruir‑se, levanta seu
mapa astrológico, coloca Tarô, estuda seus biorritmos, consulta o I Ching, faz
retiros no mato, etc. Pouco a pouco vai centrando‑se. E chega a hora em que sua
lâmpada se acende. O que sai de si mesmo pode servir, também, para os outros.
Surge uma luz em seu caminho. Sua prática começa a ser nutritiva e
vivificadora. O Louco, através do Ermitão, resgata sua fertilidade.
Este é um ponto muito perigoso. Aqui, o Louco pode usar suas descobertas
internas para transformar sua vida, ou deixar que o ego se apodere, transforme‑as
em doutrinas e começe a vendê‑las. Isto significaria um retrocesso no
caminho, até o Hierofante. Um Hierofante talvez mais alternativo e
heterodoxo, porém sempre um fanático comerciante de receitas.
O Louco, mais centrado, mais consciente, sai de seu relativo isolamento
para topar com o mundo, com a Roda da Fortuna (Arcano X). Ele pertenceu
ao mundo, viveu nesse caos competitivo e agressivo, compulsor e idiotizante,
degradado e degradante, que os tibetanos chamam de Roda do Sámsara. Esta roda,
na qual pegamos carona sem querer e sem compreender nada, vai sugando nossa
energia e nosso discernimento, até o ponto de entregar-nos para ela nossos
próprios filhos. É a roda dos sem‑vontade, cada um atuando em função dos
outros, a nível individual e a nível de nações também. O país vizinho
aumentou o orçamento militar, aumentaremos o nosso. Manipulando e sendo
manipulado, cumprindo e dando ordens sem se aperceber de coisa alguma, sem
existir ninguém que se responsabilize por seus próprios atos. Todos somos como
o piloto que jogou a bomba em Hiroshima; todos cumprimos ordens.
Neste reencontro, o louco vê o mundo diferente, já não fica mais hipnotizado
com as luzes coloridas de neon, com as bandeiras, não morde a isca. Ele vê de
fora a loucura autodestrutiva dos humanos, vê escravos escravizados mantendo no
poder os escravos escravizadores. Essas e outras percepções significam uma
reafirmação de sua individualidade, de seu centro. Ele pode viver no mundo
sem ser escravo dele e, cada situação que o mundo lhe envia, recebe‑a como
uma oportunidade para desenvolver sua expressão mais verdadeira e autêntica.
Vivenciando a Roda da Fortuna, o louco começa a ver quão maravilhoso e único
ele é. Descobre-se como um Ser bonito e gostoso, cheio de vida,
potencialidades e merecimentos.
Enfrentando esse caos, ele valoriza mais sua própria harmonia, começa a
se respeitar, a se considerar, a gostar de seu corpo, de seu jeito mais íntimo,
de seu sexo, enfim, o louco começa a se amar. Ele está atravessando o
estado de consciência do Arcano XI (Tesão, Paixão). Tradicionalmente
intitulado de “A Força”, foi rebatizado por Crowley como “O Tesão” (Vide
Roberto Freire, em seu livro: “Sem tesão não há solução”). Significando
uma integração do Ser, um autonamoro no qual o louco resgata seu entusiasmo,
seu brilho, sua força, seu tesão por ele mesmo,
pela vida e sua alegria. Sem esse reconhecimento amoroso por si mesmo,
sem essa primeira integração, sem esse: “Eu me amo, eu gosto de mim”, o
louco dificilmente poderia encarar as provas que tem à sua frente, seria
incapaz de atingir o "Eu te amo, eu gosto de você". O amor e o
tesão que sente por si mesmo transborda da taça de seu coração, motivando‑o a
se integrar amorosamente no Universo, do qual ele começa a se sentir parte
integrante.
No Enforcado (Arcano XII), próximo Arcano da seqüência, o louco
pode se entregar de coração aberto à Existência, pode ser o apóstolo, capaz de
universalizar seus sentimentos de amor e êxtase, e ver seus semelhantes como
seus irmãos. Nos Amantes, o Louco conheceu o amor por alguém, que o levou a
viver um estado de felicidade. Embora momentâneo, fez com que tomasse as decisões
que o levaram a se libertar de uma parte de uma programação e a transformar sua
vida. Agora, de novo é o amor. Desta vez, por si mesmo, permitirá que se
entregue amorosamente ao mundo, criando assim as condições para atingir o
zénite dessa transformação no próximo Arcano: A Morte (Arcano XIII).
É justamente no amor que reside a maior força de transformação, a
energia que faz evoluir o universo, a sociedade, o homem. Daí o mandamento de Cristo: "Amai‑vos
uns aos outros". A falta de amor determina a escravidão. Sua presença nos
liberta e, quando flui em abundância, conhecemos o êxtase. No Arcario XIII, o
Louco vivencia a morte de seu robô, do papagaio repetidor de doutrinas. É a
morte do escravo. Neste momento, sua armadura egoíca começa a se quebrar e,
pelas fendas, surge a própria essencialidade, o ser amoroso e livre que todos
somos. O caminho de recuperação do ser está aberto!
O Louco, irradiando Tesão e Amor, com o coração em brasa, tira a tampa
da garrafa‑programa que o continha, libertando as primeiras borbolhas de sua
fragrância mais íntima. Essa libertação, embora possa ser algo repentino,
geralmente é fruto de toda uma viagem, de um processo não isento de esforço e,
muitas vezes, de dor, que começou nos Amantes e exigiu um confronto com a
programação parental.
Nessa jornada, a Essência do Ser permeia sua manifestação. A Natureza
mais autêntica do Louco está fluindo, tomando formas e expressões concretas e
práticas. Esta é a fase de consciência que chamamos de Arte (Arcano XIV),
pois tudo aquilo que flui como uma expressão espontânea do ser é, sem
dúvida, Arte. O caminhar transforma‑se numa dança, a palavra é um poema, e
o silêncio é meditação. Cada gesto está impregnado da Divina beleza que a
Essência possui. Este momento é a segunda iniciação do louco. Aqui ele já pode
fazer, realizar, a partir de seu centro.
“Fazer” é o catalisador de qualquer mudança: fazendo é que se muda, especialmente quando esse fazer tem a
qualidade de não‑fazer, quando esse fazer vem de uma profunda calma interior,
quando está isento de expectativas a respeito dos resultados, quando é uma
resposta aos ciclos cósmicos. O Louco, transformado pelo amor e a “praxis”,
continua o resgate de seu próprio Ser. Em primeiro lugar aparecem seus
instintos, representados pela carta do Demônio (Arcano XV). Neste ponto,
a vitória do louco é permitir que a sua instintividade se expresse
espontaneamente, que floresça e volte a ser a raiz de sua força vital.
Os instintos foram, durante séculos e também agora de maneira mais
sutil, negados, reprimidos, rodeados de medos e tabus, considerados negativos,
fonte de dor e doenças, exilados nas mais profundas masmorras do inconsciente,
para depois serem manipulados e vendidos pelo "Sistemão". O resgate
dos instintos libera tanta energia que permite a remoção de velhas prisões, das
cascas, das couraças com que o louco ainda procurava segurança. Aqui, na prova
da Torre (Arcano XVI), o louco derruba essas falsas identificações, se
sente com tanta energia que já não precisa se esconder atrás de fortalezas, nem
de farda nenhuma. Não precisa ficar defendendo nada. O Louco sai,
definitivamente, da fantasia. Toma contato com o chão. Cai na real. Assim, sem
fanfarra nenhuma, o louco pode namorar a Estrela (Arcano XVII), próximo
Arcano.
Uma vez que se libertou das ataduras da Torre, ele pode sintonizar‑se
com as energias cósmicas e utilizar as novas percepções para jogar fora um
monte de crenças, de doutrinas, de lixo e deixar sua mente totalmente limpa,
pura, receptiva, intuitiva. Neste momento, o louco transforma‑se num agente
das forças evolutivas, dos princípios transformadores do Cosmos. Com a
ajuda dessas forças e, em especial, do Guia Espiritual, o louco vai ter
condições de enfrentar o lado mais sinistro de sua sombra, no encontro com A
Lua (Arcano XVIII).
Nessa fase, terá a oportunidade de resgatar, em profundidade, suas
próprias emoções. Mas para isso deve enfrentar os piores medos e as ameaças
mais horríveis que trancaram seu coração. Vai reviver sua própria tortura
infantil. Vai lutar contra os mecanismos sinistros que apagam sua consciência e
que pretendem escravizá‑lo. E contra tudo aquilo que impede a expressão mais
verdadeira de suas emoções. Se o louco conseguir encarar os monstros frente
a frente, sem piscar, acreditando em si mesmo, em seu amor, com a força de seus
instintos, os fantasmas uivantes da lua não conseguirão enfeitiçá‑lo.
Exorcizados, virarão poeira no caminho. Além deles encontram‑se as emoções mais
puras, autênticas e profundas: seu corpo emocional.
Para chegar a isto é necessário mergulhar no mais profundo das trevas do
inconciente. Só depois o
louco atinge a luz: o Sol, o Arcano XIX. Seu próprio sol interno,
sua chama divina, sua individualidade seu Ser Espiritual. O louco
resplandece, pois tomou contato com a Eternidade, com sua Eternidade interna,
com sua divindade. Finalmente, ele conseguiu retirar todos os véus que
escondiam o Ser de luz que sempre foi, é e será.
Na próxima etapa, a Era
(Arcano XX) ‑ o louco vive a reintegração de suas partes. Instintos,
intelecto, emoções e espírito fundem‑se uns aos outros. Essa operação
significa tamanho avanço na consciência do louco, que equivale a um renascimento.
E o Novo Homem que aqui aparece, completo e perfeito, livre de todas as trevas,
começa a viver um Novo Tempo.
No último Arcano, o Universo (Arcano XXI), o louco culmina sua
tarefa, realiza as potencialidades de seu Ser, vai até as últimas sínteses,
conseqüências e concretizações. Isto implica um passo a níveis superiores,
equivale a uma transcendência e o louco atinge um novo estágio na espiral
evolutiva. Então, ele celebra, livre e feliz, o êxtase da Dança da Vida.
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