Sempre que encontro um novo, ou não muito novo assim, Maçom, pergunto-lhe se conhece esse senhor autor desse texto. Inevitavelmente a resposta é não. Infelizmente, até hoje, nunca encontrei nenhum que tenha dito que conhecia e que já havia lido. Talvez por isso que as coisas estão nos pés que estão para eles.
Boa leitura!!!
Manual do Aprendiz Franco Maçon
Manual do Aprendiz
Franco Maçon
Introdução ao Estudo da Ordem e da Doutrina
Maçônica
ALDO LAVAGNINI
(MAGISTER)
Qualquer que tenha sido o vosso propósito e o anseio de vosso coração ao ingressar na Augusta Instituição que fraternalmente vos acolheu, como um de seus membros, é certo que não tereis entendido, a princípio, toda a importância espiritual deste passo e as possibilidades de progresso que com ele vos foram abertas.
A Maçonaria é pois, uma Instituição Hermética no tríplice e profundo sentido da palavra. O segredo maçônico é de tal natureza, que não pode nunca ser violado ou traído, por ser mística e individualmente realizado por aquele maçom que o busca para usá-lo construtivamente, com sinceridade e fervor, absoluta lealdade, firmeza e perseverança no estudo e na prática da Arte.
A Maçonaria não se revela efetivamente senão a seus adeptos, aqueles que a ela se doam por inteiro, sem reservas mentais, para tornar-se verdadeiros maçons, isto é, Obreiros Iluminados da Inteligência Construtora do Universo, que deve manifestar-se em sua mente como verdadeira Luz que ilumina, desde um ponto de vista superior, todos os seus pensamentos, palavras e obras.
Isto é conseguido por intermédio das provas que constituem os meios pelos quais torna- se manifesto o potencial espiritual que dorme em estado latente na vida rotineira, as provas simbólicas iniciais e as provas posteriores do desânimo e da decepção. Quem se deixar vencer por elas, assim como aquele que ingressar na Associação com um espírito superficial, deixará de conhecer aquilo que a Ordem encerra sob sua forma e seu ministério exterior, deixará de conhecer seu propósito real e a Força Espiritual oculta que interiormente anima a Ordem.
Seu tesouro acha-se escondido profundamente na terra. Só escavando, ou seja, buscando-o por baixo da aparência, podemos encontrá-lo. Quem passa pela Instituição como se fosse uma sociedade qualquer ou um clube profano, não pode conhecê-la; somente permanecendo nela longamente, com fé inalterada, esforçando-nos em tornarmo-nos verdadeiros maçons e reconhecendo o privilégio inerente a esta qualidade, ela nos revelará o seu tesouro oculto.
Deste ponto de vista, e qualquer que seja o grau exterior que possamos conseguir, ou que já nos tenha sido conferido para compensar de alguma forma nossos anseios e desejos de progresso, dificilmente poderemos realmente superar o grau de aprendiz. Na finalidade iniciática da Ordem, somos e continuaremos sendo aprendizes por um tempo muito maior que os simbólicos três anos de idade. Oxalá fossemos todos bons aprendizes e continuássemos sendo-o por toda nossa existência! Se todos os maçons se esforçassem primeiro em aprender, quantos males que tem sido lamentados e que ainda serão lamentados, não mais teriam razão de existir!
Este pequeno Manual, quer ser um Guia Sintético para os aprendizes de todas as idades maçônicas, apresentando em suas páginas, de forma clara e simples, as explicações que nos parecem necessárias para entender e realizar individualmente o significado deste grau fundamental, no qual se encontra todo o programa iniciático, moral e operativo da Maçonaria.
Ser um aprendiz, um Aprendiz ativo e inteligente que envida todos os esforços para progredir iluminadamente no caminho da Verdade e da Virtude, realizando e pondo em prática (fazendo-a carne de sua carne, sangue de seu sangue e vida de sua vida) a Doutrina Iniciática que se encontra escondida e é revelada no simbolismo deste grau, é sem dúvida muito melhor que ostentar o mais elevado grau maçônico, permanecendo na mais odiosa e destruidora ignorância dos princípios e fins sublimes de nossa Ordem.
Não devemos ter, portanto, demasiada pressa na ascensão a graus superiores. O grau que nos foi outorgado, e pelo qual exteriormente somos reconhecidos, é sempre superior ao grau real que alcançamos e realizamos interiormente, e a permanência neste primeiro grau dificilmente poderá ser taxada de excessiva, por maiores que sejam nossos desejos de progresso e os esforços que façamos nesse sentido. Compreender efetivamente o significado dos símbolos e cerimônias que constituem a fórmula iniciática deste grau, procurando a sua prática todos os dias da vida, é muito melhor que sair prematuramente dele, ou desprezá-lo sem tê-lo compreendido.
A condição e o estado de aprendiz, referem-se, de forma precisa, à nossa capacidade de apreender; somos aprendizes enquanto nos tornamos receptivos, abrindo-nos interiormente e colocando todo o esforço necessário para aproveitarmos construtivamente todas as experiências da vida e os ensinamentos que de algum modo recebemos. Nossa mente aberta, e a intensidade do desejo de progredir, determinam esta capacidade.
Estas qualidades caracterizam o Aprendiz e o distinguem do profano, seja dentro ou fora da Ordem. No profano, (segundo se entende maçonicamente esta palavra) prevalecem a inércia e a passividade, e, se existe um desejo de progresso, uma aspiração superior, encontram-se como que sepultados ou sufocados pela materialidade da vida, que converte os homens em escravos completos de seus vícios, de suas necessidades e de suas paixões.
O que torna patente o estado de aprendiz, é exatamente o despertar do potencial latente que se encontra em cada ser e nele produz um veemente desejo de progredir, caminhar para a frente, superando todos os obstáculos e limitações, tirando proveito de todas as experiências e ensinamentos que encontra em seus passos. Este estado de consciência é a primeira condição para que seja possível tornar-se maçom no sentido verdadeiro da palavra.
Toda a vida é para o ser ativo, inteligente e zeloso, uma aprendizagem incessante; tudo o que encontramos em nosso caminho pode e deve ser um proveitoso material de construção para o edifício simbólico de nosso progresso, o Templo que assim erigimos, cada hora, cada dia e cada instante à G. D. G. A. D. U. isto é, do Princípio Construtivo e Evolutivo em nós mesmos. Tudo é bom no fundo, tudo pode e deve ser utilizado construtivamente para o Bem, apesar de que possa ter-se apresentado sob a forma de uma experiência desagradável, de uma contrariedade imprevista, de uma dificuldade, de um obstáculo, de uma desgraça ou de uma inimizade.
Heis aqui o programa que o Aprendiz deve esforçar-se em realizar na vida diária. Somente mediante este trabalho, inteligente, zeloso e perseverante, pode converter-se num verdadeiro obreiro da Inteligência Construtora, e companheiro de todos os que estão animados por este mesmo programa, por esta mesma finalidade interior.
O esforço individual é condição necessária para este progresso. O Aprendiz não deve contentar-se em receber passivamente as idéias, conceitos e teorias vindas do exterior, e simplesmente assimilá-las, mas trabalhar com estes materiais, e assim aprender a pensar por si mesmo, pois o que caracteriza a nossa Instituição é a mais perfeita compreensão e realização harmônica de dois princípios de Liberdade e Autoridade, que se encontram amiúde em tão franca oposição no mundo profano. Cada um deve aprender a progredir por meio de sua própria experiência e por seus próprios esforços, ainda que aproveitando segundo seu discernimento e experiência daqueles que procederam nesse mesmo caminho.
A Autoridade dos Mestres, é, simplesmente Guia, Luz e Apoio para o Aprendiz, enquanto não aprender a caminhar por si mesmo, mas seu progresso será sempre proporcional a seus próprios esforços. Assim é que esta Autoridade - a única que é reconhecida pela Maçonaria - nunca será o resultado de uma imposição ou coação, mas o implícito reconhecimento interior de uma superioridade espiritual ou melhor dizendo, de um maior avanço na mesma senda que todos indistintamente percorremos. Aquela Autoridade natural que somente conseguimos conhecendo a Verdade e praticando a Virtude.
O aprendiz que realizar esta sublime Finalidade da Ordem, reconhecerá que em suas possibilidades há muito mais do que fora previsto quando, inicialmente, pediu sua filiação e foi recebido como irmão.
O impulso que o moveu desde então, foi sem dúvida, radicalmente mais profundo que as razões conscientes determinantes. Naquele momento, atuava nele uma Vontade mais elevada que a da sua personalidade comum, sua própria vontade individual, que é a Vontade do Divino em nós. Seja ele pois, consciente desta Razão Oculta e profunda que motivou sua afiliação a uma Ordem Augusta e Sagrada por suas origens, por sua natureza e por suas finalidades.
A todos nós é dado o privilégio e a oportunidade de cooperar para o renascimento iniciático da Maçonaria, para o qual estão maduros os tempos e os homens. Façamo-lo com aquele entusiasmo e fervor que, tendo superado as três provas simbólicas, não se deixa vencer pelas correntes contrárias do mundo profano, nem arrastar pelo ímpeto das paixões, nem desanimar pela frieza exterior, e que chegando a tal estado de firmeza, amadurecerá e dará ótimos frutos.
Mas, antes de tudo, aprendamos. Aprendamos o que é a Ordem em sua essência, quais foram suas verdadeiras origens; o significado da Iniciação Simbólica pela qual fomos recebidos; a Filosofia Iniciática da qual provêm os elementos, o estudo dos primeiros Princípios e dos símbolos que os representam; a tríplice natureza e valor do Templo alegórico de nossos trabalhos e a sua qualidade; a palavra dada para uso e que constitui o Ministério Supremo e Central. Receberemos assim o salário merecido como resultado de nossos esforços e tornar-nos-emos obreiros aptos e perfeitamente capacitados para o trabalho que de nós será exigido.
Capítulo I
AS ORIGENS DA INSTITUIÇÃO CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Das três perguntas; "De onde viemos? Quem somos? e Aonde vamos?", nas quais pode subdividir-se e expressar-se o Grande Mistério da experiência, assim como, o princípio de todo o verdadeiro conhecimento e toda a sabedoria, a primeira delas é a que especialmente diz respeito ao Aprendiz.
Aplicada a nossa Instituição, para dar a conhecer sua essência, esta pergunta suscita-nos em primeiro lugar o problema em suas origens, ou seja, aquelas instituições, sociedades, costumes e tradições, nas quais a Maçonaria tem sua raiz, seu princípio espiritual, ainda que sem nelas diretamente ter origem. Deste ponto-de-vista é certo, conforme nos dizem os catecismos, que suas origens perderam-se "na noite dos tempos", ou seja; naquelas remotas civilizações pré-históricas das quais tem-se perdido os vestígios e a memória, e que remontam provavelmente a centenas de milhares de anos antes da era atual.
Os primeiros rituais baseados nas tradições bíblicas, uma vez que seus redatores apoiaram-se pela fé nessas tradições, contam que: "Adão foi iniciado na Ordem do Éden, pelo G.A. em todos os ritos da Maçonaria, isto significando, evidentemente, que as origens da Maçonaria devem remontar à primeira sociedade humana, da qual Adão é um símbolo, correspondendo à Era Saturniana ou Idade de Ouro da tradição greco- romana, e ao Satra Yoga dos hindus.
É certo, pois, que esse íntimo desejo de progresso, essa profunda aspiração em direção à Verdade e à Virtude, esse desejo de trabalhar reta e sabiamente, de que a maçonaria constitui, para seus adeptos a encarnação nasceram, já na aurora da civilização (que todas as tradições concordam em considerar luminosa).
Mas, se o espírito maçônico existiu desde as primeiras épocas conhecidas e desconhecidas - da história, e não foi alheio ao primeiro homem esse mesmo espírito (se realmente tiver existido tiver se expressado naturalmente de uma forma adaptada e conveniente nas primeiras comunidades - íntimas e por tanto secretas - de homens que se isolavam dos demais pelo seu desejo de saber e penetrar o Mistério Profundo das coisas, é igualmente correto que nem sempre ter-se-á manifestado exatamente da forma em que hoje se conhece, se exerce e se pratica.
Entretanto, os princípios imutáveis sobre os quais foi estabelecido essa manifestação, e que constituem seu espírito e sua característica fundamental, não podem ter sofrido variações substanciais, e uma vez que foram estabelecidas em épocas de antigüidade incalculável, devem também ter permanecido basicamente os mesmos através de todas suas metamorfoses ou encarnações exteriores.
Também devem remontar os sinais, símbolos e toques, a íntima essência da alegorias e o significado das palavras que correspondem aos diferentes graus, (por seu caráter e sua transmissão ininterrupta) até a mais remota antigüidade. Ainda que as alterações das lendas - em sua forma exterior - possam ter sido notáveis, entretanto, face ao reduzido e eliminado meio social no qual foram disseminadas, pela própria aparência exterior e ainda, pelas provas e a fidelidade que eram solicitadas aos iniciados, essas alterações sempre se reduziram ao mínimo, sendo mais intencionais (isto é, causadas por necessárias adaptações) que causais.
Além disso, por terem tais alegorias girado ao redor de um mesmo tema ou Idéia Mãe Fundamental, estas alterações devem ter sido geralmente cíclicas, gravitando ao redor de um mesmo ponto, passando, em conseqüência, mais de uma vez pela mesma forma ou por formas análogas.
Apesar do segredo que deve ter caracterizado constantemente a atividade da Ordem, nas diferentes formas assumidas exteriormente, em diversos locais podemos encontrar alguns vestígios que confirmam esta asserção: nos Templos sagrados de todos os tempos e de todas as religiões, entre as estátuas, gravuras, baixos-relevos e pinturas; nos escritos que nos foram transmitidos, em representações simbólicas de origens diversas, nas próprias letras do alfabeto, podemos encontrar vários traços de uma intenção indubitavelmente iniciática ou maçônica (sendo os dois termos, até certo ponto, equivalentes); e eventualmente ocorre não aparecerem nestas representações os mesmos sinais de reconhecimento.
Da mesma forma na mitologia, e nas lendas e tradições que constituem o folclore literário e popular, há muitos traços dos mistérios iniciáticos, daquela Palavra Perdida à qual se refere nossa Instituição, com seu ensinamento esotérico revelado de uma forma simbólica.
O aspecto esotérico da religião - conhecida exotericamente - deve ter conservado através dos tempos esta dupla característica, qualquer que tenha sido a forma exterior particular na qual tenha se manifestado nos diferentes povos e nas mais variadas épocas da história.
A DOUTRINA INTERIOR
Todos os povos antigos conheceram, além do aspecto exterior ou formal da religião e das práticas sagradas, um ensinamento paralelo interior ou esotérico que era ministrado unicamente aos que moral e espiritualmente eram reputados dignos e maduros para recebê-la.
O aspecto esotérico da religião - conhecida exotericamente pelos profanos - era provido especialmente pelos chamados Mistérios (palavra derivada de "mysto", termo que era aplicado aos neófitos, e que significava etimologicamente mudo ou secreto, referindo-se evidentemente a obrigação de segredo selado por juramento, que era pedido a todo iniciado), Mistérios dos quais a Maçonaria pode considerar-se herdeira e continuadora, por intermédio das corporações de construtores e demais agrupamentos místicos que nos transmitiram sua Doutrina.
Esta Doutrina Interior - esotérica e oculta - é essencialmente iniciática, pois que somente será alcançada por intermédio da iniciação, isto é, pelo ingresso num particular estado de consciência (ou ponto-de-vista interior), pois somente mediante ele pode ser entendida, reconhecida e realizada.
A Doutrina Interior tem sido e continua sendo a mesma para todos os povos em todos os tempos. Em outras palavras, enquanto para os profanos (os que se encontram na frente ou fora do Templo, isto é sujeitos à aparência puramente exterior das coisas) tem havido e haverá sempre diferentes religiões e ensinamentos, em aparente contraste uns com os outros, para os iniciados não houve nem haverá mais do que uma só e única religião Universal da Verdade, que é Ciência e Filosofia, ao mesmo tempo que Religião.
Deste ensinamento iniciático, esotérico e universal comum a todos os povos, raças e épocas, as diferentes religiões e as diversas escolas tem constituído e constituem ainda hoje, um aspecto exterior mais ou menos imperfeito e incompleto. As lutas religiosas sempre caracterizaram aqueles períodos nos quais, pela imensa maioria de seus dirigentes, foi perdida de vista aquela essência interior que constitui o Espírito da religião, compreendido unicamente o aspecto profano ou exterior. Pois o fanatismo sempre tem sido acompanhado da ignorância.
OS MISTÉRIOS
Em todos os povos conhecidos da história, na era pré-cristã, houve instituição de mistérios: no Egito como na Índia, na Pérsia, Caldeia, Síria, Grécia e em todas as nações mediterrâneas, entre os druidas, os godos, os escitas e os povos escandinavos na China e entre os povos indígenas da América.
Traços deles podem ser observados nas curiosas cerimônias e costumes das tribos da África e Austrália, e em todos os chamados povos primitivos, aos quais possivelmente, de forma mais justa, deveríamos considerar como originários da degeneração de raças e civilizações mais antigas.
Tiveram fama especialmente os Mistérios de Isis e de Osiris no Egito; os de Orfeu e Dionísios e os Eleusinos na Grécia; os de Mitra, que da Pérsia se estenderam com as legiões romanas, por todos os países do império. Menos conhecidos e menos brilhantes, especialmente em seu período de decadência e degeneração, foram os de Creta e os da Samotrácia; os de Vênus em Chipre; os de Tammuz na Síria, e muitos outros.
Também a religião cristã teve no princípio seus Mistérios, como deixam transparecer os indícios de natureza inequívoca que encontramos nos escritos dos primitivos Pais da Igreja, ensinando aos mais adiantados um aspecto mais profundo e interno da religião, à semelhança do que fazia Jesus, que instruía o povo por meio de parábolas, alegorias e preceitos morais, reservando ao pequeno círculo eleito dos discípulos - os que escutavam e punham em prática a Palavra seus ensinamentos esotéricos. A essência dos Mistérios Cristãos tem-se conservado nas cerimônias que constituem atualmente os Sacramentos.
Igualmente a religião muçulmana, assim como o Budismo e a antiga religião brahmânica, tiveram e têm seus Mistérios, que conservaram e em alguns casos conservam até hoje muitas práticas sem dúvida anteriores ao estabelecimento de ditas religiões, reminiscência daqueles que eram celebrados entre os antigos árabes, caldeus, aramaicos e fenícios, pelo que se refere à primeira, e entre os povos da Ásia Central e Meridional, pelos segundos.
Ainda que os nomes difiram e sejam parcialmente discordantes, a forma simbólica e as particularidades dos ensinamentos e suas aplicações tem sido característica fundamental e originária de toda a transmissão de uma mesma Doutrina Esotérica, em graus diversos e sucessivos, conforme a maturidade moral e espiritual dos candidatos, os quais eram submetidos a provas (muitas vezes difíceis e espantosas) para reconhecê-la, subordinando-se a comunicação do ensino simbólico, e os instrumentos ou chaves para interpretá-la, à firmeza e fortaleza de ânimo demonstradas na superação destas provas.
A própria Doutrina nunca variou em si mesma, ainda que tenha-se revestido de formas diferentes (mas quase sempre análogas ou muito semelhantes) e interpretada mais ou menos perfeita ou imperfeitamente e de uma maneira relativamente profunda ou superficial, por efeito da degeneração, à qual com o tempo sucumbiram os instrumentos ou meios humanos aos quais aquela havia sido confiada. Esta unidade fundamental, assim como a analogia entre os meios, pode considerar-se como prova suficiente da unidade de origem de todos os Mistérios de um mesmo e único Manancial, do qual tem emanado, ou pelo qual foram inspiradas, as diferentes instruções e tradições religiosas, e a própria Maçonaria em suas formas primitivas e recentes.
A UNIDADE DA DOUTRINA
Esta Doutrina-Mãe Eclética que tem sido perpetuamente Fonte inesgotável dos ensinamentos mais elevados de todos os tempos (foco de luz inextinguível, conservado zelosa e fielmente no Mistério da Compreensão e do Amor, que nunca deixou de brilhar mesmo nas épocas mais obscuras da História, para os que tiveram "olhos para ver e ouvidos para ouvir", é a própria Doutrina Iniciática manifestada nos Mistérios Egípcios, Orientais, Gregos, Romanos, Gnósticos e Cristãos, e é a mesma Doutrina Maçônica revelada por meio do estudo e da interpretação dos símbolos e cerimônias que caracterizam nossa Ordem.
É a Doutrina da Luz interior dos Mistérios Egípcios, que era desperta no candidato e tornava-se para sempre mais firme e ativa na medida em que chegava a "osirificar-se", ou seja conhecer sua unidade e identidade com Osiris, o Primeiro e Único Princípio do Universo. É a mesma Doutrina da luz simbólica que os candidatos procuram em nossos Templos, e que se realiza individualmente na medida em que cada um se afasta da influência profana ou exterior dos sentidos, e busca o secreto entendimento no íntimo de seu ser.
É a Doutrina da Vida Universal encerrada no simbólico grão de trigo de Elêusis, que deve morrer e ser sepultado nas entranhas da terra, para poder renascer como planta, à luz do dia, depois de abrir caminho através da escuridão em que germina. É a mesma doutrina pela qual o candidato, tendo passado por uma espécie de morte simbólica no quarto de Reflexões, renasce a uma nova vida como Maçom e progride por meio do esforço pessoal dirigido pelas aspirações verticais que o prumo simboliza.
É a Doutrina da redenção cristã, obtida por intermédio da fidelidade na palavra, com a qual o Cristo ou Verbo Divino (nossa percepção interior ou reconhecimento espiritual da verdade) nasce ou se manifeste em nós e nos conduz, segundo a antiga expressão brahmânica "da ilusão à Realidade, das trevas à luz, da morte à Imortalidade". É a mesma doutrina do Verbo ou Logos sobre a qual colocamos nossos instrumentos simbólicos ao abrirmos a Loja, isto é, ao iniciar a manifestação do Logos.
É pois, sempre e onde quer que seja, um mesmo ensinamento que se revela por infinitas formas, adaptando-se à inteligência e à capacidade de compreensão dos ouvintes; uma Doutrina secreta ou hermética, revelada por meio de símbolos, palavras e alegorias que só podem entender e aplicar em seu real sentido os ouvidos da compreensão. É uma doutrina vital que deve fazer-se carne em nós, sangue e vida, para produzir o milagre da regeneração ou novo nascimento, que constitui o Télos ou "fim da iniciação".
A HIERARQUIA OCULTA
O reconhecimento da Identidade fundamental desta Doutrina em suas múltiplas concessões e manifestações exteriores, da idêntica finalidade destas e da identidade dos meios universalmente empregados para ensiná-la, em suas distintas adaptações às diferentes circunstâncias de tempo e lugar, como selo de sua origem comum, faz com que se torne patente a existência de uma Hierarquia Oculta, uma Fraternidade de Sábios de Mestres, que tem sido através das eras sua íntima, secreta e fiel depositária, manifestando-a exteriormente em formas análogas ou diferentes, conforme a maturidade dos tempos e dos homens.
As origens desta Fraternidade Oculta de Mestres da Sabedoria, chamada também Grande Loja Branca (e, na Bíblia, Ordem de Melchisedeck), podem unir-se às primeiras civilizações humanas das quais esses Mestres, como Reis-Sacerdotes Iniciados (conforme é indicado pelo nome genérico Melchisedeck), foram Reveladores e Instrutores, pode-se dizer, desde a aparição do primeiro homem sobre a Terra. Sua existência tem sido e pode ser reconhecida por todos os discípulos adiantados, dos quais os Mestres tem-se servido e ainda se servem para sua Obra no Mundo.
Devemos a esta Hierarquia Oculta, formada pelos genuínos Intérpretes, Depositários e Dispensadores da Doutrina Secreta, o primitivo estabelecimento de todos os Mistérios e todos os cultos, em suas formas mais antigas, mais puras e originárias, assim como, o estabelecimento da Instituição Maçônica e todo o movimento progressista e libertador.
Elevar e libertar as consciências, conduzir os homens das trevas da ignorância e da ilusão, à luz da Verdade; desde o vício até à virtude; e da escravidão da matéria à liberdade do espírito, tem sido sempre e constantemente, a finalidade destes Seres superiores, destes verdadeiros Mestres Incógnitos em suas atividades no mundo.
Todo Movimento elevador e libertador deve considerar-se, direta ou indiretamente, inspirado por esta Hierarquia, formada pelos que se elevaram e se libertaram por si mesmos, sobrepondo-se a todas as debilidades, limitações e correntes (que atam a maioria de nós e nos fazem escravos da fatalidade ou da necessidade em aparência, mas em realidade somos escravos de nossos próprios erros e ilusões); realizando assim o verdadeiro Magistério.
Pelo contrário, todo movimento (político, social ou oculto) que tende a limitar, escravizar, entorpecer e adormecer a consciência dos homens tem uma oposta e diferente inspiração, sendo obra manifesta do Senhor da Ilusão, ou seja, do movimento de refluxo das ondas espirituais. A liberdade individual e o respeito pleno desta tem sido sempre e ainda o são, a característica da linha direita e esquerda da Evolução Ascendente, enquanto a escravidão e coerção assinalam o caminho esquerdo ou descendente.
AS COMUNIDADES MÍSTICAS
Ao lado das mais antigas instituições oficiais dos Mistérios - protegidas por reis e governos com leis e privilégios especiais, por sua influência reconhecidamente benéfica e moralizadora e instintivamente veneradas pelos novos - existiram em todo o Oriente, e especialmente na Índia, Pérsia, Grécia e Egito, muitas comunidades místicas que, se por um lado podem ser comparadas aos atuais conventos e ordens monásticas, por outro, algumas de suas características as relacionam intimamente com a moderna Maçonaria.
Estas comunidades - algumas das quais tiveram, embora outras não caráter decididamente religioso - nasceram, evidentemente, da necessidade espiritual de agrupar-se para levar, ao abrigo das condições contrárias do mundo exterior, uma vida comum mais de acordo com os ideais e íntimas aspirações de seus componentes.
As características destas comunidades, que constituem um laço de união com nossa Ordem, referem-se igualmente à sua dupla finalidade operativa e especulativa - enquanto se dedicavam igualmente a trabalhos e atividades materiais, assim como aos estudos filosóficos e contemplação - à iniciação como condição necessária para nelas serem admitidos, e aos meios de reconhecimento (sinais, palavras e toques que usavam entre si e por intermédio dos quais abriam suas portas ao viajante iniciado que se fazia reconhecer como um deles, tratando-o como irmão, qualquer que fosse sua procedência.
Destas místicas comunidades muito nos fala Filostrato em sua Vida de Apolônio de Tiana, baseando-se nos apontamentos de Damis, discípulo do grande filósofo reformador do primeiro século de nossa Era (ou melhor dizendo, companheiro de viagem, pois por não ser um iniciado, quase sempre Damis era obrigado a ficar na porta dos Templos e Santuários que não possuíam segredos para seu Mestre), Mestre que viajou constantemente de uma a outra comunidade, assim como de Templo em Templo nas mais diversas religiões, e onde sempre encontrou hospitalidade e acolhida fraternal, neles compartilhando o Pão da Sabedoria.
As mais conhecidas foram as comunidades dos Essênios entre os hebreus, dos Terapeutas do Alto Egito e dos Ginosofistas na Índia. Este último termo - que literalmente significa sábios despidos - parece muito bem aplicar-se aos iogues, em seu tríplice sentido moral, material e espiritual, quando se despojavam de toda sua riqueza ou posse material e reduziam seu traje ao que de mais simples havia, despindo-se espiritualmente com a prática da meditação que em seus aspectos mais profundos é um despojo completo da mente (a "Criadora da Ilusão") e das faculdades intelectuais, das quais está revestido nosso Ego ou Alma para sua atuação como "ser mental".
AS ESCOLAS FILOSÓFICAS
Não podemos esquecer igualmente, nesta sintética enumeração das origens da Maçonaria, as grandes escolas filosóficas da antigüidade: a vedantina, na Índia, a pitagórica, a platônica e a eclética ou alexandrina no Ocidente, as quais, indistintamente, tiveram sua origem e inspiração nos Mistérios.
Da primeira, diremos simplesmente que seu propósito foi a interpretação dos livros sagrados dos Vedas (Vedanta significa etimologicamente fim dos Vedas), antigas escrituras brahmânicas inspiradas, obras dos Rishis, "videntes" ou "profetas" com propósito claramente esotérico, como é demonstrado por sua característica primitivamente adavaita ("antidualista" ou unitária), com o reconhecimento de um único Princípio ou Realidade, operante nas infinitas manifestações da Divindade, consideradas estas como diferentes aspectos desta Realidade Única.
A escola estabelecida por Pitágoras, como comunidade filosofico educativa, em Crotona, na Itália meridional (chamada então Magna Grécia), tem uma íntima relação com nossa instituição. Os discípulos eram inicialmente submetidas a um longo período de noviciado que pode comparar-se ao nosso grau de Aprendiz, onde eram admitidos como ouvintes, observando um silêncio absoluto, e outras práticas de purificação que os preparavam para o estado sucessivo de iluminação, no qual permitia-se que falassem, tendo uma evidente analogia como grau de Companheiro, enquanto o estado de perfeição relaciona-se evidentemente como nosso grau de Mestre.
A escola de Pitágoras teve uma decidida influência, também nos séculos posteriores, e muitos movimentos e instituições sociais foram inspirados pelos ensinamentos do Mestre, que não nos deixou nada como obra direta sua, já que considerava seus ensinamentos como vida e preferia, como ele mesmo o dizia, gravá-las (outro termo caracteristicamente maçônico) na mente e na vida de seus discípulos, do que confiá-las como letra morta ao papel.
Em relação a Pitágoras cabe recordar aqui um curioso e antigo documento maçônico, no qual atribui-se ao Filósofo por excelência (foi quem primitivamente usou este termo, distinguindo-se como amigo da sabedoria dos sufis ou sufistas, que ostentavam, com orgulho inversamente proporcional ao mérito real, o título de sábios) o mérito de ter transportado as tradições maçônicas orientais ao mundo ocidental greco-romano.
Desta escola platônica e de sua conexão com os ensinamentos maçônicos, é suficiente que recordemos a inscrição que existia no átrio da Academia (palavra que significa etimologicamente "oriente"), onde eram celebradas as reuniões: "Ninguém deve aqui entrar se não conhecer a Geometria"; alusão evidente à natureza matemática dos Primeiros Princípios, assim como ao simbolismo geométrico ou construtor que nos revela a íntima natureza do Universo e do homem, bem como, de sua evolução.
A filiação destas escolas aos Mistérios é evidente pelo fato de que Platão, como Pitágoras e todos os grandes filósofos daqueles tempos, foram iniciados nos Mistérios do Egito e da Grécia (ou em ambos), e todos deles nos falam com grande respeito, ainda que sempre superficialmente, por ser então toda violação do segredo castigada pelas leis civis até com a própria morte.
Da escola eclética ou neoplatônica de Alexandria, no Egito, podemos estabelecer a dupla característica de sua origem e de sua finalidade, uma vez que nasceu da convergência de diferentes escolas e tradições filosóficas, iniciáticas e religiosas, como síntese e conciliação destas, do ponto de vista interior no qual se revela e torna patente sua fundamental unidade.
Esta tentativa de unificação de escolas e tradições diferentes, por meio da compreensão da Unidade da Doutrina que nelas se encerra, foi renovada uns séculos depois por Ammonio Saccas, constituindo ainda um privilégio constante e universal característico dos verdadeiros iniciados em todos os tempos.
A ESCOLA GNÓSTICA
Diretamente relacionada com a escola eclética alexandrina, a tradição ou escola gnóstica do cristianismo, tem sido considerada e foi posteriormente perseguida como heresia pela Igreja de Roma.
O gnosticismo tentou conciliar e fundir até o limite possível, o cristianismo então nascente, com as religiões e tradições iniciáticas mais antigas, substituindo o dogma (doutrina ortodoxa, da qual pede-se uma aceitação incondicional como "ato de fé") pela gnosis (conhecimento ou compreensão por meio da qual alcança-se a Doutrina Interior). De acordo com esta escola, o Evangelho, à semelhança de todas as escrituras e ensinos religiosos, deve ser interpretado em seu sentido esotérico, isto é, como expressão simbólica e apresentação dramática de Verdades espirituais.
O Cristo, mais que uma atribuição pessoal de Jesus, seria o conhecimento ou percepção espiritual da Verdade que deve nascer e realmente nasce em todo iniciado, que assim, torna-se seu verdadeiro cristoforo ou cristão. O próprio Jesus seria também o nome simbólico deste princípio salvador do homem, que o conduz "do erro à Verdade e da Morte à Ressurreição".
A própria Fé (pistis), considera-se como meio para chegar à Gnosis, preferivelmente à aceitação passiva e incondicional de qualquer afirmação dogmática, apresentada como uma Verdade revelada.
Apesar das posteridades interpolações, é certo que o Evangelho, as Epístolas e o Apocalipse de São João, revelam claramente um fundamento gnóstico (a mesma doutrina ou tradição gnóstica dizia-se instituída pelos discípulos ou seguidores de São João), e esta tradição gnóstica ou joanita representa no Cristianismo o ponto de contato mais direto com a Maçonaria.
A CABALA HEBRAICA
As antigas tradições orientais e herméticas encontram na Cabala e na Alquimia duas novas encarnações ocidentais que não foram estranhas às origens da moderna Maçonaria.
A Cabala (do Hebraico kabbalah, "tradição") representa a Tradição Sagrada conhecida pelos Hebreus, e por sua vez deriva de antigas tradições caldéias, egípcias e orientais em geral. Trata especialmente do valor místico e mágico dos números e das letras do alfabeto relacionadas com princípios numéricos e geométricos, que encerram em si outros tantos significados metafísicos ou espirituais, dos quais aparece a íntima concordância e a fundamental das religiões.
A antigüidade do movimento cabalista e sua proximidade aos hebreus tem sido negada por alguns críticos modernos, mas, geralmente, admite-se sua existência após o cativeiro da babilônia, tornando-se assim manifesta sua afirmação doutrinária dos magos caldeus. Especial importância possuem na cabala as palvras sagradas e os Nomes divinos, atribuindo-se aos mesmos um poder que se faz operativo por meio de sua correta pronúncia – doutrina comum a todas as antigas tradições, que também tem sido desenvolvida de forma racional na Filosofia da Índia, onde o som ou o Verbo é considerado como um espírito da divindade (Shabdabralman).
ALQUIMIA E HERMETISMO
Como do Oriente asiático tem chegado as doutrinas cabalísticas, do Egito e da tradição hermética (de Hermes Trismegisto ou Thoth, o fundador, tradicional dos mistérios egípcios) faz-se originar a Alquimia (palavra árabe que parece significar "a Substância"), daqueles que se auto denominavam verdadeiros filósofos.
O significado comum e familiar do adjetivo hermético pode nos dar uma idéia do sigilo por meio do qual os alquimistas costumavam ocultar a verdadeira natureza de suas misteriosas pesquisas. Não devemos portanto estranhar se a maioria das pessoas segue acreditando, ainda hoje, que os principais objetos dos alquimistas foram os de enriquecer-se por meio da pedra filosofal, que deveria converter o chumbo em ouro puro, e alongar notavelmente a duração de sua existência, livrando-se, ao mesmo tempo, das enfermidades por intermédio de um elixir e de uma milagrosa panacéia.
Nesta mística lápis philosophorum, entretanto, nós os maçons não podemos deixar de reconhecer uma particular encarnação, um estado de pureza, refinamento e perfeição da mesma pedra em cujo trabalho principalmente consiste nosso labor. Quando refletimos sobre o segredo simbólico, no qual, à nossa semelhança, envolviam seus trabalhos para ocultá-los aos profanos da Arte, não podemos Ter a menor dúvida de que, além dessas finalidades materiais, que justificavam para os curiosos suas ocupações, os reais esforços de todos os verdadeiros alquimistas foram dirigidos para objetivos essencialmente espirituais.
A pedra filosofal não pode ser pois, nada senão o conhecimento da Verdade, que sempre exerce uma influência transmutadora e enobrecedora sobre a mente que a contempla e se reforma á sua imagem e semelhança. Unicamente por meio desse conhecimento, que é realização espiritual, podem converter-se as imperfeições, as paixões e as qualidades mais baixas e vis dos homens naquela perfeição ideal da qual o ouro é símbolo mais adequado.
Como esta chave é relativamente fácil para nós entendermos a misteriosa linguagem que os alquimistas utilizam em suas obras, e como a própria personalidade do homem é o athanor, mantido ao calor constante de um ardor duradouro, onde devem desenvolver-se todas as operações.
O parentesco entre o simbolismo alquímico e o maçônico aparece com bastante clareza no desenho que reproduzimos na página 17, extraído de uma ilustração da obra de Basilio Valentin sobre o modo de fazer o ouro oculto dos filósofos, igualmente adotado por outros autores.
A Grande Obra dos alquimistas, e aquela que procuramos em nossos simbólicos trabalhos, apresentam, efetivamente, uma idêntica finalidade comum a todas as escolas iniciáticas, seja no significado místico da realização individual, como numa iluminada e bem dirigida ação social, que tem por objetivo o aprimoramento do meio e a elevação, o bem e o progresso efetivo da humanidade.
TEMPLÁRIOS E ROSA-CRUZES
As tradições herméticas orientais encontram no Ocidente, durante a Idade Média e o princípio da Idade Moderna, outros tantos canais para sua expressão nas muitas sociedades e ordens místicas e secretas, que se manifestaram aqui e acolá, ainda que aparentemente com diversa finalidade exterior, mas todas intimamente relacionadas com a Tradição Iniciática e ligadas interiormente pela afinidade de seus meios de manifestação e de uma identidade fundamental de orientação...
Entre estes movimentos, os dois mais conhecidos e que mais influenciaram a Maçonaria, são a Ordem do Templo, que teve seu apogeu e seu período de esplendor no século XIII, e a Fraternidade Rosa-Cruz que a influenciou especialmente no século XVII.
A Ordem dos Cavaleiros do Templo nasceu das Cruzadas e do contato estabelecido por ocasião destas, entre os cavaleiros vindos do Ocidente e as místicas comunidades orientais depositárias de tradições esotéricas. Como Ordem, foi fundada em 1118 por dois cavaleiros franceses, Hugues de Payens e Godefroid de St. Omer, com o fim de proteger os peregrinos que iam a Jerusalém depois da Primeira Cruzada.
Os cavaleiros faziam os três votos evangélicos de pobreza, castidade e obediência, como as demais ordens religiosas, e a Ordem compreendia em si um corpo eclesiástico próprio, dependente direta e unicamente do Grão Mestre da Ordem e do Papa. Assim, os místicos segredos dos quais a Ordem se fez depositária, podiam ser guardados com toda a segurança.
O segredo dentro do qual eram desenvolvidos as cerimônias de recepção e se comunicavam os mistérios aos que se reputavam dignos e maduros para possuí-los, foi o pretexto das acusações de imoralidade e heresia que se fizeram à Ordem, sendo em realidade motivadas pela ignorância, o ciúme e a cobiça de sua imensa riqueza. Esta última foi principalmente a razão que levou a Felipe o Belo, rei da França no ano de 1307, a prender sem prévio aviso a todos os Templários, que foram torturados e julgados sumariamente pelo Tribunal da Inquisição, como preciso objetivo de acabar com a Ordem, cujo fim foi tragicamente selado em 1314 com a bárbara morte infligida a seu Grão Mestre Jacques de Molay, que foi queimado vivo diante da catedral de Notre Dame de Paris (quatro meses depois da abolição da Ordem ter sido decretada por obra do pontífice.
Também o movimento filosófico conhecido com o nome de Fraternitas Rosae-Crucis teve sua origem no contato do Ocidente com o Oriente, e com as secretas tradições que aqui puderam conservar-se mais livre e fielmente. Cristhian RosenKreutz, seu místico fundador, nasceu segundo a tradição da qual se fala na Fama Fraternitatis, em 1378, e ainda muito jovem viajou para Chipre, Arábia e Egito, aonde lhe foram revelados muitos importantes segredos que levou consigo para a Alemanha, aonde fundou a Fraternidade, destinada a reformar a Europa. Depois de sua morte foi sepultado secretamente numa tumba preparada expressamente para ele, que devia permanecer desconhecida para os membros da mesma Fraternidade, até que foi casualmente descoberta, lendo-se mesma a inscrição: Post CXX anos patebo.
Esta estória, assim como os segredos e maravilhas que se encontram na tumba, é evidentemente um simbolismo da Tradição Iniciática da Sabedoria, personificada pelo mesmo Cristian Rosenkreutz, que vem do Oriente para o Ocidente, e é conservada zelosamente em sua tumba hermética, onde a buscam e encontram seus adeptos, os fiéis buscadores da Verdade.
Quanto à influência destes dois movimentos sobre a Maçonaria, que é a que neste momento mais nos interessa, é certo que não somente muitas tradições templárias e rosa-cruzes encontram seu caminho em nossa Ordem, senão que também esta se fez a intérprete e natural herdeira de seus objetivos ideais e da Grande Obra que constitui o objeto de todas as diferentes tendências. Hermetistas, templários, rosa-cruzes e filósofos, sempre se confraternizaram com os maçons, e desta comunhão espiritual nasceu a Maçonaria conforme hoje a conhecemos.
ESPÍRITO, ALMA E CORPO
Podemos considerar estas fraternidades e movimentos, como a alma multiforme do Espírito Uno da Tradição Universal, que veio diretamente e sem interrupção até nós provindo dos antigos Mistérios. Assim, no que diz respeito a seu espírito iniciático como à tradição que a anima (e da qual é herdeira e continuadora), as origens de nossa Instituição não podem ser mais gloriosas, sendo nós, como Maçons, os herdeiros dos antigos Reis-Sacerdotes (simbolizados por Melchisedeck e Salomão) e dos Grandes Iniciados de todos os Tempos.
E no que se refere ao corpo no qual esta Alma tradicional encarnou - isto é, a forma que domina exteriormente nossa Instituição, que foi tomada particularmente da Arte de Construir -, nossas origens não são menos gloriosas, já que se relacionam diretamente com a fonte de toda civilização, como a causa se relaciona com o seu efeito natural.
Conhecemos, pelo estudo que temos feito nas páginas precedentes, algo de sua alma, que é tradição e Finalidade, comuns às diferentes ordens, escolas, movimentos, sociedades e comunidades que acabamos de examinar - uma Alma formada pelas mais elevadas aspirações humanas e expressada constantemente em termos de compreensão, tolerância e amor fraternal. Vejamos agora como também o corpo exterior da Instituição tem suas origens nos tempos da mais remota História e da pré-história humana, tendo deixado seus vestígios em todas as grandes obras e monumentos que até nós chegaram das épocas passadas.
A "ARS STRUCTORIA"
Entre todas as artes, a Arquitetura tem sido venerada e praticada em todos os tempos como uma arte especialmente Divina. Não devemos maravilhar-nos da especial consideração em que sempre foi tida, por estar a construção material intimamente relacionada com a forma exterior de toda civilização, da qual pode-se considerar ao mesmo tempo como causa, meio, condição necessária e expressão natural.
A casa representa o princípio da vida civil e não carece de razão sem dúvida, que a segunda letra do alfabeto hebraico (que constitui a inicial da palavra sagrada do Aprendiz) signifique exatamente "casa", derivando sua forma do hieróglifo simbólico da mesma. A Casa representa assim à primeira letra ou o princípio da civilização, enquanto sua interpretação esotérica em relação às demais letras da Palavra dá outro significado mais próprio para o Aprendiz, que estudaremos mais adiante.
Quando os homens tiveram casas ou abrigos protetores, e quando os muros das cidades constituíram para estas a base de sua segurança, foi quando puderam desenvolver as artes, as ciências e as instituições sociais.
Então, elevando-se a atenção e as aspirações dos homens, do reino dos efeitos para o das causas, ou da aparência exterior à realidade interior que nela se esconde e a anima, foi quando nasceu a idéia e sentiu-se a necessidade de construir um Templo, de levantar um edifício ou símbolo exterior do reconhecimento interior da Causa Transcendente, dos efeitos visíveis.
Esta aspiração interior constitui o princípio de toda iniciação, ou ingresso, numa forma superior de pensar, de ver e de considerar as coisas. Portanto, podemos dizer que a Maçonaria teve tanto moral como materialmente origem no primeiro Templo que se levantou em reconhecimento à Divindade, e que o primeiro maçom foi quem o levantou, apesar do rude e elementar que foi esse Templo primitivo, que bem pode ter consistido de uma única coluna, ou tronco de pedra ou de madeira, cuja tradição foi perdida em seguida nos obeliscos.
MAÇONARIA OPERATIVA E MAÇONARIA ESPECULATIVA
É evidente, pois, que o elemento espiritual (especulativo ou devocional) e o material (operativo ou construtivo) encontram-se intimamente unidos desde o momento em que o primeiro se concebeu e se realizou a idéia de um Templo, como símbolo exterior de um reconhecimento interior, e que a Maçonaria, surgiu espontaneamente desta idéia de levantar ou estabelecer um símbolo à Glória do Princípio ou Realidade interiormente reconhecidos, pois se os Maçons no sentido material foram "construtores" em geral, sempre tem sido mais particularmente os que tem elevação Templos para o espírito.
Tendo presentes estas considerações, não há nada de surpreendente na transformação da maçonaria operativa em especulativa, isto é, de como uma Instituição Moral e Filosófica tenha podido desenvolver-se sobre uma arte material, tomando o lugar das corporações medievais e continuando-as.
Ambos os elementos - operativo e especulativo - estiveram juntos desde o princípio, e isto evidencia-se no desenvolvimento cíclico que faz prevalecer, conforme os momentos históricos e as necessidades de uma época, uma ou outra tendência, um ou outro destes dois aspectos da nossa Instituição, tão inseparáveis como as duas colunas que dão acesso a nossos Templos.
Além de que constitui o selo de sua origem, a construção em geral e a de um templo em particular - prestou-se sempre e atualmente ainda se presta admiravelmente como símbolo interpretativo da atividade da Natureza, podendo-se considerar o Universo como uma Grande Obra, como um Templo e ao mesmo tempo uma Oficina de Construção, dirigida, inspirada e atualizada por um Princípio Geométrico, cujas diferentes manifestações são as leis naturais que o governam e as forças que, segundo estas leis, produzem diferentes efeitos visíveis.
Esta obra de construção pode o homem observá-la em si mesmo, em seu próprio organismo físico (muitas vezes comparado a um templo), assim como em sua íntima organização espiritual, no mundo interior de suas idéias, pensamentos, emoções e desejos. Todo homem vem a ser assim, um microcosmos ou "pequeno universo" e um Templo (análogo ao Grande Templo do Universo que constitui o Macrocosmos), individualmente erguido "a Glória" do Princípio Divino ou Espiritual que o anima.
Com esta Obra Universal que se desenvolve igualmente dentro e fora de nós, na qual todo ser participa geralmente de forma inconsciente com sua própria vida e atividade, o Maçom - ou seja o iniciado nos Mistérios da Construção - tem o privilégio e o dever de cooperar conscientemente, convertendo-se em obreiro inteligente e disciplinado do Grande Plano que constitui a evolução.
Assim, pois, a Ars Structoria é, para quem sabe interpretá-la e realizá-la, a verdadeira Ciência e Arte Real da Vida, o Divino privilégio dos iniciados que a praticam especulativa e operativamente; dois aspectos intimamente unidos e inseparáveis, ainda que possam manifestar-se de diferentes formas, conforme a evolução particular do indivíduo. E não há altura ou elevação do pensamento ou do plano da consciência individual que não possa ser interpretado, ou ao qual não possam utilmente aplicar-se as alegorias, os emblemas e os instrumentos simbólicos da Construção.
AS CORPORAÇÕES CONSTRUTORAS
Nenhuma atividade, arte ou obra importante pode ser o resultado dos esforços e da experiência de um indivíduo isolado. Por conseqüência, os primeiros construtores tiveram, necessariamente, que agrupar-se, fosse para a aprendizagem e o aperfeiçoamento, aonde a experiência dos demais pudesse ser aproveitada, fosse para o exercício e a prática regular da Arte, agregando-se cada um a outros membros como ajudantes ou aprendizes, que deveriam cooperar nas mais rudes tarefas sem entretanto conhecer os princípios e segredos, que se adquirem com o tempo, com o esforço e com a aplicação.
A divisão em Aprendizes, Companheiros e Mestres, teve de ser espontânea em qualquer grupo de obreiros com intenção construtiva, devendo-se distinguir os braçais e noviços, que não podiam dar mais que sua força, sua boa vontade e suas faculdades ainda indisciplinadas, dos obreiros, que já conheciam os princípios da arte e cuja atividade podia ser utilizada mais proveitosamente. Estes obreiros diferenciavam-se, por sua vez, daqueles outros consumados ou perfeitos que já dominavam esses princípios e estavam capacitados a executar qualquer obra, assim como, a dirigir a ensinar aos demais.
Como a unidade de uma tarefa sempre uma correspondente unidade de conceito e de direção, é óbvio também, que estas três categorias tiveram de manter-se fielmente disciplinadas (no duplo sentido intelectual e moral da palavra disciplina, isto é, tanto na teoria como na prática) sob uma Autoridade reconhecida como tal, por sua experiência e conhecimento superior, eleita ou proposta sobre eles, o Mago por excelência, ou Arquiteto, a cuja iniciativa e direta responsabilidade encomendava-se evidentemente a obra, um Mestre Venerável entre os Mestres da Arte, ao qual todos os demais deviam respeito e obediência.
Assim, toda a corporação construtora ou agrupamento de obreiros para um fim determinado deve ter-se constituído espontaneamente à semelhança de nossas Lojas, sendo ainda necessário além do Mestre Arquiteto, diretor da Obra, um ou dois Vigilantes que o Ajudaram e puderam substitui-lo em caso de necessidade, e outros membros que tiveram cargos e atribuições especiais, diferentes dos demais.
A primeira loja foi constituída, consequentemente, pelo primeiro grupo de construtores que uniram disciplinadamente seus esforços para alguma obra importante, ou para a realização de um Ideal comum. E como as regras morais são necessárias para a ordem, a disciplina e a eficiência em toda atividade material, é evidente que estas devem ter sido inseparáveis das normas e regras próprias da Arte. O conjunto destas normas e regras, que constituíam uma necessária disciplina para os que eram admitidos a tomar parte na Obra, ou como membros da corporação, formou a característica da Ordem, pois, sem ela não poderia ter existido nenhuma ordem verdadeira e a aceitação desta disciplina deve ter naturalmente sido exigida como condição preliminar para admissão na Ordem.
A "RELIGIÃO" DOS CONSTRUTORES
Nas especulações, cultos e tradições primitivas, tudo tende à unidade: poderes e atribuições que hoje se distinguem cuidadosamente como por exemplo o eclesiástico e o civil, o legislativo, e o judiciário, estavam ontem em mãos de uma mesma autoridade. Assim, o mundo antigo deu-nos o exemplo dos Reis-Sacerdotes que tomavam para si diferentes representações e poderes que hoje são consideradas inteiramente suprimidos.
Igualmente a Religião formava então parte da vida, e as instituições civis e religiosas entrelaçavam-se mutuamente, constituindo um conjunto quase inseparável. Por isso, nas primitivas corporações construtoras, o elemento religioso-moral deve ter sido considerado como formando uma unidade com o elemento artistico-operativo, desenvolvendo e transmitindo-se igualmente nestas corporações, os segredos da arte e certas especiais tradições religiosas.
Note-se, a este respeito, que a própria palavra religião identifica-se, em seu significado original, com a tradição, indicando simplesmente "o que é legado ou se transmite". Também nesse mesmo sentido, a Maçonaria é religião ainda que não uma religião: a religião operativa e especulativa, simbólica e iniciática, nascida espontaneamente nas primeiras corporações construtoras, à medida em que seus adeptos se esforçavam em divinizar sua Arte, convertendo-se em veículos e meios dos quais pode aproveitar-se a Hierarquia Oculta para seus ensinamentos, encontrando nesse meio em terreno particularmente fértil para semear a mística semente da Sabedoria.
Também o caráter particular das corporações que se especializaram na construção de Templos fez com que estas se identificassem, nas diferentes épocas da história, com distintas tradições religiosas, e em alguns casos com os próprios Mistérios (aos quais alguns entre eles devem ter sido admitidos como participantes), e não há como maravilhar-se se assimilaram muitos ensinamentos esotéricos, transmitidos como patrimônio secreto entre os mestres da Arte.
Fora da dúvida está que, em qualquer período da História, as corporações construtoras aparecem como possuidoras de segredos e alegorias, alguns dos quais provêm de uma época remotíssima, e outros representam antiquíssimas tradições revestidas de nomes e formas simbólicas mais recentes. Enquanto que, por outro lado, bem sabemos que todas tiveram regras e modalidades particulares para a dupla transmissão do segredo material da arte e de sua interpretação especulativa, assim como para a admissão de candidatos como aprendizes, exigindo-se serem "livre e de bons costumes", dando provas definidas de moralidade, diligência e capacidade para a obra.
Esta "religião dos construtores" teve de ser uma religião eminentemente moral, isto é, uma ética individual aplicada à vida, como é demonstrado pela Tradição Maçônica, que mais diretamente lhe dá continuidade.
O GRANDE ARQUITETO
O conceito de um Grande Arquiteto, ou Princípio Divino Inteligente que constitui o foco espiritual e a Base Imanente da Grande Obra da Construção particular e universal, tem representado sem dúvida, em todos os tempos, o fundamento da Religião dos Construtores.
Este mesmo conceito constitui o Princípio Cardinal da Maçonaria Moderna, pois não possuem valor maçônico os trabalhos que não forem feitos "a glória" deste Princípio, isto é, com o fim de que a espiritualidade latente em todo o ser e em toda a coisa, encontre por meio dos mesmos sua expressão ou manifestação mais perfeita.
Trata-se, sem dúvida, de um conceito iminentemente iniciático, isto é, no qual ingressamos progressiva e gradualmente à medida em que nossos olhos espirituais se abrem à luz maçônica. Assim pois, enquanto no princípio é dada a cada maçom a liberdade de interpretar esta expressão de Grande Arquiteto conforme suas particulares idéias filosóficas, opiniões e crenças (teístas e ateístas, considerando-se neste último caso o Grande Arquiteto como expressão abstrata da Lei Suprema do Universo), posteriormente, será conduzido gradualmente, por meio de seu próprio trabalho interior ou do esforço pessoal com o qual obtém todo progresso, a um reconhecimento mais perfeito, a uma realização mais íntima e profunda deste Princípio, ao mesmo tempo imanente e transcendente, que constitui a base e a essência íntima de tudo o que existe.
Ao redor desta idéia central (cujo caráter iniciático a diferença de todo conceito ou crença dogmática) tem-se agrupado, como em torno de seu centro natural, as diferentes tradições, símbolos e mistérios que constituem outras tantas aplicações e expressões do Princípio Fundamental à interpretação da vida e a seu aperfeiçoamento.
Desta maneira, sem impor opinião ou crença alguma, mas deixando a cada um a liberdade de interpretar esta expressão simbólica segundo sua particular educação e suas convicções todos são naturalmente conduzidos para uma mesma Verdade, esforçando-se em penetrar cada um mais interiormente, chegando ao fundo de sua própria visão e crença, que (como todas) tem de ser tolerada, respeitada e interpretada como um dos infinitos caminhos que conduzem à Verdade.
AS PRIMEIRAS CORPORAÇÕES
Esta digressão sobre um dos pontos fundamentais da Maçonaria, tem nos parecido necessária para mostrar o caráter iniciático, eclético e universal da Ordem em seus próprios conceitos e símbolos em aparência mais vulgares, mas que encerram em si um propósito e uma profunda doutrina.
Voltando ao nosso tema, sobre as origens maçônicas, resta-nos traçar sumariamente a história das corporações construtoras desde as primeiras civilizações até os nossos dias.
As pegadas das antigas corporações construtoras encontram-se em todos os povos que nos deixaram alguma notícia de sua experiência. Entre os mais antigos e importantes monumentos que restam de antigas civilizações, devemos ressaltar as pirâmides do Egito. A princípio, foram consideradas tumbas magníficas dos reis, mas um estudo mais atento tem revelado que se trata de monumentos simbólicos, nos quais e próximo aos quais, com toda probabilidade, desenvolveram-se ritos e cerimônias iniciáticas.
Isto parece particularmente certo com respeito à Grande Pirâmide, cujas medidas e proporções calculadas escrupulosamente tem sido reveladas em seus arquitetônicos conhecimentos geográficos, astronômicos e matemáticos, não menos exatos que os que se consideram exclusiva conquista dos nossos tempos. É suficiente dizer que a unidade de medida desta pirâmide, o côvado sagrado (que pode ser identificado com a régua maçônica de 24 polegadas) é exatamente a décima milionésima parte do raio polar terrestre, uma medida mais justa e mais exatamente determinada que o metro, base de nossos sistema. Seu perímetro revela um conhecimento perfeito da duração do ano; sua altura, a exata distância da Terra ao Sol, e o paralelo e o meridiano que se cruzam em sua base constituem o paralelo e o meridiano ideais, uma vez que atravessam a maior parte das terras. Por outro lado, a precisão com a qual estão cortados e dispostos os enormes blocos de pedra de que se compõem, daria muito o que pensar a um engenheiro moderno que quisesse imitar estas obras.
Apesar do Egito ter sempre sido considerado como a terra clássica da escravidão, já que realmente em épocas posteriores os obreiros dirigidos pelos sacerdotes não tinham nenhuma liberdade ou iniciativa, muito difícil admitir que uma obra como a Grande Pirâmide - obra caracteristicamente maçônica - tenha sido outra coisa que a Obra Mestra da mais sábia e celebrada corporação construtora de todos os tempos. Além disso, é possível que nossa Era Maçônica (que começa no ano 4000 A. C. e que vem de antigas tradições) date precisamente da construção da Grande Pirâmide, que alguns, entretanto, consideram mais recente em quanto outros, por sua vez, julgam mais antiga.
Outra importante construção da antigüidade, além dos templos cujos traços se encontram esparsos pela Terra, parece ter sido a Torre de Babel, de bíblica memória, diferenciando-se esta construção da precedente pelo emprego de tijolos em lugar de pedras cortadas, e de outro material em vez de cal. O mito da confusão das línguas antes da conclusão da obra, e da conseqüente dispersão das corporações de construtores que se reuniram para executá-la, dá muito o que pensar ao estudante das tradições antigas.
OS CONSTRUTORES FENÍCIOS
Em épocas mais recentes (cerca de 1000 anos A. C.), encontramos as corporações e a obra de Construtores Fenícios em todos os países do Mediterrâneo nos quais este povo estabeleceu suas colônias e a influência de sua civilização.
Estas corporações viajavam, evidentemente, de um país a outro conforme delas se necessitava e solicitado era o seu concurso, erguendo com igual habilidade e facilidade templos e santuários para os diferentes cultos e mistérios, ainda que sempre erigidos conforme o mesmo tipo fundamental, que revela, nas obras das idênticas corporações ou de corporações afins, uma mesma identidade de conceitos.
Podemos considerar como um exemplo típico (e como obra simbolicamente mestra dos construtores fenícios) o Templo de Jerusalém, erigido na época indicada no livro das Crônicas (cerca de 1000 anos A. C.) pelos obreiros que Hiram, rei de Tiro, enviou a Salomão para este efeito, construção sobre a qual é baseada nossa atual tradição maçônica.
CONSTRUTORES GREGOS E ROMANOS
Na Grécia, as corporações formaram-se, sem dúvida, à influência e semelhança das fenícias, e dedicaram-se especialmente à construção de templos, tomando o nome de dionisíacas, relacionando-se evidentemente com os Mistérios homônimos em honra a Iaco ou Zéus Nisio.
A arquitetura grega, caracterizada pelo uso da arquitrave (em vez do arco empregado posteriormente pelos romanos), tem, por sua singeleza hierática, muita analogia com a egípcia, da qual se diferencia pela graça e a esbelteza que substituem à poderosa majestade daquela. Seus três estilos, dórico, jônico e coríntio, que se distinguem pela forma dos capitéis e das decorações que os acompanham, são caracteristicamente emblemáticos dos três graus maçônicos. E a Maçonaria Simbólica pode muito bem comparar-se, alegoricamente, à Arquitetura Grega, correspondendo perfeitamente suas três câmaras às três ordens fundamentais desta.
Á semelhança de ditas corporações de obreiros dionisíacos, Numa Pompílio, o rei iniciado de Roma, instituiu, segundo a tradição, os collegia fabrorum que, como nos precedentes, tinham seus próprios mistérios e guardavam e transmitiam com os segredos da Artes, certos segredos e tradições de natureza religiosa. Como as Lojas Maçônicas, estavam dirigidos por um triângulo (como é testemunhado pela clássica expressão três faciunt collegium, formados por um Magister e dois Decuriões, compreendendo três graus análogos aos atuais, usando uma especial interpretação emblemática de seus instrumentos.
Estes colégios estenderam-se depois por todo o império, percorrendo como forças construtoras o caminho das legiões e levantando, onde quer que fossem, aqueles monumentos e edifícios dos quais ainda restam múltiplos vestígios.
Já no século primeiro antes de Cristo, várias destas corporações passaram a estabelecer- se na Gália, Alemanha e Inglaterra, onde construíram especialmente campos atrincheirados que depois se converteram em cidades (o termo inglês chester, dos nomes de muitas localidades revela de forma clara sua origem latina, de castrum, "acampamento").
AS CORPORAÇÕES MEDIEVAIS
Com o triunfo do Cristianismo, que se converteu em religião oficial durante o último período do Império Romano, enquanto os Mistérios tiveram de desaparecer, os collegia fabrorum resolveram adaptar suas tradições pagãs à nova fé, e isto foi feito muito habilmente, substituindo-se pela lenda da construção do Templo de Salomão outra transmitida anteriormente, e pelos nomes de santos e personagens cristãos os antigos deuses pagãos. Nasceu assim um São Dionísio, em lugar do homônimo deus grego (o Baco dos latinos), e São João foi honrado como protetor da Ordem, em lugar do antigo deus bifronte Janus.
Assim renovada, a tradição dos antigos colégios romanos seguiu no Oriente a sorte do Império Bizantino, adaptando-se depois, com igual facilidade, à fé islâmica, enquanto no ocidente, com a queda do Império e a invasão dos vândalos e dos godos, encontrou um asilo seguro numa pequena ilha, perto da cidade italiana de Como, na Lombardia (país assim denominado em conseqüência da invasão longobardos, "os de longa barbas", de onde tomaram seu nome os magistri comacini, que deram origem àquele estilo proveniente do romano, chamado românico, que fez sua primeira aparição por volta do ano 600 e continuou dominando por vários séculos depois o estilo na Itália e nos países contínuos, até que o estilo gótico, produzido pelas corporações nórdicas, obteve depois o predomínio.
Nas obras destes artistas encontramos vários símbolos maçônicos, e a expressão de uma singular independência do pensamento que é revelada pelas curiosas e mordazes sátiras contra o Igreja, gravadas com uma audácia surpreendente nas próprias esculturas das catedrais. Apesar do hermético segredo com que guardavam suas tradições e crenças, parece que estas corporações (que existiam em várias cidades da Itália, entre outras em Siena, desde o século XI) não era estranho o conhecimento de um G. A. D. U., nem a lenda de Hiram.
No fervor religioso que caracterizou este período, algumas ordens monásticas da Igreja também se dedicaram, especialmente na França e na Alemanha, à Arte de Construir, levantando templos com a ajuda dos obreiros nômades que encontravam, contribuindo assim, indiretamente, para a organização destes em corporações que depois tornaram-se independentes.
Por obra e esforço das corporações independentes que se formavam em diversos países, nasceu então, e rapidamente se afirmou, o chamado estilo gótico, que converte o simples arco romano e românico em ogival, magnífico símbolo do fervor religioso e das mais ardentes aspirações humanas que se levantam, como cântico majestoso, da terra ao céu. Nos dois estilos orientais, árabe e russo, encontramos um desenvolvimento ulterior desta idéia que fez evoluir o arco gótico do romano, com a curvatura especial que caracteriza estes estilos.
Estas corporações dedicadas especialmente à arte gótica, constituíram na Inglaterra os guilds de obreiros; na França o compagnonnage (dos quais existiam três seções diferentes que tomavam o nome, respectivamente, de filhos de Salomão, de Mestre Jacques e de Mestre Soubise) e na Alemanha as oficinas e uniões de canteiros (Steinmtzen), entre as quais tomou justo renome aquela que levantou a Catedral de Estrasburgo, erigida no século XV.
Os documentos que delas nos chegam, provam que os obreiros achavam-se divididos em aprendizes, companheiros e mestres, que se reuniam em pequenas casas e empregavam de uma maneira emblemática os instrumentos de sua profissão, levando-se consigo como insígnias. Além disso, reconheciam-se por meio de palavras e sinais que chamavam saudações. Os neófitos eram recebidos com particulares cerimônias e juravam o mais profundo segredo sobre o que ia ser-lhes comunicado e ensinado.
A palavra maçom (do latim medieval "macio", equivalente de canteiro, de onde teve origem igualmente o termo alemão Metzen) parece que foi usada pela primeira vez no século XIII, sendo exportada da França para a Inglaterra. A expressão franco maçom (maçom franqueado ou livre de impostos) aparece por primeira vez em 1375.
A origem desta última palavra tem sido relacionada aos privilégios especiais e isenções concedidas pelos pontífices Nicolas III e Benito XII, em vista da reconhecida moralidade destas corporações e das obras piedosas a que elas se dedicavam como construtoras de igrejas. Mas o real significado originário deste atributo de francos ou livres (em inglês "freemasons") é um assunto todavia discutido e discutível.
OS MAÇONS "ACEITOS"
Debilitando-se depois, no século XVII, com o renascimento clássico e a corrupção da Igreja (que ocasionou a reforma e as novas teorias filosóficas), o fervor religioso dos séculos passados, a arte sagrada teve necessariamente que decair, e com ela as corporações de maçons operativos que desta atividade extraiam sua razão de ser sua subsistência.
Mas aqui e ali, e especialmente na Inglaterra, algumas delas subsistiram, se bem que de forma muito reduzida, passando natural e gradualmente da atividade construtiva que ocasionou sua formação, até se ocupar exclusivamente dos assuntos que antes eram para eles de secundária importância, como por exemplo o estudo e a beneficência.
Sem dúvida contribuiu notavelmente para esta nova orientação de atividade das lojas a admissão que foi feita desde então, sempre mais liberal e numerosa (conforme ia decrescendo seu valor como associações profissionais) de maçons aceitos (accepted freemasons), isto é, membros honorários que nunca tinham exercido uma profissão relacionada com a arte de construir.
Os novos associados, muitas vezes homens de estudo e filósofos eminentes, influíram largamente nestes agrupamentos de antigos construtores, os quais chegaram facilmente a dirigir. Foi assim que as lojas maçônicas profissionais transformaram-se naturalmente em lojas de maçonaria especulativa, nascendo dessa maneira a Maçonaria como atualmente conhecemos. E assim também, muitas doutrinas e tradições iniciáticas e místicas, de diferente origem ou descendência, passaram a incorporar-se à nascente, ou melhor dizendo, renascente instituição. As tradições templárias e rosa-cruzes, em especial, tiveram parte importante nesta transformação. Enquanto as lojas Maçônicas encontravam naquelas doutrinas, a alma que lhes infundia uma vida nova, estas encontraram naquelas o corpo, o veículo ou o meio exterior mais conveniente à sua expressão, o que de outra forma poderia ocorrer de modo estéril e deficiente.
Com o século XVII termina assim o estudo das origens maçônicas; desde o XVIII começa a sua história como instituição moderna preparando-se o futuro, temas dos quais falaremos nos dois "Manuais" que se seguem, desta mesma série.
A "LOJA DE SÃO JOÃO"
O problema das origens maçônicas acha-se delineado e resolvido sinteticamente em poucas palavras na pergunta ritual do Ven. Mestre a todo irmão visitante: De onde vens?, e na resposta deste: De uma Loja de S. J. justa e perfeita.
Esta pergunta é fundamental para o Aprendiz e, à semelhança de Édipo, deve esforçar- se em respondê-la satisfatoriamente, buscando em si mesmo a solução do problema das origens: a origem de seu ser e do universo que o rodeia.
Que representa, pois, para os maçons a expressão "Loja de S. J."?
Já sabemos que a Tradição Maçônica guarda uma relação profundamente íntima com a Tradição Joanita ou mística do Cristianismo (como é claramente demonstrado pela superposição de nossos instrumentos sobre a primeira página do Evangelho de S. J., que representa a Tradição Cristã mais pura, assim como as Tradições Gnósticas e iniciáticas anteriores).
Igualmente sabemos que S. J. foi tomado como patrono pelas Corporações Construtoras da Idade Média, e conhecemos também, o uso - que remonta a uma época remotíssima - de festejar os dois solstícios, cujas datas coincidem respectivamente com as festas cristãs de S. J.
Estas mesmas festas celebravam-se também antes do cristianismo, sendo, em época próxima aos romanos, em honra a Janus, o deus de duas faces que muito bem simboliza a Tradição, estando uma das faces constantemente voltada ao passado e outra ao futuro. Este nome relaciona-se etimologicamente com o latim janua, "porta", de onde vem igualmente o latim januarius, "janeiro". É interessante notar a este respeito que "porta" é também o significado originário da letra grega delta (do semítico daleth), representa por um triângulo, e que a antiga porta das iniciações, era triangular.
Este deus presidia todos os inícios (em latim initium, de onde também initiare, "iniciar") e, em particular, o do ingresso do Sol nos dois hemisférios celestes, e a própria iniciação cuja chave possuía e guardava. Agora, é evidente que o nome Janus tem também em sua forma latina, uma semelhança singular com João (Johannes) e não foi por acaso que este último foi colocado no exato lugar do primeiro.
Por outro lado, o hebraico Jeho-hannam ou João significa "Graça ou favor de Deus", isto é, homem iluminado ou iniciado. Assim é que a justo título pode este último ser chamado irmão ou discípulo de S. J.. A importância iniciática desta escolha tornar-se mais evidente por esta dupla ou bifronte etimologia: a primeira pagã ou voltada ao passado (tradição iniciática da qual constitui a porta ou passagem, e a outra, cristã ou voltada para o futuro (os eleitos ou favorecidos de Deus que continuam e darão prosseguimento à tradição por todos os séculos).
A expressão Loja de S. J. vem a ser assim, um nome simbólico de toda união ou agrupamento de iniciados, de homens iluminados e favorecidos espiritualmente, aplicando-se, em sua acepção mais geral, a todos os que são admitidos nos Mistérios e mais particularmente aos verdadeiros II S. J., os Mestres da Sabedoria que constituem a Grande Loja Branca, a mais justa e perfeita "Loja de S. J.", na qual devemos buscar a inspiração e a origem profunda e verdadeira de nossa Ordem.
Capítulo II
A INICIAÇÃO SIMBÓLICA CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
A cerimônia através da qual são recebidos os candidatos em nossa Associação, é uma pura fórmula arbitrária ou existe nela um significado e uma importância que escapam à observação superficial, e se revelam a uma consideração mais cuidadosa e a um estudo mais profundo?
Está pergunta cada maçom tem o privilégio de responder individualmente na proporção de seu entendimento, e a iniciação, assim como a Maçonaria de modo geral, serão para ele o que ele mesmo nelas reconhecer e realizar. Será esta uma sociedade mundana, e aquela uma simples cerimônia exterior, para quem as considerar com espírito profano e mundano. Será uma Instituição Iniciática e uma cerimônia simbólica (cuja compreensão despertará seu espírito) para quem a estudar e considerar com o propósito de encontrar a verdade: Realidade profunda que constantemente se oculta sob a aparência exterior das coisas.
Para isto é necessário examinar e estudar os diferentes elementos que compõem esta cerimônia, buscando o íntimo significado de cada um deles e seu valor em termos de vida, para aplicação operativa no místico Caminho da existência ao qual deve ser relacionado, para que a cerimônia possa ser individualmente vivida e realizada, e para que aquele que foi recebido Maçom, de uma forma puramente formal e simbólica, se torne efetivamente isso, transformando-se, com o esforço individual, de pedra bruta em pedra lavrada ou filosófica, do estado de homem escravo de seus vícios, erros e paixões, em Obreiro Iluminado da Inteligência Criativa que mora em seu coração, e no do mundo exterior.
Por intermédio deste estudo veremos como as duas características fundamentais de nossa Instituição (a iniciática e simbólica) estão perfeitamente expressadas na cerimônia de recepção do Aprendiz, e como, neste grau, se resume todo o programa da Maçonaria. Assim, na mesma cerimônia, encontram-se alegoricamente reunidos todos aqueles elementos cuja íntima compreensão e prática realização fazem operativa a cerimônia da iniciação.
SIGNIFICADO DA INICIAÇÃO
Ao alcançarmos este ponto, a primeira coisa que se faz necessária é compreender o significado da palavra iniciação e como deve ser interpretada.
Iniciação é uma palavra oriunda do latim initiare, que tem a mesma etimologia de initium, "início ou começo", provindo as duas de interesse, "ingresso em" e de "começo ou princípio de" uma nova coisa. Em outras palavras, iniciação é a porta que conduz a adentrar num novo estado moral ou material, no qual se inicia ou começa uma nova maneira de ser ou de viver.
Este novo estado, esta maneira de ser e viver, é que caracterizam o "iniciado" e o distinguem do profano, enquanto o primeiro, tendo nele ingressado, conhece-o por dentro, enquanto fica fora dele, fora do Templo da Sabedoria ou de um real conhecimento da Verdade e da Virtude, das quais reconhece unicamente os aspectos profanos ou exteriores que constituem a moeda corrente do mundo.
Assim pois, esta admissão não é nem pode considerar-se unicamente como material; não é nem ser e somente a recepção ou aceitação de uma determinada associação, ao contrário, deve considerar-se, inicial e fundamentalmente, como o ingresso em um novo estado de consciência, e num modo de ser interior, do qual a vida exterior é efeito e conseqüência.
É necessária, em outros termos, uma palingenesia, um nascimento ou renascimento interior, uma transformação ou transmutação do íntimo estado de nosso ser, para efetivamente iniciar-se, ou ingressar numa nova visão da realidade: aquela nova maneira de pensar, viver, falar e agir que caracteriza o Iniciado e o Maçom verdadeiro.
Por esta razão, o símbolo fundamental da iniciação é o da morte, como preliminar para uma nova vida; a morte simbólica para o mundo ou para o estado "profano" necessário para o renascimento iniciático; ou seja a negação dos vícios, erros e ilusões que constituem os "metais" grosseiros ou qualidades inferiores da personalidade, para a afirmação da Verdade e da Virtude, ou da íntima Realidade, que constitui o ouro puro do Ser, a Perfeição do Espírito que em nós habita e se expressa em nossos Ideais e em nossas Aspirações mais elevadas.
A CÂMARA DAS REFLEXÕES
A Câmara das reflexões não representa unicamente a preparação preliminar do candidato para sua recepção, mas é principalmente aquele ponto crítico, aquela crise interior, onde começa a palingenesia que conduz à verdadeira iniciação, à realização progressiva, ao mesmo tempo especulativa e operativa, de nosso ser e da Realidade Espiritual que nos anima, simbolizada pelas viagens.
A Câmara das reflexões, com seu isolamento e com suas negras paredes, representa um período de obscuridade e de maturação silenciosa da alma, por meio de uma meditação e concentração em si mesma, que prepara o verdadeiro progresso efetivo e consciente que depois tornar-se-á manifesto à Luz do dia. Por esta razão, encontram-se nela os emblemas da morte e uma lâmpada sepulcral, e acham-se sobre suas paredes, inscrições destinadas a pôr à prova a sua firmeza de propósitos e a vontade de progredir que tem
de ser selada num testamento.
Ao ingressar neste quarto (símbolo evidente de um estado de consciência correspondente), o candidato tem de despojar-se dos metais que porta consigo e que o Experto recolhe cuidadosamente. Tem de voltar a seu estado de pureza original - a nudez adâmica - despojando-se voluntariamente de todas aquelas aquisições que lhe foram úteis para chegar até o seu estado atual, mas que constituem outros tantos obstáculos para seu progresso ulterior.
Deve cessar de depositar sua confiança e cobiça nos valores puramente exteriores do mundo, para poder encontrar em si mesmo, realizar e tornar efetivos os verdadeiros valores, que são os morais e espirituais. Deve cessar de aceitar passivamente as falsas crenças e as opiniões exteriores, com o objetivo de abrir seu próprio caminho para a verdade.
Isto não significa absolutamente que tem de despojar-se de tudo o que lhe pertence e adquiriu como resultado de seus esforços e prêmio de seu trabalho, mas, unicamente, que deve deixar de dar a estas coisas a importância primária que pode torná-lo escravo ou servidor delas, e que deve pôr, sempre em primeiro lugar, sobre toda a consideração material ou utilitária, a fidelidade aos Princípios e às razões espirituais. Este despojo tem por objetivo conduzir-nos para sermos livres dos laços que de outra forma impediriam todo nosso progresso futuro. Trata-se, portanto, em essência, do despojo de todo apego às considerações e laços exteriores, com a finalidade de que possamos ligar- nos à nossa íntima Realidade Interior, e abrir-nos à sua mais livre, plena e perfeita expressão.
"LIVRE E DE BONS COSTUMES"
Ser "livre e de bons costumes" é a condição preliminar que é pedida ao profano para poder admiti-lo em nossa Ordem, condição necessária tanto de todo progresso moral como espiritual, de toda evolução na senda da Verdadeira Luz, ou ainda, da Verdade e da Virtude.
Livre dos preconceitos e dos erros, dos vícios e das paixões que embrutecem o homem e fazem dele um escravo da fatalidade. De bons costumes por ter orientado sua vida para aquilo que é mais justo, mais elevado e perfeito. Estas duas condições tornam latente em cada homem a qualidade do maçom e a possibilidade de fazer-se ou "ser feito" como tal, enquanto em sua plenitude, o caracteriza essa mesma qualidade. Na medida de sua liberdade interior e da orientação ideal de sua vida, o homem é e "se faz" um verdadeiro maçom, um obreiro da Inteligência Construtora do Universo.
O despojo dos metais é assim, o despojo voluntário da alma, de suas qualidades inferiores, de seus vícios e paixões, dos apegos materiais que turvam a pura - luz do Espírito; o abandono das qualidades e aquisições que brilham com luz ilusória na inteligência e impedem a visão da Luz Maçônica, a Realidade que sustenta o Universo e o constrói incessantemente.
O intelectual deve igualmente despojar-se de suas crenças e preconceitos, as crenças e prejulgados científicos e filosóficos tanto quanto as superstições e preconceitos religiosos e vulgares, para que diante de seus olhos possa abrir-se o Caminho da Luz e da Verdade, aonde prepara para assentar seus pés.
Como o maçom deve aprender a pensar por si mesmo, atingindo a certeza e o conhecimento direto da Verdade, de nada lhe servem as crenças e prejulgados que constituem a moeda corrente do mundo, as aquisições materiais, como as quais nunca a Verdade pode ser paga ou comprada, e a qual o maçom deve alcançar pelo seu esforço individual.
SIGNIFICADO DA CÂMARA
A Câmara de reflexões, como o seu nome o indica, representa antes de tudo aquele estado de isolamento do mundo exterior que é necessário para a concentração ou reflexão íntima, com a qual nasce o pensamento independente e é encontrada a Verdade. Aquele mundo interior para o qual devem dirigir-se nossos esforços e nossas análises para chegar, pela abstração, a conhecer o mundo transcendente da Realidade. É o "gnothi seautón" ou "conhece-te a ti mesmo" dos iniciados gregos e hindus, como único meio direto e individual para poder chegar a conhecer o Grande Mistério que nos circunda e envolve nosso próprio ser.
Isto, e a cor negra do quarto, trazem-nos à mente a antiga fórmula alquímica e hermética do Vitríolo: "Visita Interiora Terrae, Rectificando Invenies Occultum Lapidem", Visita ao interior da Terra: retificando encontrarás a pedra escondida". Isto é: desce às profundezas da terra, sob a superfície da aparência exterior que esconde a realidade interior das coisas e a revela; retificando teu ponto de vista e tua visão mental com o esquadro da razão e o discernimento espiritual, encontrarás aquela pedra oculta ou filosofal que constitui o Segredo dos Sábios e a verdadeira Sabedoria.
A representação da Verdade final e fundamental por uma pedra, não demonstra nada de estranho se imaginarmos que deve constituir a base sobre a qual descansa o edifício de nossos conhecimentos, que transformar-se-á na Igreja ou Templo de nossas aspirações, e o critério ou medida sobre a qual, e a cuja imagem, devem enquadrar-se ou retificar-se todos os nossos pensamentos.
Os ossos e as imagens da morte que se encontram representadas nas paredes da câmara, além de indicar a morte simbólica que é pedida ao candidato para que complete seu novo nascimento, mostram os fragmentos esparsos e desunidos da Realidade morta e dividida na aparência exterior, cuja Vida e Unidade ele deverá buscar e encontrar interiormente, reconhecendo-a sob a aparência e dentro dela.
O GRÃO DE TRIGO
O quarto de reflexões constitui a prova da terra - a primeira das quatro provas simbólicas dos elementos - e, através de sua analogia, conduz-nos aos Mistérios de Elêusis, nos quais o iniciado era simbolizado pelo grão de trigo atirado e sepultado no solo, para que germinasse abrisse, por seu próprio esforço, um caminho para a luz.
A semente, na qual se encontra em estado latente ou potencial toda a planta, representa muito bem as possibilidades latentes do indivíduo que devem ser despertadas e manifestadas à luz do dia, no mundo dos efeitos. Todo ser humano, é, efetivamente, um potencial espiritual ou divino, idêntico ao potencial latente da semente, que deve ser desenvolvido ou reduzido à sua mais plena e perfeita expressão, e este desenvolvimento é comparável, em todos os sentidos, ao desenvolvimento natural e progressivo de uma planta.
Assim como a semente, para poder germinar e produzir a planta, deve ser abandonada ao solo, onde morre como semente, enquanto o germe da futura planta começa a crescer, assim também, o homem, para manifestar as possibilidades espirituais que nele se encontram em estado latente, deve aprender a concentrar-se no silêncio de sua alma, isolando-se de todas as influências externas, morrendo para seus defeitos e imperfeições a fim de que o germe da Nova Vida possa crescer e manifestar-se.
Uma vez que o Germe espiritual, a Divina Semente de nosso ser, é imortal e incorruptível, esta morte - como toda forma de morte, sob um ponto de vista mais profundo - é simplesmente o despojo de uma forma imperfeita e a superação de um estado de imperfeição, que foram no passado um degrau indispensável ao nosso progresso, mas que a atualidade transformaram-se numa limitação e ao mesmo tempo numa necessidade; na oportunidade e na base para um novo passo adiante.
Essa imperfeição ou limitação que deve ser superada - os estreitos limites em que se acha enclausurado nosso pensamento e nosso ser espiritual pelos erros e falsas crenças assimiladas na educação e na vida profana - é o que simboliza a casca da semente, produzida por esta como proteção necessária em seu período de crescimento, e inteiramente análoga à casca mental de nosso próprio caráter e personalidade.
O PÃO E A ÁGUA
Essa semente, que deve morrer na terra para produzir a nova vida da planta, cuja perfeição encerra em estado potencial, morreu efetivamente no pão que está sobre a mesa da câmara de reflexões, para simbolizá-la. Esta pão, representa além disso a substância que constitui o meio pelo qual a vida se manifesta em todas as suas formas, a matéria prima continuamente o mecanismo incessante da renovação orgânica, passando de um a outro estado, de uma a outra forma de existência.
Ao lado do pão, encontra-se um copo com água, ou seja aquele elemento úmido - outro aspecto da própria Substância Mãe - que é fator e condição indispensável de crescimento, germinação, maturação, reprodução e regeneração. Como a Vênus Anadiômera, que se transforma em Vênus Genitrix; a Mãe Universal, também a Vida somente pode nascer do seio das águas, enquanto que a terra mitologicamente simbolizada por Géa e Deméter (às quais estavam consagradas os Mistérios de Elêusis) converte-se na nutris.
Estas duas formas complementares da Substância Una, atuam constantemente uma sobre a outra, como podemos observar em todos os processos biológicos; em seu estado primitivo, o pão representa o carbono que sob a forma de ácido carbônico, é encontrado na atmosfera, e que a vida vegetal transforma nos hidrocarbonatos, substâncias básicas que constituem todas as partes da planta, das quais nascem posteriormente as proteínas. Todas estas produções necessitam como base o elemento úmido, que pode comparar-se à Matriz - Templo e Oficina de toda a atividade orgânica.
Finalmente, o pão e a água possuem moralmente fundamentos de sobriedade e sensibilidades indispensáveis para a vida do iniciado, e juntamente com o despojo dos metais, este demonstra seu discernimento, que o faz buscar unicamente o essencial - os verdadeiros Valores da existência, que só podem nos dar paz, felicidade e satisfação, fazendo-se fatores de nosso progresso interior em Sabedoria e Virtude -, eliminando todas as superfluidades e complicações da vida profana, em cuja busca o homem ordinário perde suas melhores energias.
O SAL E O ENXOFRE
Uma vasilha de sal e uma de enxofre encontram-se também sobre a mesa, junto com o pão e a água. Ainda que o primeiro seja habitualmente conhecido como um condimento, sua associação simbólica com o segundo não deixa de parecer algo estranho e misterioso. O que significam pois, estes dois novos elementos, este novo casal hermético, que se une ao anterior?
Trata-se de um novo tema de meditação que é apresentado ao candidato, sobre os meios e elementos com os quais deve se preparar para uma nova Vida, iluminada pela Verdade e concebida, ativa e fecunda com a prática da Virtude, a que se referem o Enxofre e o Sal em sua mais elevada acepção.
Como tal, indica o primeiro a Energia Ativa, que se torna a Força Universal, o princípio criador e a eletricidade vital que produzem e animam todo crescimento, expansão, independência e irradiação. Enquanto que o segundo é o princípio atrativo que constitui o magnetismo vital, a força conservadora e fecunda que inclina à estabilidade e produz toda maturação, a capacidade assimilativa que tende para a cristalização, o princípio da resistência e a reação centrípeta que se opõe à ação ativa da força centrífuga.
Assim pois, da mesma maneira que no pão e na água vimos os dois aspectos da Substância cósmica e vital, nestes dois novos elementos temos os dois aspectos ou polaridades da Energia Universal, dirigido o primeiro de dentro para fora, aparecendo exteriormente como direito (ou destro), e o segundo de fora para dentro, manifestando- se como esquerdo (ou sinistro).
São respectivamente, rajas tamas - os dois primeiros gunas (ou qualidades essenciais) da filosofia hindu -, e o impulso ativo que produz toda mudança e variação, e engendra no homem o entusiasmo e o amor à atividade, o desejo e a paixão. A tendência passiva para a inércia e a estabilidade é inimiga de mudanças e variações, produzindo em nosso caráter, firmeza e persistência, e com seu domínio da mente, a ignorância, a inconsciência e o sentido da materialidade, que nos prendem às necessidades e preocupações exteriores e aos instintos destinados à proteção da vida em suas primeiras etapas.
O primeiro nos impele constantemente para cima e para a frente, anima-nos e nos dá firmeza em todos nossos passos, dá-nos o ardor, a iniciativa, o espírito de conquista, a vontade e a capacidade de satisfazer nossos desejos e conseguir o objetivo de nossas aspirações; mas, dá-nos também, a inquietude, a inconstância e o amor das mudanças e novidades, a impulsividade que nos inclina para ações inconsideradas, fazendo-nos recolher frutos maduros e perder os melhores e mais desejáveis resultados de nossos esforços.
O segundo é aquele que nos refreia e desalenta; faz com que nos recolhamos em nós mesmos, dá-nos o temor e a reflexão, faz-nos abraçar e estabelecer igualmente o erro e a verdade, os hábitos viciosos e virtuosos faz-nos fiéis e perseverantes, firmes em nossa vontade e tenazes em nossos esforços; dá-nos a capacidade de atrair aquilo com o que estamos interiormente sintonizados por nossos desejos, pensamentos, convicções e aspirações. Dá-nos a desilusão e o discernimento, afasta-nos das mudanças e de toda ação irrefletida, mas também, de todo progresso, esforço e superação.
São as duas colunas ou tendências que se achar constantemente ao nosso lado, em cada um de nossos passos sobre o caminho da existência, e nossa felicidade, paz e progresso efetivo baseiam-se em nossa capacidade de manter em cada momento um justo e perfeito equilíbrio entre estas tendências opostas, conservando-nos a igual distância de uma e de outra, sem deixar que nenhuma das duas adquira um predomínio indevido sobre nós, mas que trabalhem em perfeita harmonia, dando-nos, cada uma delas, suas melhores qualidades: o ardor reflexivo e a paciência iluminada, o entusiasmo perseverante e a serenidade inalterável, o esforço vigilante e a firmeza incansável, que também simbolizam sobre a parede da câmara, o galo e a clepsidra.
O MERCÚRIO VITAL
A ação e interação entre estas duas tendências opostas, é pois, destinada a produzir em nós, ativando o estado latente que se encontra dentro de nosso Germe Espiritual, o mercúrio vital ou princípio da Inteligência e Sabedoria, que corresponde ao salva da filosofia hindu: o ritmo da natureza, produzido pela lei de Harmonia e Equilíbrio.
O pensamento em todos seus aspectos, nasce pois, naturalmente no indivíduo, da ação e relação entre suas tendências ativas e passivas, entre o amor e o ódio, a atração e a repulsão, a simpatia e a antipatia, o desejo e o temor. Cresce e adquire sempre maior força, independência e vigor quando lutam entre si o instinto e a razão, a vontade e a paixão, o entusiasmo e a desilusão. Eleva-se e floresce, sempre mais livre, claro e luminoso, conforme aprende a seguir seus ideais e aspirações mais elevadas, e quando estas conseguem sobrepor-se à sua ignorância, erros e temores, assim como às demais tendências passionais e instintivas.
Em outros termos, o pensamento nasce, cresce, se eleva e sublima, conseguindo alcançar horizontes sempre mais altos, amplos e iluminados, conforme predomine na mente e em toda a personalidade o elemento ou vibração sátvica, o princípio do equilíbrio e da harmonia, que produz a Música das Esferas e engendra toda a criação e concepção caracterizada por sua genialidade e formosura. Pois este mercúrio sublimado é o único que pode perceber a Verdadeira Luz, que se torna, com seu reflexo mental luz criadora, simbolizada pela Vênus Celestial, antiga divindade da Luz, e portanto da beleza que a acompanha.
O fogo rajásico, aceso no homem, inicialmente pelos desejos e paixões, e depois pela vontade, o entusiasmo e suas mais nobres aspirações (que constituem o enxofre em seus diferentes aspectos), agindo sobre a substância tamásica dos instintos, temores e tendências conservadoras (o sal da reflexão), que constitui a matéria-prima de nosso caráter, faz fermentar, ferver e sublimar esta massa heterogênea no crisol da vida individual, produzindo finalmente esse mercúrio refinado ou elemento sátvico, ou seja a Sabedoria, nascida da transmutação - por meio da sublimação e refinamento - da ignorância, do erro, do temor e da ilusão.
O TESTAMENTO
O novo nascimento ou regeneração ideal que indica, em todos seus aspectos, a câmara de reflexões, tem finalmente o seu selo e concretiza-se por um testamento, que é fundamentalmente um atestado ou reconhecimento de seus "deveres", ou seja de sua tríplice relação construtiva, com o princípio interior (individual e universal) da vida, consigo mesmo como expressão individual da Vida Una, e com seus semelhantes, como expressão exterior da própria Vida Cósmica.
Trata-se de um testamento iniciático bem diferente do testamento ordinário ou profano. Enquanto este último é uma preparação para a morte, o testamento simbólico pedido ao recipiendário, antes de sua admissão às provas, é uma preparação para a vida - para a nova vida do Espírito para a qual deve renascer.
Morte e nascimento são na realidade, dois aspectos intimamente entrelaçados e inseparáveis de toda mudança que se verifica na forma expressão, interior e exterior, da Vida Eterna do Ser. Na economia cósmica, e da mesma forma na vida individual, a morte, cessação ou destruição de um aspecto determinado da existência subjetiva e objetiva, é constantemente acompanhada de uma forma de nascimento. Assim pois, só em aparência os consideramos como aspectos opostos da Vida, ou como seu princípio e fim, enquanto indicar simplesmente, uma alteração ou transformação, e o meio no qual se efetua um progresso sempre necessário, ainda que a destruição da forma não seja sempre sua condição indispensável.
Como emblema da morte do homem profano, indispensável para o nascimento do iniciado, o testamento que faz o candidato é um testamento do qual ele mesmo será posteriormente chamado a converter-se em executor, um Programa de Vida que deverá realizar com uma compreensão mais luminosa de suas relações com todas as coisas.
A primeira relação ou "dever" do testamento é a do próprio indivíduo com o Princípio Universal da Vida, uma relação que tem de reconhecer-se e estabelecer-se interiormente, e não sobre a base das crenças ou prejuízos, sejam positivos ou negativos. Não se pergunta ao candidato se crê ou não em Deus, nem qual é seu credo religioso ou filosófico; para a Maçonaria todas as "crenças" são equivalentes, como outras tantas máscaras da Verdade que se encontram atrás ou sob a superfície delas e somente à qual aspira a conduzir-nos.
O que é de importância vital é nossa íntima e direta relação com o Princípio da Vida (qualquer que seja o nome que lhe dê externamente, e o conceito mental que cada um possa ter formado ou dele venha a formar, uma relação que é estabelecida na consciência, além do plano da inteligência ou mentalidade ordinária, sendo só diretamente nela onde pode manifestar-se aquela Luz "que ilumina a todo homem que vem a este mundo".
A consciência desta relação, que é Unidade e Individualidade, traduz-se no sentido da primeira pergunta do testamento: "Quais são os vossos deveres para com Deus?" A segunda: "Quais são os vossos deveres para vós mesmos?" nada mais é do que a conseqüência da primeira. Tendo-se reconhecido, no íntimo de seu próprio ser, naquela solidão da consciência que está simbolizada pela câmara de reflexões como uma manifestação ou expressão individual do Princípio Universal da Vida, o candidato é chamado a reconhecer o modo pelo qual sua vida exterior se encontra intimamente relacionada com o que ele mesmo é interiormente, e como a compreensão desta relação tem em si o poder de dominá-la e dirigi-la construtivamente.
O homem é, como manifestação concreta, o que ele mesmo se fez e faz constantemente, com seus pensamentos conscientes e subconscientes, sua maneira de ser e sua atividade. Seu primeiro dever para consigo mesmo é realizar-se e chegar sempre a ser a mais perfeita expressão do Princípio de Vida que nele busca. E encontra uma especial diferente e necessária manifestação, deduzindo ou fazendo aflorar à luz do dia, as possibilidades latentes do Espírito, aquela Perfeição que existe imanente, mas que só se manifesta no tempo e no espaço, na medida do íntimo reconhecimento individual.
Quanto aos deveres para com a humanidade, estes representam um sucessivo reconhecimento íntimo que é complemento necessário dos dois primeiros: tendo-se reconhecido como a manifestação individual do Princípio Único da Vida, e sabendo que ele é por fora o que realiza por dentro, deve acostumar-se a ver em todos os seres outras tantas manifestações do próprio Princípio. Deste reconhecimento, brota como conseqüência necessária o seu dever ou relação para com a humanidade, que não pode ser outra coisa que a própria fraternidade.
A compreensão desta tríplice relação é o princípio da iniciação, o início efetivo de uma nova vida, o testamento ou doação que é feita para si próprio, preparando-se para executá-lo. É a preparação necessária para as viagens ou etapas sucessivas do progresso que o aguardam.
A PREPARAÇÃO
Antes de ser admitido no Templo, é necessário que seja feito um preparo físico correspondente ao preparo moral que o candidato fez na câmara de reflexões: os olhos devem ser vendados, coloca-se-lhe uma corda no pescoço e descobre-se o lado esquerdo de seu peito, o joelho direito e o pé esquerdo.
Que significa esta preparação?
A venda que lhe cobre os olhos não é simplesmente o símbolo do estado de ignorância ou cegueira, de sua incapacidade para perceber a verdadeira Luz. Como preparação para ser admitido no Templo, é evidente a necessidade de uma constituição da obscuridade da câmara de reflexões, uma cegueira voluntária, um isolamento das influências do mundo exterior e da luz ilusória dos sentidos como meio para chegar à percepção espiritual da Verdade.
O cordão que lhe cinge o colo, lembra-nos o dos frades, assim como o cordão umbilical que une o feto à mãe no período de sua vida intra-uterina. Além de indicar o estado de escravidão as suas paixões, erros e preconceitos, em que o homem se encontra nas trevas do mundo profano, o jugo da fatalidade que pesa sobre ele, mostra seu desejo, vontade e capacidade de libertar-se deste jugo e desta escravidão, aceitando voluntariamente as provas da vida e cooperando com a sua disciplina. desta forma, os próprios obstáculos, dificuldades e contrariedades, convertem-se em graus e meios de progresso.
Finalmente, o triângulo da nudez, que constitui o terceiro elemento desta simbólica preparação, é um novo despojo voluntário de tudo o que não é estritamente necessário e constituiria um obstáculo ao progresso posterior - o despojo de todo convencionalismo que impede a sincera manifestação de seus sentimentos e de suas aspirações mais profundas (nudez do peito esquerdo); do orgulho intelectual, que impede o reconhecimento da Verdade (nudez do joelho direito); da insensibilidade moral, que impede a prática da Virtude (nudez do pé esquerdo).
A perfeita sinceridade das aspirações é, pois a primeira condição de todo progresso; mas faz-se necessário com ela um bem compreendido espírito de humildade (que não deve confundir-se com um falso desprezo de si mesmo, nem com a ignorância das divinas possibilidades que se encontram em nós mesmos), dado que nosso progresso deve desenvolver-se num plano superior à ilusão da personalidade. Com a primeira destas duas qualidades abrimos nosso coração, e com a segunda nossa inteligência ao sentimento e à percepção daquela Realidade que Jesus chamou o Reino dos Céus, meta de toda iniciação.
Enquanto a nudez do pé esquerdo - o instrumento do caminhar que abre nossa marcha para a frente - indica a faculdade do discernimento que devemos usar em cada passo de nosso caminho e que nos permite reconhecer a verdadeira natureza dos obstáculos e provas do caminho, nos quais podemos tropeçar.
Com este preparo, o candidato encontra-se em condições de bater à porta do Templo, de pedir, buscar e encontrar a Luz da Verdade.
A PORTA DO TEMPLO
A porta tem sido desde as mais antigas épocas, o símbolo natural de toda passagem ou entrada, e em particular, de toda iniciação. Além disso, a porta já é por si mesma um Templo (um Templo rudimentar) e o ternário de suas duas colunas com a arquitrave, constitui o elemento fundamental de toda construção arquitetônica. Assim pois, o momento de franquear a Porta do Templo depois de dupla preparação moral e física de que acabamos de falar, é um dos mais importantes da cerimônia de iniciação.
O candidato é introduzido, depois de três fortes golpes, golpes desordenados que revelam uma mão todavia inexperta ou profana. Por esta razão, seus golpes produzem alarma no interior do Templo, alarma que se repete por três vezes, como eco dos mesmos. Isto relaciona-se com as palavras evangélicas: buscai e encontrareis (a Verdade), pedi e vos será dada (a luz), batei e vos será aberta (a Porta do Templo).
Ao ser recebido no Templo, com os olhos vendados, somente sente sobre o seu peito nu, a ponta de uma arma cortante. Isto serve unicamente para fazê-lo entender que ainda que não veja, pode sentir, e o sentimento da Verdade será o Guia que o conduzirá em seu progresso e em seus esforços para a Luz.
O Guia interior, que conduz individualmente a todo o que se torna receptivo à sua influência no Caminho da Verdade e da Vida, acha-se materializado exteriormente pelo Experto (ou seja quem for, que por tê-lo já percorrido, conhece bem o Caminho e pode assim servir de guia ao inexperiente), sem o qual seria impossível ao candidato preencher devidamente as condições que lhe são pedidas para a sua admissão.
É o guia quem responde por ele à pergunta: "Quem é o temerário que se atreve a perturbar nossos pacíficos trabalhos e tenta forçar a Porta do Templo?, dizendo que "É um profano desejoso de conhecer a Luz Verdadeira da Maçonaria o que solicita humildemente por ter nascido livre e de bons costumes".
Do significado iniciático desta dupla condição, já tratamos por ocasião do despojo dos metais. Este requisito é de fundamental importância uma vez que, em virtude do mesmo abre-se-lhe a primeira porta do Templo, assim como as três portas simbólicas, representadas pelas três Luzes, depois de cada uma das viagens.
A ponta da espada, apoiada sobre o coração, é o símbolo da Verdade, através da sua intuição que ocorre ou se manifesta diretamente no íntimo de nosso ser, ao adentrarmos ao Templo, isto é, num particular estado de devoção receptiva, tendo-nos isolado das influências exteriores e fechado nossos olhos à vista profana e à consideração ordinária, puramente objetiva das coisas.
Ainda que não vejamos, sentimos; ainda que não saibamos explicar a nós mesmos o por que e a razão dos acontecimentos, percebemos intuitivamente alguma coisa que reconhecermos diretamente como Verdade e que se manifesta em nossa consciência pela forma repentina e violenta da qual a espada apoiada sobre nosso peito constitui símbolo muito expressivo.
INTERROGATÓRIO DO CANDIDATO
O interrogatório a que se submete o candidato em seu primeiro ingresso no Templo, é de certa maneira a continuação e a expressão de suas meditações na câmara de reflexões.
As perguntas que lhe são feitas, versam inicialmente sobre suas próprias respostas às perguntas do testamento, pedindo-se-lhe os necessários esclarecimentos sobre os conceitos ali expressos a respeito de como entende sua relação e portanto seus deveres, "para com Deus, para si mesmo e para com a humanidade".
Uma vez esclarecido este ponto, e como necessária conseqüência da compreensão desta relação e destes deveres (cujo reconhecimento faz o maçom, enquanto põe o homem em harmonia com o Princípio Construtivo ou Lei Evolutiva do Universo), pode-se-lhe que expresse suas idéias sobre o vício e a virtude.
Um claro discernimento entre o vício e a virtude é o que torna operativo o reconhecimento dos deveres e conduz o homem a progredir sobre o caminho da Liberdade. O vício é, pois, como o diz a própria etimologia da palavra, um "vínculo, laço ou liame", uma corrente que escraviza o homem e impede ou dificulta o seu progresso, reduzindo ou atrofiando seus esforços para a expressão de suas possibilidades mais elevadas.
O homem escravo do vício nunca poderá ser um verdadeiro maçom, uma vez que lhe falta o requisito essencial, com o qual pode tornar-se virtuoso: ser livre e de bons costumes.
Assim como na idéia do vício está implícita a idéia de escravidão, sujeição, passividade e debilidade, sendo o inferior aquele que domina e limita o superior, assim na idéia de virtude está implícita a idéia de "força" que faz do humanus (o filho de Humus ou Bhumi, a terra), um vir ou vira, isto é, um "herói", um Hércules, no sentido moral e etimológico do homem que por meio de seus "esforços pessoais" ou fadigas, domina e supera suas próprias debilidades.
Estabelecer o domínio do superior sobre o inferior, do espiritual sobre o material, do Ideal sobre as imperfeições manifestas, heis aqui o programa de todo verdadeiro maçom, de todo iniciado na Verdade e na Virtude. Por esta razão, uma clara definição deste ponto é preliminarmente necessária para a efetivação de todo o progresso posterior.
AS VIAGENS
Toda possibilidade de progresso, tanto interior como exterior, baseia-se no reconhecimento de um caminho como algo que está diante de nós, e no discernimento de uma determinada direção, rumo a uma meta que percebemos com maior ou menor clareza.
Nossos pés físicos, assim como nossos pensamentos, que de uma maneira análoga, passo a passo, parecem dirigir-se em certo sentido, marcham precisamente de forma espontânea e automática, naquela exata direção na qual se fixa nosso olhar, ou melhor, nossa visão interior. Se nosso olhar e nossa visão se fixam em algum obstáculo, dificuldade, contrariedade e condição indesejável, no temor ou pressentimento de algo desagradável, não devemos pois, estranhar se formos dar direta e precisamente nesse obstáculo, ou, no objeto de nossos temores.
Além disso, uma percepção ou visão obscura e indefinida e dificulta nossa marcha e faz nossos passos incertos e vacilantes, pelo que tropeçamos continuamente com os obstáculos que aparecem no caminho, enquanto que ao divisarmos adiante de nós perfeitamente nossa senda, com toda clareza e discernimento, nossa marcha é fácil, rápida, direta e segura, e superarmos facilmente todos os obstáculos que possamos encontrar.
O mesmo sucede com nossa marcha intelectual em direção à Verdade e com a marcha moral rumo a um ideal de perfeição, que se revela sempre com maior clareza conforme avançamos na senda que deve conduzir-nos à sua realização. A essa mesma Lei obedecem nossos esforços dirigidos para um particular objetivo, para o qual tendem e no qual se concentram nossos desejos e aspirações: a marcha é mais fácil, rápida e direta conforme aprendemos a concentrar nesse objeto as melhores energias de nosso pensamento e, sobretudo, a contemplá-lo, vê-lo e discerni-lo com perfeita clareza.
A concentração de nossas energias interiores em direção a uma meta determinada é, em todo caso, a base indispensável de todo esforço que possamos fazer e de todo passo que possamos dar nessa direção.
A cerimônia de recepção do candidato no primeiro grau, consiste essencialmente de três viagens que sintetizam admiravelmente todo seu progresso maçônico nos três graus. Cada viagem representa assim um novo estado, um período diferente e uma nova etapa de seu progresso.
A PRIMEIRA VIAGEM
A primeira viagem apresenta-se cheia de dificuldades, de ardis e perigos, e completa-se em meio aos ruídos mais fortes e variados, que representam o desencadeamento das tempestades e dos ventos, símbolos das falsas crenças, opiniões e correntes contrárias do mundo, como as que temos que enfrentar. É a prova do ar das antigas iniciações, como é demonstrado pela purificação pelo ar que coroa esta viagem.
A direção desta viagem, como das sucessivas, é aquela que é indicada silenciosamente pelo guia invisível que o conduz, e que ele tem de seguir com docilidade e confiança. Essa docilidade (palavra derivada de docere, "ensinar", que por sua vez tem evidente analogia com ducere, "conduzir"), é a que o faz receptivo e o coloca em condições de aprender. No que diz respeito ao guia, representa, como já dissemos, o sentido íntimo, do justo, do bom e do verdadeiro, pois é o guia invisível e silencioso de todo homem, o único que pode realmente conduzir-nos pelo caminho do progresso.
Essa direção é de Ocidente a Oriente pelo lado do Norte. O que significam estes pontos cardeais?
Aqui abrangemos uma das fases mais profundas e instrutivas do segredo maçônico: da mística doutrina que se esconde e se revela em seu simbolismo.
DO OCIDENTE AO ORIENTE
O Ocidente é o lado ou aspecto do mundo aonde o Sol se põe, isto é, onde a luz que o ilumina declina, se oculta e se torna invisível ainda que faça entrever sua presença, no último resplandecer do ocaso, antes de deixar o mundo submergido nas escuras trevas da noite. É portanto, uma imagem muito expressiva do mundo sensível, da realidade visível que constitui o aspecto material, fenômeno ou objetivo do Universo, no qual a verdadeira luz que o ilumina, a Essência ou Realidade invisível que o suporta, ocultou- se na aparência, sob o velame comparativamente ilusório de sua realidade exterior.
O Real não é o que aparece, senão o que se esconde e revela atrás da aparência. Reconhecer essa Realidade constitui a substância de toda a iniciação, que consiste essencialmente em ingressar em sua percepção intuitiva, em adquirir consciência da mesma com um progressivo e sempre mais perfeito discernimento entre o que é e o que parece. É a Doutrina Iniciática de todos os tempos: a Realidade se oculta na aparência, na qual se acha, como Isis, velada e revelada, desvelando-se unicamente para o iniciado que tenha chegado individualmente, por seus próprios esforços, ao estado de consciência em que se torna manifesta sua natureza essencial.
Quanto à Essência ou Realidade íntima, Imanente e Transcendente, é a que se acha representada simbolicamente pelo lado oposto, o Oriente, o aspecto do mundo de onde nos vem, nasce e emana a Luz. Onde a realidade aparece e brilha por seu próprio resplendor, esclarecendo e fazendo fugir as trevas da noite.
Partindo do Ocidente, ou do conhecimento objetivo da realidade exterior, o homem encaminha-se pela fria escuridão do Setentrião - a razão pura - em busca daquela Realidade que constitui a essência mais permanente e profunda do Universo, e que não pode ser encontrada senão caminhando para o Oriente, dos efeitos às Causas, desde os fenômenos aos números, Leis e Princípios que os regem.
Esta busca numa obscuridade inicial, que irá depois esclarecendo-se conforme avança no caminho, está representada pela região fria e tenebrosa do Norte, que deve ser atravessada com passo firme e perseverante, sem deixar que ela assuste ou desvie, pelas dificuldades e obstáculos que se encontram no caminho que conduz "da Ilusão" à Realidade".
DO ORIENTE AO OCIDENTE
No curso desta primeira viagem, não pode o candidato deter-se no Oriente pois deve retornar imediatamente ao Ocidente, passando, desta vez, pelo caminho mais luminoso e agradável do Meio-dia. Isto quer dizer que uma vez atingida a primeira percepção, ocorrido o primeiro vislumbre da Realidade profunda das coisas, não deve o candidato nela deter-se, mas deve prosseguir seu caminho, voltando outra vez ao Ocidente da aparência sensível, mas com a consciência iluminada pelo reflexo desta aquisição, estado que simboliza o Meio-dia.
Ou seja, uma vez atingido o conhecimento rudimentar das causas que regem os efeitos do mundo visível, e das Leis e Princípios que governam o mundo, deve completar o esforço indutivo, que o fez chegar a este conhecimento, com um análogo esforço dedutivo, no qual encontra a oportunidade e lhe é imposta a necessidade de uma aplicação fecunda e construtiva dos conhecimentos adquiridos.
Como a dedução não é geralmente mais difícil que a indução, o caminho de regresso não está menos semeado de obstáculos e dificuldades. Entretanto, a certeza já adquirida em sua passagem pelo Oriente, permite-lhe enfrentar com mais serenidade as crenças, opiniões e preconceitos do mundo, que já não tem poder para fazê-lo desviar-se do seu caminho. Esta é a purificação pelo ar que deve sofrer ao chegar ao término desta primeira viagem, próximo ao altar do 2° Vigilante.
Também simboliza esta viagem as provas da vida que temos de enfrentar constantemente em seus primeiros esforços desde o material até o Ideal, dominando seus instintos, paixões e desejos, assim como as circunstâncias contrárias que o confrontam, por meio do discernimento da realidade profunda da vida e do íntimo propósito de todas suas experiências, buscando a Verdade e servindo-se da mesma como remédio para todos seus males, conforme ensina Pitágoras em seus Versos Áureos:
"Mas existe uma estirpe divina entre os mortais, Da qual se chegares a ser partícipe,
Conhecerás as coisas que te ensino,
E servindo-lhe delas como remédio
Do muitos males, farás livre tua alma!"
A SEGUNDA VIAGEM
A segunda viagem diferencia-se da primeira por sua maior facilidade: desapareceram os obstáculos, e os ruídos violentos deixaram seu lugar ao tinido argênteo das espadas que os presentes fazem entrechocar.
Esta maior facilidade é conseqüência direta dos esforços feitos na primeira viagem. À medida em que aprendemos a superar os obstáculos que se encontram em nosso caminho, estes progressivamente desaparecem, pois já não tem razão de existir, uma vez desenvolvida em nós a capacidade de superá-los, com as qualidades que nos faltavam.
O choque das espadas é o emblema das lutas que travam ao redor do candidato, assim como da luta individual que ele deve empreender com suas próprias paixões, pensamentos, hábitos e tendências negativas: todo pensamento deve ser retificado, todo erro resolvido e convertido em Verdade. Indica sobretudo a negação do erro (ainda que tenha a força da aparente evidência exterior), na luz da Superior Realidade, da qual tem- se percebido os primeiros vislumbres.
A segunda viagem pretende relacionar-se com esta hora de incessante transmutação, com esta progressiva catarse da palavra inferior, que requer uma constante atenção e vigilância, que representa simbolicamente a prova da água, isto é, aquela espécie de batismo filosófico que consiste em limpar ou libertar a alma de seus erros, vícios e imperfeições que constituem a raiz ou causa interior de todo mal ou dificuldade exterior.
A primeira viagem representa os primeiros esforços na busca da luz ou da Verdade, os primeiros passos desde as sobras da Ilusão em direção à Realidade íntima e profunda que é a Essência, a Substância e a Base imanente de tudo. Também representa, em seu regresso, o esforço individual que cada um deve fazer para caminhar e processar sua vida em harmonia com seus Ideais e com suas aspirações mais elevadas, deixando de seguir passivamente a rotina de seus hábitos, instintos e tendências negativas.
Como complemento destes primeiros esforços, a segunda viagem indica a perseverança nesta obra metódica de purificação da alma, que a fará digna de receber ou abrir-se às suas mais elevadas possibilidades, o batismo da água, ou seja a negação do negativo (sendo a água o elemento negativo por excelência) que deve preceder ao batismo do fogo, ou do espírito, ou seja à afirmação do positivo que levará consigo um perfeito estabelecimento da Verdade.
A purificação pela água, com a qual é concluída esta segunda viagem é essencialmente uma purificação da imaginação e da mente, de seus erros e de seus defeitos, constituindo uma fase importante daquela Grande Obra de redenção e regeneração individual que a iniciação maçônica nos mostra com seu particular simbolismo.
A TERCEIRA VIAGEM
Representando a segunda viagem principalmente a virtude negativa, que consiste em purificar a alma de suas paixões, erros e defeitos, mais do que um objetivo para cada um, constitui a necessária preparação para a etapa sucessiva que nos indica a terceira viagem.
Esta se completa com uma facilidade ainda maior que as precedentes, tendo desaparecido por completo os obstáculos e ruídos. Somente são ouvidos os acordes de uma música cadenciada e profunda que parece sair do próprio silêncio.
Tendo o iniciado dominado e purificado a parte negativa de sua natureza, que é a causa dos ruídos e das dificuldades externas, é natural que estas tenham completamente desaparecido. Agora deve familiarizar-se com a energia positiva do fogo, isto é, com o Potencial Infinito do Espírito que se encontra em si mesmo, cuja mais perfeita manifestação se tornou possível pela precedente purificação.
Esta descida do espírito, que constitui a prova e a purificação pelo fogo, elimina, por meio de uma plena consciência da Verdade, todo resíduo de impureza, todo traço dos erros e ilusões que precedentemente dominaram a alma. Quando a Luz da Verdade aparece em toda sua plenitude, toda treva, todo erro, toda dúvida e imperfeição, automaticamente desaparecem.
O iniciado prepara-se e aprende, por intermédio desta terceira viagem, a caminhar no fogo, isto é, no mais profundo e sutil elemento das coisas, do qual todas nascem e no qual se dissolvem, onde cessa por exemplo o poder da ilusão e a Realidade manifestar- se como realmente é.
Esse mesmo fogo representa, por um lado, a essência espiritual ou Princípio Universal do Ser, com a qual estabelece contato através do discernimento da Verdade, e por outro lado, também representa a energia primordial, que constitui o Poder da Suprema Essência. Esta Divina Energia acha-se representada, no simbolismo helênico, por Prosérpina, a Rainha da Hades, filha de Démeter - a qualidade produtora da Essência Primordial - que se encontra nos "infernos", ou seja, nas profundezas místicas das coisas.
Tendo realizado nas profundezas de seu próprio ser, este íntimo contato com a essência fundamental que é ao mesmo tempo Verdade, Poder e Virtude, o iniciado anda agora com passo firme e seguro, sem que nada tenha o poder de modificar sua atitude ou fazê- lo desviar-se. Esta serenidade imperturbável, que tem em si mesma sua razão de ser e sua raiz, e na qual a alma descansa para sempre ao abrigo de todas as influências, tempestades e lutas exteriores, permanecendo absolutamente firme em seus esforços e em seus propósitos, torna patente que a prova simbolizada pela terceira viagem foi superada. O iniciado leva agora, aceso dentro de si mesmo, algo que é como uma chama que nunca se apaga: aquele entusiasmo veemente e persistente que brota da própria raiz do ser e é a base de toda a realização exterior.
Com esse fogo, cuja essência é Amor infinito, livre de todo desejo, impulso ou motivo pessoal, tem o iniciado o poder de executar em torno dele os milagres e as coisas mais inesperadas, sendo, como Fé Iluminada e sincera, uma Força Ilimitada por ter franqueado e possuir o poder de superar os limites da Ilusão.
O CÁLICE MISTERIOSO
O iniciado que afrontou as provas simbolizadas pelas três viagens e sofreu a tríplice purificação dos elementos, libertou-se de todas as escórias de sua natureza inferior e tem agora o dever e o privilégio de manifestar o mais alto e divino de seu ser.
Este dever e este privilégio, que já fazem dele potencialmente um maçom, devem ser selados com uma primeira obrigação (o reconhecimento dos deveres) que precede ao juramento propriamente dito, e consiste em dar-lhe de beber um cálice de água que de doce se transforma em amarga.
Nesta tríplice obrigação, que pode considerar-se como uma confirmação do testamento, aprende e reconhece as condições nas quais será recebido maçom: o segredo sobre o que há de mais sagrado; a solidariedade e devoção para com seus irmãos; e a fidelidade à Ordem, com observância de suas Regras e Leis tradicionais.
O cálice da amargura descreve-nos de forma eficaz, as desilusões que encontra quem desce das regiões puramente ideais, do Oriente simbólico, para enfrentar as realidades materiais. A doçura inefável dos sublimes conhecimentos adquiridos e dos planos ou programas de atividade que foram formulados na mente, não podem transformar-se na amargura que nasce quando tudo parece ir contra nossos projetos e nossas aspirações.
Então, não devemos estranhar se num momento de debilidade, a alma cede momentaneamente sob o peso envolvente dessa aparência e brota do fundo do coração o grito: "Pai, se for possível, afasta de mim este cálice!".
Mas o cálice não pode ser afastado, já que deve ser servido até a última gota. O contato com a realidade externa não pode ser evitado, e neste contato deve demonstrar-se praticamente o valor de suas aquisições ideais e sua confiança na Verdade na qual se estabeleceu. A realidade exterior deve ser transmutada pela simples influência silenciosa de sua consciência íntima, fixada na visão de uma Realidade de ordem superior ou transcendente.
Em outras palavras, o iniciado que foi purificado pelos três elementos, deve ter sido convertido e deverá agir como um verdadeiro filósofo. Deve portanto, com sua atitude interior, ser a pedra filosofal que tudo transmuta pela simples influência de sua própria presença. Assim, pois, longe de evitar e afastar de si a poção amarga que lhe é oferecida pela ignorância dos homens, deve levá-la a seus lábios serenamente, como se fora a mais doce e agradável das bebidas. É, quando, então, cumpre-se o milagre: a amargura converte-se em doçura, e a visão espiritual triunfa sobre as sombras da ilusão que se desvanecem.
O SANGUE
Antes de selar definitivamente, por meio de um solene juramento, a admissão do recipiendário na Ordem, costuma-se submetê-lo a algumas outras provas que possam demonstrar sua força de ânimo, e sua retidão e firmeza de propósitos.
Uma destas provas é a do derramamento de sangue. É dito ao recipiendário que, como a Sociedade da qual anseia tomar parte poder-lhe-á pedir que verta seu sangue até a última gota, para a defesa dessa Causa Sagrada ou da vida de seus irmãos, deve dar prova de estar disposto a fazê-lo, firmando com seu próprio sangue, o seu juramento.
Este argumento do sangue, lembra-nos muitas antigas tradições que davam um singular valor à assinatura com o mesmo, de modo que o pacto assim firmado, não pode ser interrompido nem com a morte. Entre outros, citamos o Fausto, de Goethe, onde Mefistófeles, pede a Fausto selar com seu sangue o trágico pacto pelo qual se obriga a servi-lo, em troca de sua alma. E tendo-lhe este pergunto por que razão dito pacto deveria assim ser firmado, responde-lhe Mefistófeles enigmaticamente que o sangue é um fogo de virtude singular.
Com efeito, o sangue é a expressão orgânica mais direta da vida individual, ou do Ego pessoal e portanto do que um em nós existe do mais próprio e genuíno. A permanência da vida no organismo está caracterizada pelo estado de fluidez do sangue, que circula e anima todas as partes do corpo, cessando a vida quando o sangue deixa de circular, bem como, quando coagula.
O fato de "estar disposto a firmar com sangue" o juramento maçônico, significa pois, que ele deve estar disposto a aderir com todo o seu ser, e de forma permanente e inviolável, aos Princípios e Ideais da Ordem, fazendo dos mesmos, carne de sua carne, sangue e vida de sua vida.
Assim pois, a qualidade de maçom, que é conferida simbolicamente com a iniciação, e que individualmente é adquirida realizando ou tornando efetiva dita iniciação, deve considerar-se como permanente e indelével. Sua transitoriedade não provaria senão o fato de que nunca teria sido efetiva. Em outras palavras, não pode alguém "ser e deixar de ser" maçom à vontade, senão que, uma vez que tenha-se tornado verdadeiramente como tal, sê-lo-á para sempre. Aquele que acredita que pode deixar de considerar-se maçom é porque nunca o tinha sido, no sentido iniciático da palavra, apesar de que possa ter tido o desejo de sê-lo e tenha-se-lhe outorgado externamente tal título, dando- se-lhe assim a oportunidade (nada mais ou nada menos que a oportunidade) de converter-se em verdadeiro maçom.
A MARCA DO MAÇOM
Outra prova análoga à do sangue, que insiste sobre o caráter permanente da qualidade do maçom, é o convite que é feito ao candidato para que permita que se deixe imprimir com fogo, em alguma parte do corpo, "a marca gloriosa de um selo que se encontra em todas as Lojas do Universo" e por meio da qual os maçons se reconhecem.
Esta marca ou estigma verdadeiramente glorioso (mas que nunca foi aplicado materialmente pela simples razão de que a Maçonaria quer fazer homens livres e não coração de todo maçom, e é outro símbolo daquilo que o maçom deve ser e naquilo em seu coração e expressa por todo o seu ser.
As qualidades ou emblemas que são aplicadas com o fogo, por cujo intermédio os maçons reconhecem-se entre si, são evidentemente o compasso da razão que caracteriza o reconhecimento da Realidade Espiritual (que é o Centro simbólico de todo ser e de todas as coisas) e sua relação com a vida exterior (a circunferência ou aparência das coisas), e o esquadro do juízo, com o qual o maçom retifica, seus pensamentos, aspirações e desejos, em harmonia com o Plano do Grande Arquiteto, Plano com o qual deve esforçar-se em cooperar conscientemente.
Finalmente, e para dar uma prova tangível de suas boas disposições, é convidado a tomar parte na cadeia de união dos maçons, mediante uma oferta voluntária com a qual manifesta e reconhece seu dever de solidariedade com aqueles que se encontram momentaneamente necessitados de recursos e de meios suficientes para viver. Todos nós devemos e todos podemos ser úteis reciprocamente uns aos outros. O egoísta é um ser inconsciente que não conhece os laços que nos unem e o dever que temos de cooperar com todas as nossas forças para alcançar o Bem comum. E o maçom nunca pode ser um egoísta, ignorante de sua relação e deveres para com os demais.
O JURAMENTO
O candidato encontra-se agora pronto para cumprir a formalidade do juramento, ou obrigação solene que se lhe faz prestar diante da área de sua própria consciência, ajoelhado com o joelho esquerdo, e com o joelho direito em esquadro, em sinal de humildade, respeito e devoção; com a mão direita sobre a Bíblia, que representa a palavra Divina ou a Verdade Revelada pela tradição, tendo na esquerda um compasso, cujas pontas apoia sobre o peito num símbolo da plenitude da consciência e do perfeito entendimento de seu coração.
O juramento é feito "em presença do G. A do U. e dos irmãos reunidos em Loja". O reconhecimento da presença do G. A. é pois, sua primeira condição. O juramento ou obrigação assume-se individualmente em presença do Ideal e das aspirações mais elevadas de cada um de nós naquele Princípio impessoal que constitui o primeiro molde, rege o curso e é o Divino Arquiteto em nossas vidas.
Os irmãos reunidos ao redor do aspirante, com suas espadas juntas, formando uma abóbada de aço sobre sua cabeça sem que ele possa percebê-lo entretanto, com seus próprios olhos, são o símbolo daquelas presenças ou inteligências invisíveis que se acham constantemente ao nosso redor, sem que delas tomemos consciência; mudas testemunhas de nossos atos, que nos vigiam, nos protegem e nos ajudam a levar a termo nossos propósitos e nossas aspirações mais elevadas.
A obrigação contrai-se livre e espontaneamente "com pleno e profundo convencimento de alma". Heis aqui uma condição fundamental de seu significado e de sua validade: não se trata, pois, de uma obrigação obtida com lisonjas, promessas ou ameaças, com a qual se faz a ligação contra a própria vontade ou contra os desejos e aspirações, podendo o aspirante de tal forma ser constrangido a fazer algo que repugne, como em qualquer sociedade secreta, cuja orientação seja diferente da genuína Tradição Iniciática.
Isto é o que caracteriza a Maçonaria e a diferencia nitidamente de outras sociedades de diversas finalidades que tenham o segredo como meio ou instrumento de sua atividade. Seus elevados Princípios e a lealdade e fidelidade aos mesmos que é pedida a seus iniciados, dos quais quer fazer homens livres no sentido mais pleno e profundo da palavra, colocam-na eternamente acima das críticas interessadas e malévolas que lhe são feitas, sob o pretexto do segredo no qual se desenvolvem suas atividades.
O maçom contrai a obrigação que o liga à Ordem pelas mais elevadas aspirações de sua alma, com a mais plena, livre e espontânea vontade, e até o último momento dá-se-lhe a liberdade de se retirar, se assim o preferir.
AS TRÊS OBRIGAÇÕES
A primeira das obrigações contraídas pelo juramento, refere-se aos segredos da Ordem. O recipiendário obriga-se a "não revelá-los a ninguém que não seja um bom e legítimo maçom". É a obrigação da discrição no que se refere a todo ensinamento esotérico, para que a mesma seja útil e proveitosa, e que dito ensinamento possa transmitir-se unicamente a quem estiver devidamente preparado para recebê-lo, isto é, capacitado a entendê-lo em seu sentido real.
Esta obrigação está em perfeito acordo com as palavras de Jesus: "Não deis coisas sagradas aos cães ou pérolas aos porcos", e de Buda: "Não turbe o sábio a mente do homem de inteligência retardada"; como também na máxima hermética: "Os lábios da sabedoria estão mudos fora dos ouvidos da compreensão".
O termo cão, nas palavras de Jesus, nada significa de injurioso, sendo uma palavra de uso no Oriente no sentido de, profano ou "estranho"; e no que diz respeito às pérolas, estas representam uma imagem muito expressiva dos fragmentos da Sabedoria que o iniciado deve reunir cuidadosamente, no místico silêncio da alma, em vez de "atirá-las" ao mundo das paixões, onde ninguém saberia compreendê-las.
A segunda obrigação é a promessa de "não escrever", gravar ou fazer qualquer sinal pelo qual possam conhecer-se tanto a Palavra Sagrada, como os meios de comunicação e reconhecimento entre os maçons. Esta obrigação, em seu sentido exotérico, destina-se a proteger a unidade e inviolabilidade da Ordem, e, portanto, a continuidade da Tradição que por meio dela se transmite simbolicamente.
Esotericamente a palavra sagrada refere-se mais particularmente ao místico Verbo ou Ideal Divino que cada um recebe no íntimo de seu ser para expressá-lo numa atividade construtiva - atividade que será o meio pelo qual será exteriormente reconhecido como maçom por todos "os bons e legítimos maçons". Esta palavra não deve dar-se a conhecer exteriormente a ninguém, pois, perderia sua eficácia, assim como a semente perde seu valor vital se for afastada da terra aonde deve germinar.
A terceira obrigação é o reconhecimento dos deveres de solidariedade que o unem aos demais maçons pelo mesmo fato de ter adquirido a consciência de sua relação para com eles, que é a fraternidade. Deve, pois, considerá-los a todos como irmãos e a eles sentir- se ligado por aquela fraternidade espiritual que brota da comunidade de ideais, tendências e aspirações, que é mais forte e profunda que qualquer outra fraternidade puramente carnal ou exterior.
Assim compromete-se a ajudá-los e socorrê-los onde suas forças o permitam, tanto moral como materialmente. Isto não quer dizer que deva fazê-lo com prejuízo de outrem, amparando injustiças e ações desonestas, mas que deve cumprir para com eles o primeiro dever de humanidade, fazendo em todas as circunstâncias tudo o que o amor fraternal e seu próprio senso do bem, lhe sugerirem, evitando tudo quanto possa prejudicá-los direta ou indiretamente.
Antes de faltar a este juramento, o maçom prefere "ter a garganta cortada e a língua arrancada pela raiz", o que significa perder o poder da palavra, cuja eficácia construtiva e regeneradora depende do segredo e da veneração com os quais se custodia em religioso silêncio exterior, para que possa livremente manifestar-se em seu interior.
É o castigo simbólico que o indiscreto recebe, naturalmente, como conseqüência necessária de suas próprias ações, quando faz uso indevido, egoísta ou volúvel do que lhe tiver sido confiado. Comunicando aquilo que não deveria, perde ou retarda sua própria capacidade de expressá-lo, assim como a capacidade de alcançar uma justa e perfeita compreensão das coisas. O indiscreto e o infiel nunca podem estabelecer-se na Verdade, que se envolve em seus véus mais impenetráveis e se afasta deles para sempre.
Assim, a língua acaba efetivamente arrancada de sua raiz, que não pode ser outra coisa senão a própria verdade.
A LUZ
O juramento ou obrigação que acaba de contrair perante todos, e, fundamentalmente, consigo mesmo, com o propósito que exprime o testamento em sua vida profana, e com o qual as resoluções iniciais desse mesmo testamento se acham solenemente confirmadas e seladas, fazem o recipiendário digno de ver a luz, caindo-se-lhe por completo dos olhos, a venda de ilusão que lhe impedia de ver a Realidade em si mesmo.
E a luz é lhe dada simbolicamente por duas vezes, depois de tê-lo feito sair momentaneamente do Templo para que recomponha as irregularidades simbólicas de seu traje.
Tendo-se declarado disposto a confirmar seu juramento - à falta do qual sempre se lhe concede a faculdade de retirar-se - cai de seus olhos a venda com a qual até agora tinha podido ser admitido no Templo. Vê ao redor de si, na semi-escuridão do lugar em que se encontra, a todos os irmãos de pé com a cabeça envolta num capuz negro, portando na mão esquerda uma espada que é dirigida ao seu peito.
Estas espadas não são, entretanto, uma ameaça. Partindo da mão esquerda, ou seja, do lado do coração, são o símbolo dos pensamentos de todos os presentes, ainda desconhecidos para ele (e por esta razão velados) que convergem com benevolência em direção ao neófito e simbolizam também a unidade de sentimentos com os quais ele é recebido.
Estes irmãos fazem-no notar que na qualidade de testemunhas silenciosas de suas obrigações (e imagem das forças silenciosas que nos rodeiam), estão dispostos a ajudá- lo e socorrê-lo desde que cumpra com suas obrigações, assim como, a castigá-lo como é devido em caso de transgressão. Assim, oferece-se lhe pela última vez a oportunidade de se retirar, e com a certeza de que o juramento pronunciado não lhe provoca nenhuma inquietação, concede-se lhe a plena luz. Os irmãos presentes descobrem-se, abaixando suas espadas ficando à ordem, enquanto o Templo é iluminado com toda a claridade.
As espadas são o símbolo de todas as forças desconhecidas que na vida sempre favorecem e auxiliam a quem permanece constantemente fiel a seus ideais e obrigações apesar da situação difícil e das condições em aparência contrárias em que se encontre, enquanto que essas forças se convertem em outros tantos flagelos, remorsos e castigos, para quem cede e se assusta renunciando e faltando ao cumprimento de suas obrigações e ideais.
A vida torna-se sempre mais dura, difícil e insatisfatória para os que renunciam a seus ideais e às suas mais elevadas aspirações; aqueles que cedem à aparente contrariedade dos homens e das coisas e se deixam desalentar por sua frieza e falta de cooperação. Nunca e por nenhuma razão deve alguém renunciar à expressão de seu próprio Ser mais elevado e à do Divino desejo que constitui o anseio de seu coração. São estes para ele, além de um privilégio, uma obrigação e um dever cujo perfeito cumprimento lhe assegura a investidura de sua Primogenitura. Se bem que deve saber esperar com firmeza e confiança, sem que seu coração ao que nele representa o reflexo do próprio Verbo Divino e sua mais elevada visão da Realidade.
Com esta firme atitude de sua consciência diante das provas contrárias da vida, faz-se a luz gradualmente, em seu mundo exterior. As adversidades e os próprios inimigos descobrem-se, e aparecem agora como "amigos", tendo deposto a máscara, ou aparência hostil que escondia seus semblantes, e toda sombra pavorosa desvanece-se de sua existência. É a plena luz que passa livremente do interior e é derramada sobre o mundo exterior, uma vez que tenhamos sabido resistir com Fé inalterável, fidelidade e persistência a todas as contrariedades que nos tenham sido apresentadas.
A luz tem sido sempre considerada como o símbolo mais apropriado da Divindade e da Realidade. O próprio São João, o apóstolo iniciado, diz em sua primeira epístola: "Deus é Luz e nele não há trevas". Conhecer a luz é, pois, conhecer a Verdade e comunicar-se com a própria Divindade, que é Bem Onipresente, e desenvolver outros tantos Centros ou Canais, por meio dos quais essa Luz se manifesta em nossa vida e ao nosso redor.
A Luz que o iniciado recebe, como prêmio e conseqüência de seus esforços, é um símbolo de transcendental importância em todas suas acepções. A capacidade de ver a luz e adentrar à sua percepção constitui, pois, toda a essência e finalidade da iniciação.
Restituição à visão exterior das coisas, uma vez removida a venda que lhe cobria os olhos, depois de ter sido iniciado na visão interior da consciência, o candidato experimenta de início uma profunda decepção, uma vez que a realidade exterior aparece em seu aspecto mais sombrio e negativo. Mas, aprendendo a combinar a visão dos sentidos com a íntima visão da Realidade, adquire também a capacidade de manifestar e ver exteriormente a Luz da qual adquiriu a percepção interior, e a ilusão do aparente perde para ele todo o poder.
A CONSAGRAÇÃO
Conduzido novamente ao altar diante do qual deve, como antes, postar-se em atitude coerente com a importância do ato que será realizado deve o recipiendário confirmar novamente suas obrigações, após o que o Ven. Mestre com a espada flamejante apoiada sobre a cabeça daquele, pronuncia a fórmula da consagração, acompanhada pelos golpes misteriosos do grau. Isto feito, faz com que se levante e abraça-o, dando-lhe por primeira vez o título de irmão, dizendo ao cingir-lhe o avental:
"Recebe este avental, distintivo do Maçom, mais honroso que todas as Condecorações humanas, porque simboliza o trabalho, que é o primeiro dever do homem e a fonte de todos os bens, ele que dá o direito de sentar-vos entre nós, e sem o qual nunca deveis estar em Loja".
A espada flamejante, emblema do Magistério, e o avental de pele, que caracteriza todo maçom, são dois símbolos que merecem toda a nossa consideração.
Encontramos tanto este como aquele nos versículos 21 e 24 do terceiro capítulo do Gênesis, aonde foi dito que o Eterno fez túnicas de pele para Adão e sua mulher e os vestiu. E depois de ter expulsado o homem do Jardim do Éden "para que trabalhasse a terra" colocou no Oriente do mesmo Jardim do Éden uns querubins, que mostravam uma espada flamejante, "para custodiar o Caminho da Árvore da Vida"..
É evidente que as túnicas de pele, às quais aqui se faz menção, simbolizam o corpo físico do homem, do qual se reveste a consciência individualizada (Adão) e seu reflexo pessoal (sua mulher) ao serem enviados do estado de beatitude edênica (o mundo mental ou interior) sobre a terra (ou realidade objetiva) para trabalhá-la, ou nela expressar suas qualidades divinas.
Da mesma forma, a espada flamejante que se encontra com os querubins anjos ou Mensageiros do Divino no homem) no Oriente, ou origem do Mundo Mental ou interior da consciência, é um símbolo manifesto do Poder Divino, "que é poder criador" latente em todo ser humano, e que é privilégio do Magistério realizar, ou recuperar, manifestando assim as mais elevadas possibilidades da vida, cujo Caminho abre a custodia.
O avental que recebe, e com o qual se reveste todo maçom, é um emblema do próprio corpo físico com o qual vimos para trabalhar sobre a terra, com o objetivo de adquirir aquelas experiências que nos transformarão em artistas verdadeiros e acabarão por dar- nos o magistério ou domínio completo sobre nosso mundo.
A percepção deste avental, ou túnica de pele, como simples traje ou envoltório exterior, assim como da essência de nosso próprio ser, é conseqüência da visão espiritual que conseguimos através da busca da Luz, desde o Ocidente dos sentidos ao Oriente da Realidade. Mas isto não deve conduzir-nos a desprezá-lo, por ser parte integrante e necessário à perfeita manifestação do homem na vida terrestre, mediante a qual deverá ir depurando-se, escalando graus em prol de uma existência divina.
AS LUVAS
Com o avental davam-se ao recém iniciado, e em alguns países este costume ainda persiste, dois pares de luvas, um para ele e outro para que ele dê à mulher que mais ama.
As luvas brancas são um símbolo evidente da pureza de intenções que o maçom sempre deve observar em suas ações: fazer o Bem pelo próprio Bem, esforçando-se em toda atividade ou trabalho, para fazer o melhor que puder para a Glória do G. A., ou seja, para a expressão do Divino, em vez de deixar-se guiar pelas considerações de conveniência e utilidade material ou visar principalmente o fruto ou benefício direto da ação. Heis aqui o significado das luvas brancas que se lhe oferecem, e que ele deve ter cuidado de não deixar sujar e manchar com o egoísmo e com a escravidão das paixões que embrutecem o homem.
Com o outro par de luvas, "para a mulher que mais ama", a Maçonaria quer mostrar como sua influência moralizadora, iniciática e regeneradora, deve estender-se também à mulher, ainda que esta não seja diretamente admitida nos seus trabalhos. Com estas luvas, a mulher que cada recém iniciado reputa como a mais digna de possuí-las, ingressa espiritualmente na Corrente de Solidariedade Ideal e Construtiva que a Maçonaria forma no mundo todo, como companheira do homem, sem necessidade de passar pelas provas de iniciação.
Assim pois, apesar de que alguns pretendem franquear-lhes e outro negar-lhe a entrada em nossos Templos, a debatida questão de admitir a mulher na Maçonaria acha-se já potencialmente resolvida a seu favor, pois que pelas qualidades que a fazem estimar, fica admitida nesta forma, e adotada espiritualmente no seio da Instituição.
Em vez das luvas, usa-se entregar, em alguns países, um malho e um cinzel, símbolos do trabalho que o Aprendiz deve executar sobre si mesmo, despojando-se das asperezas da pedra bruta que representa sua personalidade, e uma régua "para que nunca se separe da linha reta do dever". Estes símbolos são relativamente equivalentes e não é necessário discutir o valor de uma preferentemente aos outros. O essencial é reconhecê- los como símbolos e por em prática seus ensinamentos alegóricos.
A PALAVRA
Tendo sido consagrado maçom, o neófito está agora em condições de receber os sinais, marcha e a bateria do grau, bem como, a palavra sagrada e de modo de dá-la, juntamente com os meios de reconhecimento, que constituem o fundamento de suas instruções.
Estudaremos em outro local o significado e o valor dos sinais e da marcha, no que diz respeito especialmente à aplicação da Doutrina Maçônica, contentando-nos por ora em ver o que representa a Palavra para o iniciado que tenha recebido a Luz.
O primeiro versículo do Evangelho de São João, sobre o qual são colocados os instrumentos emblemáticos da Maçonaria ao abrirem-se os trabalhos, dá-nos a chave do amplo significado da Palavra para o maçom. Constituindo este versículo o fundamento de toda atividade ou trabalho maçônico, devemos perceber seu significado, antes de ver a exata interpretação, em particular, da palavra sagrada do Aprendiz.
A afirmação No Princípio era o Verbo (ou seja, a Palavra) é eminentemente iniciática, isto é, não pode ser entendida sem adentrar ao sentido interior das coisas. É a comprovação da Verdade de que tudo se manifesta desde um Princípio Interior ou espiritual chamado Verbo ou Palavra, ou seja, afirmação criadora de sua realidade, que o manifesta e faz existir desde o estado de Realidade Imanente, latente ou potencial.
Dizendo "no Princípio era o Verbo" reconhecemos a origem espiritual de tudo o que vemos, ou se apresenta de alguma forma diante de nossos sentidos. De tudo sem distinção podemos dizer que no princípio (ou em sua origem) era ou foi um Verbo, Palavra, Pensamento não pode ser senão uma manifestação da consciência, tudo o que é exterior tem uma origem interior no ser onde teve nascimento primeiro como Causa, cujo efeito agora estamos percebendo.
Isto aplica-se tanto à criação ou formação do Universo desde seu Primeiro Princípio (que é Ser, e como tal, fundamento de tudo o que existe, espaço e tempo incluídos) como à particular criação ou formação do ser, do homem e da sua vida manifestada. Tudo o que nesta aparece teve sua origem num verbo (pensamento, desejo, aspiração, afirmação ou estado de consciência que é a causa sutil de sua existência, como efeito visível).
É, pois, de importância transcendente o que o homem diz, pensa ou afirma ainda que somente dentro de si mesmo. Por este único fato, participa consciente ou inconscientemente do Poder Criador Universal do Verbo e de sua atividade construtiva. É privilégio e prerrogativa do maçom fazê-lo consciente e sabiamente, enquanto o profano o faz inconsciente e alienadamente.
Aprender o reto uso da Palavra e disciplinar-se nele mesmo: heis aqui a tarefa fundamental de que se incumbe o maçom. Com esta disciplina faz sua atividade construtiva e em harmonia com os planos do G. A., isto é, com os Princípios Universais da Verdade.
Existe pois, uma palavra sagrada, diferente de todas as palavras profanas que são nossos erros, pensamentos negativos e juízos formados sobre a aparência exterior das coisas. A palavra sagrada é o Verbo, isto é, o que de mais elevado e de acordo com a Realidade podemos pensar ou imaginar, uma manifestação da Luz que do interior nos ilumina e cuja natureza é idêntica a essa Luz. É nosso ideal e nosso conceito do que há de mais Justo, Bom, Formoso, Grande, Nobre e Verdadeiro. Adaptando nossas palavras a este Verbo, pronunciamos a "Palavra sagrada" e decretamos seu estabelecimento. Pois, como foi dito: "Assim mesmo decretarás alguma coisa, e esta será estabelecida em ti", e sobre teus caminhos resplandecerá a Luz" (Job, 22-28).
SIGNIFICADO DA PALAVRA
A Palavra Sagrada, dada pelo Ven. Mestre que toma assento no Oriente, simboliza a Palavra Sagrada dada individualmente a cada um de nós pelo Espírito da Verdade que igualmente se posta ou mora no Oriente ou origem de nosso ser. Também representa a instrução que é dada ou deveria ser dada em Loja (ou lugar aonde se manifesta o Logos ou Palavra) e que sempre deve partir do Oriente para ser efetiva, isto é, do que cada um pode imaginar individualmente de mais nobre e elevado. Deve ser Luz inspiradora e vida, como é a luz do sol que surge do Oriente material, iluminando e vivificando nosso planeta.
À semelhança da Palavra Sagrada do Aprendiz, que se pronuncia ao ouvido, letra por letra, assim deve ser dada a instrução maçônica. Dá-se a cada um o primeiro rudimento, a primeira letra da Verdade para que meditando e estudando sobre seu significado, chegue por seu próprio esforço a conhecer e formular a segunda, que lhe fará digno de receber útil e proveitosamente a terceira. Desta maneira tem sido e sempre foi comunicada a Doutrina Iniciática em todos os tempos, sendo o próprio simbolismo maçônico a primeira letra da mística Palavra Sagrada da Verdade.
O significado particular da Palavra Sagrada do Aprendiz é: "Nele há Força". Isto quer dizer que o Aprendiz reconhece por meio da palavra sagrada, ou seja, do Verbo Divino nele próprio, que a força verdadeira não se encontra no exterior, no mundo dos efeitos, mas interiormente, na Realidade que constitui o Princípio Imanente e Transcendente de tudo o que existe.
Esta transformação completa do ponto de vista da consciência - que distingue o iniciado do profano - não pode ser senão, o coroamento e a conseqüência de sua iniciação. É preciso, pois, adentrar interiormente na percepção da Realidade, para reconhecer que a força está nela, e não nas coisas aparentes que vemos, estabelecendo-nos firmemente neste reconhecimento fundamental, como coluna do simbólico Templo que erigimos, e baseando sobre este reconhecimento íntimo e secreto, todas nossas ações.
A análise da Palavra, nas três letras hebraicas de que se compõe, dá-nos um guia para compreender o sentido profundo que tomam as três letras em sua combinação.
A primeira letra refere-se, como é evidente, ao corpo físico e ao mundo objetivo que constitui a morada ou habitação do homem. Estudando a primeira letra, o homem aprende a conhecer a realidade exterior e o mundo dos efeitos, e meditando sobre a íntima essência deste, chegará a perceber a realidade interior que se esconde atrás desta aparência, representada pela segunda letra que deve ser individualmente encontrada ou descoberta.
Esta representa a consciência ou mundo interior que cada um de nós acha em si mesmo, o Mundo Mental, no qual se expressa individualmente o Ser, produzindo assim a causa de todo o feito visível. O descobrimento ou percepção individual desta segunda letra põe o iniciado em atitude para comunicação ou recebimento da terceira.
O significado desta última deve ser relacionado com aquilo que já temos visto quando falamos do simbólico instrumento, do qual a própria letra representa admiravelmente a sua forma. Refere-se às possibilidades do Mundo Divino ou Transcendente que se encontram no homem em estado latente, e que podem manifestar-se como um raio, ou como o brilho de uma espada, ante o olho de nossa consciência, que constitui o ponto central ou eixo de nosso próprio mundo interior "a luz que ilumina a morada do homem".
RESTITUIÇÃO DOS METAIS
A cerimônia iniciática dá-se por concluída no mesmo ponto em que teve ser início: tendo-se feito assentar o recém iniciado no lugar que lhe corresponde, isto é, no primeiro posto ao Oriente da Coluna do Norte, para que possa continuar dali no simbólico caminho que, em sentido inverso à direção de suas viagens, lhe fará realizar na Loja, o seu progresso maçônico. Após a proclamação e o reconhecimento de todos os seus irmãos, restituem-se-lhe os metais, cuidadosamente guardados, dos quais havia sido despojado ao entrar na câmara de reflexões.
É claro que esta restituição tem também um significado simbólico: depois de ter aprendido a pensar por si mesmo, com o esforço alegórico das três viagens, depois de ter visto a luz e recebido a Palavra da Verdade, pode reconhecer novamente as possessões intelectuais e materiais de que antes teve de despojar-se para poder empreender o Caminho da Verdade.
Agora tem o dever de fazer das mesmas aquele sábio uso para qual sê-lhe restitui sua posse, pois, tudo indistintamente tem-nos sido dado e sempre será dado para seu uso. Não existe posse de nenhum tipo que possamos reter para sempre. Nem nossas próprias criações intelectuais, nem tão pouco os átomos de que se compõe o nosso corpo, que estão sujeitos a uma incessante mudança. Devemos pois, converter-nos em canais sábios e úteis de tudo o que passa por nossas mãos, transmitindo-o como o temos recebido, em benefício dos demais. Isto ensinar-nos-á o primeiro uso que deverá fazer o recém iniciado, dos metais que lhe foram devolvidos, dando sua primeira contribuição à Solidariedade Maçônica.
Capítulo III
A FILOSOFIA INICIÁTICA DO GRAU DE APRENDIZ A INSTRUÇÃO SIMBÓLICA
A Palavra Sagrada que é dada ao novo iniciado depois de sua consagração e admissão definitiva na Ordem é, como temos visto, um símbolo de instrução verbal sobre os Princípios da Verdade que cada Aprendiz tem o direito de esperar dos que se encontram mais adiantados que ele na Senda da Iniciação.
Sendo a Maçonaria, em sua verdadeira essência tradicional e universal, uma Escola Iniciática, ou seja uma Academia destinada ao Aprendizado, ao Exercício e ao Magistério da Verdade e da Virtude, é natural que esta instrução deva ser esperada por parte dos menos adiantados e deva ser dada por aqueles que se encontram a isto capacitados. Esta comunhão espiritual de estudos e aspirações é a razão pela qual existem as Lojas e outros agrupamentos maçônicos.
A instrução deve ser dada como se faz com a palavra: "ao ouvido", ou em secreto entendimento e "letra por letra", isto é, partindo dos primeiros elementos e com a ativa cooperação do discípulo, cujo progresso não depende do que recebe, mas do que encontra por si mesmo, por seus próprios esforços, pelo uso que faz da primeira instrução recebida com meio e instrumento para descobrir a Verdade.
Esse método caracteriza e distingue a instrução iniciática da instrução profana. Enquanto o objetivo desta última é simplesmente o de comunicar determinados conceitos ou conhecimentos, preocupando-se menos com a opinião que o discípulo possa formar sobre os mesmos, que de sua capacidade para repeti-los tal como lhe foram comunicados. Para a instrução iniciática isto representa unicamente o ponto de partida, e o essencial é a opinião que cada um forma de seus próprios esforços e raciocínio sobre aquilo que recebeu.
A uma primeira e elementar compreensão dos Princípios ou rudimentos da Verdade, que representa a opinião e o resultado do esforço pessoal do instrutor - a primeira letra da palavra da Sabedoria - deve-se seguir um período silencioso de estudo e reflexão individual, no qual o discípulo aprende a pensar por si próprio, avançando por seus próprios esforços pelo Caminho que lhe foi indicado. Este estudo e esta reflexão, encontram o seu amadurecimento na descoberta da segunda letra, que é aquela que o discípulo deve dar ao Instrutor, em resposta à primeira, com o objetivo de que possa ser julgado digno e capacitado a receber a terceira, que é de um tipo inteiramente diferente das duas primeiras.
O TRÍPLICE SENTIDO
As três letras da Palavra simbolizam efetivamente o tríplice sentido - exotérico, esotérico e transcendente - de toda expressão simbólica ou verbal da Verdade.
O primeiro sentido é aquele que corresponde à apresentação exterior de determinado ensinamento ou Doutrina. Na Maçonaria esta apresentação consiste nos símbolos, cerimônias e alegorias que caracterizam a Ordem. Na religião constitui os dogmas, cerimônias e obrigações exteriores. Na Ciência está representada pela observação analítica que nos familiariza com as propriedades exteriores das coisas. Na Arte, indica aquele conjunto de regras e cânones que formam a veste exterior e a técnica do artista. Esta é a letra que comumente se escreve.
Unicamente por intermédio do esforço pessoal, com o estudo, a reflexão e a aplicação individual, pode-se chegar ao sentido esotérico da Verdade, a Doutrina Interior é o verdadeiro segredo maçônico, o místico ou o secreto entendimento da Verdade apresentada exteriormente nas alegorias da construção e de seus instrumentos. Esta segunda letra não pode, portanto, ser escrita e também não o pode a seguinte que somente se recebe pelo fato de possuir a segunda.
Assim como o maçom deve chegar por seus próprios esforços ao conhecimento da Doutrina Iniciática que fará dele um verdadeiro filósofo, o mesmo caminho acha-se aberto no campo da religião para o metafísico que busca o sentido profundo dos dogmas e símbolos religiosos e o valor operativo de suas cerimônias quando for entendido em seu significado espiritual. Assim , igualmente, o sincero e ardente buscador da Verdade não se circunscreverá à observação exterior dos fenômenos e das leis que governam sua causalidade imediata, senão que esforçar-se-à em reconhecer e encontrar os Princípios que os regem e aos quais obedecem. O Artista não será digno de tal nome até que a arte daquele que tenha aprendido o domínio puramente técnico ou formal, não seja capaz de expressar sua própria vida e seus sentimentos interiores.
Por conseguinte, em qualquer campo da vida temos de progredir constantemente desde um conhecimento inicial do concreto para o reconhecimento do mais profundo que nos inicia subjetivamente na realidade da coisa conhecida. Este passo, simbolizado na Maçonaria pela passagem da primeira à segunda letra da Verdade, ou do primeiro ao segundo grau da iniciação, é uma preparação necessária para chegar à terceira letra ou terceiro sentido da Verdade, que corresponde ao terceiro grau da Iniciação, ao Magistério que dá a capacidade de falar ou realizar o que individualmente tenha sido assimilado.
OS TRÊS ANOS
Os três anos do Aprendiz e os três passos de sua marcha, ainda lembrando as três viagens da iniciação, são evidentemente o símbolo do tríplice período que marcará as etapas de seu estudo e de seu progresso.
Estes três períodos referem-se particularmente às três artes fundamentais (a Gramática, a Lógica e a Retórica) a cujo estudo deve aplicar-se, ainda que deva contentar-se com dominar unicamente a primeira, por ser a perfeição da segunda e da terceira, respectivamente, o objeto do domínio dos Companheiros e Mestres.
A primeira entre as sete "artes liberais" - a Gramática - refere-se ao conhecimento das letras (em grego gramática: "sinais, caracteres ou letras"), isto é, ao conhecimento dos Princípios ou elementos simbólicos com os quais é representada a Verdade. Neste estudo é onde principalmente deve ser demonstrada a capacidade do Aprendiz, que ainda não sabe ler nem escrever" a linguagem da Verdade, senão que se exercita tanto num como no outro, soletrando ou estudando uma por uma as letras ou Princípios Elementares nos quais pode resumir-se e nos quais pode ser traçada a origem de todas as coisas.
Há também, evidente referência dos três anos do Aprendiz ao conhecimento dos três primeiros "números" ou Princípios Matemáticos do Universo: o número um, ou seja, a Unidade do Todo; o número dois, ou seja, a Dualidade da Manifestação, e o número três, ou seja, o Ternário da Perfeição.
Este conhecimento filosófico dos três números, sobre o qual falaremos logo após, é de verdadeira e fundamental importância, enquanto compendia e sintetiza em si todo o conhecimento relativo ao Mistério Supremo das coisas. Pitágoras o expressou admiravelmente nas palavras: A Unidade é a Lei de Deus (ou seja, do Primeiro Princípio, da Causa Imanente e Pre-Antinômica), o número (nascido da multiplicação da Unidade e por meio da Dualidade) é a Lei do Universo, a Evolução (expressão da Lei do Ternário) é a Lei da Natureza.
Ou, segundo as palavras de Ramaseum de Tebas: Tudo está contido e se conserve no Um, tudo se modifica e se transforma por três: a Mônada criou a Díade, a Díade produziu a Tríade, e a Tríade brilha no Universo inteiro.
A UNIDADE DO TODO
A Primeira Lei ou Princípio, cujo reconhecimento caracteriza e distingue constantemente ao Verdadeiro filósofo iniciado, é a da Unidade do Todo ou, como diziam os antigos: "En to Pan" - "Uno o Todo". O Todo é Uno em sua Realidade, em sua Essência e Substância íntima e fundamental; tudo vem da Unidade; tudo está contido e sustentado pela Unidade; tudo se conserva, vive, é e existe na Unidade; tudo se dissolve e desaparece na Unidade.
A Unidade está simbolizada naturalmente pelo ponto, origem da linha reta, do círculo e de toda figura geométrica (o ponto superior que refletindo-se em seu aspecto dual, representado pelos dois pontos inferiores, forma os três pontos ( que caracterizam os maçons).
O Ponto, enquanto simboliza a Unidade, é um centro, o Centro do Todo, o Centro Onipresente, no qual estão contidos, em sua totalidade e unidade, o espaço, o tempo e todas as coisas existentes. Não tem lugar onde não se encontre e que não seja uma manifestação ou aspecto parcial desta Sublime Unidade que constitui a Eternidade e o Reino do Absoluto.
Este Todo, é evidentemente, o ser, isto é, o que é Ego sum qui sum; heis aqui a definição da Realidade que constitui o Grande Todo, a Essência e Substância de todas as coisas, potencialmente contido em todo "ser" e parcialmente manifestado em toda existência, e no qual vivemos, nos movemos e temos nosso ser.
O conhecimento do Uno (um conhecimento que para ser tal deve superar a ilusão da dualidade, entre "sujeito conhecedor" e "objeto conhecido", que é a base de todo conhecimento ordinário) é o objeto supremo de toda filosofia e de toda religião: todo conhecimento relativo que se funde neste reconhecimento da Unidade do Primeiro Princípio que tem sua base na Realidade; toda ciência ou conhecimento que dele se descuidar, não será a verdadeira ciência nem o verdadeiro conhecimento, uma vez que descansa fundamentalmente na ilusão.
Conhecer a Unidade do Todo, é pois, conhecer a Realidade, "o que é" verdadeiramente; e não reconhecê-la, ou admitir implicitamente que pode haver dois princípios fundamentais e antinômicos, ou que não há unidade e identidade fundamental entre duas coisas ou objetos em aparência diferentes, significa viver ainda no Reino da Ilusão ou na aparência das coisas e não saber discernir entre o real e o ilusório.
A Luz Maçônica consiste neste discernimento fundamental, que nos faz progredir constantemente em inteligência desde o Ocidente, que é o Reino da Ilusão, da Multiplicidade e da Aparência, em direção ao Oriente, que é o Reino do Real, da Unidade e do Ser. No Ocidente vemos o Uno manifestado na diversidade de seres e coisas diversas, sem aparentes laços ou relações entre si, enquanto que no Oriente reconhecemos a Unidade na multiplicidade (Unidade essencial, substancial e imanente, numa multiplicidade aparente, contingente e transitória) e o laço ou relação interior que unifica a multiplicidade exterior.
Cada ponto do espaço é um centro e um aspecto do Ser, um Centro ou aspecto desta Unidade, da que tende a reproduzir em si mesmo as infinitas potencialidades. Assim pois, no infinitamente pequeno está contido o Mistério do Todo e do Infinito, e em cada aspecto do Ser, existem indistintamente todas as possibilidades do Ser e da Unidade.
A LINHA RETA
A linha reta, produzida pelo movimento do ponto de um a outro extremo (representados pelos dois infinitos), é o emblema da vida individualizada, nascida da Unidade do Ser, assim como de todo movimento ou passo do ponto numa infinita sucessão de pontos, que caracterizam o Espaço, ou a Eternidade na infinita sucessão de momentos que formam o Tempo, tal como vulgarmente o conhecemos.
Assim como na mecânica a linha reta representa uma força, e a direção em que ela se aplica na Maçonaria representa o progresso retilíneo, que é a resultante da força individual potencialmente encerrada no ponto ou Centro de nosso ser, aplicada naquela exata direção que dá como produto natural a evolução ou "desenvolvimento progressivo e progressista" das potencialidades latentes nas virtudes ou poderes ativos.
Este progresso individual, simbolizado pela linha reta, está muito bem representado pelo prumo, que mostra o esforço vertical de cada ser e de toda a Vida em seu conjunto, de baixo para cima, desde a atração dos instintos e das tendências materiais escravizadoras, à atração de um Poder, de uma Lei ou Ideal superior, que é a luz do Sol para a vegetação e os seres orgânicos, e a Luz interior da consciência para o homem e os seres conscientes. Este esforço vertical é condição necessária para toda finalidade ou efeito construtivo.
Assim como sem o prumo não seria possível dispor verticalmente as pedras na posição mais adequada à estabilidade e progresso de uma construção, seria também impossível o progresso individual do homem se todos os seus pensamentos, aspirações e ações não se modelassem sobre uma mesma linha reta, no sentido oposto à atração das tendências interiores, elevando-se gradualmente até a percepção de suas possibilidades superiores.
Finalmente, a linha reta representa uma relação ininterrupta entre os dois infinitos que marcam seus limites extremos, isto é, entre os dois aspectos antinômicos e complementares da Unidade Mãe, fazendo-nos ver uma vez mais, a unidade fundamental da Dualidade Aparente no mundo manifestado.
A DUALIDADE DA MANIFESTAÇÃO
Ainda que tudo seja essência e realidade, tudo se manifesta e aparece como dois. Unidade e Dualidade, estão assim, intimamente entrelaçadas, indicando a primeira o Reino Absoluto, e a segunda sua expressão aparente e relativa, sem que haja nenhuma separação verdadeiramente entre estes dois aspectos diferentes da mesma Realidade.
Assim como a Unidade caracteriza o Ser (no qual não pode existir nenhuma diferença ou antinomia), assim igualmente, a Dualidade expressa a existência em suas múltiplas formas, entrelaçadas, por assim dizer, nos pares de opostos, que constituem o selo que marca o mundo dos efeitos e a Lei que governa toda a manifestação.
A dualidade começa no próprio domínio da consciência, com a distinção entre "eu" e "aquilo", entre, o sujeito e o objeto (sujeito conhecedor e objeto conhecido), constituindo assim o fundamento de todo nosso conhecimento e experiência, tanto interior como exterior. Não deve, pois, surpreender-nos que estando o sentimento de dualidade tão fortemente enraizado na ilusão de nossa personalidade, seja difícil subtraírmo-nos à mesma e chegar assim à perfeita consciência da Unidade transcendente do Todo, na qual a ilusão da dualidade - que forma a base de nosso pensamento ordinário - esteja superada por completo.
Temos dois olhos para ver, aos quais correspondem dois ouvidos e dois diferentes hemisférios cerebrais, como instrumentos orgânicos de nossa inteligência, e duas mãos e dois pés, instrumentos de nossa vontade. Como o nosso pensamento ordinário baseia-se naquilo que vemos e ouvimos, é evidente que nossa visão exterior das coisas seja invariavelmente "marcada" por esta dualidade, misticamente simbolizada pela Árvore da Ciência, do Bem e do Mal, comendo de cujo fruto perde-se momentaneamente a consciência da Unidade, que, entretanto, constitui nossa Sabedoria instintiva e primordial (anterior à queda do domínio dual da consciência material).
Somente quando aprendemos, por meio do discernimento e da abstração filosófica, a unificar os dois aspectos de nossa visão exterior por meio do olho simples de nossa consciência interna, chegamos ao conhecimento da Realidade )que é o conhecimento da Unidade), e a ilusão da Dualidade e da Multiplicidade perde inteiramente o poder que exerceu sobre nós.
Então, o "eu" identifica-se com "aquilo", o sujeito com o objeto, o conhecedor com o conhecido, e rasga-se para sempre o véu atrás do qual Isis (o Mistério Supremo da Natureza) se esconde dos olhares profanos. Mas, enquanto isso, o Véu da Ilusão permanece estendido entre as duas colunas, e a ciência ordinária - a ciência que se baseia na observação e na experiência que provêm da ilusão dos sentidos e é impotente para levantá-lo.
AS DUAS COLUNAS
As duas colunas que se encontram no ocidente e à entrada do Templo da Sabedoria são o símbolo do aspecto dual de toda nossa experiência no mundo objetivo ou Reino das Sensações.
Representam os dois princípios complementares humanizados em nossos dois olhos, na dualidade manifestada em quase todos nossos órgãos, nos dois lados, direito e esquerdo, de nosso organismo, e nos dois sexos que se integram à espécie humana e se refletem em todos os reinos da vida e da natureza.
Cosmicamente correspondem aos dois Princípios da Atividade e da Inércia, da Energia e da Matéria, da Essência e da Substância, representados pelo enxofre e o Sal na câmara de reflexões e, metafisicamente, pelos dois aspectos masculino e feminino da Divindade, que como Pai e Mãe Celestes, como deuses e deusas, em seus aspectos particulares, encontram-se praticamente em todas as religiões.
O reconhecimento individual da Divindade, sob o aspecto de Pai ou de Mãe, parece ter sido instintivo onde queira que a religião tenha sido efetivamente vivida. Foi sempre mais fácil estabelecer aquela relação individual com a Divindade, revelada pela primeira pergunta do testamento maçônico, considerando-a como um Princípio Abstrato, afastado de nossa percepção e experiência direta, que faz exclamar às almas mais simples, como a Madalena: "Levaram o meu Senhor e não sei onde o puseram".
O Princípio de Vida, é pois, em nós, nosso Pai e nossa Mãe, e o Pai-Mãe do Universo e de todos os seres. Algumas religiões dão mais importância a um do que a outro destes aspectos, na realidade complementares e inseparáveis da Realidade Única. Não é este o local mais apropriado para se fazer um estudo mais detalhado sobre este interessantíssimo tema, e contentar-nos-emos com transcrever, sobre o valor da preferência de um ou de outro conceito, as palavras de um culto e sábio orientalista contemporâneo: "O Pai e a Mãe não brigam entre si (pela adoração ou reconhecimento interior de um ou do outro), ainda que seus filhos possam fazê-lo.
ESPAÇO E TEMPO
No que diz respeito ao domínio do manifestado, o Macrocosmo, as mesmas duas colunas podem considerar-se como símbolos do espaço e do tempo, ou seja, das duas realidades fundamentais nas quais parece ter sido fundamentado e baseado o Universo que conhecemos.
Espaço e Tempo, da mesma que Energia e Matéria, são as realidades finais que a ciência positiva admite como condições indispensáveis de toda existência física, fazendo abstração das quais nada do que existe e é objetivamente percebido, poderá ser concebido. Ainda que na teoria einsteiniana se unifiquem (fazendo do tempo uma quarta dimensão do espaço) e se trate de pôr em evidência sua relatividade, seguem constituindo os alicerces inalteráveis, o marco primordial e o pressuposto relativamente invariável de nosso Templo Cósmico.
Como a dualidade não é, em verdade, nada mais do que a soma dos dois aspectos complementares de um Princípio Único, ao qual revelam objetivamente, e do qual expressam respectivamente a Imanência e a Transição, o Espaço é, pois, no fundo, um só aspecto relativo do Ser, que tudo contém e compreende, pelo fato de que tudo é , e o Tempo é outro aspecto dessa Suprema Realidade considerada como o dinâmico manancial do Grande Fluxo Cósmico.
Se quisermos considerar o Tempo e o Espaço como um só elemento conservador, por assim dizer, de toda manifestação objetiva, teremos no Tempo-Espaço uma das duas colunas da Dualidade básica do Templo da Natureza, sendo a integral Energia-Matéria a outra coluna ou elemento que constitui a soma de todas as forças ou aparências que agem, se assentam ou se estabelecem dentro do primeiro elemento.
De qualquer forma, considerando o universo e seus elementos formadores, não nos será possível evitar um conceito fundamentalmente dual desses primeiros elementos. Podemos reduzir o Tempo ao Espaço, considerando-o como um aspecto deste, e a Matéria à Energia (ou reciprocamente), mas, se quisermos chegar à unidade, temos de transcendê-los a ambos, e nenhum outro elemento poderá constituir a síntese suprema fora do próprio Ser que tudo é, e constitui a Unidade de Tudo.
Uma vez que o aspecto dual do Universo e do Primeiro Princípio que o origina encontra-se com as duas colunas no Ocidente e à entrada do Místico Templo da verdadeira Ciência, é natural que este aspecto deva ser superado. Realmente, no Oriente, as duas colunas (representadas pelo Sol e a Lua) unificam-se no Delta, do qual falaremos mais adiante, assim como o enxofre e o sal sintetizam-se no mercúrio, que reintegra na consciência do homem a Unidade da Vida, dividida na manifestação.
O ÂNGULO
O ângulo, no qual duas linhas diferentes partem de um único ponto originário, divergindo ao prolongar-se à medida em que se afastam de sua origem, representa outra imagem característica da dualidade, proveniente de uma unidade preantinômica e imanente, na qual está sua origem e sua raiz.
O ponto central no qual se unem e do qual partem as duas linhas divergentes, corresponde ao Oriente, o Mundo da Realidade, no qual tudo permanece no estado da Unidade Indiferenciada e Indivisível. A parte oposta corresponde ao Ocidente, o domínio da realidade sensível, na qual a própria Realidade Transcendente aparece dividida ou separada nos dois princípios simbolizados pelas duas colunas.
Enquanto a manifestação emana constantemente do Oriente ao Ocidente, ou seja, do domínio da Realidade ao da aparência, da Essência à Substância, do Ser à forma e do Espírito à matéria, o conhecimento ou progresso iniciático, representado pela Luz Maçônica, caminha em sentido contrário, do Ocidente ao Oriente ou seja, desde os extremos do ângulo em direção à sua origem. (Perceba-se aqui, o estreito parentesco existente entre as palavras oriente e origem, ambas derivadas do verbo latino orior, "surgir, emanar, levantar-se")
O ESQUADRO E O COMPASSO
O esquadro e o compasso, separados ou unidos na forma conhecida e usada como símbolo maçônico, formam dois diferentes ângulos, um móvel e com o vértice voltado para cima ou para o Ocidente.
O ângulo reto, formado pelo esquadro, é o emblema da fixidez, estabilidade e aparente inexorabilidade das Leis Físicas que governam o Reino do Ocidente ou da Matéria. Os dois princípios ou lados que concorrem a defini-lo encontram-se sempre à mesma distância angular de 90 graus, que corresponde à quarta parte da circunferência (que, de por si, representa a Unidade dentro do ciclo da continuidade) e ao ângulo do quadrado. O esquadro é, pois, outro símbolo da crucificação da qual deve libertar-se retificando e dirigindo para o centro todos seus esforços.
O ângulo reto é também, o símbolo da luta, dos contrastes e das oposições que reinam no mundo sensível, de todas as desarmonias exteriores, que devem ser enfrentadas e resolvidas na Harmonia que provém do reconhecimento da unidade interior. O compasso é o símbolo deste reconhecimento e desta harmonia, que deve unir-se ao esquadro e dominar o mundo objetivo por meio da compreensão de uma Lei e de uma Realidade Superior. Por intermédio de seu ângulo de 60 graus, no qual está ordinariamente disposto (o ângulo do triângulo equilátero), mostra o ternário superior que deve dominar sobre o quaternário inferior, ou seja, o perfeito domínio do Céu sobre a Terra.
O CÉU E A TERRA
O céu e a terra, indicados emblematicamente pelo esquadro e o compasso, e entrelaçados da mesma forma um com o outro, por serem aspectos respectivamente superior e inferior de uma mesma coisa, não representam nada mais que o Oriente e o Ocidente, com os quais já nos familiarizamos interpretando o valor esotérico da Cerimônia de Iniciação.
O Céu, ou seja o Mundo da Realidade Transcendente, apresenta-se à nossa consciência através do uso do compasso ou da faculdade compreensiva e comparativa da mente que conduz ao estudo das analogias, à indução e generalização das idéias, com as quais chega-se progressivamente do relativo ao absoluto.
A Terra, ou seja o Mundo da Aparência ou Realidade Objetiva, apresenta-se igualmente por meio do esquadro da razão, ou inteligência concreta e racional, que marca os limites fixados por suas leis, por meio da lógica e do juízo, com um determinismo do qual aparentemente não podemos escapar.
Entretanto, o Caminho da Liberdade encontra-se aqui mesmo, por meio do uso destas leis em seu aspecto progressista e construtivo conforme nossas aspirações verticais, indicadas pelo prumo.
Cabe aqui citar outra vez o axioma hermético ao qual fizermos referência quando falamos da "câmara de reflexões": visita interiora terrae: retificando invenies occultum lapidem. Devemos adentrar à realidade do próprio mundo objetivo, e não contentar-nos com seu estudo ou exame puramente exterior. Então, retificando constantemente nossa visão e os esforços de nossa inteligência (como demonstra a cuidadosa retidão dos três passos da marcha do aprendiz) atingiremos o uso do compasso em união com o esquadro, ou seja, o conhecimento da Verdade que nos liberta da ilusão.
AS LINHAS PARALELAS
Assim como o ponto com seu movimento direto engendra uma linha reta, assim também os dois pontos, movendo-se numa mesma direção retilínea, produzem as duas paralelas, símbolo característico da dualidade, ou seja, dos dois princípios cuja atividade ocorre paralela e complementarmente, à imagem dos pares de rodas que suportam um veículo e dos trilhos sobre os quais se apóiam.
Voltaremos a ver novamente este símbolo das paralelas, e outros aos quais aqui temos feito referência sumária, no grau de Mestre, limitando-nos por ora a dizer mais alguma coisa sobre o que eles podem significar para o aprendiz.
Duas paralelas são efetivamente os dois Caminhos do Norte e do Sul, que são percorridos nas viagens de ida e volta entre o Ocidente e o Oriente, e correspondem às duas colunas nas quais se assentam respectivamente os Aprendizes e os Companheiros. O quadrilongo que constitui o Templo Maçônico, está compreendido entre essas duas paralelas, delimitadas respectivamente por seus extremos oriental e ocidental.
Cada viagem de ida, ou progresso, do Ocidente, ao Oriente, corresponde pois a uma idêntica viagem de volta ou regresso, desde o Oriente ao Ocidente, paralelo este ao primeiro, mas dirigido em sentido inverso.
Os dois caminhos paralelos dos quais acabamos de falar não existem tão só simbolicamente dentro do quadrilongo da Loja, senão que também podem-se observar de muitas maneiras sobre o nosso próprio planeta. Por exemplo, como correntes magnéticas que vão respectivamente do Oriente para o Ocidente e reciprocamente, produzidas pelo movimento da terra dentro do campo magnético determinado pela radiação solar, às quais se devem os desvios da bússola.
Assim agem todas as; forças do Universo, segundo a Lei da Dualidade, paralelamente, mas em sentido inverso uma em relação à outra, prevalecendo por um lado o movimento centrífugo ou de extensão do interior ao exterior, e pelo outro, o movimento centrípeto de construção, do exterior ao interior. Este origina a gravidade, aquele a gravitação, duas formas diferentes da Força ou Princípio de Atração.
Aquilo que é ativo interiormente é passivo exteriormente, e vice-versa. Assim deve-se entender o valor das duas colunas, geralmente confundido e mal interpretado pela falta de compreensão desta Lei de Compensação, em conseqüência da qual ambos princípios (ativo e passivo) se acham presentes em cada um dos dois aspectos, mas agindo em sentido inverso, um em relação ao outro.
O BINÁRIO
A atividade em duas correntes ou sentidos inversos dos dois Princípios, comparável ao fluxo e refluxo das marés, origina os pares de opostos que se observam onde quer que seja no mundo fenomênico ou exterior, como ocorre na experiência psicológica ou interior.
Assim, a Luz, emanação ativa e positiva, efeito do movimento centrífugo ou expansivo, opõe-se às trevas, que podem considerar-se como falta de luz ou luz negativa, efeito de um movimento centrípeto ou de absorção, do exterior ao interior. A primeira tem, pois, uma correspondência moral com a Sabedoria, o Amor e o Altruísmo, que é o desejo de dar; a segunda relaciona-se com a Ignorância, a Paixão e o Egoísmo, que é o desejo e a vontade de receber.
O mesmo pode ser dito do calor e do frio. O primeiro faz dilatar os corpos e os conduz a superar suas limitações moleculares, do estado, sólido ao líquido, e deste ao gasoso, e do gasoso ao estado radiante, libertando os átomos progressivamente de sua escravidão dentro das moléculas, assim como da lei da Gravidade. Enquanto o segundo, fazendo voltar ao estado líquido os gases e solidificando os líquidos, sujeita-os sempre mais estreitamente a uma forma definida, limitando suas possibilidades de movimento.
No campo moral, o calor tem uma evidente analogia com o entusiasmo, ou chama interior que nos inflama para qualquer tentativa que seja expressão de nosso ser e de nossos íntimos desejos. Por seu lado, o frio está constituído pelas considerações materiais e o poder da ilusão que limitam, paralisam, escravizam e entorpecem nossos esforços.
O mesmo pode ser dito no plano físico, da eletricidade positiva e negativa, das ações e reações moleculares, das duas propriedades opostas da atividade e da inércia, da afinidade química que age em ambos os sentidos, e dos diferentes tropismos visíveis tanto no mundo orgânico como no inorgânico, e no mundo moral, dos diferentes impulsos que nos animam, de nossos pensamentos e inclinações positivas e negativas, e que nos fazem, respectivamente, ativos e passivos.
O Bem e o Mal, a Beleza e a Feiúra, a Vida e a Morte, a Fortuna e a Desgraça, a Verdade e o Erro, o Vício e a Virtude; heis aqui outros tantos pares de opostos que dominam no mundo relativo, sendo relativos do ponto de vista da consciência em que se consideram, existindo cada um deles unicamente em relação ao outro, e dissolvendo-se todos na diáfana perfeição do Absoluto.
Estes pares de opostos estão simbolizados pelos quadrados brancos e negros do pavimento de mosaico que parte das duas colunas. O eterno conflito, que parece constituir a mesma essência da vida, tem sido simbolizado pelas diferentes religiões na luta entre os dois Princípios do Bem e do Mal; o Deus Branco e o Deus Negro, Princípio da Vida e o da Atividade, Brahma o Criador e Shiva o destruidor, Ormuz o Princípio da Luz e Arimán o Princípio das Trevas, Zéus e Cronos ou Júpiter e Saturno, Jehova e Satã, Osiris e Tifón entre os egípcios, Baal e Moloc entre os fenícios.
Deuses brancos e deuses negros, ou anjos e demônios, existem praticamente em todas as religiões, símbolos evidentes do impulso evolutivo e progressista das aspirações superiores do homem e da inércia ou gravidade dos instintos e tendências inferiores. Assim pois, o Armagedon ou batalha celeste entre os espíritos da Luz e os espíritos das trevas, ou seja entre as Forças Evolutivas e Libertadoras e as Forças Involutivas e Escravizadoras, é uma realidade psicológica universal de todos os tempos.
Mas não é menos certo que as duas forças opostas, os dois princípios que aparecem constantemente travando uma luta encarniçada, são dois diferentes aspectos ou manifestações de uma única e mesma Realidade, cujo reconhecimento faz-nos superar o ponto de vista da luta e do conflito, e situa-nos no ponto central da Harmonia que de tudo faz uma Coisa Única.
Diabolus est inversus Dei: não é uma realidade em si mesma, mas um aspecto ou contraparte negativa da manifestação positiva da única Realidade. O conflito entre o Bem e o Mal e o poder deste sobre nós cessam quando reconhecemos aquilo como sendo a única Realidade e o único Poder, e nisto vemos tão somente uma aparência ilusória desprovida de realidade e poder verdadeiros.
O TERNÁRIO
Todo par de elementos ou princípios opostos e complementares encontra um terceiro elemento, o intermediário equilibrante ou Princípio de Harmonia, reflexo no mundo do relativo da Unidade Preantinômica originária.
Assim cessa o conflito dos dois opostos e a dualidade faz-se fecunda e se resolve em impulso evolutivo, construtivo e progressista.
O Pai e a Mãe engendram o Filho, Osiris e Isis engendram a Horus, e o Enxofre e o Sal produzem o Mercúrio; Vishnú, o Conservador, posiciona-se entre Brahma o Criador e Shiva o Destruidor; a Arquitrave levanta-se sobre as duas colunas e origina a Porta; o Homem, ou seja, a Criatura Perfeita, nasce da união do Céu e da Terra, realizando a mística união e a expressão do Superior com o Inferior.
2 + 1 = 3
Todo Ternário resulta de uma Dualidade, à qual se lhe agrega uma nova Unidade do mesmo gênero, que pode considerar-se como a resultante da união dos elementos constitutivos do Binário ou Dualidade. Assim, por exemplo, toda vez que nos esforçamos em unir os dois lados ou linhas divergentes do ângulo por meio de uma linha horizontal, obtemos como resultado um triângulo, isto é, a primeira e mais simples das figuras geométricas.
No caso das idéias, a Verdade encontra-se uma vez examinada a tese e a antítese, os prós e os contras sobre determinado assunto, que nos conduz à solução do problema que nos ocupa, com a síntese dos argumentos favoráveis e dos contrários.
O esquadro, que é um dos símbolos fundamentais de nossa Instituição, nasce da união da perpendicular com o nível. O mesmo pode-se dizer do malhete, que não é outra coisa senão o Tau dos antigos iniciados, e o mesmo igualmente da cruz formada pela união de uma linha vertical com uma horizontal.
Nos três casos, a vertical é o símbolo do Princípio Ativo ou masculino, que corresponde ao enxofre dos alquimistas e pode considerar-se como o Pai do Universo; a horizontal representa analogamente o Princípio Passivo ou feminino, o sal dos alquimistas, ou seja a Mãe do Universo. E a união dos dois, forma um novo elemento ou Princípio que torna fecundas e construtivas as possibilidades dos dois primeiros, realizando a Harmonia e originando o Ritmo e o Movimento.
Isto resulta evidentemente pela suástica, ou cruz em movimento, símbolo muito antigo e universal, que representa a Vida que anima os quatro elementos, nascidos da união dos dois elementos primordiais na cruz.
A vida representada pela suástica é o mesmo mercúrio dos filósofos, ou seja o Filho do Pai e da Mãe celestiais.
Outros significados do Tau e da Cruz dizem respeito a graus diferentes do de Aprendiz, e deles falaremos oportunamente.
OS TRÊS PONTOS
Os três pontos maçônicos constituem o mais simples e característico emblema do Ternário. Escolhendo estes símbolo juntamente com o esquadro e o compasso, como insígnia da Ordem, os seus fundadores deram prova de uma perspicácia e sabedoria que aqueles que conhecem, o valor oculto das coisas nunca poderão negar-lhes.
Estes três pontos sintetizam admiravelmente o Mistério da Unidade, da Dualidade e da Trindade, ou seja do Mistério da Origem de todas as coisas e de todos os seres.
Encontramos estes três pontos, harmonicamente juntos e diferenciados numa Unidade Oriental e numa Dualidade Ocidental, nas três Luzes do Altar, em torno do Livro da Tradição que através dos séculos é portador da Eterna Verdade, e dos instrumentos que são necessários para compreendê-la e aplicá-la.
O ponto superior representa, como é evidente, a Unidade Fundamental ou Primeiro Princípio Preantinômico, Originário e Imanente, do qual tudo teve origem. É o Absoluto, o Ain-Soph, cabalístico, que existe "em princípio", e no qual existem em princípio todas as coisas. Brahma, Vishnu e Shiva o Criador, o Conservador e o Destruidor do Universo; Osiris, Isis e Horus, ou seja o Pai, A Mãe e o Filho, formam Nele uma única pessoa e um só ser, uma única e indivisível Realidade. É SAT "o que é" o fundamental Princípio imanente e transcendente de toda existência, o Fulcro Central Imóvel que é Origem e Princípio da Criação.
Os dois pontos inferiores, são igualmente, uma imagem da Dualidade; os dois Princípios que representam as duas colunas, de cuja união e de cujas múltiplas ações e reações é produzida a multiplicidade fenomênica do Universo. Cada um deles é um diferente aspecto da Unidade Primordial Originária, que permanece indivisa e indivisível em sua dúplice aparente manifestação: um existe enquanto existe o outro, e os dois resolvem-se no Princípio Fundamental do qual tiveram origem. Efetivamente, se aproximarmos os dois pontos inferiores, com movimento igual, ao ponto superior, aproximam-se também, um do outro, e quando se unem a este, unem-se também mutuamente.
Se traçarmos duas linhas entre o ponto superior e os dois pontos inferiores, obteremos o ângulo que expressa, com seus dois lados emanados de um único vértice, esta mesma dualidade dos dois Princípios, emanações ou aspectos de um só Princípio Originário.
E se traçarmos outra linha que una os dois pontos inferiores, obteremos o triângulo, cuja base, unindo os dois elementos, representa o terceiro, que reproduz em si, no mundo do relativo um novo aspecto contingente da Unidade Preantinômica Absoluta.
Assim os três pontos mostram isoladamente os três Princípios que constituem a Unidade Originária e a Dualidade da manifestação. A união dos três Elementos primordiais - o enxofre, o sal e o mercúrio, o Pai, a Mãe e o Filho - que tornam fecunda e construtiva a atividade dos três Princípios.
Enquanto o ponto superior corresponde ao Oriente e ao Mundo Absoluto da Realidade (e, na Loja, ao Delta, emblema da Unidade tri-unitária), os dois pontos inferiores correspondem ao Ocidente, ou seja ao Mundo Relativo, que é o domínio da aparência, e na Loja às duas colunas emblemáticas da Dualidade:
O progresso maçônico acha-se também, aqui indicado sinteticamente, com o progresso da inteligência, que se ergue sobre o domínio da mente concreta (Reino da Dualidade e dos pares de opostos), estabelecendo-se no sentimento e na consciência da Unidade fundamental de tudo e da identidade essencial de todos os seres, por meio das faculdades superiores da Inteligência, que se baseiam na Unidade, da mesma maneira que a mente concreta baseia sua lógica e seus juízos no sentido da Dualidade.
O TRIÂNGULO
O triângulo, figura geométrica resultante da união de três pontos por meio de três linhas retas, e mais particularmente o triângulo eqüilátero ou regular, cujos três lados e ângulos são iguais, tem sido sempre considerado como um símbolo de Perfeição, Harmonia e Sabedoria, e, portanto, do que é Celestial e Divino.
Um triângulo eqüilátero é, em essência, o Delta Luminoso que é encontrado no Oriente em todas as lojas Maçônicas. O olho que se acha em seu centro é o símbolo da consciência do ser que é o primeiro e fundamental atributo da Realidade. Nada melhor que este símbolo para expressar a Realidade e sua manifestação ternária nos três lados que o constituem e nada mais apropriado para colocar-se naquele simbólico Oriente, no qual unicamente a Realidade pode ser encontrada.
Do triângulo, que forma o Delta propriamente dito, irradiam em seus três lados outros tantos grupos de raios que terminam numa coroa de nuvens.
Os raios simbolizam a força expansiva do Ser, que de um ponto central infinitesimal estende e preenche o espaço infinito. As nuvens indicam a força centrípeta, produzida como refluxo natural da primeira como movimento de contração que engendra a condensação das forças irradiadas.
Do Princípio ou Unidade do Ser (representado pelo Delta) manifesta-se, pois, uma dupla corrente positiva e negativa, formada pelos dois Princípios, cuja atividade está relacionada e regulada pelo ritmo que os une, como intermediário equilibrante.
O TEOREMA DE PITÁGORAS
Outro triângulo que possui uma especial importância no simbolismo maçônico é o triângulo retângulo, representado pelo esquadro, instrumentos de medida e retificação do mundo concreto ou da realidade visível. Enquanto o triângulo equilátero mostra principalmente, o esforço de nossa inteligência para relacionar-se com os Princípios e o Mundo das causas, o esquadro indica a inteligência racional que se limita ao estudo dos fenômenos e do Mundo dos Efeitos, representando a norma ou regra que deve guiar-nos para proceder retamente no estudo e na ação.
A importância do triângulo retângulo evidencia-se no famoso teorema de Pitágoras, cujo valor não se limita à geometria ordinária, sendo assim encontrado entre os símbolos maçônicos.
O estudo da trigonometria faz-nos ver a importância excepcional do triângulo em geral, em relação às demais figuras geométricas (todas podem reduzir-se ou decompor-se em triângulos), e a aplicação universal de suas propriedades. O próprio quadrilongo que constitui a Loja resolve-se diagonalmente em dois triângulos retângulos, e outro triângulo retângulo deveria resultar na união dos três lugares que correspondem às três luzes em sua justa e exata posição.
Não deve igualmente ser esquecida a propriedade característica dos triângulos, cujos três ângulos formam sempre dois ângulos retos, isto é, o ângulo cujos dois lados se expandem em linha reta, sendo assim, aquela figura geométrica a expressão ternária circunstanciada das infinitas possibilidades representadas no infinito.
TETRADA E TETRAEDRO
Quatro triângulos unidos por seus três lados, de maneira que cada um deles esteja, por cada um de seus lados, em união com os três restantes, formam as quatro faces do tetraedro ou pirâmide triangular, o primeiro e fundamental entre os cinco sólidos regulares.
Quatro faces e quatro vértices - respectivamente triangulares e triedros - concorrem a formá-lo e mostram como o ternário se resolve e concretiza, dentro das três dimensões especiais num quaternário, originando aquela Tétrada "Manancial Perene da Natureza", da qual fala Pitágoras.
No tetraedro, os três princípios ou elementos (Enxofre, Sal e Mercúrio, ou Pai, Mãe e Filho), provenientes da Unidade Primordial (o vértice superior do tetraedro) e representados pelas três faces, unem-se intimamente entre si, formando um ângulo triedro, cuja delimitação no mundo da matéria dos três princípios.
Se nos posicionarmos ao lado deste último triângulo, e buscarmos nele o reflexo do Vértice Originário, a Unidade Mãe, que se encontra do outro lado, obteremos outra vez a imagem do Delta, sendo o ponto refletido pelo vértice o olho sagrado deste.
E se nos fixarmos nas quatro linhas que unem os quatro vértices no centro da figura, obteremos uma estrela de quatro pontas, uma dirigida para cima, para a origem, e as restantes para baixo, para a Manifestação, outra imagem da relação do Princípio Único Original como ternário que o expressa no mundo sensível.
TRINDADES E TRILOGIAS
O estudo do número três não estaria completo sem um exame das diferentes trindades e trilogias, de ordem filosófica, religiosa e moral, que se lhe relacionam.
Encontramos trindades e trilogias em todas as religiões e em todas as filosofias, em todos os povos: sob diferentes nomes encontra-se uma mesma realidade, um igual reconhecimento diferentemente expressado. A trindade mais simples e fundamental do Pai-Mãe-Filho, encontra-se na religião egípcia com os nomes de Osiris-Isis-Horus, na bramânica como Nara-Nâri-Virâj, ou Shiva-Shakti-Bindu, na Caldaica como Anu- Nuah-Bel e outras trindades equivalentes. No cristianismo, a Mãe desaparece teoricamente para dar lugar ao Espírito Santo, mas, praticamente se conserva no culto à "Mãe de Deus" (seja qual for a definição teológica particular deste culto), comparável com toda a adoração tributada a Isis no Egito e à que hoje se tributa à deusa Kali ou Shakti (o aspecto feminino ou poder de Shiva) na Índia.
Filosoficamente, o Enxofre, o Sal, e o Mercúrio, como Princípios constitutivos do Universo ou Forças Criadoras primordiais (análogas ao Pai-Mãe-Filho), encontram uma perfeita correspondência nos três gunas Rajas-Tamas-Sattva, ou seja Atividade-Inércia- Ritmos, correspondente o primeiro à força centrífuga ou Princípio de Expansão, o segundo à força centrípeta ou Princípio de Contração, e o terceiro à força equilibrante ou Princípio do Ritmo ondulatório.
Brahma, Vishnu e Shiva, da trindade brahmânica, devem entender-se como correspondentes aos três gunas, sendo Vishnu, como conservador, o princípio equilibrante entre os dois opostos; Brahma como Criador, a força expansiva; e Shiva como Destruidor, a força de contração que retorna a si mesma.
Também na filosofia da Índia, encontramos a definição do Ser Supremo como Sat-Chit- Ananda, que no Ser Absoluto é "satisfação em si mesmo", converte-se na faculdade humana da Vontade, que impulsiona o desejo em direção à sua satisfação. Estes três princípios correspondem também, aos três atributos divinos da Omnipresença, Omnisciência e Omnipotência.
Outro gênero de trindade resulta da polaridade entre o céu e a Terra, ou seja entre o Superior e o Inferior, o Oriente e o Ocidente. Entre eles nasce a consciência individualizada, tipificada pelo Homem, que serve de intermediário entre os dois e mutuamente os relaciona. Origina-se assim a distinção entre os três mundos: o objetivo ou exterior, o subjetivo ou interior, o divino ou transcendente, e as três partes do homem Espírito-Alma-Corpo, sendo este último o ponto de contato entre o mundo exterior e o interior, e o primeiro entre o mundo manifestado e o transcendente.
No sistema maçônico a trindade está formada pelos três instrumentos de medida que correspondem às três Luzes: o Prumo ou perpendicular, o Nível ou horizontal e o Esquadro, que como vimos tem um valor análogo ao tau e à cruz. O primeiro é o princípio ativo que nos impulsiona a progredir, segundo nossas aspirações verticais; o segundo é o princípio passivo de resistência e persistência que nos instala equilibradamente em nossas aspirações e as faz madurar e frutificar; e o terceiro é a norma ou regra que faz nossas ações coerentes com a Verdade e a Virtude.
Os três pilares simbólicos que sustentam a Loja, representados igualmente pelas três Luzes: Sabedoria, Força e Beleza, constituem outra interessante trilogia. A Sabedoria, que corresponde ao Ven. Mestre, é a faculdade inventiva, ou seja a Inteligência Criadora, que concebe e manifesta interiormente o Plano do Grande Arquiteto; a Força que Corresponde ao 1 Vig. é a faculdade volitiva, que se esforça em realizar o que a primeira concebe; e a beleza, representada pelo 2 Vig., é a faculdade imaginativa, que adorna e aperfeiçoa a obra realizada pelas duas primeiras.
Também correspondem, respectivamente, a Sabedoria à mente superconsciente, a Força à mente consciente e a Beleza à mente subconsciente.
TRINDADES MITOLÓGICAS
Na mitologia helênica, como na oriental e na egípcia, as trindades possuem também, um papel de primeira importância.
Fundamental entre elas é a trindade cosmogônica, formada por Urano, símbolo do Ser que se manifesta como espaço, ou seja a "extensão" que torna objetiva sua Omnipresença; Urano Engendra a Cronos ou Saturno, que representa o próprio Ser como mudança e movimento, dentro da eternidade, que em nós produz a idéia de tempo ou "sucessão", na qual todas as coisas são produzidas e desaparecem; Saturno engendra a Júpiter ou Zeus, que representa o Ser como vontade e energia, que parece dominar sobre os princípios que lhe deram produção.
Esta trindade é acompanhada pela outra, a feminina, constituída pelas qualidades destes três aspectos do Ser e da Realidade fundamental: Gea, a capacidade produtiva ou geométrica inerente ao espaço; Rea, o fluxo ou corrente do tempo; e Hera ou Juno, o poder que expressa a vontade criadora.
Outra trindade acha-se formada pelos três aspectos de Júpiter, dois dos quais estão representados por seus dois irmãos, que com ele compartilham a soberania universal; Netuno ou Zeus, marinho que domina sobre as águas; Plutão, o Júpiter subterrâneo que assenta seus reinos nas profundezas das coisas - os dois companheiros do Senhor do Céu e da Terra -, que estabeleceu seu império sobre o domínio das forças titânicas.
Paralela a esta segunda trindade masculina é a que formam suas três qualidades: Juno, a Rainha das profundidades marinhas, onde se encerram as possibilidades latentes da vida, e Prosérpina, a deusa do mundo desconhecido que se encontra nas próprias entranhas do mundo visível.
Também, Hécate, como divindade da Luz que nos vem de longe, da Realidade Transcendente, é tríplice, sendo representada por três deusas: a primeira leva, em sua cabeça, uma meia lua, e uma tocha na mão, o símbolo da luz sensível do mundo físico; a segunda com gorro frígio e frente radiante, símbolo da luz intelectual, leva em suas mãos o cutelo da análise e da penetração, e a serpente da lógica que se insinua nas relações entre as coisas; e a terceira, cujos atributos são a corda e a chave, é o símbolo da luz transcendente que se descobre com a iniciação, e nos dá a chave do significado profundo ou razão mais verdadeira das coisas, assim como o "laço" que interiormente as une.
Uma trindade feminina, muito conhecida e familiar é a que formam as três Graças, ou seja os três aspectos da mesma Luz que se revela no ser e na vida do homem: Aglaya, a luzente, a luz espiritual que ilumina a inteligência, e nos dá essa felicidade e contentamento profundos, que tem o poder de irradiar-se fora de nós como uma benção, em nossos pensamentos, palavras e obras. A ela se deve a inspiração de toda obra de
arte ou criação intelectual, que tem o poder de elevar o homem a um plano superior.
Eufrosina, o gozo da alma, ou seja, a luz que penetra em nosso coração e produz em nós toda forma de íntimo contentamento e satisfação, a felicidade que reside dentro de nosso ser, independentemente das condições externas.
Tália, a florida, ou seja a felicidade exterior que se manifesta em todas as coisas formosas, e na mesma formosura da vida com seus bens, prazeres e coisas desejáveis.
Menos conhecida é a trindade da Horas, ou "tempos" que presidem a toda atividade, assim como às divisões do ano e do dia: o começo ou germinação, que preside à primavera; a continuação ou maturação de todo esforço, que preside ao verão; o término da obra, na qual se recolhem seus frutos, que preside o outono. Também representam a Causa, o Meio e o Efeito, os três períodos iniciáticos de preparação, iluminação e perfeição, as três divisões da vida diária no tempo dedicado ao descanso, ao trabalho e a recreação.
OUTRAS TRINDADES
A Trindade das Horas leva-nos naturalmente à das Parcas ou Moiras, filhas da Noite, ou da contingência material: Clôto, a fiandeira, da qual se origina o fio da existência, representando tudo aquilo que se acha potencialmente na mesma, relacionando-nos com o lugar ou condição "de onde viemos"; Lachesis, por cujas mãos passa toda a trama do fio da vida, presidindo o desenvolvimento atual e causal dos acontecimentos, nos quais deve ser demonstrado "quem somos" e Atropos, em cujas mãos entrega-se tudo aquilo que já nos aconteceu e o resultado de nossas ações, como sementes do que nos espera, determinando "onde vamos". Esta última é a que deve cortar, com suas fatídicas tesouras, o fio da vida quando tiver chegado a sua maturação e as violações da Lei não permitem sua ulterior continuação.
As três Fúrias ou Eumênides são, pode-se dizer, a antítese das Graças, ou suas contrapartes negativas: Alecto, a que nunca descansa, produzindo o furor rahásico, a inquietude e a paixão vingativa; Tisífone, o ódio cego ou tamásico, os erros e o remorso da alma que acompanhava o homicida; e Magara, o demônio da inveja sátvica, que ao governar o homem afasta-se constantemente da possessão e gozo de seus bens.
As três Graças ou Górgonas, Medusa, Steno e Eríagle, são emblemas das forças misteriosas que dormem em nosso ser subconsciente: nossas próprias tendências negativas, temores e ansiedades e ilusões, as que como Perseu temos de vencer não as escutando nem para elas olhando, cortando-lhes a terrífica cabeça com a espada da Sabedoria, para que de seu sangue surja Pegasso, o gênio alado do pensamento intuitivo, que nos conduza às regiões celestiais da pura Verdade.
Passando do domínio da mitologia ao da natureza, encontramos outra trindade nos três reinos, mineral, vegetal e animal, que representam três graus de evolução da forma, da vida e da consciência. Nos minerais, a forma geométrica acompanha-se da vida inorgânica e da consciência obscurecida numa comparativa inconsciência. Nos vegetais, a forma afasta-se dessa rigidez geométrica e faz-se plástica e responsiva, obedecendo à vida orgânica, que manifesta uma consciência ainda rudimentar. Nos animais finalmente, prevalece e surge em posição de domínio, o princípio da consciência, que se expressa como sensação, ação e reação, e a forma e a vida se adaptam a essa expressão.
Também podemos dizer, em relação às três gunas, ou qualidades universais da matéria, que nos minerais prevalece o princípio da inércia (Tamos ou Sal), que nos animais o princípio oposto da atividade (Rahas ou Enxofre), e nos vegetais o princípio rítmico do equilíbrio (Sattva ou Mercúrio). O primeiro tende à cristalização, o segundo ao movimento, e o terceiro a harmonia.
As três dimensões do espaço e os três aspectos do tempo constituem outros dois ternários por meio dos quais a Omnipresença Eterna do Ser Absoluto se faz manifestar na relatividade do mundo como ritmo evolutivo e perpétuo devir.
A longitude, que é medida por meio da Régua, representa o caminho da vida e o progresso na direção que escolhemos; a largura, que se relaciona com a anterior por meio do Esquadro, corresponde à amplitude de nossa visão e à extensão de nossos esforços e atividades; a altura, a qual se alcança por meio do Compasso e do Prumo, determina-se individualmente conforme a profundidade das convicções e conhecimentos, e a elevação dos ideais.
O passado, que corresponde às bases do edifício da existência e às raízes do ser, possui importância para nós uma vez que enfrentamos o problema das origens, constituindo nossa herança espiritual e material; o presente é aquele que nos relaciona com nossos deveres e responsabilidades, assim como com a obra ou atividade que constitui nossa constante oportunidade atual; o futuro, meta de nossos esforços e aspirações, é aquele que nos relaciona com nosso Destino, dando-nos o poder de superar a fatalidade (que é a herança de nosso passado), conduzindo-nos a um fim sempre mais elevado que sempre retrocede e se aproxima.
LIBERDADE - IGUALDADE – FRATERNIDADE
O conhecido trinômio maçônico Liberdade - Igualdade - Fraternidade, tem do ponto de vista iniciático um significado bem diferente do que podem ser suas interpretações político-profanas.
A Liberdade do iniciado não e, pois, precisamente, aquela que podem conceder ou limitar as leis da sociedade, e não deve particularmente confundir-se com a licença de entregar-se ao vício e à paixão, que sempre levam a desordem à vida, e nos fazem realmente escravos de nossas debilidades, hábitos e tendências negativas, e sobretudo de nossos erros.
A Liberdade, no sentido iniciático, é uma aquisição individual, interior, fundamentalmente independente da liberdade externa que pode ser outorgada pelas leis e as circunstâncias da vida. É a liberdade que se adquire buscando a Verdade e é forçando-se do erro e da ilusão, e dominando as tendências viciosas, hábitos negativos e paixões destrutivas.
É a liberdade que encontramos, e que sempre nos é dado conservar quando agimos de acordo com nossos princípios, ideais e convicções íntimas, buscando o que seja melhor em si e por si, melhor que buscando nosso guia inspirador nas aparências externas, modificando e regrando segundo estas, nossa linha de conduta e nossas ações. É, em outras palavras, o que obtemos por intermédio do uso da Régua e do Prumo, seguindo o caminho direto do Progresso e do dever.
A igualdade iniciática, do mesmo modo baseia-se na consciência da identidade fundamental de todos os seres, de todas as manifestações do Espírito ou Suprema Realidade, por cima e por trás de todas as diferenças exteriores de direção e grau de desenvolvimento. Esta igualdade, que se realiza por meio do Esquadro e do Nível, é a que nos proporciona uma justa e reta norma de conduta com todos nossos semelhantes, e nos atribui e nos faz ocupar o lugar que nos pertence no edifício da sociedade, e em qualquer outro edifício particular ao qual tivermos sido chamados a trabalhar.
Interiormente a Igualdade é a capacidade de nos sentirmos iguais em todas as circunstâncias e condições exteriores, e em todo posto ou lugar que possamos temporariamente ocupar: é a igualdade que devemos tratar de cultivar em nossos sentimentos para com os demais, independentemente de suas palavras e ações para conosco, e com uma igual serenidade nas condições favoráveis como nas adversas, na fortuna e na desgraça, no êxito e no fracasso, na perda e no ganho, ou seja, diante de todos os pares de opostos, os ladrilhos brancos e negros da existência sobre os que igualmente devemos progredir, apoiando nossos pés.
Quanto à fraternidade, deve considerar-se como a soma e o complemento da liberdade individual e da igualdade espiritual, das que constitui a adaptação prática, sendo como a base do triângulo formado por essas duas linhas divergentes. A Fraternidade é pois, tolerância com relação à liberdade, e compreensão com relação à igualdade, manifestada na desigualdade. E é, ademais, a relação que a Maçonaria estabelece entre seus membros, como núcleo e exemplo daquilo que deveria existir entre todos os homens.
Praticamente a Fraternidade pode, entretanto, estabelecer seus laços unicamente entre os que se sentem Irmãos, ou seja, efetivamente filhos de um mesmo Pai, o Princípio Universal da Vida ou Ser Supremo, e de uma mesma Mãe, a Natureza, que a todos igualmente deu origem, sustentando-nos e nos alimentando. Com esse reconhecimento a Fraternidade faz-se efetiva, e segundo se generalize, chegará a espalhar-se sobre toda a terra e todos serão, como deveria e como deve ser, a relação normal entre todos os homens e povos.
Todos os homens podem ser irmãos segundo conhecem e realizam no íntimo de seus corações a Verdade da Fraternidade; isto é, de sua relação comum com o Princípio da Vida, por um lado, e pelo outro com o meio que os hospeda. Cairão então, as barreiras ilusórias que atualmente dividem os homens, conforme cai a venda que cobre seus olhos, e a Maçonaria terá espargido efetivamente sua Luz sobre toda a terra.
AS LETRAS DO ALFABETO
O estudo e o conhecimento dos três primeiros números deve ser integrado e completado pelas cinco primeiras letras, que são as que especialmente se referem ao grau de Aprendiz. Este estudo é aquele relativo à gramática simbólica com a qual deve familiarizar-se o adepto do primeiro grau.
Uma vez conhecidas as letras, será possível combiná-las relacioná-las mutuamente, por meio da lógica, e assim ler as palavras que resultem de sua combinação. E com a experiência adquirida no estudo da Lógica, adestrando-se na Retórica, isto é, no uso construtivo do Verbo Criador.
A primeira letra do alfabeto mostra em sua forma greco-latina os dois princípios ou Forças Primordiais que partem do ponto originário e formam o ângulo; a dualidade que expressa a Unidade e produz a manifestação ternária; o triângulo que nasce do ângulo, por intermédio de uma linha horizontal - o terceiro Princípio ou elemento - que une seus dois lados.
Como primeira letra, assim como pelo simbolismo evidenciado em sua forma, mostra- nos a origem de tudo e sua progressiva manifestação; a involução ou revelação do Espírito no reino da forma e da matéria.
A forma hebraica desta mesma letra (cujo nome é alef, que significa "boi" e que tem o valor numérico um, apresenta-nos na linha oblíqua central o Primeiro Princípio Unitário do qual se manifestam as duas Forças ou Princípios, respectivamente ascendente e descendente, ou seja centrífuga e centrípeta, masculina e feminina, representadas pelas duas colunas. É em si mesmo um signo de equilíbrio, enquanto demonstra o domínio dos opostos e a Harmonia produzida por sua atividade coordenada. Em seu conjunto indica a tri-unidade, isto é, a Trindade manifestada pela Unidade.
A letra B é uma clara expressão da dualidade dos dois Princípios que evidenciam a Lei de Polaridade; mostra a relação entre o Superior e o Inferior - o Céu e a Terra, uma dupla relação curvada e bem diferente em seus dois aspectos no lado direito (que corresponde à involução ou revelação do Espírito na matéria), e direita do outro lado (ao lado ascendente que corresponde à evolução do Espírito expressado na Matéria). O lado direito mostra o domínio do homem, e a dupla linha curva, o da natureza.
Já falamos do significado desta letra, em relação às demais, que formam a Palavra Sagrada.
A forma da letra C é originariamente a de um esquadro, e com tal se apresenta nos alfabetos fenícios, etrusco e grego (onde tem o nome de gamma e o som da letra G). Como tal, seu significado primitivo é o do instrumento maçônico da retidão. Enquanto a sua forma latina, mostra um arco que podemos considerar emblemático da tensão das energias individuais para alcançar um fito ou objeto determinado. Também, representa o ciclo descendente da involução, que deve completar-se com a obra individual de ascensão evolutiva.
No alfabeto hebraico esta letra toma o nome de guimel (camelo) e tem o valor numérico três. Refere-se ao progresso vertical individual do homem de baixo para cima, como o mostra a pequena linha ascendente que forma o pé da figura.
O camelo, conhecido por sua torpeza como por sua docilidade e resistência, mostra o corpo do homem, que de obstáculo deve transformar-se em instrumento dócil e resistente para a expressão das possibilidades superiores da vida. Este simbolismo encontra de uma certa maneira uma correspondência na forma egípcia da dita letra, que representa um avental, símbolo da pele ou corpo físico do homem.
A letra D está representada por um triângulo nos alfabetos dos quais derivou sua forma latina. Este triângulo, é o mesmo delta, e com esse nome é conhecida no alfabeto grego.
Se bem que também a forma difira do mesmo modo que a precedente letra do alfabeto grego, seu nome no alfabeto hebraico é daleth, significando "porta", com valor numérico quatro. Mostra efetivamente um dos lados ou colunas que suportam a arquitrave e formam com o mesmo a porta. Representa a introdução parcial ou imperfeita do Aprendiz na Verdade, tendo reconhecido unicamente um de seus dois lados ou aspectos.
Quanto à forma latina, cujo valor numérico é 500, não nos é difícil ver nela igualmente uma porta com o arco; mas posta horizontalmente.
A letra E necessita, para sua interpretação, que a confrontemos com a forma fenícia primitiva da qual descende, e que damos juntamente com a greco-latina. Aparenta esta letra a forma de três esquadros que se sucedem numa mesma linha, clara alusão aos três passos da Marcha do Aprendiz. Também indica, em sua forma greco-latina, os três mundos ou planos de existência, através dos quais se manifesta um idêntico Princípio de Vida (a linha vertical).
A letra hebraica he, à qual corresponde o valor numérico cinco - e cujo nome significa "buraco" ou "janela" - mostra o progresso realizado pelas aspirações do Aprendiz em relação à letra precedente, e indica claramente a senda que se abre para reconhecer e manifestar suas potencialidades latentes.
A LÓGICA E A RETÓRICA
O estudo da Gramática conduz naturalmente ao da Lógica, isto é, à compreensão do Verbo ou Logos que constitui a Realidade interior representada por cada símbolo ou letra da Verdade, assim como ao reconhecimento de suas relações.
A lógica é pois, primitivamente, a faculdade de relacionar as letras simples para formar e interpretar palavras ou orações, isto é, conjuntos harmônicos que tem um sentido definido; e este sentido possui o mesmo Verbo ou logos que se encontra no princípio de tudo: "Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez".
A Gramática, ou seja o estudo dos símbolos, é pois, uma introdução ao conhecimento ou percepção espiritual da Realidade que é o Verbo. Este conhecimento faz-nos entrever a relação lógica entre todas as coisas, e particularmente entre as causas e princípios invisíveis e seus efeitos visíveis.
Com a Retórica aprendemos o uso deste conhecimento, levando à expressão, o Verbo ou princípio latente do que desejamos. A eficácia e efetividade desta faculdade depende inteiramente do progresso realizado na precedente: devemos aprender a relacionar-nos intimamente com o Verbo Criador, para poder expressá-lo e depois vê-lo manifestado.
Quando entendemos o significado esotérico destas duas Artes, facilmente compreenderemos porque o aprendiz pode tão somente familiarizar-se com seus primeiros rudimentos, na medida em que estes o ajudam a melhor dominar a Gramática. Somente ao Companheiro será possível medir com sua inteligência os significados da Lógica, e só o Mestre poderá avançar com real eficiência no domínio da Retórica.
O TEMPLO
O Templo é o lugar onde se desenvolvem os trabalhos maçônicos e é reunida a Loja, manifestação do Logos ou Palavra que vive em cada um de seus membros e encontra em seu conjunto uma expressão harmônica e completa.
É, ao mesmo tempo, um lugar de trabalho e de adoração, uma vez que nunca cessa de construir-se enquanto for de real proveito a todos; e como esta construção simbólica necessita ser a expressão do Plano do Grande Arquiteto, no qual a atividade construtiva busca sua inspiração, este esforço constante em direção à Verdade e à Virtude é a mais efetiva e verdadeira adoração.
Etimologicamente, a palavra templo relaciona-se com o sânscrito tamas, "escuridão", de onde vem também o latim tenebrae (por temebrae), "Trevas". Significa, portanto, lugar escuro, e por conseguinte "oculto", aludindo ao antigo costume de construir os templos em grutas ou criptas subterrâneas, fora da luz exterior e ao amparo da indiscrição profana.
Isto informa-nos que todos os templos no princípio, foram antes de tudo, lugares de recolhimento e silêncio; e da mesma forma também o são os templos sucessivamente erigidos sob uma forma arquitetônica específica mas sempre caracterizados interiormente por essa penumbra mais ou menos completa que favorece à concentração do pensamento e à sua elevação para o transcendente, em direção ao que há de menos conhecido e misterioso. Também este isolamento do mundo exterior é favorecido por uma atenção mais profunda sobre os ritos e cerimônias que nesses templos - sejam religiosos ou iniciáticos - tem se sempre desenvolvido.
O Templo maçônico é um quadrilongo estendido do Oriente ao Ocidente, isto é, "em direção à Luz". Sua largura é do Norte ao Sul (desde a potencialidade latente à plenitude do manifestado), e sua altura do Zênite ao Nadir. Isto quer dizer que praticamente não tem limites e compreende todo o Universo, no qual se esparge a atividade do Princípio Construtivo, que sempre atua na direção da Luz, como pode ser observado em toda a natureza.
Todos os templos antigos, qualquer que fosse o uso ao qual estivessem destinados, apresentavam esta característica comum de orientação, muitas vezes com maravilhosa exatidão. Ainda que a orientação mais freqüente seja aquela que exatamente é indicada pela própria palavra (em direção ao Oriente), alguns templos apresentam a direção oposta, estando a porta situada do lado do Oriente, para que os primeiros raios do Sol incidam em determinado ponto, que resplandece repentinamente na semi-escuridão do lugar. Em alguns casos, familiares aos arqueólogos, esta orientação na direção ao Sol é feita por intermédio de um corredor estreito, de forma que os raios luminosos por ele possam passar unicamente em certo dia ou época do ano (geralmente solstício e equinócio). Outros templos estão orientados em direção a alguma estrela particular de primeira magnitude (como Sirius, Canopus, ou a Estrela Polar, em certos templos egípcios).
Quanto às três dimensões do Templo, podemos considerá-las até certo ponto equivalentes; tanto o Norte e o Zênite, como o Oriente, indicam o Mundo Divino dos Princípios ou domínio do Transcendente; enquanto o Sul, o Nadir e o Ocidente representam, de diferentes modos, o mundo manifestado ou fenomênico.
A diferença baseia-se principalmente em que a direção do Oriente ao Ocidente refere-se à Senda da vida ou Caminho do Progresso; a do Norte ao Sul, à Lei dos ciclos, que nos aproxima alternativamente do domínio das Causas e dos Efeitos; e a vertical, ao Pai e a Mãe, de quem somos igualmente filhos, ou seja, às duas gravitações, celestial e terrena, que respectivamente atraem nossa natureza espiritual e material.
Também podemos ver nestas três direções dimensionais uma alusão aos três movimentos da Terra: de rotação (Oriente-Ocidente), de revolução (Norte-Sul) e de precessão (Zenite-Nadir): ou seja, as três dimensões dinâmicas do mundo em que vivemos.
AS TRÊS LUZES
Três grandes colunas sustentam o Templo Maçônico (distintas das duas que se encontram no Ocidente): a Sabedoria, a Força e a Beleza, ou seja a Omnisciência, a Omnipotência e a Omnipresença do G. A., reafirmadas como Princípios de Verdade, de Atividade e de Amor ou Harmonia. Estas três colunas representam ao Ven. Mestre e ao 1ºe 2º Vig. que tem assento respectivamente no Oriente, no Ocidente, e no Meio dia, onde são manifestados respectivamente aquelas três qualidades.
O Delta luminoso, com o Olho Divino no centro, brilha no Oriente por cima do assento do Ven. Mestre, símbolo do Primeiro Princípio, que é a Suprema Realidade, em seus dois lados, ou qualidades primordiais que a definem, expressas em síntese inimitável a no trinômio vedântico Sat-Chit-Ananda.
Nos dois lados do Delta, que representa a verdadeira luz (a luz da Realidade transcendente), aparecem o sol e a lua, os dois luminares visíveis, manifestação direta e refletida dessa luz invisível, que ilumina nossa terra e que simbolicamente representam a Luz Intelectual e a Material.
O PAVIMENTO DE MOSAICO
A três passos da porta, que se encontra no Ocidente, estão situadas as duas colunas, J. e B., emblema dos dois princípios e dos pares de opostos que dominam o mundo visível. A atividade combinada destes dois princípios aparece manifestadamente no pavimento de mosaico em ladrilhos brancos e negros, que se estendem desde a base das colunas em direção ao Oriente, igualmente em forma de quadrilongo, ocupando o centro do Templo.
O pavimento de mosaico é um belo emblema da multiplicidade engendrada pela dualidade, constituída pelos pares de opostos que se encontram constantemente um perto do outro; o dia e a noite, a obscuridade e a luz, o sonho e a vigília, a dor e o prazer, as honras e as calúnias, o êxito e a desilusão, a sorte e o azar, etc. Sobre estes opostos, que se encontram em todos os caminhos e em todas as etapas de nossa existência, o iniciado que tenha provado da Taça da Amargura deve marchar com ânimo sereno e igual, sem deixar-se exaltar pelas condições favoráveis nem reprimir-se pelas aparências desfavoráveis.
Por cima desta visão dualística da vida formada por pares de opostos, levanta-se a ara ou Altar (etimologicamente "altura" ou elevação), símbolo da elevação de nossos pensamentos, por meio do qual percebemos a realidade transcendente que se esconde sob a aparência contraditória, e atingimos o conhecimento da palavra, ou seja da Verdade, que é o propósito intimamente benéfico de toda experiência, sempre compreendida como útil ao nosso progresso e benefício mais verdadeiro.
As três luzes que se encontram sobre o altar, formando um triângulo equilátero, representam a necessária relação, que deve existir em nossa inteligência, entre a dualidade ocidental (ou fenomênica) das colunas e a Unidade Oriental da Verdadeira Luz, por meio da qual se realiza o ternário da harmonia e do perfeito equilíbrio, sobre todos os extremos e as tendências dualistas.
Entre estas luzes tem seu lugar mais conveniente o livro sagrado, símbolo da Verdade que se encerra na tradição, uma vez que saibamos convenientemente interpretá-la por meio de nossas faculdades inteligentes, representadas pelo esquadro e o compasso que são colocados sobre esse livro para que possamos realmente compreendê-lo e medi-lo em toda a sua extensão.
O CÉU
O teto da Loja representa um céu estrelado, imagem do Infinito e de sua manifestação ativa nos infinitos pontos ou centros luminosos, que expressam de dentro para fora a Luz Latente do Princípio Supremo.
Esse Céu representa o espaço do qual cada ponto é igualmente centro geométrico, origem e fim. Sua cor azul, em contraste com o vermelho do pavimento, é representativa das mais elevadas vibrações, tanto individuais como cósmicas, que estão por cima da manifestação sensível, e a completam e coroam.
Podemos ver nele também, uma imagem de nossa mente, ou mundo causativo interior, que preside às condições da vida, aproveitando-as construtivamente e transmutando-as. As estrelas representam as Idéias Divinas, que manifestam o mundo da Realidade e da Verdade, as idéias salvadoras que revelam o Plano do G. A. e guiam em harmonia com ele, nossos pensamentos e ações, os ideais que nos inspiram e orientam em todas as etapas de nossa existência.
Sob o teto, desde a porta ocidental, onde terminam seus dois extremos, está a mística cadeia de união, entrelaçada em doze nós laterais e descansando sobre os capitéis de doze colunas assim distribuídas: seis no lado Norte e seis no Sul, simbolizando os seis signos ascendentes e os seis signos descendentes do zodíaco.
A cadeia é o laço interior que une todos os maçons por cima de suas diferenças pessoais, fazendo deles uma só Família Universal. Este laço interior deve ser buscado individualmente, esforçando-se cada um em manifestar o mais elevado em pensamentos e ideais (os capiteis em que descansa). É também a corrente da causalidade que se manifesta ininterruptamente no mundo dos efeitos, no qual todo pensamento ou ato é efeito de uma causa antecedente, e causa por suas vez, de um efeito conseqüente.
ASSENTOS E POSIÇÕES
Em ambos os lados, Norte e Sul, estão os assentos, respectivamente, dos Aprendizes, dos Companheiros e dos Mestres: os primeiros devem sentar-se na região menos iluminada pelo Sol por serem ainda incapazes de suportar a plena luz do Meio-dia, onde os Companheiros e os Mestres, do lado do Ocidente e do Oriente, respectivamente, trabalham proveitosamente, os primeiros ajudando aos últimos.
A parte oriental do Templo encontra-se erguida sobre três degraus, em relação ao piso da Loja, significando com isso que não é possível chegar ao mundo das Causas a não ser, elevando-se por meio da abstração e da meditação às regiões superiores do pensamento, onde aparecem com clareza os Princípios originários que constituem a Essência Eterna das coisas sensíveis.
Sobre esta elevação tomam assento, respectivamente ao Norte e ao Sul, e à direita e à esquerda do Ven. Mestre, o Secretário e o Orador, e mais abaixo, o Hospitaleiro e o Tesoureiro, o Porta Estandarte e o Mestre de Cerimônias. Estes com os dois Diáconos, os dois Expertos e o Guarda do Templo, constituem os oficiais da Loja, que cooperam com os três Dignatários nas diferentes cerimônias que se desenvolvem para a ordem e harmonia dos trabalhos.
De acordo com a etimologia que temos dado a essa palavra, o templo maçônico não tem janelas: isto significa que não recebe luz de fora, mas unicamente de dentro. Por esta razão deve ser fechado hermeticamente ao mundo profano e sua porta está constantemente vigiada pelo Guarda do Templo, armado de espada, símbolo da vigilância que constantemente devemos exercer sobre nossos pensamentos, palavras e ações, para fazer delas um uso construtivo, e progredir constantemente na senda da Verdade e da Virtude.
Capítulo IV
APLICAÇÃO MORAL E OPERATIVA DA DOUTRINA SIMBÓLICA DO GRAU DE APRENDIZ TRABALHO DO APRENDIZ
Desbastar a pedra bruta, aproximando-a numa forma em relação ao seu destino: heis aqui, a tarefa ou trabalho simbólico ao qual deve dedicar-se todo o Aprendiz para chegar a ser o Obreiro que domina inteiramente sua Arte.
Neste trabalho simbólico, o Aprendiz é ao mesmo, tempo obreiro, matéria-prima e instrumento. Ele mesmo é a pedra bruta, representativa de seu atual e ainda muito imperfeito desenvolvimento, à qual e ainda mui imperfeito desenvolvimento, à qual tem de converter numa forma ou perfeição interior, que se encontra em estado latente dentro dessa imperfeição evidente, de modo que possa tomar e ocupar o lugar que lhe corresponde, de acordo com o Plano, no edifício ao qual está destinada.
Uma vez que a Perfeição, é infinita, e em seu estado absoluto inacessível, somente podemos esperar conseguirmos aproximarmo-nos da perfeição ideal que nos é dado conceber no estado ou etapa de progresso em que atualmente nos encontramos. Nosso progresso desenvolve-se, pois, através de graus sucessivos de perfeição relativa, e o próprio reconhecimento de nossa imperfeição por um lado (a pedra bruta), e o de um ideal que desejamos, pelo outro, são as primeiras condições indispensáveis para que possa existir um tal esforço ou trabalho.
O próprio trabalho consiste em despojar a pedra de suas asperezas, pondo primeiro em evidência as faces ocultas no estado de rudeza natural da pedra; depois retificar essas faces, alisando-as e tirando todas aquelas protuberâncias que a afastam de uma forma harmoniosa com aquela que é preciso obter.
É importante notar que não se trata de aproximar a pedra da forma de determinado modelo exterior, se bem que isto possa servir de motivação e inspiração, o importante é que o modelo ou perfeição ideal tem de ser procurado dentro da própria pedra, de cujo foro íntimo há de ser manifestada ou extraída a própria forma a qual cada pedra idealmente pertence. Ou seja, abandonando a metáfora, trata-se reconhecer e manifestar a perfeição inata do Ser Íntimo, da Idéia Divina que habita em cada um de nós, cuja expressão relativa e progressiva é o objeto constante da existência.
OS INSTRUMENTOS E A OBRA
Esse trabalho na pedra, que também historicamente é o primeiro trabalho humano requer para a sua perfeição três instrumentos característicos, que são o malho, o cinzel e o esquadro. Este último serve de medida afim de assegurar-nos que a obra mais especificamente ativa dos dois primeiros esteja de acordo com as normas ou critérios ideais universalmente reconhecidos e aceitos; aqueles são os meios complementares com os quais a perfeição concebida ou reconhecida fazer-se-á efetiva.
O esquadro representa fundamentalmente a faculdade do juízo que nos permite comprovar a retidão ou a sua falta, ou seja a forma octogonal das seis faces que tratamos de lapidar, assim como a de suas arestas e dos oito ângulos triedros nos quais elas se unem, como o objetivo de fazer com que a pedra se torne retangular, como deve ser toda pedra destinada a formar parte de um edifício.
É por intermédio do esquadro que nossos esforços para realizar o ideal ao qual nos propusemos podem ser constantemente comprovados e retificados. Isto é feito de maneira que estejam realmente encaminhados na direção do ideal, conforme é demonstrado pela simbólica marcha do Aprendiz, que ensina a cuidadosa aplicação desse valioso instrumento sobre cada passo e em cada etapa de nossa existência diária.
Desta forma, o malho e o cinzel, como instrumentos propriamente ativos, representam exatamente os esforços que, por meio da Vontade e da Inteligência, temos de fazer para nos aproximarmos da realização efetiva desses Ideais, que representam e expressam a perfeição latente de nosso Ser Espiritual. O malho, que utiliza a força da gravidade de nossa natureza subconsciente, de nossos instintos, hábitos e tendências, é pois, representativo da Vontade, que constitui a primeira condição de todo progresso e é ao mesmo tempo o meio indispensável para realizá-lo.
Temos de querer antes de poder realizar, assim como para realizar e poder realizar, sendo a Vontade a força primeira da qual podem se considerar originárias todas as demais forças, e portanto aquela que a todas pode dominar, atrair e dirigir.
Devemos entretanto, precaver-nos dos excessos aos quais poderão nos conduzir o culto exagerado da faculdade volitiva, uma vez que os resultados desta Força soberana entre todas as forças cósmicas podem também ser destrutivos, quando essa força não for aplicada e dirigida construtivamente por meio do discernimento necessário à sua manifestação mais harmônica, de acordo com a Unidade de tudo o que existe. Pois assim, como o malho utilizado sem o auxílio do cinzel, instrumento que concentra e dirige a força daquele em harmonia com os propósitos da obra, poderá facilmente destruir a pedra em vez de aproximá-la da forma ideal de sua finalidade assim igualmente a Vontade que não é acompanhada do claro discernimento da Verdade não pode nunca manifestar seus efeitos mais sutis, benéficos e duradouros.
O propósito inteligente que deve dirigir a ação da vontade é aquilo que é representado exatamente pelo cinzel, como instrumento que complementa o malho na Obra maçônica. Essa faculdade que determina a linha de ação de nosso potencial volitivo não é menos importante uma vez que de sua justa aplicação, iluminada pela Sabedoria que é manifestada como discernimento e visão geral, dependem inteiramente a qualidade e a bondade intrínsecas do resultado: ou uma formosa obra de arte sobre a qual se concentra a admiração dos séculos, ou então a obra tosca e mal formada que revela uma imaginação enferma e um discernimento ainda rudimentar.
Para que a ação combinada de ambos os instrumentos seja realmente maçônica, isto é, útil e benéfica para o propósito da evolução individual e cósmica, ela deve ser constantemente comprovada e dirigida pelo Esquadro da Lei ou norma de retidão, cujo ângulo reto representa a retidão de nossa visão, que nos coloca em harmonia com todos os nossos semelhantes fazendo-nos progredir retamente na Senda do Bem.
Esta atividade eminentemente diretora do Esquadro, que representa e expressa a Sabedoria, faz dele o símbolo mais apropriado do Ven. Mestre, assim como o malho, emblema da Força, pode ser atribuído ao 1° Vigilante, e o cinzel, produtor da Beleza, ao Segundo. Assim como a atividade combinada dos três instrumentos é indispensável à obra maçônica, da mesma forma a cooperação mais completa das três luzes da Loja e indispensável para que esta possa desenvolver um trabalho realmente fecundo.
IDEAL
Os dois Vigilantes representam também, respectivamente, o nível e o prumo. Este último principalmente diz respeito ao Aprendiz, ao demonstrar a direção vertical de seus esforços e de suas aspirações, para realizar o que há de mais elevado em seu ser e em suas potencialidades latentes.
Este esforço, em sentido oposto à gravidade dos instintos, é o que caracteriza o maçom no seu desejo de aperfeiçoamento. Sua mira deve, pois, dirigir-se constantemente ao Ideal mais elevado de sua alma, para realizá-lo em cada pensamento, palavra e ação.
Assim, como a planta cresce e progride por meio de seus esforços verticais, também, nós ao fixarmos nosso olhar no Ideal que nos revela a verdadeira luz, cresceremos em sua direção e chegaremos a encarná-lo, avançando na senda de nosso progresso individual.
Este é o uso que devemos fazer do prumo para erigir o simbólico Templo à Glória do Grande Arquiteto, do qual procedem nossas mais elevadas aspirações: o Templo que construímos ou erguemos em nosso interior com nossa própria vida, a atividade construtora que age em nós de acordo com os planos da Inteligência Criadora ou Princípio Evolutivo do Universo, com a qual temos o privilégio de cooperar conscientemente com nosso entendimento e boa vontade.
O Templo e a pedra cúbica são uma mesma coisa: o Ideal que devemos realizar individualmente em nossa vida esforçando-nos para superar nossos defeitos e debilidades, vencer e dominar nossos vícios, instintos e paixões, que são as asperezas da pedra bruta que representa nosso estado de imperfeição.
O aperfeiçoamento de si mesmo: heis aqui a parte essencial e fundamental da Obra do Aprendiz. Um aperfeiçoamento que consiste em educar, ou seja eduzir: exteriorizar e manifestar à Luz, as gloriosas possibilidades de nossa Individualidade, despojando-nos dos defeitos, erros, vícios e ilusões da personalidade, a máscara que esconde nossa verdadeira natureza.
Caminhar e esforçar-se para a Luz, buscar a Verdade e estabelecer em seu domínio o Reinado da Virtude, libertar-se progressivamente de todas as sombras que escurecem e impedem a manifestação desta Luz Interior que deve brilhar sempre, mais clara e firmemente esclarecendo e destruindo toda treva, é, em síntese, a nobre tarefa de todo verdadeiro maçom.
Uma vez que tenhamos aberto os olhos a este superior estado de consciência e que a tenhamos diretamente reconhecido, esta Luz que esta em nós, manifestar-se-á naturalmente ao nosso redor a vida toda, assim como em nossos pensamentos, palavras e ações.
PENSAMENTO, PALAVRA E AÇÃO
Pensar, falar e agir, conforme melhor for possível, de acordo, com nossos mais íntimos ideais e profundas convicções, é um trinômio que diretamente nos diz respeito em cada momento de nossa existência diária.
Pensar bem é pensar retamente, de acordo com o esquadro do Juízo, orientando toda nossa atividade mental para aquilo que em si for bom, belo e verdadeiro. O pensamento reto é pensamento positivo e construtivo, assentado sobre as funções invioláveis da Verdade e do Bem: os pensamentos inarmônicos que descansam sobre a ilusão devem ser afastados da mente, assim como foi feito simbolicamente por Jesus com os profanadores do Templo.
Esse esquadro deve apoiar-se, conforme é indicado pelo sinal do Aprendiz, sobre a garganta, para medir todas nossas palavras, em conformidade com nossos ideais e sentimentos mais elevados, rechaçando todas aquelas que não estiverem de acordo com essa medida, de forma que elas nunca se façam porta vozes de nossas tendências mais baixas e negativas, de nossos erros e juízos superficiais, de nossos ressentimentos e paixões mesquinhas, ou do domínio que a ilusão pode ainda ter sobre nós. Devemos assim mesmo, evitar toda crítica que não seja realmente construtiva, e sobre tudo não seja realmente construtiva, e sobre tudo não nos permitir nenhuma expressão que não seja inspirada por uma verdadeira benevolência.
O domínio das palavras é mais fácil que dos pensamentos, e na medida da sinceridade individual, tende a produzi-lo. Mas, este último é, naturalmente, o mais importante, uma vez que nossas palavras não podem expressar a não ser aquilo que "está em nosso coração". Desta forma à seleção das palavras deverá seguir a dos pensamentos, conforme é indicado, como veremos, pelo sinal de Companheiro.
Da mesma maneira, conforme dominemos nossas palavras e pensamentos, será possível dominarmos também nossas ações. Assim chegaremos ao terceiro ponto: agir bem, ou seja, acertadamente, e em nível com as leis morais de equidade e justiça que governam as relações harmônicas entre os homens, e em aprumo com nossos próprios princípios, ideais e aspirações. Este é pois, o sinal com o qual se dá universalmente a conhecer e reconhecer o Maçom.
Assim é como deve se usar o esquadro, horizontalmente, para medir nossas palavras, e verticalmente, para corrigir os pensamentos, e como nossas ações devem, por meio do nível e do prumo, estar igualmente em harmonia com estes e com aquelas.
O TOQUE
Também, o toque tem um sentido profundo, do fato que passa desapercebido à maioria dos maçons, uma vez que significa, de uma maneira geral, a capacidade de reconhecer a qualidade real que se esconde sob a aparência exterior de uma pessoa, e portanto, implica num grau de discernimento proporcional ao grau de compreensão que individualmente alcançamos.
Enquanto o homem profano ao conhecimento da Verdade (conhecimento que é conseguido por meio da iniciação) baseia seus juízos e suas apreciações em considerações puramente exteriores, o iniciado esforça-se em ver tudo à Luz do Real e julgar de uma forma bem diferente por ter adquirido, a faculdade de ver as qualidades reais, íntimas e profundas das coisas num grau proporcional à sua iniciação.
Em vez de ficar na superfície, na máscara, que constitui a personalidade, ou seja a parte mais superficial e ilusória do homem, esforça-se em ver sua individualidade, ou a expressão individualizada do Princípio Divino em si mesmo, que constitui seu Espírito, o Homem-Real, Eterno e Imortal.
As batidas são os toques simbólicos com os quais a qualidade do maçom vibrará em resposta natural e de forma expontânea manifestando-se como tal. Este reconhecimento prepara para o abraço fraternal através do qual é comunicada a Palavra, ou seja o Verbo e o Ideal mais elevado que está presente em seus corações que escondem zelosamente para o mundo profano da crítica e da malevolência, as "más ervas" que sufocariam e impediriam o crescimento desses preciosos germes espirituais.
Cada golpe é um esforço para penetrar sob a pele, ou seja debaixo da ilusão da aparência, até encontrar o Ser Real; é a busca individual, para descobrir o Mistério Final dentro de si mesmo e de todas as coisas nas três etapas que representam as palavras evangélicas: Buscai e achareis, pedi e vos será dado, batei e vos será aberto, referindo-se à Verdade, à Luz e à Porta do Templo.
Assim, pois, o toque manifesta e reconhece a qualidade do iniciado nos Mistérios da Construção, que se desenvolvem no indivíduo e em todo o Universo. E expressa também, como conseqüência natural, a solicitude fraternal que o iniciado manifestará em todas suas relações com seus semelhantes, e particularmente com seus irmãos.
A PALAVRA
Assim como o toque mostra que o maçom deve esforçar-se por penetrar na essência profunda das coisas em vez de ficar na superfície, a palavra mostra seu ato de fé e a atitude interior de sua consciência.
A palavra Sagrada que o Aprendiz obtém como prêmio final de seus esforços, depois de ter-se submetido às provas de iniciação, longe de ser uma palavra sem sentido, possui um significado profundo cuja compreensão e aplicação vale o esforço que foi empreendido para consegui-la. É uma palavra que é dada secretamente para que permaneça no segredo da consciência, e o aprendiz dela faça o uso fecundo que demonstra sua compensação.
A Palavra Sagrada significa: Na Força, e é, portanto o implícito reconhecimento (conseqüência da iluminação recebida, como resultado de seus esforços nas viagens do Ocidente ao Oriente) de que a Força Verdadeira e Real não reside no mundo da aparência nem nas coisas materiais, mas no Mundo Transcendente no qual reside o Princípio Imanente de tudo.
Este reconhecimento, quando for efetivo e profundo convencimento da alma, deve produzir uma mudança completa na atitude do ser: o iniciado diferenciar-se-á assim do profano, e em vez de pôr, como este, sua confiança nas coisas e meios exteriores, pô-la- á unicamente no princípio da Vida, que é o Princípio do Bem, cuja presença e onipotência terá reconhecido dentro de seu próprio ser.
O conhecimento e o uso da Palavra Sagrada é, pois, a base da verdadeira liberdade e independência: cessando de depender por completo das coisas externas e do capricho dos homens, o iniciado liberta-se das considerações materiais, que prendem a todos os que ainda não sabem onde se encontram a Força e o Verdadeiro Poder e que assim são geralmente escravos destas coisas.
Deste modo aprende o iniciado a não dobrar nunca o joelho ante os homens, elevados que sejam seus postos e os cargos que possam ocupar na sociedade, tornando-se igual aos reis ao tratar a todos os homens sem orgulho nem arrogância, e igualmente sem medo e sem temor, ou seja, simplesmente como irmãos.
Mas, sabe dobrá-lo ante o Eterno, reconhecendo-o como a única Realidade e o único poder, tirando como Moisés, ante a sarça ardente, os sapatos da ignorância e presunção, e humilhando diante Dele as asperezas de sua personalidade, para poder receber Sua Luz e tornar-se receptivo à Sua Influência, em íntima comunhão, no místico segredo da alma.
O PRIMEIRO MANDAMENTO
A Palavra Sagrada do Aprendiz possui um significado análogo ao Primeiro Mandamento: Eu sou o Senhor teu Deus: não terás outro Deus diante de mim. Aqui também vemos o implícito reconhecimento de uma só Realidade, a Realidade Espiritual de tudo; de um só Princípio, Poder e Força: o Princípio da vida, que é o Princípio do Bem e o Poder e a Força que Nele unicamente residem.
A segunda parte do mandamento mostra como neste reconhecimento devemos encontrar o poder soberano que nos assiste e nos faz triunfar sobre toda ilusão ou crença no poder ou na força das coisas exteriores. A confiança deve ser depositada única e exclusivamente no Real, naquela Realidade da qual adquirimos (como resultado da iniciação) a consciência e o contato interior, que é portanto, nosso "Pai ou Senhor", e não nos falsos deuses das considerações triviais aos quais tributam sua adoração a maioria dos homens.
Este Princípio que vive em nós é nosso Deus, ou seja, a Luz que nos conduziu para fora do Egito, a ilusão dos sentidos, o país das trevas e da escravidão. O Êxodo de Israel é pois, uma pitoresca imagem da iniciação, do êxodo individual do povo eleito dos iniciados, fora dos falsos deuses, ou seja, as ilusões dos sentidos, para chegar à Terra Prometida da liberdade e da independência.
A PRIMEIRA COLUNA
A Palavra Sagrada do Aprendiz é também o nome da primeira das duas colunas que se encontram à entrada do simbólico Templo erigido pela iniciação: o Templo da Verdade e da Virtude.
Isto quer dizer que seu reconhecimento é o Princípio Básico (ou coluna) que pode nos conduzir a atravessar a Porta daquele Templo: sem este reconhecimento nunca poderemos esperar nele adentrar; sua porta permanecerá fechada até que reconheçamos essas duas colunas, das quais unicamente a primeira diz respeito ao grau de Aprendiz.
Esta coluna próxima à qual o Aprendiz recebe seu salário é pois a Coluna da Fé, coluna que ele mesmo deve erigir em si dela fazendo um ponto de apoio. E um princípio do qual nunca deve se separar, em seus pensamentos, palavras e ações, sob cuja condição poderá atuar de uma maneira sempre segura e construtiva em todas as circunstâncias de sua vida.
De tudo quanto já temos dito percebe-se com toda a clareza e importância da Palavra e da interpretação de seu significado, por ser a inteligência e o uso desta Palavra o que verdadeiramente faz o iniciado e o maçom. Esta Palavra pode e deve ser aplicada indistintamente em todas as condições da existência, estando nela o Poder de libertar- nos do mal e estabelecer-nos no Bem.
Se, portanto, aprendemos a permanecer fiéis, a esta Palavra ou de temor cessará de nos dominar e de Ter poder sobre nós: se a Força está Nele (que é a Realidade e o Princípio do Bem), toda aparência do mal é só uma ilusão que tem poder sobre nós enquanto nossa mente reconhece esta ilusão como "realidade", mas que desaparece tão logo paramos de lhe dar em nosso foro íntimo realidade e poder.
O temor é pois, a única corrente que nos prende ao mal e pode lhe dar domínio sobre nós: se cessamos de temer o mal e, com plena e profunda convicção de nossa consciência, lhe negamos uma verdadeira existência e realidade, fugirá de nós como fogem as trevas ao aparecer a luz. Isto explica como Daniel, verdadeiro iniciado e fiel à Palavra, pode estar perfeitamente tranqüilo em meio aos leões famintos, e como estes não lhe causaram dano algum.
Esta coluna de Fé absoluta no Princípio ou Realidade cuja existência e onipotência reconhecem em si mesmo, é aquela que o Iniciado deve levantar em seu interior para que lhe sirva de base para apoiar todos seus esforços, tanto de baluarte como de defesa em qualquer circunstância ou perigo.
O PRINCÍPIO DO BEM
A palavra reconhece implicitamente o Bem como único Princípio, Realidade e Poder, e consequentemente o Mal como pura ilusão e aparência que não tem Realidade nem poder verdadeiros.
Este é o ensinamento de todos os iniciados: daqueles que chegaram a penetrar e estabelecer-se com sua consciência por cima do domínio do aparente, onde o Bem e o Mal figura como poderes iguais, como pares de opostos irreconciliáveis que lutam constantemente um contra o outro, e que se alternam como o dia e a noite, a luz e as trevas, a vida e a morte.
O iniciado sabe que, detrás do mundo da aparência, existe uma só e única Realidade, e que esta Realidade é o Bem: Bem Infinito, Onipresente e Onipotente; que além desta única e pura Realidade, nada existe e nada pode existir. Que aquilo que consideramos mal é uma sombra inconsistente, uma verdadeira irrealidade, uma pura e simples ilusão de nossos sentidos e de nossa imaginação, que deve ser superada no mais íntimo de nossa consciência para que possa desaparecer como concretização exterior.
A primeira letra da Palavra Sagrada, com a qual costuma-se nomear a Coluna do Norte, lembra-nos esse Princípio do Bem, no qual devemos por toda nossa confiança, e que assim nos fará partícipes de seus benefícios, pois um Princípio faz-se operativo unicamente quando é reconhecido, vive e reina em nossa alma.
O homem escravo da ilusão do mal, reconhecendo-o como poder e realidade, dá-lhe preponderância em sua vida, e seus esforços para combatê-lo reforçam as correntes da escravidão. Só quando o reconhece como ilusão, e cessa consequentemente de Ter poder em sua consciência, é quando na realidade dele se liberta.
USO DA PALAVRA
A Palavra torna-se efetiva por meio de sua aplicação nas oportunas afirmações e negações entendidas para conduzir nosso ser interno ao reconhecimento ou percepção da Verdade que essa mesma Palavra quer reverlar-nos. Muito explícitas e oportunas são, sob esse aspecto, as palavras do maior Iniciado que conhecemos: Se perseverardes na minha Palavra (ou na Palavra) conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará.
A Palavra deve pois, afirmar-se e repetir-se com fidelidade e perseverança para que possa conduzir-nos à consciência da Verdade que encerra. Então, esta Verdade tornar- se-á efetiva em nossa vida, convertendo-se em verdadeiro poder que nos libertará do erro, do mal e da ilusão.
Além disso todas nossas palavras, indistintamente, possuem um poder construtivo ou destrutivo; as primeiras unem e atraem , as segundas desunem e afastam. É pois, de importância essencial que selecionemos com extremo cuidado aquilo em que pensamos e aquilo que dizemos, pois por trás de cada palavra ou pensamento, esta aquele mesmo Poder do Verbo que se encontra no princípio de toda coisa: Todas as coisas por ele foram feitas; e sem ele nada se fez.
A firmar o Bem, negar o Mal; afirmar a Verdade, negar o Erro; afirmar a Realidade, negar a Ilusão: heis aqui em síntese como deve ser usada construtivamente a Palavra. Como exemplo damos uma afirmação característica que deve ser lida e repetida individualmente, em íntimo segredo, e a semelhança da qual muitas outras podem ser formuladas:
Existe uma única Realidade e um único Poder no Universo: Deus, o Princípio, a Realidade e o Poder do Bem, Omnipresente e Omnipotente.
Consequentemente, não existe nenhum Princípio do Mal, este não tem realidade e poder verdadeiros, e é só uma imagem ilusória que deve ser reconhecida como tal para que desapareça.
Existe uma única Realidade e um só Poder em minha consciência: Deus, o Princípio, a Realidade e o Poder do Bem, a Omnipresença, Omnisciência e Omnipotência do Bem.
Por conseguinte, o mal não pode ter sobre mim e sobre minha vida poder algum, se eu mesmo (dando-lhe) vida ou combatendo-o) não o reconheço e confiro temporalmente realidade e poder: é um deus falso que se antepõe ao Verdadeiro Deus, que é Bem Infinito, uma sombra ilusória que impede que resplandeça a luz do Real.
O Espírito Divino é em mim, Vida Eterna, Perfeição Imortal, Infinita Paz, Infinita Sabedoria, Infinito Poder, Satisfação de todo o justo desejo, Providência e Manancial de tudo o que necessito e é manifestado em minha vida: meus olhos abertos à Luz da Realidade vêem em toda parte Harmonia e Boa Vontade: o Princípio Divino que se expressa em todo ser e em toda coisa.
O PLANO DO GRANDE ARQUITETO
O maçom coopera para a expressão ou realidade do plano do Grande Arquiteto, ou Inteligência Criadora, cujas obras aparecem em todo o Universo. Este plano é a Evolução Universal de todos os seres, o progresso incessante e a elevação da consciência, em constante esforço numa superação igualmente constante das imitações, constituídas por suas realizações anteriores.
O Plano do Grande Arquiteto age automaticamente na vida dos seres inconscientes, que sentem serem empurrados para a frente até o momento em que eles próprios atinjam o plano ou nível da autoconsciência, que caracteriza o estado humano e diferencia o homem do animal, que não tem necessidade de perceber a razão dos impulsos que o dominam, nem das Forças que o conduzem.
Mas para os seres dotados de autoconsciência e de faculdades de juízo e livre arbítrio (os que comeram do simbólico fruto da Árvore do Bem e do Mal), o progresso deixa de ser possível num estado de mera passividade, e percebe a necessidade de compreensão e inteligente cooperação, na proporção do desenvolvimento destas faculdades.
Em outras palavras, enquanto a Natureza, por seus próprios esforços, evolui como resultado de uma atividade de milhões de anos, através dos reinos mineral, vegetal e animal, até produzir sua Obra Mestra, o homem, cujas possibilidades espirituais o diferenciem por completo dos seres inferiores; e para que possa transformar-se num ser ainda mais elevado e perfeito, um Mestre, é necessário que o homem coopere voluntariamente com a Obra da Natureza, ou Plano do Grande Arquiteto.
Assim, o maçom distingue-se do profano, ao entender e realizar esta cooperação voluntária e consciente, convertendo-se num Obreiro dócil e disciplinando na Inteligência Criadora, esforçando-se em seguir a Senda que conduz ao Magistério, ou seja, à perfeição da Magna Obra do Domínio completo de si mesmo e da redenção e regeneração individual.
Mas para o aprendiz este Magistério é um Ideal necessariamente distante: ele ainda se encontra nos primeiros passos do caminho, nos primeiros esforços dessa cooperação Voluntária, com um Plano, uma Lei e um Princípio Superior que o conduzirão à realização das mais elevadas possibilidades de seu ser, e para isto, as qualidades que antes de mais nada deve adquirir são exatamente docilidade e disciplina.
É digno de nota que estas duas palavras sejam originárias respectivamente dos verbos latinos "docere" e "discere", que significam "ensinar" e "aprender". Dócil é o adjetivo que denota a disposição para aprender, a atitude ou capacidade necessária para receber o ensinamento.
Disciplina, em seus dois sentidos de "ensinamento" e "método ou regras às quais alguém se sujeita, vem de discípulo, termo equivalente ao de aprendiz. Portanto, ser disciplinado deve considerar-se como o requisito fundamental da Aprendizagem, que é a disciplina à qual o aprendiz ou discípulo naturalmente se submete para poder ser considerado como tal.
A disciplina é a parte que ao aprendiz compete no Plano do Grande Arquiteto: a harmonização de todo seu ser e de todas suas faculdades, que o fará progredir de acordo com as Leis Universais, transformando-o de pedra bruta na pedra polida capaz de ocupar dignamente seu lugar e preencher o papel e as obrigações que lhe competem.
Essa disciplina é voluntária, e de nenhuma forma poderá ser imposta de fora, ou por parte dos outros: é a disciplina da liberdade que tem na liberdade individual sua base indispensável, e é ao mesmo tempo a que outorga ao homem sua mais verdadeira liberdade e a custódia. E é uma disciplina libertadora, uma vez que libera as Forças Espirituais latentes, do "Deus acorrentado" que vive e espera no coração de todo homem, e é a fonte de seus mais íntimos anseios, de seus mais nobres ideais, de suas mais altas aspirações.
A GRANDE OBRA
O Plano do Grande Arquiteto está previsto para a realização de uma Grande Obra. Esta tem dois aspectos: individual e universal, com os quais o maçom é igualmente chamado a cooperar através de seus esforços e atividades.
Já vimos que a autodisciplina é o meio pelo qual o aprendiz se prepara para conseguir compreender e realizar as fases mais elevadas da Grande obra de Redenção e Regeneração Individual, através da qual o homem transformar-se-á num ser que estará num nível superior ao da humanidade, num verdadeiro sábio ou Mestre, num super- homem.
Seus esforços não devem ser dirigidos exclusivamente para o interior, mas será nas profundezas de sua alma que o maçom buscará a Luz que guia e ilumina a consciência, e que é ao mesmo tempo inspiração para sua atividade exterior, com a qual tem o privilégio de cooperar no Plano do Grande Arquiteto, na Grande Obra para o bem e o progresso do mundo e de seus semelhantes.
Por modesta que seja a atividade, tarefa ou trabalho que a cada maçom compete na vida profana, esta deixa de ser uma carga e converter-se assim numa atividade nobre e digna enquanto ele a considerar como realmente é, isto é como sua parte no grande Plano para a evolução de todos os seres, como sua cooperação individual e consciente na Grande Obra Universal.
Não há dessa forma, trabalho humilde que não esteja enobrecido e dignificado. Por outro lado, não há dificuldade ou problema superior às nossas forças que não nos seja dado resolver, quando percebemos que o Plano do Grande Arquiteto é e tem realmente de ser perfeito em todos os seus detalhes, nenhum dos quais pode ter esquecido a Inteligência Suprema, que além do mais se acha constantemente conosco e ao alcance de nossa inspiração para guiar-nos e iluminar-nos.
A dignificação do trabalho como a de toda atividade feita com a devida disposição de espírito, isto é, com a melhor inteligência e boa vontade de que dispomos, como cooperação para uma Grande Obra Universal, dirigida pela Inteligência Suprema ou Grande Arquiteto do Universo, é sem dúvida um dos maiores méritos da Maçonaria. Nenhum ser humano, qualquer que sejam suas condições e sua posição social, tem o direito de viver ocioso, senão que cada um deve esforçar-se por trabalhar construtivamente a serviço, utilidade ou benefício de seus semelhantes. Deve dedicar-se àquilo que sabe e pode fazer melhor, considerando que seja útil e proveitoso ao máximo.
A atividade de cada homem tem de ser pura e simplesmente expressão daquela parte do Plano do Grande Arquiteto que particularmente lhe diga respeito. Isto é, a expressão de seu Ideal mais elevado de atividade, em relação às suas capacidades atuais, e a que lhe melhor expresse as qualidades, faculdades e potencialidades latentes do seu ser, que eleve seu espírito e o faça progredir constantemente.
Por esta razão as profissões desonrosas e as que especulam sobre a desgraça alheia, como as de verdugo, açougueiro, agiota, espião, mantenedor de prostíbulos, etc., são indignas da qualidade de maçom, enquanto as nobres profissões materiais, por humildes que sejam (não esquecendo que de uma delas a Maçonaria tem sua origem e simbolismo), sempre dignificam sua categoria maçônica.
Finalmente, qualquer que seja sua atividade ou ofício, o maçom deve agir constantemente em perfeito acordo com seus Princípios e seu Ideal mais elevado, antepondo as razões e considerações espirituais às materiais, abstendo-se de tudo aquilo que sua consciência não aprovar e do que não lhe parecer perfeitamente justo, reto e digno de sua qualidade de maçom. Mas ao mesmo tempo deve cuidar para que um juízo superficial não lhe faça depreciar e considerar como indigno aquele que, na realidade, significa um real benefício e constitui uma atividade útil ou necessária.
A SUA GLÓRIA
A maçonaria dedica constantemente seus trabalhos à Glória do G. A.. Assim, também, deve fazê-lo cada maçom, em sua atividade individual, sem preocupar-se com a compreensão, aprovação ou reconhecimento dos homens ou com a compensação de seus esforços, buscando inicialmente realizar em si a Glória ou expressão do Princípio Divino.
Deve ter presente que sua obra ou trabalho, ainda que dirigidos a uma finalidade particular, não servem a não ser para glorificar ao Deus silencioso que nele mora, o inspira e o guia a cada momento, desejoso de encontrar sempre uma mais plena e perfeita expressão de si mesmo.
Igualmente deve Ter presente que este Princípio interior e transcendente, que é a Perfeição Inteligência e Onipotência, é a quem deve servir primeiramente, qualquer que seja sua direta ou indireta dependência exterior, e não antepor a aprovação e satisfação desta à Daquele.
Como a palavra "servir" nos conduz naturalmente a falar do serviço, é necessário que alguma coisa seja dito sobre como isto deve entender-se maçonicamente. Todas estas palavras provêem do latim servus, que significa originalmente "escravo", por ser "salvo" ou conservado com vida em lugar de ser morto, como se fazia naquele tempo com os prisioneiros.
É claro que o maçom, sendo um homem livre, nunca deve trabalhar com espírito servil, isto é como um escravo. Ainda que é certo que qualquer atividade, desde a mais humilde à mais elevada, pode e deve ser considerada como um serviço feito em benefício dos demais (o rei ou presidente de uma república que compreenda perfeitamente seu dever serve a seus cidadãos, do mesmo modo que o faz o simples varredor), o maçom, fiel a seus Princípios, tem o privilégio de servir com liberdade, isto é, fazendo-se guiar constantemente pelos motivos mais elevados e por considerações morais e ideais, mais que por conveniências materiais, como o faz o escravo destas, que não deixa de sê-lo, ainda que em sua mundana dignidade de rei.
A BUSCA DA VERDADE
Sem dúvida o primeiro é fundamental entre os deveres do maçom é realizar essa qualidade esforçando-se em compreender aquilo que ela verdadeiramente significa. Se bem é certo, que a iniciação confere o título de maçom, a qualidade deve ser adquirida individualmente, esforçando-se este para por em prática, como fórmula operativa, a iniciação simbólica que recebeu.
Estudar o simbolismo maçônico é esforçar-se para tornar efetiva a Verdade encontrada ou descoberta, de forma que a cada passo do pé esquerdo (inteligência ou compreensão da Verdade) corresponda um igual passo do pé direito (aplicação prática daquela Verdade), em perfeito esquadro com o primeiro. Nisto deve o maçom de qualquer grau, aplicar-se com todas suas energias, pois nunca perde mesmo com seu progresso na carreira maçônica, seu caráter inicial de aprendiz.
A busca da Verdade deve ser feita individualmente (como individual é a iniciação, e o caminho que a realiza), e a ajuda dos outros pode servir unicamente de guia, com a condição de que seja um experto, isto é, de que já conheça o caminho. Todas as demais teorias, opiniões e crenças que são vociferadas ao vosso redor são outros tantos murmúrios aos quais não devemos dar importância, se verdadeiramente queremos chegar ao termo de nossas aspirações.
Mas, para buscar eficazmente a Verdade e alcançá-la é necessário o veemente desejo de possuí-la, isto é, um desejo cuja força seja suficiente para impulsionar-nos, com a necessária energia, para fora do caminho usual das frivolidades, dentro e por cima da própria ilusão dos sentidos, conduzindo gradualmente nossos passos do Ocidente para o Oriente. Se este desejo não existe, é necessário esperar até que desperte, pois seria vão empreender a viagem sem este impulso íntimo pois só ele pode nos dar a força de superar e vencer todos os obstáculos que encontramos em nosso simbólico Caminho.
A busca deve realizar-se igualmente com perfeita liberdade de espírito, tendo-nos despojado de todos os erros, prejuízos e crenças que são os metais ou moeda corrente do mundo profano, exercitando-nos em pensar por nós mesmos, sem Ter outro objetivo que a Verdade, á qual chegaremos quando conseguirmos superar os próprios limites de nosso pensamento.
OS TRÊS DEVERES
A procura da Verdade conduzir-nos-á naturalmente ao reconhecimento dos três deveres, objeto de nossa consideração no Testamento, isto é, de nossa tríplice relação: 1º com o Princípio de Vida; 2º com nós mesmos, como expressão individualizada e pessoal de dito Princípio; e 3º com a humanidade, na qual devemos reconhecer outros tantos irmãos, quer dizer, outras tantas expressões paralelas do mesmo Princípio da Vida.
Desta trina relação, o maçom, como executor testamenteiro de si mesmo, é chamado a ser e dar testemunho vivo.
Seu dever com o Princípio da Vida está implícito na busca da Verdade que acabamos de considerar e que conduz naturalmente o Indivíduo a reconhecer sua exata relação com este Princípio e a reconhecê-lo como Realidade e Essência Verdadeira de tudo. Mas, o maçom não pode simplesmente limitar-se a reconhecer a Grande Realidade do Universo como um Princípio Abstrato, senão que é chamado a fazer deste reconhecimento um uso construtivo e prático.
Isto faz-se por intermédio do uso da palavra à qual já nos referimos anteriormente, a Palavra da Verdade que estabelece nossa íntima e direta relação com o Princípio da Verdade, que é também o Princípio da Verdade, que é também o Princípio da Vida do Ser.
Nosso dever ou relação com nós mesmos consiste em estabelecer a mais perfeita conexão ou alinhamento entre as duas partes ou polaridades de nosso ser, isto é, entre a personalidade e a individualidade, entre nosso Ser Mortal e nosso Ser Imortal, de forma que a primeira, em vez de ser a máscara que esconde, seja sempre uma melhor expressão da Segunda, atingindo-se a perfeição quando as duas estiverem intimamente unificadas e cesse toda a distinção.
Este é o simbólico trabalho da pedra bruta que deve ser conduzida, por meio do esforço constante da Vontade e do Pensamento, em harmonia com os Princípios Ideais, a fim de realizar sua perfeição interior até que a forma exterior tenha se identificado com a própria Perfeição Ideal e Latente.
Nosso dever ou relação com a humanidade não é menos importante que todos os deveres já anteriormente citados, dos quais é a conseqüência natural: o iniciado reconhece em cada homem um irmão, e em cada ser vivente uma expressão do mesmo Princípio de Vida que sente em si mesmo. Este reconhecimento manifestar-se-á primeiramente com a abstenção de tudo o que possa prejudicar, danificar ou fazer sofrer a outro ser vivo; e depois amando nossos irmãos ou semelhantes como a nós mesmos.
Em outras palavras, trata-se de por em prática os dois aspectos do mandamento ou Regra Áurea da vida: Não faças aos outros o que não queres que te façam, e Faz aos outros aquilo que desejarias que a ti fosse feito.
SEGREDO E DISCREÇÃO
A disciplina do silêncio é um dos ensinamentos fundamentais da Maçonaria. Quem fala muito pensa pouco, rápida e superficialmente, e a Maçonaria quer que seus adeptos se tornem mais pensadores do que faladores.
Não se atinge a Verdade com muitas palavras e discussões, mas sim com o estudo, a reflexão e a meditação silenciosa. Portanto apreender a calar é aprender a pensar e meditar. Por esta razão a disciplina do silêncio tem uma importância tão grande na escola pitagórica, onde a nenhum discípulo era permitido falar, sob nenhum pretexto, antes de que houvessem transcorrido os três anos de sua aprendizagem, período que corresponde exatamente ao do aprendizado maçônico.
Saber calar não é menos importante que saber falar, e esta última arte não é perfeitamente aprendida antes de que tenhamos nos adestrado na primeira, retificando por meio do esquadro da reflexão todas nossas expressões verbais instintivas.
No silêncio as idéias amadurecem e clareiam, e a Verdade aparece como a Verdadeira Palavra que é comunicada no segredo da alma a cada ser. A Arte do Silêncio é pois, uma arte complexa, que não consiste unicamente em calar a palavra exterior, mas que requer para que seja realmente completa, que também ocorra o silêncio interior do pensamento: quando soubermos calar nossos pensamentos então é quando a Verdade poderá intimamente revelar-se e manifestar-se em nossa consciência.
Para poder realizar esta disciplina do silêncio, temos igualmente de compreender o significado e o alcance do segredo maçônico. O maçom deve calar-se ante as mentalidades superficiais ou profanas sobre tudo aquilo que somente os que forem iniciados em sua compreensão podem entender e apreciar.
Por outro lado, os sinais e meios de reconhecimento, e tudo quanto se refere aos trabalhos maçônicos, devem conservar-se no mais absoluto segredo, posto que deste segredo depende a perfeita aplicação, utilidade e eficácia dos mesmos. São estes os meios exteriores ou materiais com os quais está formada e é soldada fazendo-se efetiva, a mística cadeia de solidariedade, que através da Maçonaria abraça toda a superfície da Terra.
Nenhuma razão justificaria que o maçom violasse o segredo ao qual se obrigou com solene juramento, sobre a forma de reconhecimento entre os maçons e o caráter de seus simbólicos trabalhos, nem sequer quando lhe parecer útil para sua própria defesa ou para a defesa da Ordem.
Como os iniciados sempre fizeram, os maçons devem suportar estoicamente e deixar sem resposta as acusações e calúnias das quais forem objeto, esperando com tranqüila segurança que a verdade triunfe e se revela por si mesma, pela própria força inerente a ela, como inevitavelmente sempre ocorre.
O iniciado deve, pois, renunciar sempre à sua própria defesa, quaisquer que possam ser as acusações e ofensas que lhe sejam dirigidas. Deve, além disso, estar disposto a sofrer, se necessário, uma condenação imerecida: Sócrates e Jesus, entre outros, são dois exemplos luminosos, cujo martírio foi transmutado em apoteose. A Verdade que silenciosamente atesta sua conduta, fará de per si, sem dúvida, sua defesa segura e infalível.
No que diz respeito ao ritual maçônico, é certo que boa parte das formalidades em uso na Sociedade não permaneceram inteiramente secretas. Mas, é igualmente certo que não podem ser de utilidade verdadeira senão para os maçons, da mesma maneira que os instrumentos de determinada arte só servem para os obreiros conhecedores e capacitados nessa arte. A grande maioria das obras que tratam de Maçonaria sempre caem, direta ou indiretamente, nas mãos de maçons, que, por outro lado, são os únicos capacitados para realmente entendê-las.
Assim pois, é dever do maçom cuidar de que seja observado o segredo também, naquelas partes do ritual maçônico que possam ter chegado a conhecimento público, abstendo-se de igualmente negar como de confirmar a autenticidade das pretensas revelações encontradas nas obras que tratam de nossa Instituição e que muitas vezes revelam extrema ignorância além de superficialidade.
Quanto ao verdadeiro "segredo maçônico", a sua natureza esotérica coloca-o para sempre ao abrigo dos espíritos superficiais, tanto fora como dentro de nossa Sociedade. Ainda que se possa falar deste segredo com toda clareza em obras similares à presente, quem as escreve bem sabe que sua compreensão e entendimento não podem ir mais além daquilo que lhe tenha sido destinado pela Hierarquia Oculta que governa a Ordem: os que lêem e entendem ou bem são maçons desejosos de conhecer o significado oculto do simbolismo de nossa; Arte, ou bem o são em espíritos superficiais estas obras não exerceram atração alguma.
A discrição do maçom que entende os segredos da Arte também deve ser exercida, com os irmãos que não possuem ainda a suficiente maturidade espiritual que é condição necessária para que possam fazer uso proveitoso de suas palavras.
A verdade não serve e não pode ser recebida por aquele que não se encontre ainda em condições de entendê-la, ou prefira viver no erro: todo esforço que for feito para convencê-lo transmutar-se-á em vosso prejuízo pessoal. Deixai, pois, em paz a todos aqueles irmãos sinceros, e muitas vezes entusiastas, que entendam a Maçonaria à sua maneira, com espírito semi-profano, e que se esforçam em praticá-la com boa Vontade, na medida de seu entendimento.
O maçom que conhece a verdadeira palavra deve estar sempre disposto a dar a letra que lhe corresponde quantas vezes esta lhe for pedida. Mas deve esperar sempre que esta letra lhe tenha sido direta ou indiretamente pedida fazendo com que ela esteja em perfeita correspondência e harmonia com a letra encontrada que lhe é dirigida como pergunta. A cada um se responde quando se julga necessário, de acordo com as idéias que ele expressar: não se fazer compreender bem causa dano igualmente a quem fala e a quem escuta.
NECESSIDADE DA TOLERÂNCIA
A mais ampla Tolerância é portanto necessária em matéria de idéias e opiniões, impondo-se como primeira condição da vida e da atividade maçônica, e como postulado necessário para que as diferenças entre as idéias não impeçam a realização da solidariedade e do espírito de fraternidade que sempre deve reinar entre os maçons.
Que cada um se esforce individualmente e de acordo com as possibilidades de sua inteligência e faça o melhor e mais sábio uso de seus conhecimentos; mas que cuide de não censurar os demais, seja porque ele não os entende ou porque eles não o entendem já que sempre ocorre um dos casos, e freqüentemente ambos de uma só vez.
Toda opinião sincera merece por tal razão ser respeitada ainda que possa haver discordância em seus méritos. A verdadeira liberdade de pensamento mede-se pela liberdade que cada indivíduo sabe conceder aos demais.
A diferença de idéias nunca deve produzir como resultado uma falta de simpatia e menos ainda de antipatia entre dois irmãos: aqueles que o fazem faltam a seus deveres de maçons. Devem isto sim, tratar de compreender e de identificar-se mutuamente o melhor possível com o ponto de vista contrário. Toda antipatia é fundamentalmente uma falta de compreensão, enquanto que compreensão e simpatia são sinônimos.
Por outro lado, sendo infinitos os pontos de vista desde os quais pode considerar-se a Verdade, é sempre presunçoso, denotando fanatismo e estreiteza de visão tornar-se juiz das opiniões alheias. Na realidade, ninguém pode ser os que podem afirmar estar absolutamente imbuídos da Verdade: a maioria das opiniões que se expressam participam, em diferente medida, do erro e da verdade, sendo as duas polaridades.
Além disso, é acima de tudo importante que cada homem busque, encontre e abra seu próprio caminho individual em direção à Luz: nunca podemos, portanto, pretender encontrar uma absoluta uniformidade de opiniões e de idéias, se bem que é correto dizer que estas se aproximam entre si próprias tanto quanto mais convergem as mentes individualmente para a Verdade. Mas cada um tem de pensar por si mesmo e ninguém pode tomar para si este trabalho alheio, se bem que pode se ajudar aos outros estimulando seus pensamentos.
DEVERES DA LOJA
Os maçons agrupam-se em lojas conforme as suas afinidades naturais, de ordem intelectual social e profissional. Cada Loja tem assim, sua particular fisionomia e orientação, expressão coletiva dos ideais e tendências individuais dos que a integram.
Como fundamental unidade maçônica, toda Loja representa uma diferente encarnação da Ordem da qual é o expoente, uma particular interpretação e realização das finalidades, propósitos e ideais da Maçonaria Universal. Esta vive, se manifesta e age em cada uma de suas Lojas indistintamente, como o Espírito Único que anima a todos os seres do universo, sendo cada ser uma diferente expressão individualizada do mesmo
Princípio.
Cada Loja encontra-se diretamente relacionada com as que a precederam, nas quais foram iniciados seus fundadores e membros filiados; e da mesma forma está relacionada com as Lojas que podem ser formadas por seus membros, e que nesta receberam a investidura e qualidade de maçom. Assim, todas as lojas do Universo, as que existiram nos anos e séculos passados, as que existem na atualidade, e as que serão criadas no futuro, formam, com sua filiação e descendência, uma cadeia ininterrupta que se estende desde épocas imemoriais, testemunhando a Vida única que anima o múltiplo corpo da Instituição e faz com que todas as Lojas estejam enlaçadas umas às outras.
Assim, foram transmitidos universalmente, de Loja em Loja, modificando-se e adaptando-se parcialmente as antigas tradições e os usos e fórmulas rituais. Assim, toda Loja formada por maçons regularmente iniciados, sem distinção de filiação ou obediência, pode se dizer que é, efetivamente, em sua jurisdição, a representante da Ordem.
Todo maçom tem o dever de filiar-se ou contribuir para a formação de uma Loja; e, dentro de sua Loja, todo maçom deve cooperar como melhor puder com a atividade impessoal do conjunto do qual forma parte integrante, anexando à Obra Comum o tributo de seu pensamento e boa vontade.
Cada um dos membros da Loja tem seu dever particular de acordo com o posto que ocupa e a atividade que lhe corresponde, devendo ser o seu intérprete fiel. Todo cargo indistintamente é uma oportunidade para manifestar e exercer as qualidades que para aquele cargo especialmente se exigem.
Assim, o Venerável é especialmente quem deve iluminar a Loja com a Sabedoria e o Reto Juízo que simbolicamente representa, dirigindo construtivamente sua atividade. O 1° Vigilante deve manifestar discernimento, clareza e força nas decisões, cooperando com o Venerável na ordem dos trabalhos, na sua exatidão e perfeito desenvolvimento. O 2° Vigilante deve tornar-se o expoente da Harmonia, cuidando para que todos se mantenham em um nível de perfeita equidade e compreensão, resolvendo assim suas dificuldades.
O Secretário tem a incumbência de anotar e registrar fielmente todas as atividades da Loja, assim como a de traçar suas pranchas. Enquanto o Orador, que toma assento em frente dele, tem a seu cargo tornar-se o porta voz das palavras e dos pensamentos de seus irmãos, assim como de toda a Ordem em seu conjunto, fazendo o uso fecundo e construtivo da palavra.
O Tesoureiro é o depositário tanto dos valores espirituais como materiais, e seu mais especial cuidado tem de ser que estes sejam sempre empregados para fomentar e enaltecer àqueles. O Hospitaleiro faz-se o expoente da solidariedade da Loja, cuidando para que nunca se enfraqueça o laço de união que sempre deve existir entre todos os membros da Ordem.
O Mestre de Cerimônias deve cuidar da ordem e da harmonia, assim como do prestígio dos trabalhos. O porta-estandarte deve custodiar o ideal ou Logos particular que a Loja representa e encarna.
Os dois diáconos, à semelhança de Mercúrio e Isis, são mensageiros da Sabedoria e da Vontade que se expressam na Oficina. E os dois Expertos tem de demonstrar sua perícia como guias dos candidatos e demais membros ainda inexpertos sobre o Caminho simbólico da Luz.
O Guarda do templo deve cuidar com toda atenção da cobertura da Loja, e da qualidade realmente construtiva dos elementos e materiais que adentram nela de forma que seus trabalhos sejam eficientes e completos.
Finalmente, cada membro da Loja esforçar-se-á em ser realmente uma das colunas do simbólico Templo que a própria Loja representa, fixando seu olhar nos Princípios Ideais que constituem seu telhado, e apoiando firmemente os pés sobre o solo da contingência e da realização objetiva. Desta forma, o cumprimento individual dos deveres designado a cada irmão fará com que a Loja prospere e seja uma contribuição efetiva à prosperidade e ao progresso da Ordem.
OS TRABALHOS MAÇÔNICOS
Os trabalhos representam a atividade coletiva dos irmãos na Loja. O que caracteriza estes trabalhos e os distingue das reuniões e assembléias profanas é o cerimonial especial segundo o qual se desenvolvem, e particularmente, são abertos e encerrados; cerimonial este cuja peculiar nota distintiva é a ordem, manifestando-se nesse ritmo constante que favorece a continuidade dos já realizados.
Tanto a abertura como o fechamento dos trabalhos verifica-se em horas convencionais e simbólicas, sobre as quais o Ven. Mestre sede informações ao 1 Vig. Na maioria dos rituais atualmente em uso, estas horas são do meio dia à meia-noite para os três graus simbólicos, significando o meio-dia (a hora em que o sol está no zênite, na plenitude de seu poder luminoso e calorífico) a maturidade espiritual necessária para ser maçom, e a meia noite (hora na qual a luz do dia desapareceu por completo por estar o sol no nadir), o momento em que já não é possível atuar nesses trabalhos de modo eficaz.
Entretanto, em nossa opinião é mais razoável e mais coerente com as antigas tradições maçônicas que os trabalhos sejam abertos e encerrados em horas diferentes para os distintos graus (que representam diferentes épocas ou etapas de evolução) e que, particularmente para o grau de evolução) e que, particularmente para o grau de aprendiz, os trabalhos sejam iniciados a saída do sol (isto é, naquele período da vida no qual a luz espiritual se manifesta primeiro na consciência) e sejam concluídos ao meio- dia (ou seja na hora em que a plenitude da luz permite a passagem para uma câmara ou grau superior).
Também do ponto de vista do simbolismo material, estas horas são as mais apropriadas para o trabalho especial do aprendiz (desbastar a pedra bruta, aproximando-a de uma forma em relação ao seu destino), enquanto as horas sucessivas podem ser utilmente aproveitadas por outros obreiros que completem o trabalho dos primeiros, levando as pedras e dispondo-as, oportunamente, no edifício em construção, para cuja finalidade foram lavradas.
O reconhecimento da hora deve ser acompanhado da idade, que possui um valor equivalente, representando aquela época ou estado na evolução individual em que é possível tomar parte nos trabalhos maçônicos, isto é, agir em harmonia com a lei e o Princípio Construtivo do Universo. Os três anos do aprendiz significam, na evolução individual, a passagem pelas três grandes etapas evolutivas representadas pelos três reinos da natureza; mineral, vegetal e animal, nos quais se desenvolve progressivamente aquela individualidade que no estado humano aparece em sua perfeição, como autoconsciência, com as qualidades que a acompanham: o pensamento consciência, o juízo e a vontade livre.
Não devemos nos descuidar da particularidade de que o Ven. Mestre toma informação exatamente do 1 Vig. tanto a respeito da hora quanto da idade. Por intermédio destas perguntas, o primeiro não só se assegura da qualidade maçônica da pessoa com a qual fala, o que constitui a primeira condição para que os trabalhos ocorram, mas que torna evidente a necessidade (ou Segunda condição) de que o tempo, que representa o momento evolutivo e as circunstâncias externas, seja além do mais oportuno e favorável.
A atividade maçônica requer tempo e condições especialmente adaptadas; necessita que a responsabilidade do ambiente faça fecundo e próspero o labor que queremos empreender. Quando este não o for, a pergunta ficará sem resposta, e será necessário esperar até que chegue a hora.
Em outras palavras, permanecendo dentro de nosso coração tenazmente fiéis a nossos ideais, projetos e aspirações, assim como aos esforços que tenhamos empreendido, haveremos de saber esperar a hora com Fé imutável: o tempo não pode deixar de nos fazer justiça e recompensará infalivelmente nossa perseverança.
ABERTURA DOS TRABALHOS
A primeira condição para que possa proceder-se à abertura dos trabalhos é que a Loja esteja coberta, tanto exterior como interiormente: exteriormente coberta das indiscrições profanas, e interiormente pela qualidade de maçons que todos os presentes devem demonstrar.
Ao Guarda do Templo, é a quem se incumbe de assegurar que o templo esteja perfeitamente isolado do exterior e além disso cuidá-lo, constantemente, durante o desenvolvimento dos trabalhos, vigiando a Porta do Templo, armado de espada, e abrindo-a, com a permissão do Ven., unicamente aos que forem reconhecidos como genuínos e legítimos maçons. Simboliza o Guarda-Templo a faculdade que se encontra no umbral de nossa consciência, faculdade esta que deve vigiar para que naquela consciência não penetrem os erros profanos e todos aqueles pensamentos que não venham a receber a aprovação de seu Ser mais elevado (o Ven. Mestre).
O fechamento hermético interior é assegurado por intermédio do sinal que fazem os presentes, a convite do Ven. Mestre, e de cuja exatidão este se assegura com a ajuda dos dois Vigilantes. O sinal indica a qualidade do maçom ou Obreiro consciente e disciplinado do Princípio Construtivo do Universo, e assegura ao mesmo tempo a fidelidade e discrição que devem sempre acompanhar dita qualidade, representando a vigilância que o maçom se dispõe a observar em suas palavras, e a perfeita retidão com as qual as medirá, do mesmo modo que os seus pensamentos e ações.
Segue a esta dupla segurança um diálogo entre o Ven. e os principais oficiais da Loja, pelo qual certifica-se de que cada um esteja em seu lugar e seja consciente dos deveres e obrigações que lhe correspondem. O Guarda-templo, o 2° e 1° Diácono, o 2° e 1° Vigilante, são interrogados sucessivamente, e cada um declara sua respectiva função, como razão explicativa do lugar em que se assentam.
O diálogo prossegue entre o Ven. e o 1 Vig., declarando este último as atribuições e deveres do primeiro, pelo fato de sentar-se no Oriente, e os princípios e finalidades da Ordem em geral e das reuniões maçônicas em particular.
Tendo cumprido estas diferentes formalidades iluminativas e explicativas, e com a segurança de que a hora e a idade são convenientes, adequadas e oportunas, o Ven. Mestre e depois ambos os Vigilantes, fazem a todos os presentes o convite para que lhe ajudem a abrir os trabalhos. Este convite demonstra em primeiro lugar a necessidade de que todos percebam a importância e solenidade do momento, preliminar para a invocação do G. A. em sua tríplice expressão, fixando toda a atenção nas palavras que vão ser pronunciadas, e que necessitam o uníssono espiritual dos corações de todos os membros da Loja, despertando em cada um deles um eco profundo. Em segundo lugar frisar bem a necessidade de cooperação, como condição indispensável para a eficiência de qualquer atividade maçônica.
O ACENDER DAS LUZES
Tendo o Ven. a certeza de que todos os presentes receberam o convite que lhes foi transmitido, põe-se todos de pé e à ordem, e o Ven. acende o círio simbólico da Sabedoria do Grande Arquiteto, invocando-o para que ilumine os trabalhos.
O 1 Vigilante imita-o, acendendo sua luz, que simboliza a Força Onipotente do Eterno, invocando-a para que acrescente e faça prosperar esses mesmos trabalhos. O 2° Vigilante faz o mesmo com seu círio, que simboliza a Beleza Imortal do Princípio da Vida Universal, invocando-a para que os adorne.
Esta iluminação preventiva da Loja precede e predispõe à solene invocação feita à Glória do Grande Arquiteto e em Nome da Maçonaria Universal, com a qual são declarados abertos os trabalhos, sendo esta declaração acompanhada pelos toques da três luzes e confirmada com o sinal e a bateria de todos os presentes. Estes elementos, que sublinham a invocação, conferem à cerimônia uma austera e profunda beleza.
Havendo declarado abertos os trabalhos, à Glória do Ser Supremo, o primeiro cuidado será agora que a Palavra Divina, ou seja o Logos, brilhe na Loja e dirija a atividade construtora dos obreiros no Templo simbólico. Com este fim, estando todos os representantes de pé e à ordem, o 1° Vigilante, acompanhado pelo Mestre de Cerimônias, encaminha-se solenemente ao Altar, para abrir o Livro Sagrado e o Compasso, dispondo oportunamente este e o esquadro sobre as misteriosas palavras com as quais se inicia o Evangelho de S. J..
Ao pronunciar-se estas palavras, brilha a luz do Delta e toda a Loja se ilumina completamente para que os trabalhos possam desenvolver-se em ordem e harmonia, manifestando-se efetivamente a presença do Grande Arquiteto no interior de todos os presentes, como Ideal Inspirador da atividade.
FECHAMENTO DOS TRABALHOS
Antes de proceder ao fechamento dos trabalhos, concede-se a palavra "a bem da Ordem, da Oficina em particular, e da humanidade", depois do que circula o tronco da solidariedade.
Com o primeiro destes dois atos dá-se a todo irmão que o desejar a oportunidade de falar sobre algum assunto particular de seu interesse, dirigindo a atenção da Loja para ele. Também, nesta ocasião, aproveita-se para apresentar as escusas dos irmãos que não tenham podido assistir à presente, e para saudar os irmãos visitantes que representam suas respectivas Lojas. Estes, igualmente, podem tomar a palavra, trazendo à Loja a expressão de seus sentimentos fraternos, assim como as mensagens especiais das quais tenham sido encarregados, estreitando-se assim, intimamente, as relações de amizade entre as diferentes Lojas.
Pelo segundo ato, cada maçom expressará sua solidariedade com toda a Família Maçônica e Humana, por meio de uma contribuição proporcional às suas possibilidades e depositada secretamente no tronco, que será destinada a aliviar as desgraças alheias, ou servirá de cooperação para alguma obra benéfica.
O fechamento dos trabalhos verifica-se de forma inversamente análoga à cerimônia de abertura: tendo sido concedida a palavra, circulado o tronco, e feita a leitura da ata do Secretário (é mais conveniente que isto seja feito ao término da própria reunião, em vez de deixá-la para a seguinte, para que todos possam melhor julgar sua exatidão), o Ven. informa-se se os irmãos das duas colunas estão contentes e satisfeitos.
Este será, pois, a atitude de todos os irmãos na Loja, quando os trabalhos tiverem sido convenientemente conduzidos. Obtida a confirmação de que assim é, o Ven. pede informação ao 1 Vig. sobre a idade e a hora, e como estas são justas, anuncia por meio dos Vigilantes a toda Loja que vai proceder ao fechamento dos trabalhos, requerendo-se para este ato, a cooperação unânime de todos os presentes, da mesma forma que para a abertura.
Feito o anúncio, com o fim de que todos os irmãos se disponham em atitude conveniente para participar da cerimônia, a palavra sagrada passa do oriente ao Ocidente, e do Ocidente ao Sul por meio dos Diáconos, e, sendo devidamente recebida pelo 2 Vig., este o anuncia, comunicando que todo está justo e perfeito.
Pode agora proceder-se ao fechamento propriamente dito, que é feito por intermédio dos golpes simbólicos repetidos pelas três luzes, e mediante a fórmula pronunciada pelo Ven. Mestre com o qual se declaram fechados, seguindo-se também a esta declaração, o sinal e a bateria.
Então o 1 Vig., acompanhado pelo Mestre de Cerimônias, procede ao fechamento do Livro e do Compasso, e se apaga a Luz do Delta, depois do que apagam-se as três velas simbólicas, que correspondem às três luzes da Loja, com palavras análogas às que foram pronunciadas ao serem acesas.
Antes de separar-se, é costume jurar segredo sobre os trabalhos dos quais os presentes acabam de participar. Este segredo construtivo representa o silêncio que deve preceder a toda nova atividade, podendo-se compará-lo à escuridão protetora, que dentro do seio a terra, favorece à germinação da semente em seus primeiros estados até que tenha aberto seu caminho para a Luz.
Depois disto procede-se à formação da cadeia, manifestando esta de forma tangível o laço de fraternidade que deve existir entre todos os maçons, símbolo da união íntima de todas as boas vontades, necessária ao triunfo das boas causas e ao progresso da humanidade.
É conveniente que se dedique este momento que precede à separação dos irmãos ao recolhimento por alguns instantes, concentrando-se a mente sobre alguma afirmação que o Ven. Mestre possa ter sugerido.
COMO DEVE SER ENTENDIDA A SOLIDARIEDADE
A solidariedade é o sentimento de união que nasce de um Ideal comum, de uma comunhão de aspirações, uma união consolidada no mundo espiritual, manifestada exteriormente em pensamentos, palavras e obras por meio dos quais evidencia-se e se realiza em termos efetivos de vida.
Os que lutam por uma idéia particular são solidários em tudo o que se relaciona com aquela idéia. Os que principalmente por uma idéia particular, esforçam-se para obter o triunfo impessoal do Bem, da Verdade e da Virtude (como são, ou deveriam ser, os maçons), conviria que estivessem ainda mais irmanados entre si, uma vez que o triunfo das mais nobres aspirações humanas não pode ser conseguido senão com a cooperação e os esforços unidos de todos os que as compreendam.
A solidariedade dos maçons deve ser, pois solidariedade no Bem, na Verdade e na Virtude, solidariedade em tudo o que for Justo, Nobre, Digno e Elevado. Uma solidariedade pronta para expressar-se em qualquer momento com palavras e ações perfeitamente de acordo com estas aspirações que devem dirigir-nos e com as quais verdadeiramente se realiza o místico Reino dos Céus sobre a terra e se faz a Vontade de Deus, que é o Bem e seu triunfo, assim na terra como no céu.
Quando assim o fazem os verdadeiros maçons demonstram serem verdadeiros cristãos, entendendo e pondo em prática as palavras do sublime Mestre de Nazaré, palavras que interpretam e aplicam por meio do Compasso e do Esquadro, que são os instrumentos da inteligência com os quais conhecemos a Verdade e estamos capacitados a aplicá-la construtivamente às necessidades da existência.
COMO DEVE SER REALIZADA A FRATERNIDADE
Fala-se muito de fraternidade entre os maçons, como entre os membros de outras sociedades que a sustentam entre seus objetivos; mas, se do campo da palavra e da pura teoria, dirigimos nosso olhar à prática da vida diária, vemos como a efetiva realização da fraternidade deixa muito a desejar, e esta é a causa da desilusão e perda total da confiança de muitos na veracidade deste ideal.
E, entretanto, nunca podemos esperar uma realização de fraternidade diferente do entendimento particular de cada um. Em outras palavras, não é suficiente ser chamado maçom ou ser membro de outra fraternidade para que os demais sintam-se no direito de exigir uma manifestação de fraternidade em todos os campos da vida, conforme os seus ideais particulares.
O amor é dado, mas nunca pode ser exigido: o mesmo deve ser dito da fraternidade, que não pode ser senão uma manifestação do amor. Nenhuma verdadeira e sincera manifestação de fraternidade pode obter-se a não ser quando verdadeiramente a sentimos e realizamos interiormente: um maçom tornar-se-á verdadeiro maçom e irmão conforme sinta em si mesmo o Ideal Maçônico e possa se reconhecer como irmão dos demais.
Quando se progride no Caminho da Vida (do qual a Maçonaria nos oferece em suas cerimônias uma maravilhosa interpretação) e se aproxima do reconhecimento (que não é unicamente o frio conceito ou percepção intelectual, mas a direita consciência e sentimento) da realidade do Princípio Único de tudo, sente-se então, interiormente e de uma forma sempre mais clara, sua íntima união e solidariedade com toda a manifestação da Vida, e desta íntima consciência e sentimento, uma verdadeira compreensão e realização da fraternidade será a conseqüência espontânea e natural.
Que cada um, pois se eleve, à sua maneira, e conforme lhe for possível, sobre seu egoísmo e sua ignorância, e que reconheça sua verdadeira natureza, manifestação do Princípio da Vida que vive em todos os seres (e que tem recebido na Maçonaria o nome de Grande Arquiteto), reconhecendo assim seus deveres, ou seja sua relação com o próprio Princípio da Vida, consigo mesmo e com seus semelhantes. Este é o caminho por meio do qual a Maçonaria ensina a fraternidade e busca sua mais prática e efetiva realização.
Esta fraternidade será primeiramente entre irmãos, pois só os que a entendem e se reconhecem como irmãos podem realizá-la; mas, como o Amor não pode Ter nenhum limite verdadeiro, e não existe condição ou estado em que não possa manifestar-se, não há ser ou manifestação de Vida Universal quem não possa ou deva estender-se. Esta é a Fraternidade dos Iniciados e dos verdadeiros Mestres.
Busquemos, pois, o Princípio Supremo e básico de tudo, reconheçamos a Verdade da Unidade da Vida e da íntima indivisibilidade de todos os seres: na proporção em que efetivamente cheguemos a este conhecimento, chegaremos, também, a reconhecer e realizar a verdadeira Fraternidade Maçônica, e esta cessará de ser uma vã utopia e um ideal abstrato fora das possibilidades humanas. Assim se realiza o Grande Mandamento do qual nos falava Jesus, cuja segunda parte, "ama a teu próximo como a ti mesmo", é o corolário natural da primeira: "ama a Deus (o Princípio ou Realidade da Vida) com todas as tuas forças, com toda tua alma e com todos teus pensamentos.
COMO DEVE PRATICAR-SE A CARIDADE
Fala-se também muito, na Maçonaria e em outras instituições filantrópicas, da caridade e beneficência, como deveres que os mais afortunados tem para com os "desafortunados e deserdados da sorte". Mas, dificilmente a caridade e beneficência chegam a ser verdadeiramente caritativas e benéficas, porquanto procedem do erro, bem mais que da verdade, e assim contribuem muitas vezes a reforçar e tornar estático ou crônico o mal que querem eliminar, reforçando sua raiz.
Como ensinado por todos os sábios em todos os tempos (e esta pode ser, de certa maneira, a pedra de medição da verdadeira Sabedoria), a raiz e a causa primeira de todos os males, deve ser procurada no erro ou na ignorância. E até que não se remedie este erro e esta ignorância, toda a forma de caridade não será mais que um paliativo, pois não elimina a raiz do mal, senão que muitas vezes a torna ainda mais forte e vital com a própria consciência do mal que estimula.
Por exemplo, não há dúvida que o Tronco de Solidariedade oportunamente circulando em favor de um irmão necessitado, ou de outro caso piedoso, possa constituir uma ajuda útil e providencial a ajuda direta a esta ou aquele irmão. Mas, se a ajuda peculiária (cujo valor e efetividade não podem ser senão temporais e transitórios) é acompanhada pelos presentes, como quase sempre acontece, por seus sentimentos e pensamentos de compaixão, e pior ainda, de comiseração, ou, se a pessoa necessitada for considerada impotente e em estado de inferioridade, a influência destes pensamentos de compaixão, e pior ainda, de comiseração, ou, se a pessoa necessitada for considerada impotente e em estado de inferioridade, a influência destes pensamentos torna muito pouco desejável e efetiva a ajuda, pois que contribui para abater bem mais que a realçar seu estado moral e a confiança em si mesmo.
O mesmo deve ser dito, e com maior razão, de toda forma de beneficência que mais que uma simples e espontânea manifestação do espírito de fraternidade entre irmãos livres e iguais, torne manifesta a distância entre benfeitor e beneficiado, ou de alguma forma em humilhação, se transforme para este a dádiva, com a qual paga muito cara a ajuda recebida. Não vamos dizer nada da beneficência que serve de pretexto à ostentação e à vaidade, pois neste caso dificilmente poderá considerar-se digna de tal nome.
A verdadeira beneficência deve ser secreta e espontânea e não deve envolver em si nenhuma forma de humilhação. Prever as necessidades de um irmão que se ache manifestamente em dificuldades é muito mais fraternal que esperar que este peça uma ajuda, pois com o pedido esta já está quase paga e nada se paga tão caro como quando se pede.
A mão que dá com verdadeiro espírito de fraternidade deve ser escondida, e "a esquerda não deve saber o que faz a direita". Deveria assim condenar-se absolutamente a prática em uso em algumas Lojas, de pedir a outras uma contribuição para ajuda a algum irmão, especialmente dando o nome deste irmão. Nem na própria Oficina deveria ser divulgado o nome da pessoa socorrida, pois não há necessidade de que se torne conhecida, com exceção daquelas que diretamente intervêm para ajudá-la.
A MAIS VERDADEIRA AJUDA
Ainda que a ajuda direta possa ser, em alguns casos, útil e necessária (sempre que for uma verdadeira manifestação espontânea de solidariedade e fraternidade) é muito melhor dirigir-se à raiz do mal, em vez de contentar-se com remediar temporariamente seus sintomas exteriores.
A pessoa que se acha em circunstâncias materiais difíceis tem antes de tudo, necessidade de ser ajudada espiritual e moralmente, com pensamentos positivos que reergam seu estado de ânimo abatido, e tenham para ela o efeito das palavras taumatúrgicas: Levanta-se e anda! Ajudar um irmão a caminhar sobre seus próprios pés é muito melhor que provê-lo de muletas. Facilitar um meio de ganhar por si mesmo aquilo de que necessita é muito mais fraternal, desejável e digno que facilitar-lhe uma ajuda que o ponha, como beneficiado, em condições de inferioridade.
Mas quando isto não for possível momentaneamente, compartilhar o que temos, com verdadeiro espírito de solidariedade fraternal, segundo o próprio ditado da consciência, deve ser considerado como um dever elementar, um privilégio e uma oportunidade para todo iniciado que verdadeiramente sinta em seu coração o laço de fraternidade, a mística cadeia de união que o une a todos os seres, e em particular aqueles com os quais tem uma mais profunda afinidade moral e espiritual.
As precedentes considerações não devem ser entendidas com meios para afastar alguém de seus deveres de solidariedade para com seus semelhantes em geral, e seus irmãos em particular, mas ao contrário, para que eles sejam melhor atendidos e praticados, despojados de toda ostentação por parte de quem dá e de toda humilhação por parte de quem recebe, como convêm para uma verdadeira expressão do espírito maçônico, que não pode ser nunca isolamento negativo nem deprimente solicitude.
Elevar-se sobre os sentimentos e os conceitos profanos de caridade, para realizar a verdadeira fraternidade dos iniciados, na qual aquilo que é feito por um irmão possui o mesmo espírito como se fosse feito para si mesmo, sem que disso nasça nenhuma obrigação ou dever de mostrar-se reconhecido, este tem de ser o ideal de todos os verdadeiros maçons.
O RESPEITO À LEI
O respeito a Lei e à Autoridade Constituída (e, por conseqüência, a qualquer forma de governo sem distinção) tem sido sempre um dos primordiais requisitos da Maçonaria e das regras de conduta dos iniciados de todos os tempos.
Ainda que estes reconheçam por cima de toda Lei e Autoridade humana a Lei Suprema da Verdade e a Suprema Autoridade do Espírito, e num tão íntimo reconhecimento encontrem uma perfeita liberdade e nela descansem (uma liberdade interior que nenhuma condição externa poderia tirar-lhes e nem limitar), não podem desconhecer nas Leis e Autoridades Humanas outras tantas manifestações e emanações da Lei e Autoridade Divina, na qual unicamente podem aquelas exercer e possuir o poder.
Por esta razão o iniciado, se bem perfeitamente livre de todo espírito de sujeição ou humilhação, se impõem o dever de respeitar as Leis e Autoridades do país em que se encontre, sem discutir sua legitimidade; e se fosse vítima de um preterimento ou de uma injustiça, não se oporia ao adversário, mas, ao contrário esperaria da Lei e do Poder Supremo aquela perfeita justiça que nunca será esperada em vão quando nela se depositar absoluta confiança.
Em outras palavras, o iniciado vê os homens e as coisas como expressões muitas vezes inconscientes de poderes, forças, leis ou necessidades que aqueles desconhecem: por esta razão, nunca culpa aos homens e às circunstâncias, senão que aceita serenamente a aparência do mal, sem deixar-se cegar por ele, e sem considerá-lo como definitivo (pois nesse caso ele mesmo tornar-se-ia seu escravo e sua vítima), preparando-se para ver em tudo o triunfo inevitável da Justiça e do Bem.
Por conseguinte, o verdadeiro iniciado nunca será um revolucionário ou um rebelde, um conspirador contra a Lei e a Autoridade constituída: conhecendo a ilusão dos meios e remédios exteriores, procurará remediar interiormente as coisas e males externos; e isto é feito por meio da compreensão do amor e da cooperação mais útil, eficaz e construtivamente que com meios exteriores de violência e rebeldia.
Para os maçons, as Leis e Autoridades Maçônicas (assim como as Leis e Autoridades Religiosas para os membros de determinada religião) devem ser consideradas com respeito da mesma forma que as Leis e Autoridades exteriores. Mas, por cima destas Leis escritas, o verdadeiro maçom deve lembrar que a Suprema e mais verdadeira Lei Maçônica é a que o Grande Arquiteto grava no coração de todo Adepto fiel, isto é, a que é interiormente reconhecida como expressão da própria verdade; e que nenhuma autoridade Maçônica é superior à Suprema Autoridade do Grande Arquiteto, que é o Princípio e a Realidade sobre a qual se apoia todo o Universo.
O SALÁRIO DO APRENDIZ
O salário que o Aprendiz recebe, como resultado de seus esforços, à semelhança do salário percebido pelo obreiro como prêmio e compensação de seu trabalho, deve ser objeto de uma especial consideração.
Os antigos obreiros recebiam, além dos víveres em espécie, um soldo ou compensação em dinheiro para comprar o sal e outras coisas de que necessitavam; daqui vem o nome de salário. Mas talvez não seja completamente estranho o fato de que, em termos de salário do Aprendiz estes o recebam na Coluna B. a qual corresponde ao princípio hermético feminino do sal, do qual já falamos anteriormente.
O Aprendiz recebe o salário depois de realizado o seu trabalho, aproximando-se da Coluna B. Isto significa que o iniciado somente consegue obter o resultado de seus esforços quando se aproxima do reconhecimento do Princípio da Onipotência, expresso pelo sentido da Palavra que é o próprio nome desta coluna e que, como dissemos, significa: "Na Força".
Em outras palavras, o Aprendiz progride, e neste progresso recebe a compensação de seus esforços, conforme se aproxima, como fim de seus estudos e deduções, a este reconhecimento vital que realiza o primeiro dever de seu testamento; isto é, na medida da Fé que desenvolve no Princípio da Vida e em seu poder, como coluna ou sustentáculo de sua vida individual.
O progresso do Aprendiz está caracterizado pelo desenvolvimento desta Fé e confiança no Princípio Espiritual da Vida, no qual temos nossa origem, que nos criou ou manifestou (como diferentes expressões individualizadas de seu Ser ou Realidade, divididas e separadas na aparência, mas intimamente unidas e inseparáveis em essência e realidade), que continuamente nos sustentam, guiam e dirigem para o desenvolvimento e a expressão das mais elevadas possibilidades que ainda se encontram em estado latente em nosso ser.
Esta fé, própria de quem se iniciou no conhecimento do Real que se esconde atrás da aparência exterior ou visível das coisas - e que não é fé cega, uma vez que se baseia na própria consciência da realidade -, é algo desconhecido para o profano, escravo da ilusão dos sentidos, que confunde a aparência com a realidade, e não o tendo reconhecido (por não Ter podido adentrar à sua consciência), nega a existência de um Princípio Espiritual como Causa Imanente e Transcendente da realidade visível.
Não pode obter-se este conhecimento, esta convicção que é um estado interior, sem o estudo, o trabalho e a perseverança: A Fé iluminada de que falamos, é pois, um verdadeiro salário, fruto ou resultado de longos e persistentes esforços sobre o Caminho da Verdade, depois de temo-nos despojado de todas as superficialidades, crenças positivas e negativas, erros e prejuízos do mundo profano.
Assim, estabelece o iniciado uma relação iluminada com o Princípio da Vida, cuja realidade reconheceu em sua consciência, relação que tem sua base no reconhecimento expresso pela própria Palavra Sagrada, que será daqui para frente, uma verdadeira coluna na qual pode apoiar-se com toda confiança e que o suporta em suas dúvidas e vacilações.
CONCLUSÃO
Chegamos ao final desta resenha interpretativa dos símbolos do primeiro grau maçônico, na qual nos propusemos, como objeto fundamental, a dar a quem avidamente busca a Verdade, a quem deseja penetrar e reconhecer o sentido iniciático destes símbolos, uma chave que lhe sirva para abrir, por seus próprios esforços, a Porta Hermética do Mistério, atrás da qual eles se encerram impenetravelmente ao entendimento profano.
Não demos nem pretendemos ter dado a verdade, pela simples razão de que esta nunca pode ser dada exteriormente, senão que deve ser buscada e reconhecida nas profundezas da alma; só indicamos, ou melhor dizendo, temo-nos esforçado em esclarecer o Caminho que a maçonaria ensina nesta busca individual por intermédio de seus símbolos, cerimônias e alegorias. O segredo maçônico deve ser procurado e encontrado individualmente, pois de outra forma deixaria de ser um segredo.
Os lábios da Sabedoria estão fechados a não ser para os ouvidos da compreensão. Só quem se encontra num particular estado de consciência e maturidade espiritual pode reconhecer interiormente determinada Verdade, compreendendo e tirando proveito das palavras que querem indicá-la ou revelá-la.
A Esfinge, aquele maravilhoso monumento que restou da mais antiga civilização egípcia, é uma representação escultural deste fato: é muito difícil dizer se os seus lábios estão abertos ou fechados; pode-se talvez dizer que estão abertos e fechados ao mesmo tempo, atrás do misterioso sorriso que os anima. Verdadeiro símbolo do ensinamento esotérico, a Esfinge fala ainda para quem tem ouvidos para ouvir, mas permanece em hermético silêncio para quem não tenha adentrado naquele estado de consciência no qual a Verdade espiritual pode ser reconhecida e assimilada.
O mesmo deve ser dito dos símbolos maçônicos; como a Esfinge, eles falam para quem os escuta com os ouvidos da compreensão, mas guardam seu segredo para quem não sabe descobri-lo.
A Maçonaria é uma Ciência e uma Arte que se revela progressivamente a quem se esforça e persevera no estudo e na prática, por meio da compreensão e do uso de seus instrumentos simbólicos. Assim pois, a distinção entre maçom e profano não pode ser determinada unicamente pela cerimônia através da qual um profano é admitido e reconhecido como membro da Ordem, senão que depende da efetiva realização desta qualidade.
A maioria dos maçons permanece irremediavelmente profana no que se refere ao entendimento e à realização da finalidade iniciática da Ordem e ao verdadeiro sentido dos símbolos e cerimônias. Mas, isto não lhes impede de ser bons maçons, se eles se esforçarem sinceramente, na medida de sua compreensão e, sobre tudo, se são fiéis aos seus ideais pondo em prática o que entenderam dos Princípios Morais da Ordem. Não há necessidade de conhecer a Doutrina Esotérica revelada pelos símbolos maçônicos para praticar os princípios da fraternidade, mas, é necessário saber discernir entre a ilusão exterior do egoísmo e da separatividade, e a realidade da Unidade Interior de tudo, para compreendê-la e realizá-la efetivamente.
Todo homem sincero encontra, pois, na Maçonaria um Caminho de Progresso que se torna sempre mais efetivo na medida da sua boa vontade e perseverança, um progresso ao mesmo tempo intelectual e moral, adaptando-se perfeitamente seu ensinamento simbólico à compreensão de todas as inteligências, ainda que não lhes seja dado a todos penetrar no verdadeiro significado íntimo deste ensinamento.
Mas sempre o progresso será o resultado do esforço individual e do ardor e da perseverança através dos quais cada um se esforça em realizar as finalidades da Ordem, encaminhando-se para uma mais profunda compreensão da Verdade, pondo os pés de uma maneira mais firme, equilibrada e segura sobre a senda da Virtude.
FIM