domingo, 16 de junho de 2013

Porque dos Arcanos

Porque vocês virão no decorrer desses 21 dias essas cartas soltas do Tarot de Crowley por aqui? Somente para ajudar quem necessitar tê-las em tamanho grande e de boa qualidade. Simplesmente para isso, pois é difícil encontrá-las assim num lugar só. Aproveite, copie a vontade se quiser.

Abaixo, temos um texto do livro de Veet Pramad sobre as cartas. Eu acho bem interessante.

A Grande Viagem

Abordar os Mistérios Maiores é toda uma aventura. Um estudo sistemático sobre a estrutura interna, atribuições e caminhos, poderia ser árido demais para os profanos do Tarô. E um glossário de significados práticos, deixaria o leitor sem rumo.

Eis a razão deste capítulo. Com ele pretendo passar uma visão de conjunto dos Arcanos (Mistérios), através das identificações que cada um deles suscita em nós. Veremos como refletem em nossas vidas e, sentindo‑nos presentes nas cartas, poderemos, aos poucos, conhecê‑las. A seqüência de Arcanos maiores será considerada aqui como a Grande Viagem do Ser Humano em busca da Realização de Si Mesmo.

Consideraremos cada uma das 22 cartas como um diferente estado de cons­ciência, desde a Suprema Potencialidade do louco até a Plena Consciência ou Síntese Final do Universo. Tal consideração só poderá ser feita se colocarmos o Louco como a primeira carta da seqüência. O Louco, carta número 0, vai enfrentar três séries, cada uma sete cartas. Cada carta é uma prova que o impele a se conhe­cer, a ser mais ele mesmo.

O Louco é a criança, pura, espontânea a inocente, totalmente potencial. Al­guns autores atribuem ao louco a idéia de inconsciência. Nada mais falso. A criança sabe muito bem o que é bom para ela e o que não é, seus instintos (salvo graves problemas em sua vida intra‑uterina) estão intactos. Sua memória corporal engloba as lembranças de toda a evolução da espécie. Ela é potencialmente consciente, de forma alguma inconsciente. É óbvio que a criança desconhece o mundo tão complexo ao qual chegou, desconhece a mente dos adultos e suas neuroses, a violência contra os mais fracos, a falta de amor, as guerras. Ela não sabe que em 1987 no mundo foram gastos 1,3 bilhões de dólares por minuto, em orçamentos militares. E que em cada um daqueles minutos, trinta crianças morriam de fome.

Realmente, a criança que acabou de encarnar nesta Escola Planetária não precisa saber nada disto para crescer. Para realizar‑se, ela precisa, fundamental­mente, de uma coisa só: AMOR. Ela é um ser perfeito e completo, que se desen­volve a partir de uma energia central, de uma semente original, de um átomo di­vino. Não está faltando nada. A criança não precisa de escola, de universidade, de família para ser educada. A sabedoria está dentro dela, no ponto para se manifestar. Apenas precisa de Amor para afirmar‑se, para desenvolver suas potencialidades, para florescer, para se lembrar do que ela já sabe.

Assim, a Criança‑Louco sorridente e com os olhos maravilhados frente ao desconhecido, livre de medos, preconceitos e bloqueios, cai no mundo disposta a viver a eternidade em cada momento. Neste ponto de absoluta potencialidade, o Louco começa a desenvolver uma primeira polaridade, começa a entrar em contato e a se expressar de duas maneiras fundamentais, que correspondem aos dois prin­cípios básicos que operam no universo: o Yang e o Ying. No Tarô, recebem o nomes de o Mago (Arcano I) e a Sacerdotisa (Arcano II).

A primeira expressão Yang ao nascer pode ser o choro ou o riso, se são res­peitados os ritmos da natureza: se é o nenê que nasce ou é o doutor fazendo mais um parto. Depois, o nenê vai sugar os peitos da mamãe, vai comunicar‑se, relacio­nar‑se, vai procurar coisas a descobrir, compreender e levar para a forma concreta os arroubos de sua prodigiosa imaginação. Vai criar, transformar, encontrar seus li­mites e tentar ultrapassá‑los; enfim, vai sair de seu espaço interior para atuar no mundo exterior. Tudo isso é expressão do Mago, Arcano I.

A Sacerdotisa, Arcano II, está relacionada com as forças que levam a criança a interiorizar‑se. São aqueles momentos em que a criança fica quietinha num canti­nho, tranqüila e silenciosa, às vezes de dedo na boca, totalmente conectada com ela mesma, receptiva ao externo e ao interno, compreendendo, intuitivamente, os significados de tudo o que acontece. Nesses momentos a criança nos surpreende com uma expressão de serenidade e sabedoria, que só os Budas conseguiram res­gatar.

Quando o nenê manifesta‑se através dessas duas forças básicas, ele vai en­trando, gradualmente, em contato com o mundo da matéria, que é também o mundo das regras, dos limites e da moral. Quem coloca a criança em contato com esse mundo é, primeiro, a mãe e depois o pai: a Imperatriz e o Imperador, Arcanos III a IV respectivamente. Os pais são os seres que mais influenciam a vida de qual­quer um, tanto pelo que fazem como pelo que não fazem. São mais importantes para nosso desenvolvimento do que a escola, os irmãos, os amigos, a sociedade, o sistema econômico, a nacionalidade, a classe social, etc. Até o ponto de determinar, em alto grau, o futuro da criança, como confirma a sabedoria popular: “Tal pai, tal filho”. A pessoa pode fazer os maiores esforços para liberar‑se da programação pa­rental. Porém, é muito difícil acabar totalmente com ela, como afirma Eric Berne, baseado no Panchatantra:

“Estas cinco coisas tereis de vossos pais, seis anos após sair do útero: A duração de vossos dias, vosso fardo, vossa riqueza, vossa instrução e vossa tumba”.

Quando o Ser Espiritual começa a encarnar, ele o faz dentro da mãe. Ela é a primeira a dar forma e, portanto, limite a esse Ser. Ela dá a possibilidade de nascer e, ao mesmo tempo, está assinando a sua sentença de morte. A emoção da mãe na hora da fecundação, seja o prazer do orgasmo, seja o amor pelo parceiro, o medo de ficar grávida ou a rejeição ao macho, qualquer desses sentimentos será o pri­meiro tijolo do corpo emocional da criança. Ainda durante a vida intra‑uterina, a mãe mexe intensamente com o filho, aceitando‑o ou rejeitando‑o, amando‑o ou odiando‑o.

A mãe pode escolher. Pode sentir‑se abençoada pelas Forças da Vida, que lhe confiaram a gestação de um Ser Perfeito e através do qual ela tem a possibili­dade de resgatar sua própria perfeição. Ou pode sentir sua gravidez como um cas­tigo, como algo terrível, que é “melhor tirar logo”. A criança vai saber muito bem até que ponto pode mudar sua vida, tendo ou não o amor da mãe. Justamente o que ela mais precisa, especialmente em seus primeiros dois anos de vida, é de uma mãe amorosa e nutritiva. Infelizmente, para a humanidade e para a vida do planeta como um todo, é difícil encontrar mães que estejam disponíveis para seus filhos; que sejam capazes de fazer mudanças em suas vidas para ajudar o desenvolvimento de suas crianças; capazes de abrir seus corações para o novo Ser. Tem ocorrido assim, porque neste mundo Ocidental, cristão e “civilizado”, a imensa maioria das mães sente‑se frustrada. Vivemos num sistema grosseiramente machista, que de to­dos os ângulos massacra a mulher.

Porém, constatamos que as próprias mulheres continuam vendendo‑se aos machões, se acomodando. Renunciando à sua individualidade e liberdade, ao seu prazer e sexualidade, à realização de seus sonhos e, enfim, ao desenvolvimento de suas potencialidades, para se vender à aparente segurança que o macho dá. Renun­cia a lutar por sua felicidade e dignidade, fazendo de sua renúncia e sofrimento, um mérito. Em alguns casos, compete com o macho no mundo dos machos, chegando, muitas vezes, a ser mais destrutiva que eles, (Indira Chandi, Margaret Tacher). A mulher aceitou o contrato de sua degradação: disse sim para o amo e não para ela mesma. Isso acaba gerando tanta raiva que estrangula sua capacidade de amar e a deixa incapaz de sentir outra coisa que não seja raiva, ódio e desejo de vingança. E acaba se vingando nos filhos, transmite‑lhes sua frustração.

Se a raiva de todas as frustradas do mundo se juntasse, imediatamente o pla­neta explodiria, com mil vezes mais força do que todas as armas que os machos acumularam. Assim, a mulher não pode aceitar as manifestações da individualidade da criança, nem pode tolerar suas iniciativas. Suas expressões espontâneas, instinti­vas e livres são um insulto para ela, já que questionam sua própria escravidão. Disse a mãe: “Eu renuncio, me humilho e obedeço. Você tem que fazer a mesma coisa. Você não pode ser livre nem receber amor, assim como eu não sou livre nem me sinto amada”. A mãe fecha os olhos para o amor sem limites que a criança lhe dá, vira as costas ao que poderia ajudá‑la a melhorar sua própria auto‑estima. joga fora a chave de sua salvação, enquanto despreza os sentimentos de seu filhote.

A criança ama, seu coração está aberto, ela pede contato, atenção, carinho. Mas mamãe não tem tempo, tem outras prioridades, outras obrigações. A criança sente‑se rejeitada e abandonada e passa pela amarga experiência de conferir que pedir amor, expressar suas emoções, são coisas que a levam ao sofrimento. Ela fica sabendo que tomar iniciativas, agir espontaneantente é ruim. Quanto mais é ela mesma, mais é desaprovada, invalidada, criticada e sofre mais. A criança acaba acreditando que seu amor não vale nada, que por alguma insolência do destino ela não merece carinho nem atenção. Seu Ser fica cada vez mais fraco, perde a con­fiança em seus sentimentos. Deixa de se guiar por suas emoções, de ser livre e espontânea. Perde o caminho de seu coração.

A expressão emocional e instintiva da criança fica corrompida pela mamãe. A criança, precisando mais do que nunca de amor, atenção e aprovação, começa a fazer qualquer coisa para conseguir isso da mãe. Então, começa a obedecer ordens absurdas, que vão contra sua própria natureza. Esconde e disfarça suas emoções, se comporta falsamente e, já que a via direta lhe foi trancada, começa a tentar mani­pular os outros, atuando papéis, se comportando de maneira a satisfazer a mamãe, que lhe dá as dicas: “Seja boazinha... se tu me amas tem que... come... faz isto e aquilo... que mamãe vai ficar contente, meu anjo”.

A criança, que sabia muito bem o que era o Amor (ela era, há pouco tempo atrás, puro amor tomando forma), acaba acreditando que amar é dar satisfações, que amar é se sacrificar, renunciar. E a criança passa, também, a pedir satisfações, pede e pede, pede bobagens, já que não tem mais coragem de pedir diretamente o que realmente quer: amor, contato, apoio. Com o tempo a criança vai‑se transformando em alguém que ela não é, que nunca foi, só traindo seu verdadeiro ser. No melhor dos casos, consegue migalhas de aprovação.

Enquanto a mãe padroniza as emoções e a instintividade, a criança vai en­trando, cada vez mais intensamente; em contato com o pai, que programa, espe­cialmente, a mente de seu filho. A mente que, neste ponto, já trabalha desligada das emoções e instintos originais. A mãe deixou o filho carente. Ele se vira, amoro­samente, para o pai, esperando ser preenchido e, na maioria dos casos, recebe uma boa dose de lixo. O macho, que há séculos trancou seus sentimentos, quando não é totalmente omisso com seu filho fala para ele sobre autoridade, disciplina, ordem, trabalho, dinheiro, sociedade, utilidade, em como ser alguém, etc. Quer seja com indicações específicas ou pelo próprio exemplo, ele deforma a mente da criança. Ensina‑lhe, geralmente com métodos nada socráticos, a aceitar o inaceitável, a acreditar no inacreditável, a respeitar o irrespeitável, a ser razoável, servil e obe­diente, a ser competitivo, e endurecer‑se, a procurar o poder como uma compen­sação da falta de amor e liberdade.

Se a fêmea vendeu‑se ao macho, este vendeu‑se aos mais poderosos. Virou uma formiga mais ou menos importante, incapaz de questionar qualquer coisa so­bre si mesmo. Ficou estéril, covarde, rígido e babaca. Se tiver "sorte" e conseguiu ser um dos poderosos, de tanto amolar suas armas para vencer, hoje não é mais que uma carcaça vazia. É um velho abutre insensível, distante e morto. Este é o exemplo que o macho passa para seu filho e que o filho engole sem mastigar, para ter a aprovação do pai. Este mostra o caminho "correto", dá os objetivos práticos, e deixa a criança “pronta” para a vida. Para uma vida de escravidão. O pai possibilita a existência dos exércitos e a destruição da vida, imagens do mundo moderno.

Acontece que a criança percebe muito bem o ódio que os pais destilam em cima dela, a raiva escondida atrás do “sai fora... não incomode... vai para seu quarto... você não dá conta... você não presta ....” O impacto é tão forte e doloroso que, para não sofrer ainda mais, a criança apaga suas próprias percepções e acre­dita nas desculpas que lhe dão seus pais: “E pelo teu bem... é preciso que você compreenda certas coisas... se você não aprende em casa, ninguém vai te aceitar lá fora,” etc, etc. Para não sofrer, para poder sobreviver psiquicamente, a criança de­forma a realidade, não dá mais valor ao que vê, à sua própria experiência, à sua própria verdade. E passa a acreditar, cada vez mais, no que os pais falam, no que a TV mostra, no que as religiões ensinam.

Através do trabalho da Imperatriz (Arcano III) e do Imperador (Arcano IV), o louco enfraquece seu Eu, a tal ponto que perde sua espontaneidade, fica com medo de tomar iniciativas, de expressar idéias. Já não acredita nele mesmo, acha que não merece amor, nem nada de positivo. Perde seu entusiasmo, seu tesão, tranca seus instintos. Ele fica carente, ansioso, falso e manipulador, cheio de traços que nada têm a ver com ele mesmo. Vira um frustrado, um mendigo de amor, um monstro incapaz de entregar­-se, incapaz de amar. Ele não sabe que tudo o que teve que trancar continua traba­lhando dentro dele, manipulando‑o, influenciando sua vida.

Três fatores fundamentais permitem esta sinistra transformação: 1) A entrega amorosa da criança a sua sensibilidade. 2) A necessidade de amor a aprovação que ela tem. 3) A supremacia física dos pais e a dependência material da criança. Na seqüência, o louco vai encontrar e incorporar o Hierofante, Arcano V.

O Hierofante são as doutrinas com que a sociedade dá o toque final à falsa personalidade que o louco foi adquirindo. O Hierofante é o poder Ideológico, os fundamentos filosóficos, morais e até científicos, que ajudam a sustentar o Poder Econômico, o “Sistemão”, O Imperador. O Hierofante abençoa os exércitos de jo­vens que o Imperador manda para a morte. O Hierofante, que um dia foi, no Oci­dente, o Vaticano, são hoje os meios de comunicação, o quarto poder que fabrica a pseudocultura, massificada, anticriativa e idiotizante, que arrasa com a sabedoria popular e impõe valores alheios à idiossincrasia de cada povo. Valores especial­mente decadentes, destilados nos laboratórios das Agencias de Inteligência Interna­cionais a partir de elementos judeu‑cristãos. No Brasil, poderíamos citar como um claro exemplo de Hierofante a Rede Globo.

A criança e o adolescente, igualmente privados de seus referenciais internos, caem nas garras dos mercadores de sonhos. Os jovens precisam de alguma coisa para “ser alguém”, para preencher seu vazio de identidade, mas só podem pegar o que está no mercado. Assim, começam a consumir lixo, andrajos com os quais ten­tam reconstruir sua própria imagem, mais caipira ou mais urbana, mais simples ou mais sofisticada, mais barata ou mais cara. Porém, sempre falsa e cuja interpretação é incapaz de oferecer uma gratificação profunda. Por outro lado, os critérios de seleção de andrajos já foram dados pelos pais. A criança, o adolescente, pode aceitá­-los ou, sempre desconectado de si mesmo, pode procurar, numa tentativa de re­volta geralmente autodestrutiva, os opostos.

O ser vai ficando preso num série de camadas superpostas, perfeitamente encaixadas umas nas outras.

Para encobrir essa terrível sensação de medo, fraqueza, mediocridade, frus­tração e desamor, o jovem se veste de orgulho, de especial, de invulnerável, de herói, de sábio. O Louco já está pronto para ser um militar, um advogado, um polí­tico, um padre, um juiz, um marginal, um intelectual, um membro de tal ou qual time ou partido, um fulano de tal, um número, um rótulo. Ficou civilizado, uma ovelha do rebanho dos sem vontade, sem emoções, sem critérios próprios, sem um corpo próprio, já que até sua estrutura corporal foi mudada.

No capítulo segundo do Tao Te King (o Livro sagrado do Taoísmo) está escrito: “O Ser e o Não‑Ser se en­gendram mutuamente”. Isto não só indica que toda qualidade contém seu oposto, em maior ou menor grau, mas também mostra que na medida em que intensificamos uma dessas qualidades, estamos criando as condições para que a outra cresça. Na medida em que uma se expande, a outra se fortalece, até que acontece a mudança. O ponto de maior robotização é o início da libertação.

Em palavras do Mestre indiano Osho Rajneesh:

“A confusão é uma grande oportunidade. O problema com as pessoas que não estão confusas é grande. Se você está real­mente confuso, você está abençoado. Agora, alguma coisa é possível: você está no limiar”.

Na poesia do Tao Te King:

"Todos os homens se esforçam para achar a felicidade. Caminham para seu próprio sacrifício como se assistissem a um banquete, e cheios de orgulho vivem inconscientemente como se estivessem nos jardins de uma varanda na primavera. "

Só eu fico na calma e não tenho desejos para expressar. Eu sou como uma criança que ainda não conhece o sorriso e vivo livre como uma pessoa sem família nem lar.

Todos os homens possuem mil coisas supérfluas, no entanto, eu não estou interessado nessas coisas. Tenho o coração de um Louco! Tão agitado e tão confuso!

Os outros têm um ar de seres inteligentes que tudo têm esclarecido. No entanto eu vivo na ignorância. Todos os homens confiam mais ou menos em si mesmos Eu sou arrastado pelas ondas sem ter um ponto onde me segurar.

Todos os homens têm um propósito Só eu não procuro nada e, aparentemente, não tenho objetivos na vida.

Só eu sou diferente dos homens porque amo a Mãe que me alimenta”. (Cap. XX)

Quando aceitamos a nossa ignorância, quando a mente se rende e diz: “desisto de ter uma explicação para tudo”,  estamos dando o primeiro passo para a verdadeira sabedoria.

Quanto mais escravos somos, menos energia temos disponível, já que a em­pregamos para bloquear‑nos. Assim, é menor o fluxo vital e também menor o pra­zer e a alegria de que somos capazes de desfrutar. A escravidão é uma ameaça para as Forças da Vida, tanto para aquelas que operam dentro de cada um de nós, que são nossos instintos, quanto para as que trabalham a nível planetário e cósmico. Es­sas forças são nossas aliadas em nossa libertação. Quanto maior é o bloqueio, quanto maior é a confusão, maior é também nossa necessidade vital de achar uma saída e, portanto, a possibilidade de encontrá‑la será também maior. Não nos es­queçamos que, perguntando aos sete sábios gregos sobre o que era o mais forte, a resposta foi: “a necessidade”.

Em outro nível, podemos dizer que quanto mais alienante é a cultura domi­nante, mais luminosas serão as faíscas de beleza e consciência, que atravessando as camadas sobrepostas podem atingir o Ser e ajudá‑lo a manter‑se vivo. Os poetas, músicos e artistas, com sua linguagem sutil, têm a capacidade de manter‑nos vivos, mexendo com nossas fibras mais sensíveis, favorecendo o contato interno e ajudando‑nos a sentir prazer. Uma dessas faíscas é a carta que o cacique Seattle escre­veu ao Presidente dos Estados Unidos da América, em 1854, quando este pretendia comprar o território de sua tribo, em troca de uma reserva:

“Como podereis vós comprar ou vender o céu, o calor, a terra? Se nós possuíssemos a frescura da água e a fragância do ar, de que maneira V. Exa  poderia comprá‑los?

Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu povo. Cada es­pinho do pinheiro, cada rio murmurante, cada bruma nos Bos­ques, cada clareira, cada zumbido de inseto é sagrado na lembrança e na vivência de meu povo.

Nós somos uma parte da terra e ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo, a grande águia são nossos irmãos. As rochas escarpadas, o aroma das pradarias, o ímpeto de nossos cavalos e todos os homens, são da mesma família.

Assim, o grande chefe de Washington, mandando dizer que quer comprar nossa terra, está pedindo demais a nós, índios. Manda o grande chefe dizer que nos reservará lugares onde po­deremos viver confortavelmente.

Ele será nosso pai e nós seus filhos. Prometemos pensar na vossa idéia de comprar nossa terra.
Mas não será fácil, pois esta terra, para nós é sagrada. A água cintilante que corre nos riachos e nos rios não é só água mas, também, o sangue de nossos ancestrais. Os rios são nossos irmãos. Eles saciam nossa sede, levam nossas canoas e alimen­tam nossos filhos.

Se nós vendermos nossa terra, vós deveis vos lembrar e ensinar a vossos filhos que os rios são nossos irmãos e também vossos, e vós deveis doravante dar aos rios a ternura que mostrais para um irmão.

Sabemos que o homem branco não entende nossos costumes. Um pedaço da terra, para ele é igual ao pedaço de terra vizinha, pois ele é um estranho que chega e se apossa da terra de que tem necessidade.

A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, e uma vez conquistada, o homem branco vai mais longe. Seu apetite arrasará a terra e não deixará nela mais que um deserto.

Não sei, nossos costumes são diferentes dos vossos. A imagem de vossas cidades faz mal aos olhos do homem vermelho. Mas, isso talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não entende.
O ar é precioso ao índio, pois todas as coisas participam do mesmo sopro ‑ o animal, a árvore, o homem ‑ eles dividem todos o mesmo sopro. O homem branco parece não lembrar do ar que respira. O vento, que deu a nosso avô seu primeiro fó­lego, recebeu tambêm seu último suspiro.

Pensaremos, portanto, na vossa oferta de comprar as nossas terras. Mas se decidirmos a aceitá‑la, eu porei uma condição: o homem branco deverá tratar os animais selvagens como irmãos. O que é o homem sem os animais? Se os animais desaparece­rem, o homem morrerá dentro de uma grande solidão.

Ensinais também a vossos filhos, aquilo que ensinamos aos nos­sos: que a terra é nossa mãe. Dizeis a eles que a respeitem, pois tudo o que acontecer à terra, acontecerá também aos filhos da terra. Ao menos sabemos isto: a terra não é do homem, o ho­mem pertence à terra. Todas as coisas são dependentes. Não foi o homem que teceu o fio dessa teia de sua vida, ele não passa de um fio dessa teia. Tudo o que ele fizer para essa teia, estará fazendo para si mesmo.

Nosso Deus e vosso Deus é o mesmo e sua piedade é igual para o homem branco e o vermelho. Esta terra lhe é preciosa e dani­ficá‑la é acumular desprezo para seu criador”.

Grande é o poder da beleza. O poder da verdade também é grande, mas é preciso algo ainda mais explosivo para abrir alguma fenda na armadura sinistra da falsa personalidade. Se a programação foi feita a sangue e fogo, será necessário al­guma coisa que mexa com nosso sangue (nossas emoções) e nosso fogo (nossos ins­tintos). É preciso o poder da paixão, onde o amor e o tesão se unem. Na seqüência, o Louco encontra‑se com Os Amantes (Arcano VI). A paixão leva‑o a acreditar e a gostar dele mesmo, a ampliar os limites aos quais a programação o havia reduzido. Apaixo­nado, ele acha coragem para lutar pelo que quer, se abre, tira a gravata ou o sou­tien, é capaz de se entregar, embora parcialmente. Ele ama e se sente amado. No momento em que vive sua paixão, em que está amando, o Louco pode ser total no aqui e agora. Sente que está sendo autêntico consigo mesmo, pode conhecer a feli­cidade e também pode transcender.

Ele percebe que não está somente amando alguém; às vezes, seu amor vai além desta pessoa. O Louco descobre‑se amando o cantar dos passarinhos, o pôr-­do‑sol, as ondas do mar, as crianças brincando, as flores e tudo o que o rodeia. Por uns instantes, sente‑se unido em amor ao universo, sente esse êxtase e fica imensa­mente grato. Tem um encontro real com ele mesmo. Sua energia vital se multiplica por mil e ele tem a intuição de que sua vida poderia ser bem diferente. Ele se per­gunta: será que este estado é algo que depende do relacionamento afetivo e sexual que estou vivendo? Ou é, simplesmente, a expressão de algo meu, que sempre es­teve aqui e que as situações me ajudam a resgatar?

Diante de si, um grande dilema: fazer desse momento a própria vida, cons­truir a vida na base de momentos assim ou continuar a rotina mecânica, escravi­zante, mesquinha, sem prazer nenhum. Essa escolha ‑ continuo sendo um escravo ou luto para me libertar ‑ é algo muito perigoso para o "Sistemão", que só pode se manter se existirem escravos para o alimentar. Na verdade, o que é muito perigoso para o poder estabelecido é o Amor e o Tesão. Por isso a sexualidade foi tão repri­mida por qualquer tipo de poder (Vide vida e obras de W. Reich: A função do orgasmo; Escuta, Zé Ninguém. A Revolução Sexual).

Não é por acaso que, estando no poder personagens tão reacionários quanto Reagan, Tatcher e Woytila (o Papa), o AIDS, que nunca tinha causado maiores problemas para a humanidade, vira ameaça séria, a ponto de impor um comportamento mais puritano a grandes grupos populacionais, reforçando instituições como a família, que vinha sendo questionada há décadas, e começando a ser substituida pela co­munidade.

Os Amantes levam o louco a uma opção fundamental: a escolha entre dois caminhos. Por um lado, a vida do desconhecido, do prazer, das mudanças, da es­pontaneidade, do amor, do amante. Por outro, o caminho do conhecido, das frus­trações, das rotinas, do autocontrole, do medo, dos padrões que mamãe ensinou. Mudar significa abandonar um esquema de vida, toda uma série de restrições que, ao mesmo tempo, davam segurança e proteção. Mudar significa começar uma via­gem onde as metas não estão ainda muito claras. Para realizar essa viagem, o louco sobe no O Carro (Arcano VII).

Esta é sua primeira iniciação. Ele ainda não é capaz de realizar seus potenciais, nem de se expressar espontaneamente. Não sabe bem que direção to­mar, só quer tornar permanente um estado de plenitude e prazer que conheceu. Como os cavaleiros do Rei Artur, sai à procura do Santo Graal, sem saber que está dentro de si mesmo.

Para isso, porém, tem que deixar para trás os condicionamentos mais gros­seiros, tem que se desapegar das mordomias de Camelot. Nesta hora, o Louco pode estar abandonando o lar paterno, a universidade ou o emprego, a cidade ou o país, para se lançar na aventura de encontrar‑se a si mesmo, embora carregue sua arma­dura de medos, bloqueios e mecanismos de defesa, enfim, seu ego.

O vislumbre da plenitude, da felicidade que o Louco enxerga através da paixão por outro ser humano, pode também ser atingido por outros caminhos, como a meditação, o encontro com um Mestre Iluminado, o uso ritualístico de uma droga ou uma mistura delas (Santo Daime, "a pequena fumadinha" de Don Juan, etc) ou qualquer experiência‑limite, como por exemplo passar pelo limiar da morte. Todos eles, de uma maneira ou de outra, são uma expressão da energia dos Aman­tes. Na hora em que o Louco deixa para trás as prisões‑proteções mais grosseiras, as rotinas mais sufocantes, e começa a se jogar na vida, um ajustamento se faz neces­sário para continuar sua evolução, um ajustamento que só agora é possível, já que agora ele está desprotegido, mais disponível para o desconhecido. Este ajustamento é o encontro com seu próprio Karma.

Desde o início de sua programação, o louco começou a destruir a si mesmo e aos outros, especialmente se se tornou um homem poderoso. Agora, para atingir ní­veis superiores de consciência e prazer, vai ter que equilibrar sua balança kármica, vai ter que saldar suas contas, do mesmo jeito que um inveterado consumidor de carne, lácteos e álcool vai ter que se submeter a uma dieta purificadora em algum momento, se quiser melhorar a saúde que um passado de inconsciência abalou. No encontro com a carta do Ajustamento (Arcano VIII), também chamada A Justiça na maioria dos baralhos, o louco limpa uma boa parte de seu passado e, assim, pode assinar a paz com ele mesmo e com o mundo. E continuar sua viagem de um novo ponto, mais equilibrado e fluído.

Aqui não existe escolha, a justiça atua inexoravelmente, pela necessidade de equilibrar o Universo. Para que não seja destruído, o insustentável deve ser remo­vido. É claro que os efeitos do Ajustamento não são, em princípio, nada agradáveis. O Louco vai sair muito mexido deste encontro, se não sair profundamente abalado. Ele assume, então, a vulnerabilidade que pretendia ocultar atrás de certas máscaras que o Karma arrasou. E percebe que não pode continuar seu caminho de auto‑li­bertação, enquanto não conhecer melhor a si mesmo. Nesta hora, o louco começa a viver O Ermitão (Arcano IX).

Será a primeira interiorização do louco, desde que iniciou a viagem no Carro. Ele vira a atenção para si mesmo e começa a se estudar. Sua abordagem é fundamentalmente analítica, utiliza os níveis inferiores da mente para se conhecer, para esclarecer seus medos, bloqueios e padrões de comportamento, para pesquisar na infância as origens de toda a negatividade que inibe sua evolução, que o impede de ser feliz. Vai esclarecendo áreas de seu inconsciente, tomando contato e assu­mindo suas vontades profundas, seus desejos interditados e “inconfessáveis”. Nesta jornada, ele começa a discernir entre aquilo que é dele mesmo e o que lhe foi em­butido.

Movido por essa nova consciência, o louco faz terapia, yoga ou Tai‑Chi, muda sua alimentação e ritmo de vida, deixa de autodestruir‑se, levanta seu mapa astrológico, coloca Tarô, estuda seus biorritmos, consulta o I Ching, faz retiros no mato, etc. Pouco a pouco vai centrando‑se. E chega a hora em que sua lâmpada se acende. O que sai de si mesmo pode servir, também, para os outros. Surge uma luz em seu caminho. Sua prática começa a ser nutritiva e vivificadora. O Louco, através do Ermitão, resgata sua fertilidade.

Este é um ponto muito perigoso. Aqui, o Louco pode usar suas descobertas internas para transformar sua vida, ou deixar que o ego se apodere, transforme‑as em doutrinas e começe a vendê‑las. Isto significaria um retrocesso no caminho, até o Hierofante. Um Hierofante talvez mais alternativo e heterodoxo, porém sempre um fanático comerciante de receitas.

O Louco, mais centrado, mais consciente, sai de seu relativo isolamento para topar com o mundo, com a Roda da Fortuna (Arcano X). Ele pertenceu ao mundo, viveu nesse caos competitivo e agressivo, compulsor e idiotizante, degradado e degradante, que os tibetanos chamam de Roda do Sámsara. Esta roda, na qual pegamos carona sem querer e sem compreender nada, vai sugando nossa energia e nosso discernimento, até o ponto de entregar-nos para ela nossos próprios filhos. É a roda dos sem‑von­tade, cada um atuando em função dos outros, a nível individual e a nível de nações também. O país vizinho aumentou o orçamento militar, aumentaremos o nosso. Manipulando e sendo manipulado, cumprindo e dando ordens sem se aperceber de coisa alguma, sem existir ninguém que se responsabilize por seus próprios atos. Todos somos como o piloto que jogou a bomba em Hiroshima; todos cumprimos ordens.

Neste reencontro, o louco vê o mundo diferente, já não fica mais hipnoti­zado com as luzes coloridas de neon, com as bandeiras, não morde a isca. Ele vê de fora a loucura autodestrutiva dos humanos, vê escravos escravizados mantendo no poder os escravos escravizadores. Essas e outras percepções significam uma reafir­mação de sua individualidade, de seu centro. Ele pode viver no mundo sem ser es­cravo dele e, cada situação que o mundo lhe envia, recebe‑a como uma oportuni­dade para desenvolver sua expressão mais verdadeira e autêntica. Vivenciando a Roda da Fortuna, o louco começa a ver quão maravilhoso e único ele é. Descobre-­se como um Ser bonito e gostoso, cheio de vida, potencialidades e merecimentos.

Enfrentando esse caos, ele valoriza mais sua própria harmonia, começa a se respeitar, a se considerar, a gostar de seu corpo, de seu jeito mais íntimo, de seu sexo, enfim, o louco começa a se amar. Ele está atravessando o estado de cons­ciência do Arcano XI (Tesão, Paixão). Tradicionalmente intitulado de “A Força”, foi rebatizado por Crowley como “O Tesão” (Vide Roberto Freire, em seu livro: “Sem tesão não há solução”). Significando uma integração do Ser, um autonamoro no qual o louco resgata seu entusiasmo, seu brilho, sua força, seu tesão por ele mesmo,  pela vida e sua alegria. Sem esse reconhecimento amoroso por si mesmo, sem essa primeira integração, sem esse: “Eu me amo, eu gosto de mim”, o louco dificilmente poderia encarar as provas que tem à sua frente, seria incapaz de atingir o "Eu te amo, eu gosto de você". O amor e o tesão que sente por si mesmo trans­borda da taça de seu coração, motivando‑o a se integrar amorosamente no Uni­verso, do qual ele começa a se sentir parte integrante.

No Enforcado (Arcano XII), próximo Arcano da seqüência, o louco pode se entregar de coração aberto à Existência, pode ser o apóstolo, capaz de universalizar seus senti­mentos de amor e êxtase, e ver seus semelhantes como seus irmãos. Nos Amantes, o Louco conheceu o amor por alguém, que o levou a viver um estado de felicidade. Embora momentâneo, fez com que tomasse as decisões que o levaram a se libertar de uma parte de uma programação e a transformar sua vida. Agora, de novo é o amor. Desta vez, por si mesmo, permitirá que se entregue amorosamente ao mundo, criando assim as condições para atingir o zénite dessa transformação no próximo Arcano: A Morte (Arcano XIII).

É justamente no amor que reside a maior força de transformação, a energia que faz evoluir o universo, a sociedade, o homem. Daí o mandamento de Cristo: "Amai‑vos uns aos outros". A falta de amor determina a escravidão. Sua presença nos liberta e, quando flui em abundância, conhecemos o êxtase. No Arcario XIII, o Louco vivencia a morte de seu robô, do papagaio repetidor de doutrinas. É a morte do escravo. Neste momento, sua armadura egoíca começa a se quebrar e, pelas fendas, surge a própria essencialidade, o ser amoroso e livre que todos somos. O caminho de recuperação do ser está aberto!

O Louco, irradiando Tesão e Amor, com o coração em brasa, tira a tampa da garrafa‑programa que o continha, libertando as primeiras borbolhas de sua fragrân­cia mais íntima. Essa libertação, embora possa ser algo repentino, geralmente é fruto de toda uma viagem, de um processo não isento de esforço e, muitas vezes, de dor, que começou nos Amantes e exigiu um confronto com a programação parental.

Nessa jornada, a Essência do Ser permeia sua manifestação. A Natureza mais autêntica do Louco está fluindo, tomando formas e expressões concretas e práticas. Esta é a fase de consciência que chamamos de Arte (Arcano XIV), pois tudo aquilo que flui como uma expressão espontânea do ser é, sem dúvida, Arte. O caminhar transforma‑se numa dança, a palavra é um poema, e o silêncio é meditação. Cada gesto está im­pregnado da Divina beleza que a Essência possui. Este momento é a segunda ini­ciação do louco. Aqui ele já pode fazer, realizar, a partir de seu centro.

“Fazer” é o catalisador de qualquer mudança: fazendo é que se muda, espe­cialmente quando esse fazer tem a qualidade de não‑fazer, quando esse fazer vem de uma profunda calma interior, quando está isento de expectativas a respeito dos resultados, quando é uma resposta aos ciclos cósmicos. O Louco, transformado pelo amor e a “praxis”, continua o resgate de seu próprio Ser. Em primeiro lugar apare­cem seus instintos, representados pela carta do Demônio (Arcano XV). Neste ponto, a vitória do louco é permitir que a sua instintividade se expresse espontaneamente, que floresça e volte a ser a raiz de sua força vital.

Os instintos foram, durante séculos e também agora de maneira mais sutil, negados, reprimidos, rodeados de medos e tabus, considerados negativos, fonte de dor e doenças, exilados nas mais profundas masmorras do inconsciente, para depois serem manipulados e vendidos pelo "Sistemão". O resgate dos instintos libera tanta energia que permite a remoção de velhas prisões, das cascas, das couraças com que o louco ainda procurava segurança. Aqui, na prova da Torre (Arcano XVI), o louco derruba essas falsas identificações, se sente com tanta energia que já não precisa se esconder atrás de fortalezas, nem de farda nenhuma. Não precisa ficar defendendo nada. O Louco sai, definitivamente, da fantasia. Toma contato com o chão. Cai na real. Assim, sem fanfarra nenhuma, o louco pode namorar a Estrela (Arcano XVII), próximo Arcano.

Uma vez que se libertou das ataduras da Torre, ele pode sintonizar‑se com as energias cósmicas e utilizar as novas percepções para jogar fora um monte de cren­ças, de doutrinas, de lixo e deixar sua mente totalmente limpa, pura, receptiva, in­tuitiva. Neste momento, o louco transforma‑se num agente das forças evolutivas, dos princípios transformadores do Cosmos. Com a ajuda dessas forças e, em espe­cial, do Guia Espiritual, o louco vai ter condições de enfrentar o lado mais sinistro de sua sombra, no encontro com A Lua (Arcano XVIII).

Nessa fase, terá a oportunidade de resgatar, em profundidade, suas próprias emoções. Mas para isso deve enfrentar os piores medos e as ameaças mais horríveis que trancaram seu coração. Vai reviver sua própria tortura infantil. Vai lutar contra os mecanismos sinistros que apagam sua consciência e que pretendem escravizá‑lo. E contra tudo aquilo que impede a expressão mais verdadeira de suas emoções. Se o louco conseguir encarar os monstros frente a frente, sem piscar, acreditando em si mesmo, em seu amor, com a força de seus instintos, os fantasmas uivantes da lua não conseguirão enfeitiçá‑lo. Exorcizados, virarão poeira no caminho. Além deles encontram‑se as emoções mais puras, autênticas e profundas: seu corpo emocional.

Para chegar a isto é necessário mergulhar no mais profundo das trevas do in­conciente. Só depois o louco atinge a luz: o Sol, o Arcano XIX. Seu próprio sol interno, sua chama divina, sua individualidade seu Ser Espiritual. O louco resplan­dece, pois tomou contato com a Eternidade, com sua Eternidade interna, com sua divindade. Finalmente, ele conseguiu retirar todos os véus que escondiam o Ser de luz que sempre foi, é e será.

Na próxima etapa,  a Era (Arcano XX) ‑ o louco vive a reintegração de suas partes. Instintos, intelecto, emoções e espírito fundem‑se uns aos outros. Essa ope­ração significa tamanho avanço na consciência do louco, que equivale a um renas­cimento. E o Novo Homem que aqui aparece, completo e perfeito, livre de todas as trevas, começa a viver um Novo Tempo.

No último Arcano, o Universo (Arcano XXI), o louco culmina sua tarefa, realiza as poten­cialidades de seu Ser, vai até as últimas sínteses, conseqüências e concretizações. Isto implica um passo a níveis superiores, equivale a uma transcendência e o louco atinge um novo estágio na espiral evolutiva. Então, ele celebra, livre e feliz, o êxtase da Dança da Vida.

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